Acórdão nº 1397/16.6T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Maio de 2020

Data21 Maio 2020

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães I – Relatório O presente processo iniciou-se com o requerimento do Digno Magistrado do Ministério Público para abertura de processo judicial a pedir a aplicação de medida de promoção e proteção a favor da menor F. C.

, nascida em -/06/2015, natural da freguesia de ..., concelho de Barcelos, filha de M. R. e de D. C., atualmente acolhida na "Casa do …”, com sede na Rua ….

Para tanto, alegou, em síntese, que os progenitores não reuniam competências parentais para cuidar da menor, que lhe infligiam maus tratos para o seu bem-estar físico e psicológico, por força das quezílias existentes entre o casal que deu origem ao processo crime nº.228/16. 1 PABCL, por violência doméstica, que correu termos contra o progenitor, motivado e agravado também pelos consumos excessivos de álcool que este apresentava e pelas dificuldades económicas do casal, não apresentando a progenitora ocupação profissional.

Ao circunstancialismo descrito, acrescia a falta de higienização da habitação, apresentando odor a urina e fezes de cão, com mobiliário degradado e sujidade no chão, a cozinha repleta de roupa suja e restos de comida, assim como sopa destinada à criança, que aparentava vários dias, não existindo qualquer lugar adequado para a criança dormir, nem para o acondicionamento das suas roupas. Aquando da realização da vista pela equipa da CPCJ a menor encontrava-se com febre e foi conduzida ao médico, tendo sido orientada para o hospital onde ficou internada.

Por despacho judicial proferido a fls. 43 a 44 foi declarada aberta a fase da instrução e solicitada a elaboração de Relatório Social.

Foi determinada, por despacho de 24.06.2019, a aplicação a favor da menor, a título cautelar e urgente, da medida de acolhimento residencial, no estabelecimento de acolhimento “Casa ...”.

Foram ordenadas diligências instrutórias tendo em vista aferir se, quer o pai, quer a mãe, conseguiam reorganizar-se e constituir uma alternativa viável para um projeto de vida desta criança, caso contrário, se existia a possibilidade de integrá-la em família idónea (no seio da família alargada ou fora da família biológica) ou se apenas restaria o seu encaminhamento para a adoção.

Foi designada data para inquirição dos progenitores e da técnica da Segurança Social, gestora do processo.

Por acordo de promoção e proteção firmado a fls. 112, foi aplicada a favor da menor a medida de promoção e proteção de "Acolhimento Residencial", na "Casa ...", pelo período de seis meses. Tal medida tem vindo a ser sucessivamente revista e prorrogada.

Em 13/06/2018 foi tentada a integração da menor no agregado familiar dos seus tios paternos C. M. e I. P., porém, tal acolhimento não resultou, por razões que os tios imputaram à menor, tendo estes optado pelo reingresso da menor na "Casa ..." e se recusado a recebê-la posteriormente.

Apesar de ter sido ordenada uma avaliação psicológica tendo em vista aferir quais os motivos pelos quais a menor F. C. apresentou os comportamentos descritos pelos tios, estes não compareceram nem nunca se disponibilizaram para dar início à avaliação.

Foi também averiguada a possibilidade da menor integrar, em contexto familiar, o agregado de tios maternos e de uma madrinha, o que se revelou igualmente infrutífero, tendo se concluído que estes não reuniam as necessárias competências para acolher a menor.

Face à impossibilidade de integrar a menor, quer em contexto familiar materno, quer paterno e tendo-se considerado como não viável a obtenção duma solução negociada, foi ordenada a notificação, para apresentação de alegações, as quais foram carreadas pelo Digno Magistrado do Ministério Público (cfr. fls. 352 a 359) e pela Ilustre Patrona nomeada à progenitora - cfr. fls. 361 a 362.

Realizou-se o Debate Judicial onde foram prestadas declarações pelos pais da menor e foram inquiridas diversas testemunhas.

A final foi proferido acórdão tomada por unanimidade, com o seguinte dispositivo: “Nos termos e com os fundamentos expostos, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 35º/1/g), 38º-Alb) e 62ºIAl1/3/5), o Tribunal decide aplicar a favor da menor F. C. a medida de confiança com vista a futura adopção sob a guarda da instituição "Casa ...".

Nos termos do disposto do artigo 62.º-Al5, da LPPCJP, nomeio como curadora provisória a Técnica da instituição que tiver um contacto mais direto com a criança.

Em consequência e nos termos do art.º 1978.º- A do Código Civil e 62.ºAl6 da LPCJP "ficam os pais inibidos do exercício das responsabilidades parentais e não há lugar a visitas por parte da família biológica".

A progenitora, D. C.

, não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo concluído as suas alegações com as seguintes conclusões: I. O presente recurso tem como objecto o conteúdo e matéria de direito da douta sentença proferida nos presentes autos, que decidiu aplicar a favor da menor F. C. a medida de confiança com vista a futura adopção sob a guarda da instituição “Casa ...”.

