Acórdão nº 806/19.7T8CHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Data da Resolução17 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES *I – Relatório X – INDÚSTRIA TORREFATORA DE CAFÉS, S.A., NIPC ………, com sede na Rua …, freguesia de …, concelho de Paredes (CP …), veio interpôr acção declarativa de condenação, com processo comum, contra G. C., NIF ………, residente na Rua do …, freguesia de ..., concelho de Chaves (C. Postal: …), e M. A., NIF ……….., residente na Rua do …, freguesia de ..., concelho de Chaves (C. Postal: …).

Fundamentando tais pretensões e em síntese, alega a A. que celebrou com o 1º R. um contrato de fornecimento de café em regime de exclusividade, pelo período de 2 anos, tendo este se comprometido a adquirir à A. 24 quilogramas de café da marca X, num total de 576 quilogramas, não podendo o R. comercializar outras marcas no seu estabelecimento comercial. Mais referiu que como contrapartida dessas obrigações, a A. forneceu ao R. equipamento e material publicitário, sendo que este último incumpriu o referido contrato porquanto não adquiriu as referidas quantidades de café e começou a vender café de outra marca, razão pela qual veio a A. a proceder à resolução do contrato.

Pretende por isso a A. haver dos RR., sendo a R. na qualidade de fiadora, o pagamento da quantia global de € 12.071,54 da qual o montante de € 7.992,60 diz respeito à indemnização devida em virtude do incumprimento contratual e o montante de 4.078,94 refere-se ao preço dos equipamentos e material publicitário fornecidos, tudo com juros de mora vencidos, contados desde a data da citação e vincendos até efectivo e integral pagamento.

* Em contestação, os RR. referiram que quem procedeu em primeiro lugar à resolução do contrato foi o 1º R. uma vez que a A. colocou no estabelecimento máquinas de café velhas e não funcionais e bem assim não procedeu à reparação do material publicitário ali colocado, o qual se destruiu por duas vezes com as chuvas. Mais alegam que nunca consumiu café de outras marcas a não ser após a resolução do contrato com a A. por si efectuada. Referem também os RR. que o contrato foi preenchido pela A. já depois de ter sido assinado pelos RR., de tal modo que a quantidade de café não foi previamente negociada mas antes imposta pela A.

*Foi proferido despacho saneador e dispensada a elaboração do despacho de identificação do objecto do litígio e selecção dos temas da prova, nos termos do preceituado no art. 597.º do CPC.

* Procedeu-se a julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou a acção totalmente procedente e, em consequência, condenou os RR. a pagarem solidariamente à A. a quantia de € 12.071,54 (doze mil, setenta e um euros e cinquenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora calculados à taxa comercial, vencidos desde a data da citação e vincendos até efectivo e integral pagamento.

*II-Objecto do recurso Não se conformando com a decisão proferida, vieram os RR. G. C. e mulher M. A. interpor recurso, no qual formulam, a final, as seguintes conclusões: 1.

A sociedade “X – Indústria Torrefatora de Cafés, S.A.” intentou a presente ação contra os réus, alegando, em síntese, que celebrou com o primeiro réu um contrato de fornecimento de café em regime de exclusividade, pelo período de dois anos, sendo que o último se obrigou a adquirir à primeira, mensalmente, 24 quilogramas de café da marca X, até perfazer um total de 576 quilogramas, e como contrapartida dessas obrigações do primeiro réu (compra, promoção e venda), forneceu a este equipamento e material publicitário.

  1. Alega que o primeiro réu incumpriu o contrato porquanto não adquiriu as referidas quantidades de café e começou a vender café de outra marca.

  2. A autora juntou uma carta, datada de 5 de Julho de 2017, pela qual alega ter resolvido o contrato.

  3. Os réus contestaram e alegaram que foram os próprios que procederam em primeiro lugar à resolução, em consequência do mau funcionamento do equipamento, designadamente da máquina de café e d...

    e da não substituição do toldo destruído.

  4. Os réus deram por resolvido o contrato em causa, a menos que a situação fosse resolvida e sanada no prazo de 15 dias.

  5. Alegaram ainda que os consumos acordados foram diferentes dos constantes do contrato, e que, entre 22/06/2016 e 20/06/2017, nunca encomendaram 24 quilogramas de café mensal, o que sempre foi aceite pela autora.

  6. Dá-se aqui por integralmente reproduzida a matéria de facto julgada provada.

  7. Dá-se aqui por integralmente reproduzida a matéria de facto julgada não provada.

  8. Dão-se aqui por integralmente reproduzidos os depoimentos das testemunhas supratranscritos.

  9. Deve ser julgado provado que, quer a primeira, quer a segunda máquina de café, apresentaram problemas que obviavam a que o café fosse tirado adequadamente.

  10. Deve ser julgado provado que os destroços das telas e do roofmade foram levantados por N. J., pessoa encarregue pela autora para os colocar.

