Acórdão nº 1072/18.7T8VNF-D.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelANA CRISTINA DUARTE
Data da Resolução12 de Março de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I.

RELATÓRIO C. D. intentou contra a Massa Insolvente de E. P., ação de impugnação de resolução em benefício da massa insolvente pedindo que seja declarada a nulidade da resolução levada a cabo pelo administrador, por a mesma não se mostrar devidamente fundamentada, o que deverá conduzir à sua ineficácia nos termos previstos nos artigos 280.º, 294.º e 295.º do Código Civil, ou, caso assim não se entenda, que seja declarada a invalidade ou ineficácia da resolução levada a cabo pelo administrador, por não se mostrarem verificados os requisitos necessários e inerentes, quer à resolução condicional, quer à resolução incondicional, nos termos previstos nos artigos 120.º e 121.º, n.º 1 c) e h) do CIRE.

A ré contestou, pedindo que se declare válida a resolução do negócio efetuado, no que compete o ato praticado pela insolvente e o autor e a este comunicada, devendo ser julgado improcedente todo o pedido formulado pelo autor.

Teve lugar a audiência prévia. Aí se decidiu a prossecução dos autos por não se considerar relevante apreciar concretamente se o contrato promessa de 29/04/2009 foi ou não validamente resolvido pela insolvente, uma vez que o aditamento vale por si próprio e não está dependente de ser ou não considerado resolvido o contrato promessa de 29/04/2009. Também aí ficou decidido que a carta enviada pelo Senhor Administrador da Insolvência, comunicando ao autor a resolução do negócio, se encontra devidamente fundamentada, pelo que inexiste qualquer nulidade, cabendo apenas averiguar se os fundamentos invocados se verificam no caso concreto, questão essa a decidir em sede de sentença.

Foi identificado o objeto do processo e enunciados os temas da prova.

Teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou improcedente o pedido formulado pelo autor e válida e eficaz a resolução em benefício da massa insolvente operada pelo Senhor Administrador da Insolvência quanto ao negócio formalizado por documento designado com a epígrafe “Aditamento ao Contrato Promessa de Compra e Venda celebrado a 29 de abril de 2009” outorgado entre aquele e a insolvente a 4 de janeiro de 2018.

O autor interpôs recurso, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes Conclusões:

  1. Não se conforma o Recorrente com a Sentença na parte em que decidiu: “pensamos que outra conclusão não pode ser retirada senão a de que, com o negócio objecto destes autos (datado de 4/1/2018), a insolvente praticou um acto oneroso, no ano anterior à data do início do processo de insolvência (a foi sentença proferida nos autos principais a 19/2/2018), em que as obrigações por si assumidas excederam manifestamente as do A.. Mostram-se, assim, preenchidos os requisitos elencados na alínea h) do nº 1 do art. 121º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas e, desta forma, legitimada a resolução operada pelo senhor Administrador da Insolvência. Deve improceder o pedido formulado pelo A..” “Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, decido julgar totalmente improcedente o pedido formulado por C. D. e válida e eficaz a resolução em beneficio da massa insolvente operada pelo senhor Administrador da Insolvência quanto ao negócio formalizado por documento designado com a epígrafe “Aditamento ao Contrato Promessa de Compra e Venda celebrado a 29 de Abril de 2009”, outorgado entre aquele e a Insolvente a 4 de Janeiro de 2018”.

    B) A decisão sob recurso padece, no entendimento do Recorrente, de claros vícios que a inquinam, no que respeita à decisão em matéria de facto, nomeadamente quanto à não inclusão de factos de enorme relevância para a boa e sã decisão da causa, bem como, por consequência, no que concerne ao enquadramento legal do acervo material a considerar.

    DA NULIDADE DA SENTENÇA, POR OMISSÃO POR PRONÚNCIA C) Nos termos previstos no artigo 615.º, n.º 1 d) do CPC “É nula a sentença quando: d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento” D) Neste caso, o Tribunal a quo incorreu numa notória omissão de pronúncia quanto a uma questão essencial para que fosse proferida uma justa decisão da causa, nos termos configurados pelo Autor – aqui Recorrente.

    E) Conforme foi cabalmente trazido aos autos pelo Recorrente, o aditamento objecto de resolução assumiu-se como a solução mais adequada pelas partes, uma vez que que a ora insolvente, com toda a sua astúcia, engenho e manha, tinha conseguido convencer o Recorrente – pessoa já de idade avançada e que confiava cegamente na insolvente - que os bens objecto do contrato promessa em questão – dois terrenos baldios, compostos, somente, por “mato”- teriam um valor que, em muito, supera o seu valor real, concretamente em 100 vezes o seu valor patrimonial.

    F) Razão pela qual foi alegado e é de importância fundamental para a boa decisão da causa que se considere que este contrato inicial se encontra ferido de evidente e ostensiva usura.

    G) Sendo que, apesar do Recorrente até poder ter considerado o valor do negócio – 750.000,00 € - como razoável, não podemos olvidar que o mesmo se encontrava toldado pela confiança cega que depositava na Insolvente.

