Acórdão nº 618/14.4T8VRL-G.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Março de 2020

Data12 Março 2020

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I.

Relatório Por sentença proferida em 16/03/2015 foi decretada a insolvência de E. P., tendo sido proferido despacho liminar de admissão do pedido de exoneração do passivo restante em 10/08/2015.

Em 28/10/2018 foi proferida sentença no Incidente de Qualificação da Insolvência (Apenso D) que qualificou a insolvência como culposa e na qual consta que “a actuação do insolvente implicou um agravamento da sua situação de insolvência, dispondo de bens e direitos compreendidos no seu acervo patrimonial em benefício da mãe e dos irmãos, pelo que se mostra verificada a previsão da alínea d) do n.º 2 do artigo 186.º do C.I.R.E. (aplicável “ex vi” o n.º 4 desse preceito), presumindo-se também aqui “iuris et iure” a culpa na insolvência”.

A sentença foi confirmada por acórdão proferido por esta Relação de Guimarães em 14/02/2019 e, tendo sido interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, veio a ser proferido acórdão em 16/05/2019 que não admitiu a revista excepcional.

Após o trânsito em julgado da sentença proferida no Incidente de Qualificação da Insolvência o credor “HERDEIROS DE D. R.” e a fiduciária vieram requerer a cessação antecipada da exoneração do passivo restante, em virtude de ter sido proferida sentença que qualificou a insolvência como culposa.

O devedor E. P. veio opor-se à cessação antecipada, alegando não se poder imputar ao insolvente um comportamento doloso ou negligente grave, tendo a situação de insolvência resultado de fatores económicos alheios à vontade do insolvente.

Foi proferido despacho em 11/12/2019 que, apreciando o requerido, decidiu nos seguintes termos: “Termos em que, considerando o exposto, se decide julgar procedente o incidente de cessação antecipada do procedimento de exoneração, e nessa conformidade, decide-se recusar antecipadamente a exoneração do passivo restante ao insolvente E. P. – cfr. artigo 243.º, n.º 1, al. c), do C.I.R.E..

Notifique, publicite e comunique ao Registo Civil – cfr. artigos 230.º, n.º 2 e 247.º do C.I.R.E.

*As custas do incidente mostram-se abrangidas pela tributação do processo principal de insolvência, por serem imputáveis ao insolvente – cfr. artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do C.P.C., 17.º e 303.º do C.I.R.E”.

Inconformado, veio o Insolvente E. P. interpor o presente recurso, concluindo a sua alegação nos seguintes termos: “1.O presente recurso é interposto da decisão de cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo, que teve por base os seguintes factos: 1. Em 16.03.2015 foi declarada a insolvência de E. P., por sentença transitada em julgado.

  1. Em 10.08.2015 foi proferido despacho liminar de admissão do pedido de exoneração do passivo restante formulado pelo insolvente, na petição inicial.

  2. Em 28.10.2018 foi proferida decisão no apenso D, transitada em julgado, que qualificou como culposa a insolvência de E. P..

  3. Entendeu assim o Tribunal a quo que a insolvência qualificada como culposa dará lugar necessariamente à não concessão da exoneração do passivo restante, sendo evidente a ligação entre os dois institutos.

  4. Determinando a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante por referência ao art.º 2430 N.º 1 al. c) do CIRE.

  5. Todavia o Recorrente não se conforma com a decisão supra proferida, porquanto a mesma em seu entendimento fez incorreta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto, uma vez que o Insolvente encontra-se desempregado desde o ano 2011, e devido a toda a conjuntura económica que assola o nosso País apresentou-se à Insolvência, tendo sido declarado insolvente em 16/03/2015.

  6. Reside em casa de um irmão de favor e contribui para as despesas mensais de água, luz, gás e alimentação.

  7. Foi condenado pagar à herança aberta por óbito de D. R. o montante a liquidar, com o teto máximo de €93.111,51, no âmbito do proc. n° 1 I 98/09.8TBVRL, 7. Anteriormente a tal condenação os seus irmãos concederam-lhe alguns empréstimos, sendo que por escritura pública outorgada em 26/07/2013, declararam conceder-lhe um empréstimo no montante de € 150.000,00, na proporção de € 50.000,00 para cada um deles, remunerado à taxa de juro anual de 4 % e a amortizar no prazo de 20 anos, a contar daquela data, declarando o insolvente confessar-se devedor de tal quantia Para garantia do cumprimento da obrigação por si assumida, o Insolvente constituiu uma hipoteca a onerar o imóvel inscrito na matriz sob o artigo …°, o que foi declarado ser aceite por aqueloutros outorgantes.