  1. Na verdade, mal andou o tribunal recorrido ao considerar provados os pontos supra expostos (7º, 8º, 9º, 13º, 14º, 24º, 25º, 26º, 29º, 31º e 32º), uma vez que resulta demonstrado nos autos, nomeadamente da prova produzida, o inverso III. Com efeito, o tribunal recorrido formou a sua convicção com base num único relatório da CPCJ, bem como no depoimento da técnica da segurança social, coordenadora do processo.

  2. Não corresponde, pois, à verdade que o desempenho laboral da progenitora seja escasso, por causa que lhe seja imputável.

  3. Pois que, conforme resulta das declarações da mesma, a única razão que gerou esta escassez foi o facto de ser contratada pela empresa/entidade patronal, mas mais tarde vir a apurar que a sua admissão não era declarada no sistema da segurança social.

  4. Por outro lado, quando questionada acerca das perspectivas futuras para si e para a sua filha, a progenitora assumiu uma atitude consciente.

  5. Bem sabendo das dificuldades que atravessa, mostrou-se assertiva, referindo que está a trabalhar, que pretende residir com uma tia, que é pessoa capaz, com condições habitacionais para a acolher, a si e à sua filha F. C..

  6. Face ao exposto, constatamos que o tribunal recorrido valorou, sobretudo, a prova produzida por parte da equipa da segurança social.

  7. O tribunal recorrido, apesar da inquirição da testemunha A. P. tia materna da menor F. C., optou por não considerar o seu depoimento.

  8. Pois se assim fosse, o tribunal não consideraria como provados os factos 24º, 25º, 26º, 31º e 32º XI. Destarte, perante o depoimento desta, salvo devido respeito por douto entendimento, o tribunal recorrido deveria ter averiguado, novamente, a situação económica e social da tia da menor, uma vez que a mesma alterou-se substancialmente.

  9. A tia A. P. reune todos os pressupostos para receber a menor e garantir-lhe todos os cuidados necessários a uma saudável, feliz e familiar educação, alicerçada na unidade familiar e no reaproximar dos laços parentais.

  10. Encontra-se inserida profissionalmente e de forma estável, trabalha no restaurante …, sito em Viana do Castelo, há 11 anos, auferindo o salário médio mensal de €890,00.

  11. Apesar de tal não estar devidamente declarado.

  12. Vive numa casa com a tipologia T3, na morada indicada nos autos, juntamente com dois sobrinhos, que lhe foram entregues judicialmente, o J. P., de 16 anos de idade, e o L. F., de 11 anos de idade.

  13. Os quais são primos da menor F. C..

  14. Além do salário que aufere com o seu trabalho, a requerente recebe mensalmente a quantia de €200,00, quantia paga a título de pensão de alimentos aos seus sobrinhos, acrescidos do respectivo abono de família.

  15. Os sobrinhos da tia A. P. usufruem, ainda, do escalão A, referente à acção social escolar.

  16. A tia da menor tem absoluta noção da responsabilidade que acarreta a educação, acompanhamento de uma criança nestas circunstâncias, uma vez que os seus sobrinhos lhe foram entregues na mesma situação, XX. E, contrariamente ao que foi suscitado em sede de debate judicial – não comprovado – o processo de promoção e protecção iniciado a respeito destes sobrinhos, foi já arquivado há algum tempo e teve origem em mau comportamento escolar.

  17. Ainda assim, entendeu o Tribunal "a quo", face ao conspecto fáctico dado como assente, que se impunha, atento o "superior interesse" da menor, afastá-la em definitivo dos pais biológicos e enfrentar um longo e estigmatizante processo de adoção, XXII. Desta forma, não foram ponderados devida e corretamente todos os elementos de prova existentes e produzidos nos autos.

  18. Os sobrinhos da tia A. P. usufruem, ainda, do escalão A, referente à acção social escolar.

  19. A tia da menor tem absoluta noção da responsabilidade que acarreta a educação, acompanhamento de uma criança nestas circunstâncias, uma vez que os seus sobrinhos lhe foram entregues na mesma situação, XXV. E, contrariamente ao que foi suscitado em sede de debate judicial – não comprovado – o processo de promoção e protecção iniciado a respeito destes sobrinhos, foi já arquivado há algum tempo e teve origem em mau comportamento escolar.

  20. Ainda assim, entendeu o Tribunal "a quo", face ao conspecto fáctico dado como assente, que se impunha, atento o "superior interesse" da menor, afastá-la em definitivo dos pais biológicos e enfrentar um longo e estigmatizante processo de adoção, XXVII. Desta forma, não foram ponderados devida e corretamente todos os elementos de prova existentes e produzidos nos autos, XXVIII. De tal forma, que os mesmos não permitem sustentar e fundamentar a decisão que o tribunal recorrido tomou.

  21. Assim, após essa análise outra decisão mereceria ter sido proferida, pois, salvo devido respeito, os laços afetivos, a educação, a formação pessoal e social, bem como a sua segurança está devidamente acautelada com a progenitora, ou até mesmo com a tia avó materna A. P. aqui recorrente, o que nem sequer foi equacionado pelo Tribunal.

  22. O Tribunal "a quo" valorou os relatórios juntos aos...

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