Acórdão nº 711/15.6T8VVD.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA LUÍSA RAMOS
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães A. S. e A. M. intentaram contra J. R., M. F., A. P., L. C. e N. A. acção declarativa sob a forma de processo comum na qual pedem que seja reconhecido aos Autores direito de preferência na compra do prédio rústico, a que se reporta o artigo 15.º da Petição Inicial e documento cinco junto, substituindo-se os Autores aos Réus compradores J. R. e mulher M. F., e, havendo o aludido prédio para eles, mediante o pagamento do preço e demais encargos e despesas, tudo no valor de três mil trezentos e noventa e sete euros e noventa e nove cêntimos (3.397,99€), mais se ordenando o cancelamento dos registos feitos com base na referida escritura pública de compra e venda de 15 de Setembro de 2004, bem como, a anulação da doação outorgada pelo Primeiros Réus aos Terceiros Réus e de todas as demais transmissões do identificado prédio rústico objecto desta acção que posteriormente se venham a operar com o consequente cancelamento de todos os registos realizados por via de tais transmissões.

Alegam, para tanto, e, em síntese, que são donos e legítimos possuidores do prédio rústico designado por Leira ..., terreno de mato e árvores, sito no lugar de ..., União das freguesias de …, concelho de Vila Verde, descrito na Conservatória do Registo Predial ... no segundo o nº .../20000807 - Freguesia de ... e inscrito na respectiva matriz predial rústica no artigo ..., que corresponde antigo artigo 8 da freguesia de ...; tendo adquirido tal prédio, por escritura pública de doação e partilha outorgada pelos seus pais, já falecidos, L. J. e C. M., correspondendo à verba nº33 e realizada a 31 de Janeiro de 1974, no Cartório Notarial ..., encontrando-se tal prédio rústico devidamente registado em nome dos Autores.

Por seu turno, os Segundos Réus eram donos e legítimos possuidores do prédio rústico designado por “Leira ...”, composto por terreno de mato, situado no lugar de ..., freguesia de ..., concelho de Vila Verde, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º .../260692 e inscrito na matriz predial rústica no artigo ... da União das freguesias de ..., ..., ... (antigo artigo 6 da freguesia de ...), estando devidamente registado em nome destes.

Tal prédio adveio ao domínio e posse dos Primeiros Réus por o haverem adquirido aos Segundos Réus, por escritura pública de compra e venda, celebrada no Cartório Notarial ..., no dia 15 de Setembro de 2004, exarada a folhas 62 e 63 do Livro de Notas 2015 – E.

Os acima identificados prédios rústicos confrontam, entre si e por dois lados, sendo que o prédio dos Autores confronta a Nascente com o prédio adquirido pelos Primeiros Réus numa extensão de cerca de 45 metros e, pelo seu lado Sul, a sua confrontação com o prédio rústico adquirido pelos Primeiros Réus, verifica-se numa extensão de cerca de 25 metros, e, ambos os prédios, quer o prédio dos Autores quer o prédio que foi adquirido pelos Primeiros Réus, são prédios rústicos de matos e árvores e apresentam áreas inferiores à unidade de cultura.

Sucede que os Segundos Réus não comunicaram aos Autores que pretendiam realizar a mencionada venda deste seu prédio rústico aos Primeiros Réus, nem por escrito nem verbalmente, e tão pouco o fizeram os Primeiros Réus.

Pelo que não foi permitido aos Autores fazerem uso do direito de preferência que lhes assiste na compra do referido prédio rústico, por força da acima mencionada confinância entre os mencionados prédios rústicos dos Autores e dos Primeiros Réus.

Efectivamente, só muito recentemente é que os Autores se aperceberam que o dito prédio já não pertencia aos Segundos Réus, pois só na data em que conseguiram obter cópia certificada da aludida escritura pública de compra e venda, no dia 8 de Setembro do corrente ano, é que os Autores tomaram conhecimento, por via da leitura do texto da mesma escritura notarial, dos elementos essenciais da referida alienação, ou seja, da pessoa do comprador, do preço da venda, da data do pagamento e demais condições da venda, estando, por isso, em tempo para exercerem o direito que invocam.

Acresce que os Primeiros Réus não são nem eram, à data da referida compra, proprietários de outro prédio confinante com o aludido prédio que lhes foi transmitido pelos Segundos Réus.

Além disso, não existia (nem existe) outro prédio rústico confinante com o prédio rústico que foi adquirido pelos Primeiros Réus, sendo certo que, os Autores são os proprietários de único prédio rústico que é confinante com o descrito prédio rústico que foi transmitido.

Os primeiros Réus pagaram pela dita aquisição o preço de três mil euros (€ 3.000,00) que os Segundo Réus receberam, a quantia de cento e cinquenta euros (€ 150,00) pelo Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), a quantia de quarenta e nove euros (€ 49,00) de Imposto de Selo, a quantia de cento e onze euros e quarenta e nove cêntimos (111,49 €) de despesas com a escritura notarial, a quantia de oitenta e sete euros e cinquenta cêntimos (€ 87,50) de despesas com o registo predial, pelo que os Autores vão proceder ao depósito desses montantes, no valor global de três mil trezentos e noventa e sete euros e noventa e nove cêntimos (3.397,99€).

