Acórdão nº 589/14.7TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA CRISTINA CERDEIRA
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO M. G. intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra: 1. M. L. e marido J. E., 2. J. L. e mulher M. M., 3. R. G., 4. M. C. e mulher M. T., pedindo que:

  1. Seja declarada a sonegação, por parte dos Réus M. L. e J. L., às heranças abertas por óbito dos seus pais, da quantia de € 1.400.000,00, com a consequente perda em benefício da Autora do direito que aqueles pudessem ter como co-herdeiros, a qualquer parte do valor sonegado; b) Sejam os Réus M. L., J. E., J. L. e M. M. condenados solidariamente a pagar à Autora, enquanto herdeira de seus pais, a referida quantia de € 1.400.000,00 devidamente actualizada à data da morte do pai L. J., para o montante de € 1.446.400,00, nos termos do artº. 551º do Código Civil, acrescido ainda dos juros de mora, à taxa legal, que se vencerem desde a citação até efectivo pagamento; c) Seja declarada a sonegação, por parte dos Réus M. L. e J. L., às heranças abertas por óbito dos seus pais, de todas as quantias que se vierem a apurar que eles hajam retirado da conta de D.O. n.º 4532923...., titulada em nome do pai L. J., no Banco ... (Banco ...), com a consequente perda em benefício da Autora do direito que aqueles pudessem ter, como co-herdeiros, a qualquer parte dessas quantias sonegadas; d) Sejam os Réus M. L., J. E., J. L. e M. M., condenados solidariamente a pagar à Autora, enquanto herdeira de seus pais, as quantias que forem apuradas, nos termos da alínea anterior, devidamente actualizadas à data da morte do pai L. J., de acordo com o artº. 551º do Código Civil, e acrescidas ainda dos juros de mora, à taxa legal, que se vencerem desde a citação até efectivo pagamento; e) Seja julgada procedente a impugnação pauliana, com os efeitos consignados no artº. 616º do Código Civil, dos actos jurídicos de: 1.

    Compra e venda a que se reporta o documento n.º 38 junto com a petição inicial; 2.

    Doação e reserva de direito de habitação a que se reporta o documento n.º 39 junto com a petição inicial; 3.

    Cessão, pela Ré M. L. ao Réu R. G., em Maio de 2012, da quota de € 120.000,00 no capital social da “S. G., Lda.”, depois, sucessivamente, aumentada para o valor de € 198.974,44 e convertida em igual número de acções, por força dos actos jurídicos a que se reportam os documentos nºs 40 e 41 juntos com a petição inicial; 4.

    Transferência de todas as verbas que os Réus M. L. e J. E., singular ou conjuntamente, hajam feito ou venham a fazer, para as contas tituladas em nome do Réu R. G., no Banco ..., com os nºs 454348.... e 270490.....

    Para tanto, alega, em síntese, que: A Autora e os Réus J. L. e M. L. são os únicos herdeiros do dissolvido casal formado por M. A. e L. J., falecidos em -/03/2004 e -/05/2011, respectivamente.

    O falecido L. J. deixou testamento público (junto como doc. 3) no qual distribuiu, por legados, entre os seus três filhos, os bens nele identificados, sendo que dois desses bens foram legados à Ré M. L. por conta da quota disponível.

    O Réu J. L. foi o cabeça de casal de ambas as heranças por ser o mais velho de entre os três filhos e herdeiros legais.

    Sucederam-se várias reuniões entre os três herdeiros para discutirem a partilha dos bens das heranças de seus pais, nas quais estiveram sempre presentes os respectivos cônjuges, tendo em finais de Junho, princípios de Julho de 2011, os três irmãos, na presença dos respectivos cônjuges, partilhado entre si, de comum acordo e na base de uma divisão igualitária de valores, todos os bens móveis que compunham o recheio da casa dos pais, assim como jóias, peças de colecção e objectos pessoais.

    A Ré M. L. era quem detinha poderes para movimentar as contas bancárias do pai, e logo numa dessas reuniões, informou que não havia dinheiro nas contas do pai para distribuir, justificando que os reduzidos saldos existentes eram necessários para pagar as despesas do funeral e outros encargos, como ordenados e compensações às empregadas domésticas do pai pela cessação dos respectivos contratos de trabalho.

    Referiu, ainda, que existiam apenas 46.404 acções Banco ... numa conta de títulos de que o pai era titular no Banco ..., tendo por acordo entre todos os herdeiros, a Ré M. L. procedido à venda destes valores mobiliários em 2/09/2011 e, nessa mesma data, distribuiu, entre si e os dois irmãos, em partes iguais, o produto da venda, com a entrega a cada um da quantia de € 3.836,06.

    Por escritura pública realizada em 4/04/2012, a Autora, os Réus M. L. e J. L. e todos os respectivos cônjuges, procederam entre si à partilha dos bens nela identificados e que integravam a herança do dissolvido casal.

    Pese embora o facto da Autora e seu marido, nas várias reuniões com os irmãos e cunhados, terem trazido sempre à colação a discussão da questão da alegada inexistência de dinheiros e não obstante a celebração daquela escritura de partilha, a Autora ficou sempre com a suspeita de que os irmãos M. L. e J. L. lhe teriam ocultado a existência de activos patrimoniais pertencentes à herança do dissolvido casal, uma vez que tinha a plena convicção que os seus pais seriam possuidores de um significativo património financeiro depositado em bancos.