  8. Por escritura pública outorgada em 26/07/2013, o Insolvente declarou vender a M. T., pelo preço global, já recebido, de € 2.035,00, os imóveis inscritos na matriz sob os artigos … e …, tendo esta declarado aceitar comprar esses bens nos termos exarados.

  9. Por escritura pública outorgada em 14/08/2013, o insolvente procedeu à justificação notarial da aquisição por via da usucapião dos imóveis inscritos na matriz sob os artigos … e …, os quais declarou ainda vender a C. P., pelo preço global, já recebido, de € 4.030,00, tendo este declarado aceitar comprar esses bens nos termos exarados.

  10. Por escritura pública outorgada em 14/08/2013, o insolvente declarou vender a F. M., pelo preço global, já recebido, de € 13.745,03, os imóveis inscritos na matriz sob os artigos … e … e …, tendo este declarado aceitar comprar esses bens nos termos exarados.

  11. Por escritura pública outorgada em 22/10/2013, o insolvente declarou vender a C. P., pelo preço global, já recebido, de € 400,00, o imóvel inscrito na matriz sob o artigo …, tendo este declarado aceitar comprar esse bem nos termos exarados.

  12. Ora, se é verdade que o Insolvente celebrou as referidas escrituras em 26/07/2013, 14/08/2013 e 22/1 0/2013, o certo é que todas elas são verdadeiras, correspondendo o seu teor à concreta realidade material e jurídica dos factos e à vontade das partes nelas intervenientes.

  13. Relativamente à divida que o Insolvente tem para com os seus irmãos, a qual está titulada por escritura de mútuo com hipoteca, a mesma também corresponde inteiramente à realidade material e jurídica dos factos, devendo este aos seus irmãos o valor global de €150.000,00.

  14. Sendo que o Insolvente encontrava-se em situação de manifesta insuficiência de rendimentos, o ativo não lhe permitia fazer face às responsabilidades imediatamente exigíveis.

  15. Ademais, no que concerne às dívidas à Herança aberta por óbito de D. R., as mesmas apenas foram objeto de decisão definitiva em 03.10.2014, por acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça no âmbito do processo N." 1198/09.8TBVRL, sendo que em tal processo o montante devido pelo Insolvente ainda não foi objeto de liquidação por parte dos Credores Reclamantes.

  16. Assim, tendo em conta as circunstâncias supra expostas, é certo que foram realizadas as supra referidas escrituras, todas em data anterior à decisão definitiva proferida no Processo N.º 1198/09.8TBVRL,sendo que até tal circunstância demonstra que tais atos não surgiram com o interesse de enganar ou prejudicar terceiros.

  17. Aliás, conforme decorre da sentença proferida no Apenso - A (Embargos da Insolvência), do presente processo, "verifica-se que não decorre da [actualidade provada que os referidos C. P., M. G. e P. J., não tivessem concedido ao embargado um empréstimo no montante de €150.000,00, ao contrário do que declararam, e que tivessem atuado com o intuito de enganarem terceiros. " 18. Concluindo ainda dizendo ''perante tudo o que ficou exposto, afigura-se manifesta a insuficiência dos rendimentos e do ativo do embargado para fazer face às suas responsabilidades imediatamente exigíveis, pelo que se conclui pela existência de uma situação de insolvência por parte do embargado, por referência ao disposto nos artigos ]0 n. o 1 e 20° n. o 1 al. b) do CIRE".

  18. Tal sentença declarou improcedente a "arguição da nulidade desse contrato de mútuo com fundamento na simulação negocial, pelo que as obrigações previstas nesse negócio jurídico vinculam o embargado".

  19. Logo, tal deveria consubstanciar a exceção de caso julgado, uma vez que no Apenso A, do presente processo, no qual se julgaram os Embargos da Insolvência apresentados pela Herança aberta por óbito de D. R., foi já proferida sentença em 15 de Junho de 2015, conforme supra indicado, já transitada em julgado, em que se conclui...

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