Mais se refere que os Primeiros Réus, em 4 de Novembro de 2013, doaram aos Terceiros Réus, o prédio que adquiriram aos Segundos Réus, através de Título de Doação lavrado na Conservatória do Registo Predial ..., tendo atribuído a tal doação o valor de cento e cinquenta euros (€ 150,00), que é perfeitamente irreal e descabido, atendendo ao valor deste prédio e, sendo tal transmissão feita, livre e qualquer ónus ou encargo.

Desta maneira, em resultado do direito de preferência exercido pelos Autores sobre a venda supra referida, terá a doação feita pelos Primeiros Réus aos Terceiros Réus ser dada como nula e sem qualquer efeito, por preterição na venda realizada pelo Segundos Réus aos Primeiros Réus de imposição legal.

Os Réus contestaram, impugnando parcialmente a matéria alegada na Petição, alegando que: - Os 2ºs Réus, antes de celebrar o referido contrato de compra e venda com os 1ºs Réus, notificaram os preferentes e notificaram, inclusive, a Junta de Freguesia de ..., constando dessas notificações o projeto e as condições do contrato de compra e venda do prédio em causa; - Dos notificados, apenas os Autores alegam não terem tomado conhecimento do referido negócio, mesmo tendo a Junta de Freguesia de ..., depois de notificada, publicado a mesma em edital, publicação esta que foi visualizada por vários habitantes da freguesia e arredores e até mesmo pelos próprios Réus; - Sucede, porém, que nem os Autores nem os restantes preferentes, à data dos fatos, e dentro do prazo legal, demonstraram qualquer interesse no referido bem, não fazendo uso do seu direito de preferência, pelo que o exercício do direito que os Autores invocam caducou antes de celebrado o contrato de compra e venda do imóvel; - Acresce ainda que o contrato de compra e venda celebrado entre os 2ºs e os 1ºs Réus não espelha a real vontade/intenção dos outorgantes, existindo uma divergência entre a declaração negocial e a vontade real dos declarantes; - Fazendo, assim, da referida compra e venda um negócio simulado e consequentemente nulo, ao abrigo do artigo 240.º do Código Civil, nulidade essa que desde já se invoca para os devidos e legais efeitos; - O que os 2ºs Réus sempre quiseram foi doar o bem imóvel ao 3.º Réu, uma vez que os 2ºs Réus são pais do 3.º Réu e, para além deste filho, têm mais sete filhos, um dos quais com deficiência, ainda não interditado; - O 3.º Réu é o filho que mais auxilia os 2ºs Réus, estando sempre presente no dia-a-dia dos mesmos, contribuindo diversas vezes financeiramente para despesas destes; - Em 2004, altura em que o 3.º Réu tencionava construir uma habitação própria, os 2ºs Réus, como forma de gratificar/compensar o 3.º Réu, decidiram doar o bem imóvel aqui em crise ao mesmo; - Contudo, como existem outros herdeiros (filhos dos 2ºs Réus), sendo um deles incapaz (não inabilitado ou interditado), os 2ºs e 3.º Réus não poderiam fazer uso da prerrogativa constante no artigo 877.º do Código Civil, obter o consentimento dos descendentes dos 2ºs Réus; - Assim, e com vista a obviar a esse obstáculo jurídico (com intuito de prejudicar 3ºs, nomeadamente os restantes herdeiros e em prol de beneficiar o 3º Réu, que se mostra sempre disponível para auxiliar os 2ºs Réus), os 2ºs e 3º Réus contataram os 1ºs Réus (padrinhos do 3.º Réu) para engendrar ficticiamente o respetivo negócio de compra do referido imóvel, sendo que, posteriormente, os 1ºs Réus teriam de proceder à doação do bem ao 3.º Réu, o que efetivamente veio a suceder; - Assim, em 15 de Setembro de 2004 os 2ºs e 1ºs Réus dirigiram-se ao Cartório Notarial ..., outorgando o respetivo contrato de compra e venda do imóvel; - Contudo, deste acto notarial não surtiram os efeitos essenciais da compra e venda, nomeadamente, não existiu entrega da coisa nem o pagamento do preço; - Foi 3.º Réu quem assumiu, desde logo, a posição de adquirente do bem imóvel arcando com a manutenção do mesmo, designadamente a limpar, cortar árvores e mato, à vista de todos e sem oposição de ninguém, nem mesmo dos Autores; - Quando iniciou as diligências para avançar com a construção da habitação apercebeu-se que o bem imóvel não estava em zona construível mas, para não suportar gastos desnecessários, solicitou aos 1ºs Réus que não efetuassem a doação de imediato; - Quando o 3.º Réu tomou conhecimento da alteração do PDM de ..., em que o referido imóvel passou a encontrar-se descrito num espaço de atividades económicas (zona industrial), é que se efetivou a doação, a 4 de Novembro de 2013; - O 3.º Réu, continuando a não poder construir a sua habitação, decidiu de imediato por o imóvel à venda e, para o efeito, colocou placas sinalizadoras da mesma, com a indicação dos m2 e da utilidade do terreno (terreno em zona industrial) e o seu contato telefónico; - Placas estas que por inúmeras vezes...

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