    Com efeito, apesar das solicitações da Autora, os Réus M. L. e J. L. não diligenciaram pela prestação de informações acerca dos saldos e movimentos das contas tituladas pelos falecidos pais, nem lhe disponibilizaram quaisquer extractos de movimentos das contas bancárias do pai, sendo que após diligências efectuadas pela Autora e seu marido junto dos bancos onde sabia que os pais haviam tido contas de depósito à ordem e a prazo, conseguiram obter extractos de movimentos do período de Março de 2004 (mês e ano do falecimento da mãe) a Maio de 2011 (mês e ano do falecimento do pai), de duas contas de depósitos à ordem domiciliadas em Agências de Braga – uma do ex-Banco ..., depois incorporado no Banco ... (Banco ...) e outra da Caixa ... (Caixa ...), os quais confirmaram a convicção que a A. e o marido tinham, da existência de um significativo património financeiro dos pais e da sua ocultação por parte dos irmãos, tendo apurado que: i) Por um lado, da conta com o n.º 01473160..., domiciliada no Banco …/Banco ... (Banco .../Banco ...), titulada pelos falecidos pais, após a morte da mãe e até ao encerramento dessa conta (em 6/03/2008), foram efectuados saques, levantamentos e transferências no montante total de € 1.202.450,95, que tiveram como destinatária directa a Ré M. L. e, indirectamente, também o Réu J. L., uma vez que este recebeu uma boa parte daquela verba através da irmã M. L.; ii) Por outro lado, a conta D.O. domiciliada na Caixa ... (Caixa ...) com o n.º .../081778/200, titulada pelos falecidos pais, tinha associada a Conta Poupança nº. .../081776/765, tendo no período compreendido entre 15/04/2004 e 14/10/2010, sido retirada da conta da Caixa ... a verba global de € 472.980,26, em benefício da Ré M. L. e, provavelmente, também do seu irmão Réu J. L., tudo muito provavelmente sem o conhecimento e o consentimento do pai L. J.; iii) Por fim, da conta domiciliada no Banco ... com o n.º 4532923...., titulada pelo falecido pai, foram levantadas quantias pela Ré M. L., em montante não apurado, em benefício da mesma.

    Só depois do marido da Autora confrontar a Ré M. L. com elementos mais concretos de levantamentos dessas contas, é que ela acabou por confessar e reconhecer que foi retirada das contas do pai a quantia de € 1.400.000,00 e que a mesma foi entregue ao Réu J. L., para pagamento do preço da cessão da quota que ele detinha na sociedade “S. G., Lda.” à irmã M. L., tendo aquele Réu recebido também como pagamento um armazém que pertencia à própria sociedade e que esta tratou de lhe transmitir.

    Tal negócio acertado entre os dois irmãos foi concretizado em 2/01/2008 (cerca de três anos antes do falecimento do pai L. J.) através de: a) uma escritura de cessão de quotas, mediante a qual o Réu J. L. cedeu a quota de € 222.165,00 que detinha no capital da “S. G., Lda.”, pelo preço global de € 1.400.000,00; b) uma escritura de compra e venda, pela qual a “S. G., Lda.” transmitiu ao Réu J. L. o armazém de ..., pelo preço declarado de € 340.000,00 - que não foi pago, pois, como a própria Ré M. L. afirma no antepenúltimo parágrafo do seu email de 14/12/2012, esse armazém “(…) foi transmitido ao J. L. a título de pagamento de parte do valor da sua quota.” A realização dessa cessão de quotas foi o expediente utilizado pelos irmãos M. L. e J. L. para dividir, entre si, os dinheiros que o pai possuía, em detrimento do direito da Autora, sua irmã, a receber uma parte desses dinheiros, ficando o 2º Réu marido com o dinheiro e um armazém e a 1ª Ré mulher com a sociedade.

    Os Réus M. L. e J. L. ocultaram este negócio da Autora, a quem nunca deram conhecimento das circunstâncias em que o mesmo se realizou e, muito menos, que os dinheiros nele envolvidos tinham vindo directamente das contas do pai.

    Os cônjuges dos Réus M. L. e J. L. tiveram conhecimento da ocultação de bens da Autora, tendo desse acto de sonegação resultado proveito comum para ambos os casais, pelo que também eles são responsáveis solidariamente com os Réus M. L. e J. L. pelo pagamento à Autora do valor do crédito já apurado - € 1.446.400,00 - e respectivos juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efectivo pagamento.

    Depois da Ré M. L. ter reconhecido e confessado ao marido da Autora que retirara das contas bancárias do pai a quantia de € 1.400.000,00 para realizar o negócio que combinara com o seu irmão J. L., e enquanto duravam as negociações extrajudiciais entre aquela Ré e a Autora com vista ao ressarcimento desta do prejuízo resultante do facto de não ter beneficiado da partilha daquela verba, a Ré M. L. celebrou diversos negócios jurídicos com vista a colocar a salvo da Autora bens susceptíveis de responderem pela dívida que tem para com esta, tais como: a) - a venda de uma fracção autónoma identificada no artº. 84º da petição inicial...

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