Acórdão nº 2190/17.4T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelANTERO VEIGA
Data da Resolução17 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

Nos presentes autos vieram M. M. e M. R. intentar ação emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum contra J. A., pedindo o reconhecimento da ilicitude do seu despedimento e a condenação do mesmo no pagamento da quantia de € 110.521,10 a título de indemnização pelos danos patrimoniais e morais decorrentes do despedimento de que foram alvo e de créditos laborais vencidos e não liquidados.

Para o efeito as aqui demandantes vieram invocar terem sido admitidas ao serviço do R. para exercerem funções como trabalhadoras agrícolas na “Quinta ...” que aquele enquanto empresário agrícola explora, entre 2007 e 2017, cumprindo um horário de 8 horas/dia, durante 5 dias por semana e auferindo inicialmente a quantia de 23,00/dia, paga à semana, obedecendo às ordens e instruções dadas pelo demandado através do caseiro que ali se encontrava a trabalhar, sendo muitas vezes transportadas no veículo pessoal do demandado até às suas residências no final do dia de trabalho e utilizando todas as ferramentas e utensílios disponibilizados pelo R. para o cumprimento das tarefas de que eram incumbidas.

Mais invocam que ultimamente os seus vencimentos correspondiam ao montante de e 28,00/dia o que correspondia a um vencimento ilíquido mensal de € 692,13 e que nos dias em que chovia ou em que se encontravam doentes não prestavam trabalho e não recebiam o respetivo salário, gozando férias em simultâneo com o caseiro da quinta, habitualmente em agosto as quais não eram também remuneradas, não auferindo ao longo da vigência dos seus vínculos laborais qualquer montante a título de subsídio de férias ou de Natal. Acrescentam também que nunca forma efetuadas as respetivas inscrições nos serviços sociais competentes pelo que as respetivas contribuições nunca foram efetuadas e deverão ser regularizadas.

Mais invocam que em novembro de 2017 foram ambas despedidas sem qualquer fundamento e sem que lhes tivesse sido instaurado qualquer procedimento disciplinar, pelo que estes despedimentos deverão ser considerados como ilícitos.

- A autora M. M. a fls. 344 veio declarar pretender desistir da instância, tendo o R. declarado nesse mesmo requerimento aceitar tal desistência, tendo esta sido objeto de homologação.

A autora M. R. pede que o R. seja condenado a pagar-lhe a quantia de €159.306,15 a título de compensação pelos valores devidos a título de créditos laborais, indemnizações devidas por danos morais e patrimoniais decorrentes dos despedimentos de que foram alvo e pelas contribuições relativas à Segurança Social.

- A ré impugnou a factualidade invocada, alegando que na Quinta ... existia um único trabalhador com vínculo laboral, A. R., cônjuge da A. M. R., sendo que em épocas de maiores afazeres na referida quinta este trabalhador requisitava o auxílio de outros trabalhadores que aquele pagava de acordo com o número de horas de trabalho que ali executavam, pelo que refuta veementemente que tenha existido qualquer vínculo laboral com as aqui AA. a quem nunca impôs qualquer horário de trabalho ou a deu qualquer ordem ou instrução, tendo-lhes sempre sido pagas todas as quantias que lhes eram devidas.

Mais invoca a má-fé.

Realizado o julgamento foi proferida decisão nos seguintes termos: “Tudo visto e nos termos acima expostos julga-se a presente ação parcialmente procedente por provada e em consequência declara-se que entre o R. e a aqui A. M. R. vigorou um contrato de trabalho de 01/11/1999 a novembro de 2017 o qual cessou por despedimento ilícito que aquele lhe moveu e em conformidade condena-se o demandado a pagar à A. a quantia de € 43.854,00 (quarenta e três mil oitocentos e cinquenta e quatro euros) a título de créditos laborais vencidos e não liquidados, bem como de indemnização pelos danos patrimoniais decorrentes da ilicitude deste despedimento, acrescida esta quantia dos respetivos juros de mora vencidos, à taxa legal, desde a data da citação e dos vincendos até integral pagamento.

Mais se condena o R. a pagar à A. a quantia referente às retribuições vencidas desde a data do despedimento e as vincendas até ao trânsito em julgado da presente decisão, em montante a fixar em execução de sentença, absolvendo-se o R. dos demais pedidos formulados pela A.

Julga-se ainda improcedente por não provado o pedido de condenação da A. Por litigância de má-fé deduzido pelo R., absolvendo-se a demandante do mesmo…” Inconformado o réu interpor recurso apresentando as seguintes conclusões: I – O R./ Apelante recorre da Douta Sentença que declarou a existência de um contrato de trabalho entre o R. e A, em vigor entre 01/11/1999 a novembro de 2017, e que o mesmo cessou por despedimento ilícito movido pelo R., tendo o R. sido condenado … II – A questão principal nestes Autos incide sobre a qualificação jurídica da alegada relação de trabalho existente entre A. e R., porém, para além desta o recurso versará outras questões de direito (e de algum modo de facto, mas insertas em questões de direito); III - A primeira prende-se com a violação do princípio constitucional da igualdade de armas e direito a um processo justo e equitativo, e nulidade processual por violação art. 193.º, n.º 2 CPC; IV – Considera o Apelante ter litigado desde o início da lide desigualdade de armas.