    H) Foi então pelo reconhecimento deste vício que o Recorrente e a Insolvente entenderam celebrar o aditamento em crise, que representava um acerto de contas com vista a reequilibrar as prestações, nomeadamente através de um ajuste de valores e de redistribuição de áreas dos prédios em causa.

    I) No entanto, o Tribunal a quo entendeu não se pronunciar relativamente a tão importante questão – reconhecimento do negócio inicial como usurário e ofensivo aos bons costumes – que foi a circunstância que levou à concretização do aditamento objecto de resolução.

    J) Já em sede de sentença, limita-se o Tribunal a quo a considerar “como certo” “a obrigação incumprida do Autor de entregar à Insolvente (ou agora à massa insolvente) a quantia de mais 354.000,00 €”, esquecendo que a referida quantia só não foi entregue precisamente pelo facto do negócio inicial se claramente usurário, o que justificou a realização do aditamento.

    K) Assim, o facto do negócio inicial ter sido configurado como usurário e ofensivo aos bons costumes (artigos 39.º, 40.º, 42.º, 49.º, 50.º, 68.º, 110.º da petição inicial) e tal circunstância não ter merecido na sentença recorrida qualquer tratamento, apreciação ou decisão, fez com que a mesma esteja ferida da nulidade ora invocada.

    L) Ademais, sempre se dirá que, por ser de conhecimento oficioso – nos termos previstos no artigo 280.º n.º 2 do Código Civil – sempre o Tribunal deveria ter-se pronunciado relativamente à nulidade proveniente do negócio ofensivo aos bons costumes, ainda que o Recorrente não o tivesse invocado.

    M) Pelo que, quando o Tribunal a quo se refere ao desequilíbrio das prestações, incumbia-lhe analisar o facto do negócio inicial ter sido celebrado por 750.000,00 € e o valor actual dos bens – reestruturados e integralmente recuperados – se cifrar em 367.900,00 €, ou seja, mais de 380.000,00 € relativamente ao seu valor actual de mercado, o que faz do mesmo totalmente contrário à ordem pública e aos bons costumes.

    N) Razão pela qual, o Tribunal a quo não poderia dispensar-se de se pronunciar sobre esta questão – que se mostra essencial para a justa decisão da causa – fazendo incorrer em clara omissão de pronúncia, o que constitui a nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, que ora se argui.

    DA NULIDADE PELO FACTO DO TRIBUNAL TER TOMADO CONHECIMENTO DE QUESTÕES DE QUE NÃO PODIA TOMAR CONHECIMENTO O) A sentença sob recurso refere que “a alínea L) da matéria de facto assente resulta da análise ao relatório pericial junto pelo senhor Administrador de Insolvência ao processo principal a 2/10/2018, que foi notificado a todos os credores e não foi impugnado nesta parte, tendo sido confirmado pela testemunha J. M., seu autor, em audiência de julgamento” P) Ora, do supra mencionado, bem como da leitura integral da sentença, não resta qualquer dúvida que a mesma teve como “pedra de toque” um elemento probatório que não consta dos autos – o relatório de avaliação dos imóveis, junto aos autos principais pelo senhor administrador de insolvência.

    Q) O Tribunal a quo conheceu de um meio de prova que não podia conhecer pelo simples facto do mesmo não ter sido junto aos autos, nem pelo Autor, nem pela Ré, violando assim o princípio dispositivo bem como os mais basilares princípios respeitantes ao ónus da prova.

    R) Ainda contrariamente ao referido na sentença, tal relatório não só foi objecto de impugnação no âmbito do processo principal como foi ainda requerida, pelo ora Recorrente, uma perícia sobre os imóveis objecto do contrato promessa.

    S) Pelo que, uma vez que nenhuma das partes trouxe aos autos este meio de prova, nos termos e momentos legalmente previstos para o efeito: - Conforme dispõe o artigo 415.º do CPC: “1 - Salvo disposição em contrário, não são admitidas nem produzidas provas sem audiência contraditória da parte a quem hajam de ser opostas.

    2 - Quanto às provas constituendas, a parte é notificada, quando não for revel, para todos os atos de preparação e produção da prova, e é admitida a intervir nesses atos nos termos da lei; relativamente às provas pré-constituídas, deve facultar-se à parte a impugnação, tanto da respetiva admissão como da sua força probatória.” - E o n.º 6 do artigo 552.º do CPC que estipula que “no final da petição, o autor deve apresentar o rol de testemunhas e requerer outros meios de prova; caso o réu conteste, o autor é admitido a alterar o requerimento probatório inicialmente apresentado, podendo fazê-lo na réplica, caso haja lugar a esta, ou no prazo de 10 dias a contar da notificação da contestação.”).

    T) Também o Tribunal a quo, não poderia usá-lo, sem permitir o contraditório quanto ao mesmo.

    U) Pois, “caso o juiz não faculte à parte a possibilidade de se pronunciar quanto às provas oferecidas pela contraparte (…) a...

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