Acórdão nº 1631/07.3TBVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelMARIA DA CONCEIÇÃO SAAVEDRA
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2011
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães.

I- Relatório: P…, Lda, veio propor contra Maria…, Jorge… e Ilda…, acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, invocando, em síntese, que tomou de arrendamento, em 1998, um prédio urbano, de rés-do-chão, 1º andar e logradouro, à herança indivisa de Manuel… de que os RR. são os únicos herdeiros, e celebrou, em 2002, um outro contrato de arrendamento em substituição do anterior com a 1ª Ré, por si e na qualidade de cabeça de casal da dita herança. Mais refere que, em Agosto de 2006, como o negócio de bebidas que explorava no local atravessava grave crise, a A. pôs termo ao referido contrato, com efeitos a partir de 30.11.2006. Porém, e não obstante o acordo quanto à data da retirada do locado dos móveis e equipamentos pertencentes à A. (que permaneceriam, segundo o estabelecido, no referido espaço até que os RR. encontrassem novo inquilino), aqueles RR. não vieram a permitir que a A. dali retirasse alguns desses bens, alegando que tudo o que “estivesse aparafusado às paredes ou pisos do prédio” constituía benfeitoria e não podia ser levado do imóvel por força do contratado. Mais refere que os mencionados bens estão a ser usados por um terceiro a quem os RR., entretanto, deram de arrendamento o dito prédio, o que causa a respectiva deterioração. Pede, em consequência, a declaração de que a A. é dona de tais bens, a condenação dos RR. a restituir-lhos no estado em que se encontravam em 28.3.2007 (data em que foi impedida do respectivo levantamento), e ainda a pagarem uma indemnização no valor diário de € 10,00 pelos danos patrimoniais decorrentes da privação desses bens desde aquela data até entrega efectiva; subsidiariamente, e no caso dos bens se terem extraviado ou deteriorado, pede a condenação dos RR. no pagamento do valor respectivo, correspondente a € 24.160,00, com juros acrescidos desde a citação.

Em contestação, vieram os RR. afirmar, no essencial, que os bens cuja devolução a A. pretende constituem benfeitorias realizadas enquanto inquilina no local arrendado e, como tal, de acordo com o que foi estipulado entre as partes, ficaram a pertencer ao prédio. Pedem a improcedência da causa e, ainda, em reconvenção, a condenação da A. no pagamento da quantia de € 3.933,33, acrescida de juros desde a citação, correspondente ao valor da ocupação do prédio entre o dia em que a A. o deveria ter desocupado (30.11.2006) e a data em que efectivamente o fez (28.3.2007).

A A. replicou, mantendo o alegado na p.i. e pugnando pela improcedência da reconvenção.

Foi proferido despacho saneador a fls. 94 a 101, com selecção da matéria de facto, e realizou-se a audiência de discussão e julgamento.

Seguidamente, foi proferida a sentença que decidiu pela forma seguinte: “... julgo: 1. a acção parcialmente procedente e, em consequência: a) declaro que a A. é proprietária dos bens descritos nos pontos 12/e) a s) e 28 dos Factos desta decisão; b) condeno os RR. a entregarem à A. esses bens; c) condeno os RR. a pagarem à A. uma indemnização de € 5,00 (cinco euros) por dia desde 28 de Março de 2007 até à efectiva entrega desses bens.

No mais, julgo a acção improcedente, absolvendo os RR. do restante pedido.

  1. a reconvenção improcedente e, em consequência, absolvendo a A. do respectivo pedido.” Inconformadas, ambas as partes interpuseram recurso, sendo estes recebidos como apelação e efeito devolutivo.

    Apresentadas as respectivas alegações pela A.

    , foram ali formuladas as seguintes conclusões que se transcrevem: “ 1. A autora provou o teor do quesito 1º, através do depoimento das testemunhas Ricardo…, José… e Rui… e valorando estes depoimentos com o teor da al. G) dos FA; 2. Houve, pois, erro de julgamento na resposta a este quesito por parte do Mmo. Juiz; 3. Os réus não provaram o teor do quesito 21, pois, por um lado, não indicaram nenhuma testemunha a tal quesito e, ainda que tivesse havido lapso, do depoimento das testemunhas arroladas pela ré, estas não se referiram, ao de leve sequer, a tal matéria; 4. Houve, pois, erro de julgamento na resposta a este quesito por parte do Mmo. Juiz; 5. Uma vez que este tribunal de 2ª instância tem poderes para alterar a matéria de facto julgada em 1ª instância – art. 712, nº 1, do C.P.C. - deve dar-se como provado o quesito 1º e não provado o quesito 21º.

  2. Pela cláusula 6ª do contrato de arrendamento em causa nos autos as partes tiveram em vista as obras e benfeitorias que seriam feitas pela inquilina/autora “no arrendado”; 7. Pela cláusula 5ª do aditamento ao contrato de arrendamento, as partes quiseram salvaguardar os “equipamentos e materiais” que iriam fazer parte do estabelecimento a montar no arrendado.

  3. Do estabelecimento em causa nos autos, fazia parte o aparelho de ar condicionado e de extração de ar e respetivas condutas, uma vez que, para obtenção do alvará de licenciamento do estabelecimento era obrigatório que existissem.

  4. A autora provou que comprou e pagou o sistema de ar condicionado do seu estabelecimento, logo tal sistema era sua propriedade.