  11. O contrato de fornecimento de café, em regime de exclusividade, acompanhado do comodato de bens móveis, é, de facto, um contrato complexo, que envolve segmentos próprios do contrato promessa, do contrato de prestação de serviços, do contrato de comodato, do contrato de compra e venda, e, não raras vezes, como é o caso, está ainda sob a alçada do Dl n.º 249/99 de 7/7 (cláusulas contratuais gerais).

  12. O contrato de fornecimento de café em apreço nestes autos, trata-se de um contrato, pelo menos parcialmente, pré-preenchido e elaborado, cujoconteúdo, previamente elaborado, os réus não puderam influenciar.

  13. No contrato em apreço, só os elementos preenchidos à mão da cláusula segunda e da cláusula terceira são suscetíveis de cair fora da alçada do regime das cláusulas contratuais gerais, sendo certo que, quanto às restantes, o ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo, ou seja, neste caso, a autora.

  14. Quanto à obrigação, contida na cláusula terceira, de conservação, reparação e manutenção do equipamento, não foi esta sujeita a qualquer negociação prévia.

  15. A questão da reparação e manutenção do equipamento, pressupõe, antes de mais que o equipamento e material necessário não sejam defeituosos, estejam em boas condições de funcionamento e aptos a serem reparados em caso de avaria.

  16. Não obstante as inúmeras reparações efetuadas nas máquinas (já usadas) estas não surtiram qualquer efeito.

  17. Os atos de reparar, consertar, manter e conservar pressupõem que a coisa existe, que não pereceu.

  18. Os toldos exteriores ficaram completamente destruídos.

  19. Nos termos do disposto no artigo 1136º do Código Civil, “quando a coisa emprestada perecer ou se deteriorar casualmente, o comodatário é responsável, se estava no seu poder tê-lo evitado…” 21.O comodatário está obrigado a restituir a coisa tal como a recebeu, só podendoeximir-se de tal obrigação quando ocorrer causa de exclusão da responsabilidade.

  20. O primeiro réu não pôde evitar a queda dos toldos exteriores, por via das chuvas, pois nada podia fazer para o evitar.

  21. Como contrapartida das obrigações de compra, promoção e venda, em regime de exclusividade, assumidas pelo primeiro réu, a autora entregou ao primeiro réu o equipamento e material publicitário descrito na cláusula terceira, para que aquele o usasse.

  22. O primeiro réu, além de não ter conseguido usar as máquinas de café, pelo menos de forma eficiente, ficou sem o material publicitário, designadamente a cobertura por telas da esplanada exterior, em 2016 e, definitivamente, em 2017.

  23. A sua contrapartida, que devia ter sido proporcionada pela autora, em troca das suas obrigações, deixou de existir.

  24. A resolução operada pela autora não é válida e lícita.

  25. Na verdade, por carta registada com aviso de receção, datada de 5 de Julho de 2017, a autora procedeu à resolução do “contrato de fornecimento em regime de exclusividade”, celebrado com os réus, exclusivamente com fundamento na não aquisição mensal de 24 quilogramas de café e na violação da exclusividade na venda de café.

  26. O primeiro réu, não obstante o que consta do contrato, não estava obrigado a adquirir 24 quilos de café mensalmente, pois aquela quantidade era meramente indicativa.

  27. Essa não obrigação foi dada como factualidade provada em n.º 12.

  28. O primeiro réu não consumiu os 576 quilogramas a que estava obrigado porque, entretanto, resolveu o contrato por incumprimento da autora.

  29. O primeiro réu não violou a obrigação da exclusividade.

  30. A resolução do contrato operada pelo primeiro réu, anterior à operada pela autora, é lícita porque teve por fundamento a deficiência dos equipamentos fornecidos, designadamente das máquinas de café, e da perda dos toldos exteriores, decorrente da não resistência às condições atmosféricas, ou seja, da ausência da contrapartida a que a autora se obrigou.

  31. Os réus não podem ser condenados no pagamento do material publicitário, no valor de 4.078,94 € porque, por carta registada com aviso de receção, datada de 12/07/2017, solicitaram à autora o levantamento do que restava do material publicitário, sem prejuízo daquele que já fora levantado pelo Sr. N. J., solicitação que voltaram a repetir por carta registada com aviso de receção, em 21/07/2017.

  32. A autora, não obstante já ter levantado o equipamento (máquina de café e moinho) e parte do material publicitário (mesas e cadeiras), no próprio estabelecimento, nem nessa altura, nem a solicitação dos réus, o fez.

  33. Deve ser revogada a douta sentença recorrida e substituída por outra pela qual seja julgada totalmente improcedente a presente acção declarativa de condenação aqui recorrida, com a consequente absolvição dos réus.

  34. A douta decisão recorrida violou, entre outros, o disposto nos artigos...

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