Acórdão nº 3814/19.4T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelALDA MARTINS
Data da Resolução21 de Maio de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães: 1.

Relatório Através de participação remetida no dia 26 de Junho de 2019 ao Ministério Público junto do tribunal recorrido, na sequência de acção inspectiva, a Autoridade para as Condições do Trabalho deu conta da existência de indícios de utilização indevida do contrato de prestação de serviço por parte de Associação Empresarial de X, Y e W, relativamente a A. C.

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Na sequência do recebimento da aludida participação, o Ministério Público instaurou a presente acção declarativa sob a forma de processo especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, nos termos do disposto nos arts. 5.º-A, al. c) e 186.º-K, n.º 1 do Código de Processo do Trabalho, pedindo a declaração de existência de contrato de trabalho, relativamente à pessoa acima referida, desde o ano lectivo 2005/2006(1).

A R. apresentou contestação, invocando a impossibilidade originária da lide, a falta de interesse em agir por parte do A. e o uso inadequado da forma de processo, em consequência do que pede a absolvição da instância. Assim não se entendendo, pede a absolvição do pedido, por dever ser dada como não provada a factualidade alegada, em virtude de terem sido celebrados contratos de prestação de serviços entre as partes.

A prestadora da actividade A. C. foi notificada dos articulados e nada disse.

Procedeu-se a audiência de julgamento, finda a qual foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, julgo a presente acção provada e procedente nos termos sobreditos e, em consequência: Condeno a ré, “Associação Empresarial de X, Y e W”, a reconhecer a existência de contrato de trabalho com início desde o ano lectivo de 2005/2006 em diante, relativamente à trabalhadora A. C..

Custas a cargo da ré, tendo a acção o valor de € 30.000,01.» A R. veio interpor recurso da sentença, formulando conclusões, designadamente: «(…) DA NULIDADE DA SENTENÇA A QUO POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA (…) XII. O Tribunal a quo não apreciou grande parte da factualidade descrita pela Recorrente na sua Contestação, onde constavam factos essenciais à boa e justa composição do litígio, ao apuramento da verdade material e, inerentemente, à decisão da causa.

XIII. Agiu como se o contraditório exercido pela Recorrente fosse inexistente e letra-morta para a boa apreciação da causa, desconsiderando-o de forma atroz, atropelando para esse efeito os mais basilares princípios do Direito.

XIV. No que tange à omissão de pronúncia invocada, e na esteira do estabelecido no n.º 2 do artigo 608.º C.P.C., o Tribunal a quo «deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação», impondo-se-lhe uma pronúncia acerca das pretensões deduzidas pelas partes que representam as controvérsias centrais que este deverá dirimir.

(…) XVI. Tendo em conta as considerações expostas supra nas Alegações, facilmente se conclui que ocorreu nulidade por omissão de pronúncia sobre a vasta factualidade invocada e trazida aos autos pela Recorrente através da sua Contestação, tendo a decisão recorrida violado o disposto no art.º 615.º, n.º 1, al. d) CPC, impondo-se a declaração desta nulidade e a reabertura da audiência para julgamento e decisão da matéria controvertida e relevante para a boa decisão da causa.

DA NULIDADE DE DECISÃO POR SUSPEIÇÃO XVII. Pela Recorrente foi apresentado em 12 de Dezembro de 2019, no seio do processo 3642/19.7T8GMR, que corre termos no mesmo Juiz 2 do Juízo de Trabalho de Guimarães – Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães, incidente de suspeição da Meritíssima Juiz a quo (cfr. Documento n.º 1).

XVIII. Em tal incidente, foi também suscitada a suspeição da Meritíssima Juiz a quo para os presentes autos, bem como para todos os processos nos quais existia identidade de sujeitos [Ministério Público (Autor) e Associação Empresarial de X, Y e W (Ré)], e identidade de mandatários da Ré.

XIX. Estando esse incidente de suspeição a correr termos, e revestindo uma causa prejudicial à prolação de sentença final dos presentes autos, por estar em causa a independência e imparcialidade da Meritíssima Juiz a quo, foi requerido nos presentes autos pela Recorrente a suspensão da instância, nos termos e ao abrigo do artigo 272.º C.P.C. e 125.º C.P.C., enquanto não fosse proferida decisão final do incidente de suspeição arguido pela Ré e pelo seu Mandatário.

XX. Além de não ordenar a suspensão da instância, a Meritíssima Juiz a quo proferiu sentença enquanto se encontrava a decorrer o incidente da sua suspeição promovido pela Recorrente e pelo seu Mandatário, cujo resultado visaria o afastamento fundamentado dos presentes autos, atenta a falta de imparcialidade e de isenção revelada e sustentada por uma vasta factualidade já exposta junto do Tribunal da Relação.

