Acórdão nº 1336/08.8.TBFLG de Tribunal da Relação de Guimarães, 29 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelISABEL FONSECA
Data da Resolução29 de Março de 2011
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os juízes da 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO "A"-Comércio de Produtos Ópticos Unipessoal, Limitada intentou a presente acção declarativa, com forma de processo sumário, contra "B" Unipessoal Limitada, "C" e esposa, "D" e o Banco "E" SA Sociedade Aberta, pedindo a condenação solidária dos réus a pagar à autora: a) a 1ª ré e os 2ºs réus as quantias de €15.000,00, de €45,76 e de €168,18; b) a 3ª ré as quantias de €15.000,00, de €45,76 e de €67,60; c) todos os réus nos juros de mora vincendos, à taxa legal, sobre as aludidas quantias até integral pagamento.

E, subsidiariamente, em caso de improcedência daqueles pedidos, com o fundamento no enriquecimento sem causa, ser a 1ª ré condenada: d) a liquidar à autora as quantias de €15.000,00, € 202,19 e nos juros de mora vincendos, até integral pagamento.

Para fundamentar a sua pretensão invoca, em síntese, que: A autora tem por objecto social o comércio, importação, exportação e representações de produtos e material óptico oftalmológico e para exercer a sua actividade comercial, possui estabelecimentos comerciais, os quais se encontram abertos ao público, sendo que um deles encontrava-se “instalado na fracção “A” correspondente ao rés-do-chão e primeiro andar, com entrada/saída pelo número de polícia 118, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Rua de S..., freguesia de São João de Souto, neste concelho de Braga, o qual estava arrendado à autora, que assumiu a posição de arrendatária através de um contrato de trespasse celebrado por escrito, no dia 31 de Julho de 2006, com a sociedade comercial Óptica São G..., Lda.

No dia 01/02/2008, a autora e a primeira ré celebraram por escrito um acordo denominado contrato de trespasse, que tinha por objecto a transmissão do estabelecimento comercial da autora e o respectivo contrato de arrendamento pelo preço de € 15.000,00, pagos por quatro cheques, entregues na data da celebração do contrato de trespasse, os quais foram emitidos, assinados e entregues pessoalmente pelo 2.º réu à autora.

Esse acordo foi feito com vista a que a primeira ré que aí passe a desenvolver um ramo do comércio diferente do da autora, que não estava previsto no contrato de arrendamento e, por isso, foi pedida autorização da senhoria, Angélica R..., que a concedeu sob condição de serem liquidadas as rendas que se encontravam em dívida.

A autora possuía uma dívida para com a senhoria no montante de € 3.575,10, a título de rendas dos meses de Novembro e Dezembro de 2007 e Janeiro de 2008; Cada um dos cheques entregues para pagamento do preço foi apresentado a pagamento pela autora junto do seu banco no prazo de oito dias após a data da respectiva emissão tendo eles sido devolvidos pelos Serviços de Compensação do Banco de Portugal com os seguintes dizeres apostos no verso: “CHQ VER – FALTA/VICIO F. VO”, devolução que emanou das instruções expressas que 2.º réu deu ao sacado, 3.ª ré R., que aceitou tais ordens de revogação e cumpriu-as, tendo procedido ao cancelamento dos quatro cheques; Pela devolução dos quatro cheques foi ainda imputada à autora, pelo seu Banco, a quantia de € 45,76 a título de despesas bancárias.

A 1ª ré continua instalada no locado, de portas abertas ao público, a usar e a fruir do mesmo, local onde exerce a sua actividade comercial e não pagou o preço do trespasse; O 2.º réu assumiu o pagamento em nome da 1.ª ré, tendo para esse efeito emitido, assinado e entregue ao representante legal da autora, os quatro cheques mencionados.

A ré "B" Lda ofereceu articulado de contestação, alegando, em síntese, que: O contrato objecto dos presentes autos porque é nulo e ineficaz por falta dos requisitos constantes dos artigos 112, nº 1, b) e 2 als. a) e b) do CC.

A 1ª ré queria suceder no arrendamento e acordou nisso mesmo e quando se preparava para tomar conta da fracção porque as rendas ainda não estavam pagas todos os intervenientes acordaram que a 1ª ré pagaria essas rendas em atraso, o que foi feito; Contrariamente ao que ficou combinado, quando a 1ª ré tomou conta da loja verificou que a autora tinha retirado dela os elementos eléctricos, concluindo ter incumprido com o que acordara além de que a senhoria só acordou na alteração do ramo se fossem pagas as rendas.

A terceira ré apresentou contestação e alegou, em síntese, que: O contrato de cheque situa-se no âmbito do contrato de mandato pelo que o acatamento da ordem de revogação dada pelo sacador não o faz constituir em responsabilidade civil; Pese embora a tese do Acórdão de Uniformização citado pelo autor, a verdade é que o Banco continua livre para sustentar que o entendimento correcto é o reflectivo nos votos de vencimento, pelo que tendo o Banco confiado que a ordem de revogação era verdadeira devolveu os cheques não cabendo a si sindicar a declaração de revogação.

Os demais réus não contestaram.

