Acórdão nº 4621/10.5TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 01 de Fevereiro de 2011
Magistrado Responsável | ANA CRISTINA DUARTE |
Data da Resolução | 01 de Fevereiro de 2011 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO M.. requereu contra J.. e mulher T.. procedimento cautelar de ratificação judicial de embargo de obra nova, alegando que, no dia 5 de Julho de 2010, sua filha, a seu mando, procedeu ao embargo de uma obra que os requeridos se encontravam a realizar de ampliação do beiral poente do telhado do imóvel destes, obra essa que iria ocupar o espaço aéreo do imóvel da requerente, fazendo escorrer sobre este as águas pluviais. Apesar do embargo, os requeridos continuaram a obra, tendo procedido à construção e ampliação do beiral da parte poente do telhado do seu prédio. Termina pedindo que se ratifique o embargo extra-judicial, ordenando-se a notificação dos requeridos para a não continuação das obras e que se ordene a destruição da parte inovada.
Os requeridos ofereceram oposição, excepcionando a caducidade do direito à ratificação judicial do embargo por ter a petição dado entrada mais de cinco dias após o embargo extra-judicial e alegando que a obra nova não provoca qualquer ofensa ao direito de propriedade da requerente.
Realizada a audiência de julgamento, foi proferida decisão que julgou improcedente a providência cautelar.
Discordando da decisão, dela interpôs recurso a requerente, tendo formulado as seguintes Conclusões: I – Provando-se que a requerente embargou extrajudicialmente a obra dos requeridos, que consistia na colocação telhas viradas para o prédio dela, onde antes apenas havia um remate tradicional, uma empena com murete e rufo de zinco, isto é, sem qualquer queda de águas, e que a ampliação do beiral iria ocupar mais espaço aéreo do prédio da Requerente e, em consequência, iria, de futuro, fazer escorrer sobre este as águas pluviais que incidissem sobre o prédio dos Requeridos, verificavam-se os requisitos legais de tal embargo e da requerida ratificação judicial.
II – Provando-se que, não obstante esse embargo, durante a manhã do passado dia 7 de Julho de 2010, os comitidos dos Requeridos procederam, por ordens e no exclusivo interesse deste, à inovação que se propunham fazer antes do embargo extrajudicial, tendo procedido à construção e ampliação do beiral da parte Poente do telhado do prédio dos Requeridos, tudo conforme a prova fotográfica junta claramente comprova, verificam-se os requisitos legais para ratificação daquele embargo e para destruição da parte inovada.
III – A prova de que os requeridos sabiam bem que iam lesar direitos da requerente é a de que, por várias vezes, encarregaram o empreiteiro de obter o consentimento da requerente para a inovação que pretendiam fazer.
IV – Não resulta de nenhum compulsado nos autos, muito menos da matéria de facto considerada como provada, que a obra visou resolver um problema de infiltração de humidades…, mas sim, e apenas, que os requeridos pediram ao empreiteiro J.. que procedesse aos trabalhos necessários a evitar que se verificassem infiltrações de água no prédio, através da parede poente do mesmo, consistindo a obra a executar por aquele no corte do muro referido em 11º, na execução da cornija e na colocação de telha.
V – Ao contrário do critério seguido na douta decisão recorrida, no caso de embargo de obra nova, providência cautela especificada, não há subordinação ao regime comum, pois atento o direito a proteger, o de propriedade, o direito real por excelência, justifica a especialidade de apenas bastar que a obra cause ou ameace causar prejuízo.
VI – Caso contrário, tornar-se ia despicienda a referência a prejuízo, pois ele já estaria na previsão das providências cautelares não especificadas, no artigo 381º, nº 1 (…alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito).
VII – O artº 381º, e os que o complementam, rege para as providências não especificadas; as especificadas têm, cada uma delas, o seu próprio regime – o que não foi, com o respeito devido, observado na douta decisão ora impugnada.
VIII – No caso da obra nova, a lei não exige qualquer receio, nem gravidade da lesão, nem dificuldade da sua reparação: basta que se cause ou ameace causar prejuízo e este é inerente à perturbação do direito de propriedade, seja por que forma for, incluindo com a invasão do espaço aéreo e, em especial, com a constituição de um estilicídio.
IX – A integridade e a importância, tanto pessoal como social, do direito de propriedade justificam os meios de defesa contra a sua violação abusiva, independentemente da gravidade do prejuízo, que, em casos como o presente, é inerente ao acto perturbador.
X – Fosse como fosse, mantinha-se a violação do direito da requerente e os requeridos sabiam bem dessa violação, tanto assim que, repete-se, mandaram pedir, por várias vezes, para que a requerente autorizasse a obra e, depois, in extremis, disseram ao empreiteiro seu comitido para colocar as telhas em beiral mesmo escorrendo para cima do telhado da requerente e que não haveria problemas, pois “quem tem dinheiro para mandar subir a obra, também tem dinheiro para a deitar abaixo”, embora perfeitamente conscientes da violação do direito de propriedade da Requerente sobre o seu identificado imóvel e, saliente-se, plenamente conscientes de que, com tais ordens e direcções, frontalmente violavam o embargo.
XI – Quanto ao facto de esta nova beirada ser construída no sítio onde já existia outra, não se pode o mesmo revestir-se sequer de pretensa justificação da violação operada pelos Requeridos, pois a anterior beirada não tinha as mesmas medidas, a mesma configuração e a mesma funcionalidade e, sobretudo, não fazia escorrer água para cima do telhado da Requerente.
XII – Se os requeridos queriam evitar infiltrações (a chapa de zinco é impermeável e se estivesse rota poderia ser trocada), a colocação de telhas não implicaria a violação do direito da requerente, nem precisariam os requeridos de qualquer autorização.
XIII – O entendimento seguido pelo Tribunal a quo contraria, aliás, o que se dispõe no artº 419.º, onde se prevê, isso sim, que possa ser dada autorização para a continuação da obra, quando se reconheça que a demolição restituirá o embargante ao estado anterior à continuação ou quando se apure que o prejuízo resultante da paralisação da obra é consideravelmente superior ao que pode advir da sua continuação e em ambos os casos mediante caução prévia às despesas de demolição total.
XIV – Quer isto também dizer que, ao caso do embargo de obra nova, não se aplica o disposto no artº 381º, em particular sobre a gravidade da lesão ou da possibilidade de reparação, estabelecendo-se aqui um regime próprio e específico quando o embargado queira prosseguir a obra e demonstre que o prejuízo resultante da paralisação é consideravelmente superior ao que pode advir da sua continuação.
XV – Assim, e quanto ao caso concreto, era evidente que estavam reunidos todos os pressupostos, de facto e de direito, para o decretamento da providência, e nem tal decretamento impediria que viessem depois os embargados pedir a continuação da obra, nos termos legais, incluindo, como se diz no artº 419º, sempre, em ambos os casos, mediante caução prévia às despesas de demolição.
XVI – No nº 3 do artº 381º define-se que não são aplicáveis as providências referidas no nº 1 quando se pretenda acautelar o risco de lesão especialmente prevenido por alguma das providências tipificadas na secção seguinte, isto é, precisamente as providências cautelares especificadas, onde se inclui a do embargo de obra nova.
XVII – Temos, assim, que este preceito define, com toda a clareza, que, sempre que nenhuma das providências...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO