Acórdão nº 374/18.7T8PVL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA CRISTINA CERDEIRA
Data da Resolução17 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO B. A. intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra Seguradoras ..., S.A., pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe uma indemnização no valor de € 5.559,92, através de cheque cruzado emitido a favor do Autor, sem a inscrição não à ordem ou não endossável, a enviar para o escritório dos seus mandatários contra recibo em simultâneo, acrescida de juros de mora a partir da data da citação.

Para tanto, alega, em síntese, que no dia 18/10/2015, cerca das 17 horas, ocorreu um acidente de viação na E.N. 103, ao Km 53,600, sito em ..., ..., Póvoa de Lanhoso, no qual foram intervenientes os veículos automóveis ligeiros de passageiros, de matrícula NH, propriedade do A. e por ele conduzido, e de matrícula DZ, conduzido pelo seu proprietário D. R., estando este veículo seguro na Ré.

Após descrever o acidente, que consistiu no embate entre os dois veículos, alega que o mesmo ficou a dever-se a culpa exclusiva do condutor do veículo DZ, por seguir a uma velocidade superior a 50 Km/hora, manifestamente excessiva para o local (onde está limitada por placas verticais a 50 Km/hora), completamente distraído, sem atenção ao que se passava na estrada à sua frente e ao restante trânsito, e com a mais completa falta de cuidado, prudência, consideração, diligência, habilidade e destreza.

Acrescenta que, em consequência do acidente, sofreu os danos patrimoniais que descrimina na petição inicial – relativos ao custo da reparação do seu veículo, com a matrícula NH, à privação do uso do mesmo desde a data do acidente até 12/11/2015 e à redução do seu valor comercial ou de troca por se notar que se trata de um veículo sinistrado - e cujo ressarcimento peticiona naquele articulado.

A Ré contestou, impugnando os factos alegados pelo Autor relacionados com a dinâmica do acidente e os danos que ele alega ter sofrido, dando uma versão distinta do modo como ocorreu o acidente e concluindo que o mesmo ficou a dever-se à conduta negligente, inconsiderada e grosseiramente transgressional do próprio Autor.

Acrescentou, ainda, que a própria seguradora do A., a X, aceitou a responsabilidade do seu segurado na produção do acidente, tendo reembolsado a Ré do custo da reparação do veículo DZ, o qual foi por esta inicialmente suportado no âmbito da Convenção IDS.

Termina, pugnando pela improcedência da acção, com as consequências legais.

Realizou-se a audiência prévia, na qual foi proferido despacho saneador, onde se procedeu ao saneamento da acção, verificando-se a validade e regularidade da instância, se definiu o objecto do litígio e enunciou os temas de prova, que não sofreram reclamações.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo.

Após, foi proferida sentença que julgando a acção parcialmente procedente, condenou a Ré a pagar ao A. a quantia de € 2.217,46 (dois mil duzentos e dezassete euros e quarenta e seis cêntimos), acrescida dos juros de mora, à taxa legal, a contar da data da citação.

Inconformado com tal decisão, o Autor dela interpôs recurso, extraindo das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]: 1ª A sentença recorrida não espelha, de todo, o conjunto da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, motivo por que deveria ter sido proferida decisão bem diversa daquela que consta de decisão aqui em crise.

  1. Desde logo pelas “dificuldades” que o Meritíssimo Juiz a quo referiu ter encontrado na prova que foi produzida e que, na realidade, devidamente apreciadas e ponderadas lhe impunham outra decisão, nomeadamente a que considerasse o condutor do veículo seguro na recorrida como único e exclusivo culpado na eclosão do sinistro.

  2. Com efeito, preferiu entender que a questão se deveria resolver por recurso ao instituto da responsabilidade objectiva ou pelo risco, ao invés de – atenta toda a prova produzida, testemunhal e documental – se decidir, como se referiu no corpo destas alegações, pela culpa única e exclusiva do condutor do veículo seguro na recorrida na produção do acidente descrito nestes autos.

  3. Assim, e com o devido respeito, não podemos de todo concordar com as expressões constantes dos pontos 6º e 7º dos factos quando ali se pode ler: Em circunstâncias que não foi possível apurar, uma vez que da prova produzida – testemunhal e documental – como se demonstrou no corpo desta alegações, foram – ou deveriam ter sido – apuradas todas as circunstâncias em que ocorreu o acidente dos autos.

  4. Desde logo, as fotografias juntas aos autos demonstram à saciedade que a colisão entre os veículos – atentas as partes dos mesmo danificadas – terá ocorrido (com local provável de embate) na zona de refúgio -, como foi apelidada a baía de mudança de direcção pelas testemunhas.

  5. E o único depoimento que colocou em crise esse elemento relevante de prova foi o condutor do veículo seguro na recorrida, que referiu que o embate ocorreu na sua faixa de rodagem, que o veículo do recorrente entrou para a via quando ele se encontrava a escassos 3 metros (!!!) e quando seguia animado de uma velocidade de cerca de 50 Kms por hora.

