Acórdão nº 599/15.7T8CHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA AMÁLIA SANTOS
Data da Resolução14 de Abril de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Processo n.º 599/15.7T8CHV Comarca de Vila Real Instância Local de Chaves – Secção Cível – J1 Relatora: Maria Amália Santos 1ª Adjunta: Desembargadora Ana Cristina Duarte 2º Adjunto: Desembargador Francisco Xavier * Daniel P e mulher Hermínia P residentes na Travessa A, n.º3, em Chaves, instauraram contra Dimitri T residente na Rua Av. M, n.º 28, 5400 – 215, Chaves, procedimento de tutela de personalidade nos termos do art. 878º, do Cód. Proc. Civil.

Alegaram que são arrendatários, há mais de 20 anos, de um imóvel sito na Travessa da A, n.º 3-A, na freguesia de St.ª Maria Maior, Chaves, onde têm centrada a sua vida doméstica, familiar e social.

O réu, há alguns anos explora um estabelecimento de café/bar denominado «1/4 escuro» que, há cerca de um ano passou a denominar-se «Associação Recreativa e Cultural do Centro Histórico de Chaves», sito no rés-do-chão do n.º 68 da Rua S, sendo ainda dotado de uma esplanada, com cadeiras e mesas, que funciona no período de verão.

Neste estabelecimento, além de serem servidos cafés e bebidas, são ainda confeccionadas e postas à disposição dos clientes diferentes tipos de comidas.

O estabelecimento está equipado com um aparelho de televisão, aparelhagens de som, e várias máquinas frigoríficas.

Este estabelecimento funciona ininterruptamente desde as 20h00 até às 04h00, e nas noites de sábado para domingo até às 08h00, sendo muito frequentado, especialmente durante o período nocturno.

Os aparelhos de televisão e música produzem enorme barulho, assim como é intenso o ruido provocado pelo barulho das portas frigoríficas.

É também intenso o barulho produzido pela vozearia dos clientes, quer no seu interior quer quando se concentram no exterior, bem como o ruido produzido pelo rojar das mesas e cadeiras.

Existiu no exterior do bar uma pequena roulotte com máquina de cerveja, existindo actualmente uma máquina de cerveja, o que fez com que muitos clientes permaneçam ali durante largos períodos de tempo. A situação agrava-se durante o fim de semana.

Os autores sentem com muita intensidade, na sua habitação, o barulho produzido pelo estabelecimento, especialmente durante a noite.

Tais barulhos e ruídos impedem os autores de descansar normalmente, passando noites sem dormir, acordando muitas vezes e sem poderem ter um descanso repousante e reconfortante.

Este quadro traz os autores sob constante nervosismo e intranquilidade, traz-lhes insónias e mal-estar físico e psíquico.

Os autores têm de tomar medicação para poderem descansar e dormir.

A situação torna-se intolerável a cada dia que passa.

Os autores e alguns vizinhos apresentaram queixas na câmara municipal de Chaves e fizeram participações à PSP.

A explanada do estabelecimento situa-se em plena rua, no largo junto à casa dos autores, o que vai causar muito mais barulho.

Nos dois anos anteriores durante o mês de Agosto o réu organizou festivais para dinamizar a zona histórica da cidade, o que trouxe mais pessoas a esta zona e, consequentemente, mais barulho.

Alegam ainda a falta de limpeza e o lixo que fica nas ruas contiguas ao bar, deparando-se os autores e demais vizinhos, aos domingos de manhã, com todo o tipo de dejectos espalhados pelas ruas, o que afecta a sua qualidade de vida e poe em causa a salubridade da zona.

Peticionam que: a) Seja o réu condenado a manter o estabelecimento encerrado no período entre as 22h e as 09h; b) Seja ainda o reu condenado, em conformidade com o disposto no art. 879º, n.º4, do Cód. Proc. Civil, no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória no valor de 500 € sempre que viole o determinado na decisão que vier a ser proferida.

* Contestou o réu, arguindo desde logo a sua ilegitimidade passiva para os termos da presente acção, invocando que o estabelecimento encontra-se instalado num imóvel propriedade do Sr. Luís T.

O proprietário do estabelecimento e respectivo alvará 12/94, emitido pela Câmara Municipal de Chaves, é a Associação Recreativa e Cultural da Zona Histórica de Chaves, pelo que é esta entidade e não o réu, o titular da relação material controvertida desenhada pelos autores.

Defendeu-se ainda por impugnação, alegando que o invocado pelos autores não corresponde à verdade, desde logo porque os requerentes não vivem na morada assumida nos autos.

Por outro lado, o estabelecimento não é dotado de qualquer esplanada, funcionando apenas desse modo nos períodos de verão ou em datas festivas da cidade e devidamente autorizada pela Câmara Municipal de Chaves.

O estabelecimento cumpre de modo integral o estabelecido no Regime Geral do Ruído. Ao longo do tempo foram sendo efectuadas obras de melhoria do espaço com vista à redução do seu impacto sonoro, a última das quais consistiu na colocação de uma porta interior.

O barulho produzido por quem se encontra na rua não é imputável a qualquer estabelecimento. Trata-se de uma zona com vários estabelecimentos de diversão nocturna, passando por ali muitas pessoas.