  5. O Mmo. Juiz, ao classificar o aparelho de ar condicionado, de extração de ar e respetivas condutas como benfeitorias do “arrendado”, afastando esses aparelhos como fazendo parte do equipamento do estabelecimento de bar pertencente à autora, não atendeu à vontade das partes manifestadas na cláusula 6ª do contrato de arrendamento e 5ª do aditamento a este.

  6. Para além de ter violado a cláusula 5ª do aditamento ao contrato de arrendamento, o Mmo. Juiz ainda violou o disposto no art. 398, nº 1, e 405, nº 1, do Cód. Civil.

    Termina, pedindo a procedência do recurso e, em consequência, a alteração da sentença recorrida sendo esta substituída por outra que julgue a acção procedente, declarando que a A. é proprietária dos bens descritos nos pontos 12 e 28 dos factos desta decisão, e condenando os RR. a entregar à A. esses bens bem como a pagar uma indemnização de € 10,00 por dia desde 28.3.2007 até à efectiva entrega dos mesmos bens.

    Em contra-alegações, os apelados/RR. remetem em parte para as suas próprias alegações e pugnam pela improcedência do recurso da A..

    Por seu turno, nas alegações do seu recurso os RR.

    terminam com as seguintes conclusões que também se transcrevem (não obstante a sua extensão): “ 1- A, aliás, douta sentença recorrida enferma de uma incorrecta apreciação da prova e aplicação do direito, que deverão levar à sua revogação ou substituição por este Venerando Tribunal.

    2- A decisão da matéria de facto deverá ser modificada por este Venerando Tribunal, de harmonia com o disposto no artigo 712.º, n.º 1, alínea a) e b) do CPC.

    3- Salvo o devido respeito por opinião contrária, devem ser julgados não provados os factos constantes dos pontos 8 desde “…tendo nesta data…”; 14 desde “…e autorizaram que este...” até ao fim; 23 desde “na data…” até “…acesso ao prédio…”; 28, 30; 31; 32; 33; e 34 dos factos provados da, aliás, douta, sentença recorrida.

    4- Os factos 12, 25 e 28 da sentença recorrida devem ser complementados e esclarecidos face à prova produzida.

    5- O Mm.º Juiz “a quo” julgou provado que, em 30 de Novembro de 2006, a Recorrida entregou as chaves do arrendando ao 2.º R e que nessa data a Recorrida deixou de ter acesso ao arrendado.

    6- Salvo o devido respeito resultou provado do depoimento da testemunha Ricardo… (acta de 12 de Abril 2010, CD.00.00.01 a CD.00.37.24), arrolada pela própria Recorrida que, em Novembro de 2006, a Recorrida não entregou as chaves aos Recorrentes, nem deixou de ter acesso ao arrendado, depois dessa data.

    7- Ao invés, a Recorrida, por sua própria iniciativa, mostrou o arrendado a potenciais interessados, como disse Ricardo… (acta de 12 de Abril 2010, CD.00.00.01 a CD.00.37.24, minutos CD.00.19.12 a CD.00.20.33), mesmo depois de denunciado o contrato.

    8- Pelo que, os factos 8 desde “…tendo nesta data…” e 23 “Na data em que a A. entregou as chaves ao 2.º R. (conforme indicado em 8), aquela deixou de ter acesso ao prédio […]” devem, salvo devido respeito, ser julgados não provados.

    9- Os Recorrentes não autorizaram o arrendatário Ricardo M… a utilizar bens que fossem propriedade da Recorrida.

    10- Nem aquele está a utilizar quaisquer bens descritos nos autos, nem é actualmente arrendatário do imóvel. Ninguém é; está desocupado e fechado.

    11- Por isso, os pontos 12 e 28 da, aliás, douta sentença recorrida devem ser alterado em conformidade com o alegado.

    12- No ponto 12 da, douta, sentença recorrida deveria constar “na referida data a A. não retirou do locado os seguintes bens”.

    13- Assim como, no ponto 28 da mesma deveria constar que “na referida data, a A. não retirou do prédio, além dos bens indicados em 12, também os seguintes […]”.

    14- Isto porque, no artigo 48.º da Contestação os Recorrentes impugnam expressamente o artigo 32.º da PI: todos os bens elencados no ponto 12 fazem parte da estrutura do imóvel, são partes integrantes, componentes do próprio prédio, estão presas a ele, não são móveis nem amovíveis.

    15- São obras e benfeitorias do prédio e por isso não são propriedade da Recorrida, não tem direito à sua remoção, nem a qualquer indemnização – Cláusula 6.ª do contrato de arrendamento.

    16- Os bens elencados no ponto 28 da, aliás, douta sentença recorrida não foram levantados pela Recorrida porque esta não quis, porque não levou os meios suficientes para tal.

    17- Como a testemunha Ricardo M… refere e bem os “…fluorescentes estão a 9 metros de altura e eu não os vi equipados para conseguir tirar uma fluorescente…”.

    18- Isto resultou provado do depoimento da testemunha Ricardo M…, que esteve no local e abriu a porta à Recorrida para o efeito (acta de 30 de Abril CD.00.00.01 a 00.10.19 e após paragem CD.00.00.00 a CD.00.13.22).

    19- Dos bens constantes em 12 e 28 da sentença e da adenda ao contrato de arrendamento celebrado com Ricardo M… apenas o ar condicionado era comum.

    20- O objecto do contrato celebrado entre Recorrentes e Ricardo M… foi o arrendamento de um prédio, por período...

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