Acórdão nº 1525/20.7T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelLÍGIA VENADE
Data da Resolução10 de Setembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I RELATÓRIO.

M. M.

intentou o presente procedimento de decisão europeia de arresto de contas, ao abrigo do Regulamento UE nº. 655/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de maio de 2014, contra P. S.

, alegando em requerimento apresentado juntamente com o formulário próprio e em síntese que emprestou ao Requerido a quantia de € 15.000,00, em 11.11.2008; para ressarcir de tal empréstimo o Requerido entregou ao Requerente um cheque no montante de € 15.800,00, sendo os € 800,00 relativos ao valor que o requerente deixou de receber fruto de aplicação financeira que teve de retirar para facultar o empréstimo, cheque esse que, apresentado a pagamento em dezembro de 2016, foi devolvido na compensação; apesar das interpelações e esforços do Requerente, o Requerido nunca procedeu ao pagamento de qualquer quantia ao Requerente; o Requerente propôs contra o requerido uma ação executiva para pagamento de quantia certa que corre termos no Juízo Local Cível de Viana do Castelo – Juiz 2, sob o n.º 273/17.0T8VCT, contudo não foi apurado qualquer património pertença do requerido passível de penhora; o Requerido encontra-se a residir na Avenida ..., n.º …, Espanha, para onde se mudou, desconhecendo o requerente se no estrangeiros possui bens ou rendimentos suscetíveis de penhora.

Pede que se decrete o presente procedimento cautelar, sendo ordenado o arresto dos saldos à ordem e aplicações financeiras detidos pelo requerido junto de bancos que operem em Espanha. Mais pede a dispensa de constituição de garantia pelo credor, mediante obtenção de prévias informações para o efeito quanto a banco(s) e conta(s).

No formulário relativo ao anexo I refere o requerente no ponto 10.2 (motivo do pedido) que o requerido emigrou para Espanha para se eximir ao cumprimento, e nunca quis resolver a situação que perdura há 12 anos.

*Em audiência foi produzida prova: o Requerente prestou declarações de parte e foi inquirida uma testemunha.

Findo a realização das diligências, o Tribunal proferiu decisão julgando totalmente improcedente o presente procedimento de decisão europeia de arresto de contas.

Mais condenou o Requerente nas custas.

*Inconformado, o requerente apresentou recurso, terminando com as seguintes -CONCLUSÕES- i. O presente Recurso destina-se a impugnar a Sentença proferida pelo Tribunal a quo, que judiciou pela total improcedência do procedimento de decisão europeia de arresto de contas.

ii. Não se conformando, o aqui Apelante, com a decisão proferida, quanto à sua fundamentação, o presente recurso tem por objeto a decisão na sua integralidade.

iii. Salvo devido respeito pelo douto entendimento, mal andou a Meritíssima Juiz a quo na Sentença proferida, mormente, no julgamento da matéria de facto dada como provada e não provada e, bem assim, na subsequente fundamentação.

Questão prévia iv. O Apelante intentou, no pretérito dia 27 de maio de 2020, um procedimento de decisão europeia de arresto de contas, nos termos previstos no Regulamento (UE) n.º 655/2014, com vista ao arresto de saldos à ordem e aplicações financeiras detidos pelo Apelado junto de banco(s) que operem em Espanha.

  1. Para tal, procedeu ao preenchimento e envio do formulário que o mencionado Regulamento fixa, completando aí todos os campos referentes ao crédito que detinha sobre o Requerido, ora Apelado, bem como alegando os factos onde se sustenta o fundado receio de perder a sua garantia patrimonial.

    vi. Porém, uma vez que o referido formulário apresenta um espaço demasiado curto para a exposição dos factos, o Apelante juntou ao mesmo uma Petição Inicial, ainda que tal não lhe seja exigido legalmente, onde alegou pormenorizadamente e de forma clara todos os factos que davam origem àquele procedimento de arresto, incluindo os factos em que se fundava o seu justo receio da perda de garantia patrimonial.

    vii. Acontece que, a Meritíssima Juiz a quo proferiu, no dia 12 de junho de 2020, sentença que judiciou pela não procedência do procedimento de decisão europeia de arresto de contas.

    viii. Ora, não podemos deixar de discordar com a decisão proferida, porquanto se afigura desprovida de total fundamento fático e jurídico.

    Vejamos, Da valoração das declarações de parte do Apelante ix. Consta da sentença proferida pelo Tribunal a quo que as declarações do Requerente, ora Apelante, não podem ser valoradas pelo tribunal, uma vez que estão desprovidas de qualquer outra prova que corrobore tal versão.

  2. Em consequência, foram dados como indiciariamente não provados os seguintes factos: “a) No âmbito de uma relação de amizade o Requerido solicitou ao Requerente que lhe emprestasse uma quantia pecuniária, ao que o Requerente acedeu.

  3. Em 11/11/2008, o Requerente emprestou ao Requerido a quantia de 15 000,00€ (quinze mil euros), tendo-lhe para o efeito entregado o cheque n.º ......... sacado sobre a conta ......... do banco ....