Quanto ao lixo acumulado nas ruas, na noite de sábado para domingo são os funcionários do estabelecimento que procedem à limpeza do espaço público em que está inserido, tendo, para o efeito, adquirido uma máquina lavadora de alta pressão e um soprador profissional.

Como medida preventiva de segurança e limpeza todas as bebidas são servidas em copos de plástico.

O requerido tem sido uma pessoa interessada na dinamização da zona histórica da cidade. Entende a presente acção apenas como um acto de vingança contra si.

Acresce que, da petição inicial resulta que os autores têm problemas apenas quando é instalada uma esplanada no exterior. No entanto pedem o encerramento do estabelecimento entre as 22h00 e as 09h00 da manhã, o que se revela totalmente desproporcionado.

Pugna pela improcedência da pretensão dos requerentes.

* No início da audiência de discussão e julgamento julgou-se improcedente a excepção da ilegitimidade passiva suscitada pelo réu.

* Foi então proferida a seguinte Decisão: “Em face do exposto, julgo a presente acção especial (…) procedente por provado e em consequência: a) Determino o encerramento do estabelecimento de café/bar denominado “Associação Recreativa e Cultural do Centro Histórico de Chaves” que explora no rés-do-chão do n.º68, da Rua S em Chaves, explorado pelo réu Dimitri T, nos seguintes períodos: - À segunda-feira, terça-feira, quarta-feira, e quinta-feira entre as 00h00 e as 08h00; - À sexta-feira, sábado e domingo das 04h00 às 08h00; - A explanada apenas poderá funcionar até as 24h00 durante os fins-de-semana e até às 22h00 durante a semana.

b) Condeno ainda a ré no pagamento de € 100 (cem euros) a título de sanção pecuniária compulsória por cada violação ao determinado na alínea anterior”.

* Não se conformando com a decisão proferida vieram os AA dela interpor recurso de Apelação, apresentando Alegações e formulando as seguintes Conclusões: A- Os recorrentes deduziram o presente procedimento autónomo urgente de tutela da personalidade em que, no essencial, alegavam que no estabelecimento explorado pelo recorrido e zonas adjacentes é produzido enorme ruído, ruído que se prolonga durante toda a noite e que impede que eles consigam descansar normalmente, ter um sono reconfortante, passando noites a fio sem conseguir dormir, o que os traz sob constante nervosismo e intranquilidade, provocando-lhes insónias e mal-estar físico e psíquico.

B- A douta sentença recorrida, no essencial, deu como assente todo esta factualidade e concluiu expressamente que o ruído decorrente do funcionamento do estabelecimento afecta gravemente o descanso e o sono repousante dos recorrentes.

C- E determinou o encerramento do estabelecimento, aos fins de semana –noites de sextas, sábados e domingos- apenas às 4 h da manhã e por cada violação desta determinação fixou a sanção pecuniária compulsória em 100,00 €.

D- Aceita-se e concorda-se com toda a esclarecida e pertinente alegação jurídica tecida ao longo da douta sentença, apenas se discordando da hora de encerramento do estabelecimento aos fins de semana às 4 h da manhã e do montante da sanção pecuniária fixada.

E- Aliás, o encerramento do estabelecimento àquela hora tardia está em frontal oposição com toda a argumentação, muito válida, tecida sobre o direito ao repouso dos recorrentes, sua valoração e modo de protecção. F- E isto desde logo porque na sentença dá-se como assente, por um lado, que no estabelecimento são produzidos ruídos muito intensos que afectam gravemente o direito ao repouso, tranquilidade e sono dos recorrentes, que os traz nervosos e agitados e, por outro, que há que tomar em consideração o período que, em termos de normalidade, é destinado ao repouso, ou seja, o período nocturno, para salvaguardar aqueles direitos e limitar o funcionamento do estabelecimento.

G- Com o horário de funcionamento ora fixado não são minimamente defendidos os direitos dos recorrentes, concretamente o seu direito ao repouso e ao descanso, quando, como bem se refere na sentença, a privação do descanso e sono nocturnos constitui uma lesão grave e irreparável.

H- Perante os factos assentes e as pertinentes considerações tecidas na sentença, sem dúvida que o direito ao repouso e ao sossego dos recorrentes só ficará salvaguardado se for determinado que o encerramento do estabelecimento naqueles dias terá também de ocorrer, no máximo, às 24 h e eventualmente à 1 h da manhã durante os meses de Julho e Agosto.

I- Acresce que, para combater o ambiente agressivo causado às pessoas pelo funcionamento deste tipo de estabelecimentos e dando acolhimento às inúmeras queixas com que tem sido confrontado, a Câmara Municipal de Chaves, pelo Edital nº 69/2015, de 7 de Julho de 2015, colocou em discussão pública, por um período de 30 dias, o projecto de Regulamento de horário e funcionamento dos estabelecimentos comerciais do Município de Chaves, preconizando-se no seu art. 4º que os estabelecimentos pertencentes ao 2º grupo e que se localizem em zonas com prédios habitacionais num raio de 50 m, tudo como é o caso vertente, o...

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