Acórdão nº 1002/19.9T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelRAMOS LOPES
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães (1) RELATÓRIO Apelante: PM., Unipessoal, Ldª (credora embargante) Apelada: P. R. (credora requerente) Insolvente: Peúgas ..., Ldª Juízo de comércio de Vila Nova de Famalicão (lugar de provimento de Juiz 2) – T. J. da Comarca de Braga.

*Invocando créditos laborais sobre a requerida e factos tendentes a demonstrar o estado de insuficiência económica da mesma, intentou P. R. processo de insolvência, pedindo a declaração de insolvência de Peúgas ..., Lda.

Deduziu a requerida oposição, negando o invocado crédito da requerente e invocando a sua prosperidade - não ter pendentes contra si quaisquer acções executivas (por estarem extintas as que foram interpostas), ter efectuado acordos de pagamento com a Segurança Social e com a Autoridade Tributária, apresentar resultados positivos em todos os anos de actividade, ter cinquenta trabalhadores ao seu serviço, manter sólido nível de vendas, com tendência crescente, estar liquidado integralmente o activo imobilizado de que é proprietária, assim como os bens constantes do inventário (matérias primas), ter créditos para cobrar que ascendem a 634.000.00€, ultrapassar o seu património os dois milhões setecentos e cinquenta mil euros, sendo reputada como cumpridora pelas instituições bancárias com quem lida.

Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que considerou demonstrada a qualidade de credora da requerente e verificada a situação de insolvência da requerida, nos termos dos artigos 3º, nº 1 e 2 e 20º, nº 1, b), g), ii) e h) do CIRE, insolvência que declarou.

Alegando a sua qualidade de credora da devedora declarada insolvente, apresentou-se a apelante a embargar, invocando a incompetência material do tribunal (por o crédito invocada pela requerente ser de natureza laboral e, por isso, estar a competência material para o reconhecimento da validade e da justeza da qualificação jurídica do contrato alegado atribuída, em exclusivo, ao Tribunal do Trabalho, nos termos dos arts. 40º, nº 2 e 126º, nº 1, b) da LOSJ) e alegando factos reveladores de que activo da devedora é superior ao passivo exigível (seja do ponto de vista contabilístico, seja numa perspectiva do valor justo e real dos bens e valores), assim sustentando estar afastada a presunção de insolvência da requerida (nos termos dos artigos 3º, nº 3, a), b) e c), ex vi art. 20º, nº 1 do CIRE).

Conclui, na procedência dos embargos, pela revogação da decisão que decretou a insolvência.

Contestou a requerente da insolvência, sustentando a improcedência dos embargos, impugnando o invocado crédito da embargante e argumentando não diferir a factualidade alegada da já apreciada na sentença declaratória da insolvência.

Apresentou entretanto o administrador da insolvência, no processo principal, o relatório a que alude o art. 155º do CIRE, realizando-se assembleia de credores para discussão e votação do plano de recuperação (art. 209º do CIRE), onde esteve presente a embargante apelante.

Nos presentes autos, terminados os articulados (e juntos elementos solicitados à Segurança Social e Autoridade Tributária), foram os embargos julgados improcedentes.

Inconformada, apela a embargante, terminado as suas alegações com conclusões que se transcrevem: Omissão de pronúncia: 1- Analisando a douta Sentença proferida, percebe-se, por um lado, que o tribunal “a quo” não se pronunciou e não conheceu da maioria das questões que foram trazidas aos autos pela Embargante/Apelante, e que constituíam a causa de pedir da acção de embargos à insolvência.

2- Designadamente, a Sentença recorrida não se pronuncia:

  1. Sobre a excepção de incompetência material do tribunal do Comércio para a decisão proferida de declarar ou arrancar do pressuposto da validade do contrato de trabalho que a requerente da insolvência, P. R., teria celebrado com a sociedade insolvente e a qual foi invocada em nºs 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29 e 30 da P.I.

    3- Resulta do invocado que nesta acção especial a primeira questão que tem de ser apreciada pelo tribunal, por forma a aferir da legitimidade ou ilegitimidade da Requerente para se poder intitular credora da sociedade insolvente é, também obviamente, a qualificação jurídica do contrato:

  2. Contrato de trabalho, como invoca a Requerente – mau grado parecer falecer a invocação de elementos essenciais para que assim pudesse ser qualificado … - ; b) Contrato de prestação de serviços, como invoca a sociedade Insolvente. 4- Temos como sendo absolutamente pacífico e uniforme, quer na doutrina, quer na jurisprudência, que a competência de um tribunal em razão da matéria se fixa em razão da causa de pedir e do pedido.

    5- Sem essa qualificação jurídica do contrato – verdadeira questão prévia – não é possível saber se a Requerente tem direito às quantias que reclama em razão e directamente dependentes e decorrentes de ter, ou não, existido contrato de trabalho validamente celebrado com a sociedade insolvente.