    A ser assim é absolutamente inquestionável que as zonas em colisão dos veículos teriam se der, necessariamente, a frente esquerda do veículo seguro na recorrida e a parte da frente do lado esquerdo do veículo do recorrente.

  6. Mas mais; tendo por boa essa declaração acabada de referir, e não havendo necessidade de se ser matemático, por tudo aquilo quanto todos nós do foro já escutamos, seguindo aquele veículo a 50 Kms por hora, percorreria 14 metros por segundo; e tendo um tempo de reacção (para lá do de exposição do obstáculo que tem de ser de 0,8 segundos), sempre este veículo teria percorrido aqueles 3 metros em mais tempo do que o que levou o recorrente a atravessar a quase totalidade da metade direita da faixa de rodagem da E.N. 103 – atentas as declarações do condutor do veículo seguro na recorrida e as zonas dos veículos embatidas!!! –.

  7. Ora, na metade direita da E.N. 103, atento o sentido Póvoa de Lanhoso – Braga, nem o mais ténue vestígio de ali terem colidido aqueles dois veículos existia; e as fotografias que acompanham a douta contestação trazem ainda maior certeza ao que acaba de se alegar, tanto mais que o veículo seguro na recorrida se encontra imobilizado com uma grande parte na zona de “refúgio”.

  8. Não percamos aqui de vista que o condutor do veículo seguro na recorrida afirmou sempre que o seu veículo quer quando colidiu com o do recorrente, quer quando se imobilizou nunca abandonou a sua faixa de rodagem, tendo inclusivamente afiançado em Tribunal que o mesmo se imobilizou paralelamente ao eixo da via; as fotografias que acompanham a douta contestação desmentem-no categoricamente.

  9. Por isso, esse depoimento não poderia ter merecido a mais ténue valoração, pois foi absolutamente incoerente, inverosímil, parcial que em nenhum outro meio de prova tinha o mais ténue suporte.

  10. Por outro lado, e em reforço ao acabado de alegar, as súmulas que o Meritíssimo Juiz a quo verteu na sua decisão – no ponto 3 – A Convicção do Tribunal – são o retrato fiel da falta de razão da decisão recorrida, pois não sendo os autos um jogo de futebol em que quem marca mais golo leva o jogo de vencido, tanto mais que para além das declarações de parte do recorrente, foi inquirida a única testemunha ali presente.

    São, aliás, muitos os fundamentos para valorizar uns depoimentos em detrimento de outro.

  11. E essa testemunha – esposa do recorrente – referiu de forma absolutamente assertiva, segura, coerente e objectiva tudo o que o recorrente fez até ao momento da colisão, que não presenciou por ter ocorrido no lado oposto àquele em que seguia.

    A transcrição de parte do seu depoimento no corpo destas alegações é bem ilustrativa do que se vem de referir.

  12. E não deixa de ser curioso que seguindo o condutor do veículo seguro acompanhado também pela sua esposa a mesmo nunca tenha sido arrolada pela recorrida...! Lá saberá a mesma por que motivo tomou essa decisão; mas por nós, com o devido respeito, e por sabermos que ocorre sempre uma averiguação pelos serviços da recorrida, desconfiamos que não iria com certeza secundar um depoimento absolutamente descabido como foi o do condutor do veículo seguro na recorrida, seu marido.

  13. Por isso, e como referimos no corpo destas alegações, não obstante o Meritíssimo Juiz a quo não tenha elencado os factos que foram considerados por não provados, por referência à matéria de facto alegada pelo recorrente na sua petição inicial, foram tidos incorretamente por não provados os seguintes factos (que etiquetamos por alíneas para se tornar mais simples a sua apreciação): a- Assim, e depois de ter parado completamente em obediência ao sinal de stop, e depois de se ter certificado de que não circulava qualquer veículo avistável em ambos os sentidos (art. 5º da p.i); b- iniciou a sua marcha e mudou de direcção para a sua esquerda (art. 7º da p.i.); c- o que fez de um modo sensivelmente perpendicular ao eixo da via (art. 8º da p.i.); d- Assim, e quando estava na baía de mudança de direcção existente no eixo da via, já quase direcionado para os lados da Póvoa de Lanhoso (art. 9º da p.i.); e- com o que invadiu a baía de mudança de direcção existente no eixo da via (art. 18º da p.i.); f- onde acabou por embater no veículo do demandante conforme se disse no artigo 10º desta petição inicial, tal como decorre das imagens que seguem e que demonstram onde ficaram os vestígios (plásticos e vidros partidos) (art. 19º da p.i.); g- Por força desse embate o veículo do demandante rodopiou no sentido contrário aos dos ponteiros do relógio (art. 20º da p.i.); h- acabando por se imobilizar na metade direita da faixa de rodagem da E.N. 103, considerando o sentido Braga – Póvoa de Lanhoso (art. 21º da p.i.); i- com a frente voltada, sensivelmente, para o eixo da via e a traseira para a berma do lado direito da E.N. 103, atento o referido...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT