Acórdão nº 42/11.0TCGMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelPURIFICAÇÃO CARVALHO
Data da Resolução11 de Outubro de 2011
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

RELATÓRIO A… Lda com sede em … intentou a presente acção com processo ordinário, contra S….. com sede em … pedindo que a ré seja condenada a pagar à primeira A. a quantia de € 47 461,29 correspondentes aos preços dos fornecimentos que fez à ré, quantias estas acrescidas de juros de mora vencidos desde 31/12/10 à taxa legal de 8%.

Alega que produziu e forneceu para ré pares de calçado.

Dos fornecimentos feitos é devido o valor pedido.

Citada, Ré contestou, excepcionando a incompetência absoluta do tribunal português, em razão da nacionalidade para apreciar e decidir a acção, nos termos dos arts. 2º, nº1 e 5º, nº1, al. b) do Regulamento (CE) 44/01 do Conselho de 22/12/00.

Mais impugnou os factos alegados pela autora e formulou pedido reconvencional.

Na réplica, a autora pronunciou-se pelo valor da acção, defendeu a improcedência da excepção da incompetência e pediu a procedência da acção e improcedência da reconvenção.

Foi proferido despacho que julgou procedente a excepção dilatória de incompetência absoluta do tribunal, em razão da incompetência internacional, para apreciar e decidir a acção e, consequentemente, absolveu a Ré da instância, condenando a autora no pagamento das custas.

Deste despacho recorreu a autora, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: 1. Por Sentença proferida em 13/06/2011, a Mma. Juíza absolveu a R. da instância, nos termos do disposto pelos art. 101º e 105º n.º1 do CPC, ao declarar procedente a excepção de incompetência internacional dos tribunais portugueses para tramitar a acção.

  1. O presente recurso cinge-se assim apenas à questão da competência dos Tribunais portugueses para dirimir o litígio entre as partes.

  2. Está em causa a aplicação do art. 65º-A do CPC e do Regulamento (CE) do Conselho n.º 44/2001 de 22 de Dezembro de 2000.

  3. Dispõe o Regulamento que em matéria de responsabilidade contratual; a pessoa pode ser demandada noutro Estado-Membro, designadamente perante o tribunal do lugar onde foi ou deva ser cumprida a obrigação em questão, que no caso da venda de bens, se entende ser o Estado-Membro onde, nos termos do contrato, os bens foram ou devam ser entregues.

  4. Ora, no caso concreto, como foi oportunamente alegado no art. 3º da Réplica, no início da relação contratual entre as partes, foi fixado, por escrito, que a entrega se faria segundo o regime do Incoterm EX-Works, ou seja no local de produção - na data combinada, a recorrida receberia os bens no estabelecimento da A./Recorrente em … sendo da sua responsabilidade o transporte da mercadoria a partir daí (a ré contratava e custeava o transporte). Assim, claro fica que o acordado entre as partes era a entrega efectiva dos bens à recorrida em Portugal.

  5. Atendendo a que o transitário exigia a entrega da mercadoria até às 16h, quando a fábrica da Recorrente laborava até às 19h, teve esta de aceitar entregar a mercadoria no transitário que em cada caso era indicado pela recorrida. Por esse motivo passou a constar em algumas facturas a designação FOB (o que significa que a Recorrente apenas procedia ao transporte da mercadoria até ao transitário indicado pela recorrida, em regra a P…, sita na …).

  6. Além da entrega dos bens também o respectivo pagamento era feito por transferência bancária para a conta da Recorrente no …, em Portugal.

  7. Na interpretação do art. 23º do Regulamento, vem entendendo a Doutrina e Jurisprudência comunitárias que “um pacto atributivo de jurisdição pode ser celebrado não apenas por escrito ou oralmente com confirmação escrita mas também sob uma forma que esteja em conformidade com os usos que as partes estabeleceram entre si ou, no comércio internacional, em conformidade com os usos que as partes conheçam ou devam conhecer e que, em tal comércio, sejam amplamente conhecidos e regularmente observados pelas partes em contratos do mesmo tipo, no ramo comercial considerado. Não há razão para considerar que o legislador da União teria tido a intenção de excluir a tomada em consideração de tais usos comerciais para efeitos de interpretação de outras disposições do mesmo regulamento e, nomeadamente, para a determinação do tribunal competente em conformidade com o artigo 5. °, N.º 1, alínea b), primeiro travessão, deste regulamento.” 9. Assim, no âmbito da análise de um contrato, a fim de determinar o lugar de entrega, na acepção do artigo 5. °, n.º 1, alínea b), primeiro travessão, do regulamento, o órgão jurisdicional deve ter em conta todos os termos e todas as cláusulas pertinentes desse contrato, incluindo, se for o caso, os termos e cláusulas geralmente reconhecidos e consagrados pelas práticas do comércio internacional, tais como os «Incoterms», desde que permitam determinar, de forma clara, esse lugar.

  8. Os Incoterms e as cláusulas comerciais comparáveis podem, em princípio, constituir disposições de um contrato, com base nas quais é possível determinar o lugar de entrega na acepção do artigo 5. °, N.º 1, alínea b), do Regulamento n.º 44/2001.

  9. Nesta linha, confirma-se o entendimento seguido pela doutrina e a jurisprudência de que o lugar de entrega e de cumprimento da obrigação na acepção do artigo 5. °, N.º 1, alínea b), do Regulamento n. ° 44/2001 pode ser determinado mediante a cláusula «na fábrica» dos Incoterms incluída validamente do contrato.”, como se pode ler nas conclusões da Advogada-Geral Juliane Kokott apresentadas em 3 de Março de 2011, no Processo C-87/10, que correu termos pela 3ª secção do TJCE, e continua, só “Se for impossível determinar o lugar de entrega nessa base, sem recurso ao direito material aplicável ao contrato, esse lugar é aquele em que ocorra a entrega material dos bens, pela qual o comprador adquira ou deva adquirir o poder de disposição efectiva sobre esses bens 12. No mesmo sentido: “ (as condições de venda lançam luz sobre o lugar da entrega dos bens, permitindo estabelecer uma diferenciação entre o destino e o lugar em que o vendedor tinha de entregar a mercadoria, que era nas suas instalações, ficando o resto por conta do comprador.) E apesar de o Incoterms prescrever as responsabilidades do vendedor e do comprador no comércio internacional, essas responsabilidades prendem-se com o momento a partir do qual se considera que o vendedor deixa de ser responsável pela mercadoria, por a mesma ter sido entregue ao comprador. É que o local da entrega efectiva, precisamente porque o vendedor não ficou encarregado de fazer o transporte até ao destino, tendo entregue as mercadorias no seu estabelecimento, e alijando desde aí a sua responsabilidade, é tipificado como o local do estabelecimento do vendedor. Afastada fica, pois, a competência dos tribunais alemães (cf. Ac. Da Relação do Porto de 26/04/2007.

  10. “ (Especificando os Incoterms, além do mais, o lugar da entrega da carga e quem se responsabiliza, em caso de perda, dano ou demora desta. Encontrando-se o termos FCA, Free Carrier, Livre no Transportador na categoria 2 – entrega na origem com...

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