    6- Ou seja, sem essa prévia qualificação da natureza jurídica do tipo de contrato que tenha existido entre a Requerente e a sociedade insolvente não é, juridicamente entendido, possível afirmar que a mesma é credora dos valores que veio invocar no seu requerimento inicial como decorrentes e dependentes da qualificação jurídica do contrato como “contrato de trabalho”.

    7- Verifica-se, e foi invocado – dado que antes tal não havia sido – a incompetência material do tribunal do Comércio para conhecer, decidir e julgar a propósito e sobre a qualificação jurídica do contrato verbal que terá sido celebrado entre a Requerente e a sociedade insolvente, como decorre do expressamente estipulado nas supracitadas normas do art. 40º nº 2 e 126º nº 1, al. b) da LOSJ.

    8- Constitui princípio geral do direito processual que o tribunal deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, como decorre da 1.ª parte do n.º 2 do art. 608.º do CPC.

    9- Omitindo o tribunal esteve dever de julgamento, quando o juiz/tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, a respectiva decisão é nula – arts. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC.

    10- Revelando-se absolutamente necessário que o tribunal “a quo” trate e aprecie a divergência jurídica carreada para os autos pelas partes, como estipula o art. 608º nº 2 do CPC, em vista do que já o art. 20º e 205º da CR impõe.

    11- O certo é que o tribunal “a quo” não exerceu o seu poder/dever de apreciar e dirimir, na vertente de “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação (…)”.

    12- Incorreu por isso a Sentença recorrida no vício de manifesta omissão de pronuncia sobre questão que foi colocada nos autos e sobre a qual deveria ter dirimido e decidido, podendo ainda considerar-se que aquela causa de nulidade da decisão complementa a da nulidade por falta de fundamentação que conduziu o tribunal à decisão de declarar improcedentes os Embargos.

    13- Vício este de nulidade da Sentença que aqui se invoca nos termos e para os efeitos da aplicação conjugada dos arts. 20º e 205º nº 1 da Constituição e art. 608º nº 2 e 615º nº 1 al. d) do CPC.

    Sem prescindir, 14- O tribunal “a quo” na Sentença recorrida também não exerce o seu dever de pronúncia directa sobre a factualidade invocada em nºs 34 a 48, factualidade essa estribada nos documentos contabilísticos que foram juntos sob os n.ºs 4, 5, 6 e 7 na P.I., como seja, as declarações de IRC dos anos 2016, 2017 e 2018, o mapa de depreciações e amortizações juntas com o Mod. 22 e reportado ao imobilizado da Sociedade insolvente.

    15- Do mesmo passo também o tribunal “a quo” não exerceu o seu dever de pronúncia directa sobre a factualidade invocada em nºs 49 a 73, factualidade essa estribada nos documentos contabilísticos que foram juntos sob os n.ºs 4, 5, 6 e 7 na P.I., como seja, as declarações de IRC dos anos 2016, 2017 e 2018, o mapa de depreciações e amortizações juntas com o Mod. 22 e reportado ao imobilizado da Sociedade insolvente, e também nas notas de encomenda e documentos que a própria insolvente mais tarde veio juntar a estes autos de insolvência.

    16- E também não houve pronúncia directa e concreta sobre as demais causas de pedir que servem de fundamento à pretensão deduzida pela Embargante/Apelante e que servem de fundamento para o pedido de revogação da Sentença de declaração da insolvência, conforme a supra citada e até transcrita alegação e, designadamente, o que vem invocado em nºs 75 a 81 da P.I..

    17- Ou seja, o tribunal “a quo” também não se pronunciou acerca da questão respeitante ao justo valor, seja contabilístico, seja patrimonial, do imobilizado,; 18- Á questão respeitante ao justo valor, dos créditos e valores a receber dos clientes e valores a receber das mercadorias, seja em produto e trabalhos em curso, seja em produtos acabados; 19 - Á questão respeitante á superioridade do Activo sobre o passivo exigível à sociedade declarada insolvente.

    20- Efetivamente, a Embargante/Apelante, para além dos elementos probatórios documentais que conseguiu obter e juntar, requereu, para além do mais, a produção de prova testemunhal (o que é legalmente admissível – art. 392º do CC), consistente na inquirição de testemunhas – sendo que 4 deles se tratam de industriais e gerentes de empresas que mantem actividade comercial ligada à insolvente - a prova por depoimento de parte (o que é também legalmente admissível – art. 361º do CC e 466º do CPC), a prova pericial (o que também é legalmente admissível – art. 388º e 389º do CC) e a junção de novos e fundamentais documentos (o que também é legalmente admissível – art. 376º do CC e arts. 423º e segs. do CPC).

    21- Pelo que, o Tribunal “a quo”, para além de ter incorrido naquele vício de omissão de pronúncia sobre cada uma das questões colocadas na causa de pedir, atentas as várias soluções plausíveis das questões de direito, também incorreu no vicio de desprezar e, ou, impedir a produção de prova que lhe foi...

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