V – Ainda em momento anterior a estes Autos já o R. tinha sido alvo de uma participação à ACT, da iniciativa da A./ aqui Apelada, seguida de fiscalização, que veio ter reflexos nestes autos, uma vez que, apesar do R. ter sempre negado a existência de trabalho subordinado, o facto de, na sequência da referida ação inspetiva, ter sido elaborado um relatório e decisão no sentido da existência de uma relação laboral, será desde logo, o suficiente para envenenar a mente de um julgador mais permeável a influências externas (cfr. arts. 63.º a 67.º da Resposta do R. à contestação da A., e artigo 14.º da matéria de facto dada como provada); VI – Seguiu-se o lançar mão de da ação especial para a apreciação da regularidade e licitude do despedimento, por parte da A., sem que existisse qualquer comunicação escrita a si dirigida pelo R., em que se reconhecesse uma relação laboral e a operar qualquer despedimento; VII - Não tendo o R., reconhecido a relação laboral na audiência de partes, devia logo ter sido o R. absolvido da instância, por mostrar tal ação especial imprópria, antes devendo a A. recorrer à ação comum laboral.

VIII – Não foi isso que aconteceu, antes seguiu a ação os seus normais termos, e nesse sentido foi notificado o R. para a apresentar o seu articulado, seguindo-se contestação da A., e resposta do R.., e da apensão do processo aos atuais autos, com convolação da ação especial em ação comum, em atropelo, salvo o devido respeito, às regras processuais, que considerando a diferente regra do ónus da prova nesses processos de forma diversa, foram claramente desfavoráveis ao R., pela operada inversão (cfr. .Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 21-02-2018, no âmbito do processo 10118/16.2T8VNG-A.P1); IX - Foi indevidamente aplicado ao art.º 547.º do CPC, padecendo, por isso, estes autos de uma nulidade, por diminuição das garantias de defesa do R., que inquina todos os atos subsequentes (cfr. art. 193.º, n.º 2 do CPC), e que agora expressamente invocámos, e como já tivemos oportunidade de assinalar no articulado do R. (cf. Requerimento de 21/02/2018, no Apenso A, arts. 1.º a 16.º).

X - Invocando-se tal nulidade na eventualidade de não se dever considerar sanada, por poder caber nos casos especiais em que a lei permite o conhecimento oficioso (cfr. art.º 196.º CPC), até porque contende com uma violação do princípio constitucional de igualdade de armas, patente nos arts. 13.º e 20.º, n.º 4 da CRP, e também expresso no art.º 4.º do CPC; XI - Na enunciação dos temas da prova (cfr. despacho saneador de 10-12-2018), não foi elencado qualquer tema relacionado com as questões levantadas pelo R., nos seus articulados, nem, em momento ulterior quanto aos factos que poderiam ser apreciados para apuramento de eventual má-fé da A., apesar de reclamação do R. (cf. Requerimento de 27/12/2018).

XII - E na resposta do Tribunal à matéria de facto vertida nos temas da prova, apenas foram aproveitados depoimentos que corroboram a versão da A., e desvalorizados aqueles que a contrariavam como foi o caso do depoimento da também A. nestes Autos M. M., que, assinale-se, desistiu do pedido nestes autos, inexistindo qualquer acordo homologado nos autos; XIII -Todas as situações acima descritas, vistas de forma isolada não constituem, por si mesmas, situações que denotem desigualdade processual, mas em conjunto, revelam que este processo se tem desenrolado de forma algo anómala, e não equitativa, com prejuízo para o R.; XIV – Existiu Erro de Julgamento por errada ou inexata qualificação jurídica da relação de “trabalho” existente entre A. e R., XV – Salvo o devido respeitos, a interpretação do Julgador da matéria de facto e subsunção da mesma ao Direito, não se mostra a mais assertiva, existindo mesmo incongruências patentes na factualidade provada, que, concomitantemente abalam a essa mesma interpretação.

XVI - Com uma interpretação efetuada segundo as regras da experiência, conjugada com as incongruências da matéria de facto que apontaremos, e com prova documental junta aos Autos, devia-se concluir pela inexistência de um contrato de trabalho.

XVII – Da matéria de facto dada como provada, consta no artigo 2.º da resposta aos quesitos que a A. foi contratada, em conjunto com o seu marido para exercer as funções de “caseira” cfr. artigo 2.º da resposta do Tribunal aos quesitos (de 27/06/2019).

XVIII – Mas perante uma apreciação atenta da restante matéria de facto dada como prova, não resulta que, na realidade, a A. tenha alguma vez chegado a exercer funções próprias dessa categoria; XIX – Antes se apurou que a A. nos primeiros 5 ou 6 anos da sua relação (assim qualificada na Douta Sentença em crise)...

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