Acórdão nº 2142/12.0TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelROSÁLIA CUNHA
Data da Resolução17 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência na 1ª seção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO Os insolventes E. R. E O. S.

formularam pedido de exoneração do passivo restante, o qual foi liminarmente admitido, tendo sido fixado como rendimento excluído da cessão o correspondente a três vezes ¾ do IAS em vigor no ano de 2014 e nos anos subsequentes durante o período da cessão.

Posteriormente, os insolventes requereram que seja fixado em € 100,00 a quantia a entregar à fiduciária, com efeitos reportados a 18 de setembro de 2018.

Como fundamento do seu pedido, alegaram, em síntese, que, em setembro de 2018, emigraram para a Suíça, onde trabalham, auferindo o insolvente o salário mensal de 5 785 francos suíços e a insolvente mulher a quantia de 1 099,15 francos suíços. Têm dois filhos menores a cargo, ambos estudantes, sendo as despesas do agregado familiar no valor global de 6 742,18 CHF, pelo que, deduzidas estas, ficam com rendimento de cerca de 125,42 €.

No Cantão de Genebra onde vivem não existe salário mínimo, mas no Cantão Neuchatel o salário mínimo é de 3 480 CHF equivalente a € 3 096.

*As credoras X, S.A. e Y – Consultores de Gestão, Lda. pronunciaram-se pelo indeferimento da pretensão.

*A Srª Administradora de Insolvência pronunciou-se no sentido de serem os insolventes notificados para juntarem vários documentos e considerou ainda desadequada a fixação do valor disponível em € 100 proposto pelos insolventes.

*Foi proferida decisão sobre a pretensão dos insolventes que alterou o rendimento excluído da cessão para o montante equivalente a 3 vezes o salário mínimo nacional em vigor em cada ano, a partir de outubro de 2018 e enquanto se mantiverem a residir e trabalhar na Suíça.

*Inconformados, os insolventes interpuseram o presente recurso de apelação dessa decisão, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: “I. Por despacho de fls. __, decidiu o Tribunal a quo “alterar-se o rendimento disponível dos insolventes excluído da cessão, para o montante equivalente a 3 vezes o salário mínimo nacional em vigor em cada ano, a partir de Outubro de 2018 e enquanto se mantiverem a residir e a trabalhar na Suiça”, não se conformando os Recorrente não se conformam com esta decisão; daí o presente recurso.

  1. A decisão em crise põe em causa a sobrevivência digna dos insolventes violando o disposto no art. 1º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, o disposto nos 1º, 2º, 8º, 9º, b), 12º, 13º, 14º, 16º, 18º, 26º, 44º e 59º, n.º1, al. a) da Constituição da República Portuguesa.

  2. A interpretação que o Tribunal a quo faz do disposto no art. 239º, n.º2 e n.º3 CIRE no sentido de considerar que está excluído do rendimento disponível dos Recorrentes insolventes (apenas) o montante equivalente a três salários mínimos nacionais portugueses, devendo estes entregar à fiduciária o restantes, independentemente do local onde os salários são auferido, do local de residência e das reais condições de vida dos insolventes é inconstitucional, por violação 1º, 2º, 8º, 9º, b), 12º, 13º, 14º, 16º, 18º, 26º, 44º e 59º, n.º1, al. a) da Constituição da República Portuguesa.

  3. Pelas mesmas razões e fundamentos é inconstitucional a interpretação do mesmo normativo feita pelo Tribunal a quo de que “despesas correntes que dizem suportar aos rendimentos que afirmam auferir, para depois determinar o rendimento a ceder à massa fidúcia, não tem acolhimento legal”, conquanto esse exercício permitir obter aquilo que a lei define como dignidade da pessoa humana e sustento minimamente digno do devedor.

  4. A interpretação da lei não deve cingir-se ao elemento literal, devendo ter em conta, também, as condições específicas em que é aplicada (vide art. 9º do Código Civil), atendendo, desde logo, à circunstância de os insolventes residirem na Suiça onde o custo de vida é notoriamente superior ao custo de vida em Portugal, onde o quantitativo de mínimo vital não coincide com o quantitativo do mínimo vital em Portugal; daí, no seu requerimento, os Recorrentes terem dado indicações quanto aos custos de vida naquele país.

  5. Inexistindo salário mínimo nacional e sendo o agregado familiar dos Recorrentes composto por 4 (quatro pessoas), sempre o Tribunal a quo estava obrigado a considerar o chamado “mínimo vital” que no país de residência é usado para fixar o mínimo considerado indispensável para o devedor e sua família, excluindo-o da cessão – neste sentido vide Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 21/02/2019.

  6. No Cantão vizinho de Neuchatel o salário mínimo mensal é de 3.480CHF, pelo que, atendendo, ainda, às despesas essenciais do agregado familiar dos Recorrentes, o montante de rendimento determinado pela decisão em crise é injusto, ilegal e inconstitucional, fundando-se em circunstâncias a que estão sujeitos os residentes no país, não tendo considerado as circunstâncias concretas dos insolventes e aqui Recorrentes, razão pela qual deve a decisão que antecede ser revogada.”*Não foram apresentadas contra-alegações.

*Solicitou-se informação sobre o valor do salário mínimo no Cantão da Genebra à Embaixada da Suíça a qual informou que o salário mínimo é de 23 francos suíços por hora.

*Foram colhidos os vistos legais.

OBJETO DO RECURSO Nos termos dos artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC, o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado ao Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso, sendo que o Tribunal apenas está adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso.

Nessa apreciação o Tribunal de recurso não tem...

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