  4. Para ressarcir tal empréstimo o Requerido entregou ao Requerente na mesma data do empréstimo o cheque n.º ........., no montante de 15 800,00 € (quinze mil e oitocentos euros) sacado sobre a conta n.º ........., domiciliada no Banco ....

  5. Esta diferença de valores explica-se pelo facto de como o Requerente necessitou de retirar o dinheiro que emprestou de uma aplicação financeira em ordem a entregá-lo ao Requerido, deixou de receber o exacto montante da diferença – isto é, precisamente a quantia de 800,00 € (oitocentos euros); e) Ficou convencionado entre ambos que o Requerido iria ressarcir o Requerente dessa diferença. (…)” xi. Ora, na nossa modesta opinião, e salvo melhor entendimento do douto Tribunal, não poderia o Tribunal a quo ter concluído no sentido de dar como não provado o empréstimo que o Apelante fez ao Apelando.

    xii. O Requerente, ora Apelante, prestou, em sede de audiência de inquirição de testemunhas, declarações de parte em que esclareceu os contornos que levaram à realização do empréstimo ao Apelado, e à emissão do título executivo que serve de base à execução mencionada nos autos.

    xiii. Contudo, antes mesmo de ter prestado declarações de parte, o ora Apelante já havia procedido à junção aos autos, em anexo à Petição Inicial, dos dois cheques em questão, de modo a comprovar a factualidade descrita.

    xiv. Assim, é possível comprovar que existem outros meios de prova, nomeadamente, prova documental, que corroboram a versão do Apelante, ainda que de forma indireta.

    xv. Desta forma, as declarações do ora Apelante podem, e devem, assim ser valoradas, atenta a sinceridade e coerência com que foram prestadas, como não o foram pelo Tribunal a quo.

    xvi. Nesse sentido, ainda que as declarações de parte do ora Apelante estejam sujeitas à livre apreciação do Tribunal, conforme resulta do n.º 3 do artigo 466.º do CPC, estas não devem deixar de ser valoradas, tendo em conta que são corroboradas pela prova documental apresentada.

    xvii. Tais elementos probatórios impunham decisão diversa da judiciada pelo Tribunal a quo, considerando como provada e, consequentemente, passando a fazer parte dos factos dados como provados, a seguinte factualidade: “

  6. No âmbito de uma relação de amizade o Requerido solicitou ao Requerente que lhe emprestasse uma quantia pecuniária, ao que o Requerente acedeu.

  7. Em 11/11/2008, o Requerente emprestou ao Requerido a quantia de 15 000,00€ (quinze mil euros), tendo-lhe para o efeito entregado o cheque n.º ......... sacado sobre a conta ......... do banco ....

  8. Para ressarcir tal empréstimo o Requerido entregou ao Requerente na mesma data do empréstimo o cheque n.º ........., no montante de 15 800,00 € (quinze mil e oitocentos euros) sacado sobre a conta n.º ........., domiciliada no Banco ....

  9. Esta diferença de valores explica-se pelo facto de como o Requerente necessitou de retirar o dinheiro que emprestou de uma aplicação financeira em ordem a entregá-lo ao Requerido, deixou de receber o exacto montante da diferença – isto é, precisamente a quantia de 800,00 € (oitocentos euros); e) Ficou convencionado entre ambos que o Requerido iria ressarcir o Requerente dessa diferença. (…)” xviii. Assim, verifica-se que o referido Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, violou o n.º 1 do artigo 9.º do Regulamento n.º 655/2014.

    Continuando, Da alegada utilização indevida do procedimento de decisão europeia de arresto de contas xix. Estabelece a sentença do Tribunal a quo que se coloca a questão da utilização indevida do presente procedimento, visto que o conhecimento do domicilio do Requerido não passa de uma mera suposição, uma vez que “não existe qualquer documento que tenha sido junto aos autos ou qualquer outra prova, que comprove que o Requerido se encontra a residir em Espanha”.

    xx. Ora, tal como foi alegado pelo ora Apelante, no âmbito de uma diligência de penhora realizada no âmbito do processo executivo n.º 273/17.0T8VCT, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, Juízo Local Cível de Viana do Castelo - Juiz 2, apurou-se que o Requerido, ora Apelado, se havia mudado para Espanha, segundo informações prestadas pela mãe do mesmo.

    xxi. Relativamente à sua morada em concreto, o Apelado encontra-se casado, desde 2011, com M. S., conforme assento de nascimento que o Apelante juntou aos autos.

    xxii. A morada que a Esposa do Apelado indica, no âmbito de um processo judicial de que o Apelante tomou conhecimento, é Avenida ..., n.º … Espanha, conforme documentos também juntos aos autos.

    xxiii. Na douta sentença, da qual se recorre, o Tribunal a quo, ao dar como não provada a residência atual do Apelado, considerando o depoimento da Exma. Sra. Agente de Execução e a prova documental apresentada, realizou um incorrecto julgamento da matéria de facto.

    xxiv. Tais elementos probatórios impunham decisão diversa da judiciada pelo Tribunal a quo, considerando como provada e, consequentemente, passando a fazer parte dos factos dados como provados, a seguinte factualidade: “g) O Requerido encontra-se no presente a...

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