(…) XXIV. Ao fazê-lo, o Tribunal a quo enfermou a sua decisão final de nulidade, enveredando por um excesso de pronúncia, violando dessa forma o disposto no art.º 615º, n.º 1, al. d) CPC, violando igualmente o artigo 125.º C.P.C.. e, ainda, o n.º 4 do artigo 20.º e do artigo 203.º, ambos da C.R.P., redundando numa incurável inconstitucionalidade, a qual se deixa arguida para todos os efeitos tidos por convenientes.

DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO (…) XXVIII. Da leitura da presente motivação, não se encontra qualquer fundamentação relativa a muitos dos factos provados, desconhecendo-se a que factos se referem os documentos invocados nessa motivação, qual o sentido da decisão que determinaram e o que levou efectivamente a que viessem a ser considerados XXIX. In casu, a fórmula utilizada pelo Tribunal a quo para fundamentar a decisão da matéria de facto não é, tal como supra se referiu, a correcta, porquanto essencialmente se limita a identificar as testemunhas que concorreram para a formação da convicção, não consignando o sentido dos respectivos depoimentos, não conexionando cada facto ou cada grupo de factos com os concretos meios de prova que nela se invocam.

XXX. Não pode o Tribunal de primeira instância extrair conclusões de carácter genérico, abstracto e indeterminado, como sucede no caso em apreço, e que a serem válidas, serviriam para fundamentar qualquer tipo de decisão. Ora, é clarividente que em momento algum a Mm.ª Juiz demonstra, in concretum, a(s) testemunha(s) em cujo(s) depoimento(s) as respostas assentaram.

XXXI. O procedimento adoptado pela Meritíssima Juíz a quo apresenta uma manifesta insuficiência de fundamentação.

XXXII. Desde logo, há que levar em consideração que os factos dados como provados nos pontos 5, 6, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16 e 18 condicionaram a sentença proferida, pelo que a sua alteração, no que àqueles factos diz respeito, assume crucial importância.

XXXIII. É apodíctico que a fundamentação deve ser adequada à necessidade que se imponha em cada caso concreto e, no caso em apreço, afigura-se-nos que a fórmula utilizada é insuficiente no sentido de se entender a razão do decidido, havendo razões (mais que) suficientes para determinar a baixa dos autos à 1ª instância para melhor fundamentação.

DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO (…) XLV. São vários os concretos pontos dos Factos Provados que a Recorrente considera incorrectamente julgados, sendo que no seu entender impunha-se que os mesmos constassem antes do elenco de Factos Não Provados, designadamente os pontos 8, 9, 12, 13, 14, 15, 16, 17 e 18.

(…) XLVIII. Primeiro de tudo, deve ser realçado que as testemunhas da Recorrente são as únicas testemunhas que, além da própria trabalhadora, têm conhecimento directo da organização da Recorrente, da relação mantida entre Recorrente e a trabalhadora/prestadora em causa, e que podem atestar com razão, conhecimento e ciência o comportamento da trabalhadora/prestadora e a forma como a mesma se integrava, ou não, no seio da Recorrente.

XLIX. Depois, é incompreensível a forma como o Tribunal a quo aprecia o depoimento da própria trabalhadora A. C.. Desde logo, é notório que a mesma mais não é do que a verdadeira interessada no resultado da presente acção judicial e que, atenta a sua posição, pelo que deveria ser sempre aferido pelo Tribunal a quo se esse interesse no resultado da lide não poderia retirar credibilidade ao seu depoimento. Veja-se que esta já tem contrato de trabalho, pelo que o reconhecimento da sua existência num período anterior à sua efectiva celebração, aproveitaria apenas à própria.

L. Note-se nos longos minutos dos depoimentos apresentados pelas testemunhas arroladas pela Recorrente e que nunca se contradisseram e demonstraram ter um conhecimento directo dos factos, ao invés dos dos depoimentos apresentados pelas testemunhas arroladas pelo Recorrido, apresentando depoimentos totalmente inócuos para a presente lide e privados de qualquer conhecimento directo da factualidade aqui em discussão. Não viram, não identificaram, não reconheceram de forma directa e sem intermediários os factos aqui em discussão, limitando-se a fazer um depoimento na terceira pessoa, enquanto iam lendo e relendo documentos.

LI. Enfim, todo o seu depoimento se restringiu à leitura do auto constante do processo, bastando-se tal instância do Recorrido pela leitura de tal auto em conjunto, e de um questionário com anotações que nem consta dos autos, sem qualquer conhecimento directo dos factos que ia erroneamente afirmando, o que só acentua o gravíssimo erro de julgamento com que nos deparamos.

(…) de outra banda, CVI. Do elenco de factos não provados, e atenta a sua relevância para a justa apreciação do mérito da causa, deveriam forçosamente – atenta a prova testemunhal e documental produzida nos autos – ter sido considerados como provados os factos descritos nos pontos A a V.

(…) DAS EXCEPÇÕES I - DA IMPOSSIBILIDADE ORIGINÁRIA DA LIDE E VALIDADE DA ACÇÃO (…) CLXIII. Apesar de verificada a existência deste vínculo laboral, veio, na decorrência da participação da ACT, o Ministério Público suscitar, mediante proposição de Acção Especial de Reconhecimento da...

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