A autora respondeu às excepções e concluiu como na petição inicial.

Foi proferido despacho de saneamento do processo, com dispensa da selecção da matéria de facto assente e controvertida.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento e fixou-se a factualidade assente.

Proferiu-se sentença, que concluiu nos seguintes termos: “Pelo exposto, julgo a presente acção procedente, por provada, termos em que decido condenar solidariamente os réus no pagamento a autora da quantia de €15.000,00, e os primeiros em €45,76, a título de despesas bancárias e juros de mora, à taxa legal sobre aquele valor €15.000,00 desde a data de incumprimento definitivo, que ocorreu em 18.2.2008, até pagamento e o último réu, além daquelas duas quantias juros de mora vencidos desde 15.4.2008 até pagamento.

Custas a cargo dos réus pela sua totalidade.

Notifique.

Registe”.

Não se conformando, os réus recorreram.

O Banco "E" SA formulou as seguintes conclusões: 1ª) O presente recurso tem por objecto discutir a bondade da solução do caso dos autos no que respeita à medida do dano a indemnizar – tema a que se circunscreve o recurso sem prejuízo de o Banco continuar a pensar que agiu conforme ao direito ao dar acatamento à ordem de revogação dos cheques dos autos.

  1. ) O artº 563º do Cód. Civil inscreve-se no quadro da teoria da causalidade adequado querendo significar, como ensina Galvão Telles, que “determinada acção ou omissão será causa de certo prejuízo se, tomadas em conta todas as circunstâncias conhecidas do agente e as mais que um homem normal poderia conhecer, essa acção ou omissão se mostrava, à face da experiência comum, como adequada à produção do referido prejuízo, havendo fortes probabilidades de o provocar” (citado em Pires de Lima e Antunes Varela, Cód. Civil Na. Artº 563º); 3ª) Tratando-se, no caso, de determinar os danos que se entendem abrangidos e os que se entendem excluídos da obrigação da obrigação de indemnizar, parece claro que, analisando-se o facto ilícito no não pagamento de um cheque cuja revogação (ilegitimamente) se aceitou, não decorre sem mais desta revogação a certeza ou, até, a probabilidade de que o cheque ser pago se tivesse sido, pelo banco, apresentado a pagamento; 4ª) Da não apresentação do cheque a pagamento só resulta a certeza de que o não foi, não se podendo dizer, mesmo com recurso á ideia de probabilidade de que nos fala o artº 563º do Cód. Civil, que o mesmo seria pago se, em vez de recusado, tivesse, de facto, sido apresentado a pagamento; 5) E se nem sequer com apelo a esta ideia se fica sem saber se o cheque seria pago ou não, é bem claro não poder afirmar-se que se mostra verificado o pressuposto do nexo de causalidade entre o facto lesivo (recusa na apresentação do cheque) e prejuízo (montante titulado pelo cheque); 6ª) O que se deixa dito não é respondido pelo Supremo Tribunal de Justiça na fundamentação que ofereceu à solução que fez vencimento no Acórdão Uniformizador de 28 de Fevereiro de 2008, por não servir de fundamento à sustentação da tese que nele fez vencimento dizer-se que “da revogação resulta normalmente o afastamento do pagamento voluntário por parte do sacador e é utópico presumir-se que este disponha de outros bens acessíveis que garantam solvabilidade”; 7ª) E não serve de fundamento por duas decisivas e definitivas razões: primeiro, porque se sabe, em termos de experiência comum, que a ordem de revogação anda associada à falta de provisão na conta sacada e não ao propósito de fugir a um pagamento que se não evitaria s a conta tivesse provisão; depois, porque a hipótese de o sacador não ter outros bens acessíveis que permitam o pagamento está excluída pela ponderação, em termos de experiência comum, por se saber que a ordem de revogação tem na sua origem bem mais precisamente, a falta de provisão; 8ª) Se quisermos reflectir em termos de experiência comum, o que se pode dizer é que a recusa da apresentação do cheque provavelmente nunca causará o dano do não recebimento do cheque por a ordem que a determina ter precisamente como fundamento a falta de provisão da conta: e se a conta, segundo a experiência comum, é de pressupor que não teria provisão, pôr o banco sacado a pagar o montante do cheque só porque o não apresentou a pagamento, significará pô-lo a pagar uma quantia que o portador, segundo toda a probabilidade, não receberia se, em vez de recusar a apresentação, o Banco tivesse apresentado os cheques a pagamento; 9ª) A douta sentença recorrida, tal como o Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão Uniformizador nº 4/2008, violou o disposto no artº 563 do Cód. Civil – norma que violou ao dar por cobertos pelo nexo de causalidade danos que efectivamente não estão por ele abrangidos”; Os demais réus recorreram formulando as seguintes conclusões: A) Não se conformam os Réus com a sentença que os condenou a pagar á Autora a quantia de €15.000,00.

  1. Pois este montante é relativo a quatro cheques que se destinavam ao pagamento do trespasse de um estabelecimento comercial, que não foi entregue conforme acordado e por esse motivo o Réu marido, revogou os cheques que emitiu.

  2. Entendem os...

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