Acórdão nº 1583/07-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelAUGUSTO CARVALHO
Data da Resolução15 de Novembro de 2007
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães A Caixa Geral de Depósitos, S.A., instaurou execução comum contra Alexandra A... e marido Armando L...; José A... e mulher Rosa V..., visando a cobrança da quantia total de 21.140,62 euros, proveniente de um contrato de empréstimo que celebrou com a primeira e segundo executados. Para garantia do pagamento do referido empréstimo, foi constituída fiança pelos terceiro e quarta executados.

Os executados José A... e mulher Rosa V... deduziram oposição, alegando que gozam do benefício da excussão prévia, previsto no artigo 638º, do C. Civil e, deste modo, têm direito de recusarem o cumprimento enquanto não estiverem excutidos todos os bens dos devedores principais e, ainda, mesmo depois dessa excussão, se provar que o crédito não foi satisfeito por culpa do credor. Mais alegam que a cláusula 20.1 do título dado à execução se encontra ferido de nulidade, na media em que, aquando da assinatura do dito contrato de empréstimo, ficou assente entre todos os intervenientes – incluindo os responsáveis da exequente – que os opoentes só assinavam esse documento no pressuposto de gozarem, de qualquer modo, do benefício da excussão prévia, devendo os responsáveis da exequente, como lhes competia, terem explicado verbalmente aos opoentes o conteúdo da dita cláusula, cuja compreensibilidade não resulta imediatamente do seu teor e é contra o que foi acordado. Nesta decorrência, referem que do artigo 6º, do D.L. nº 446/85, de 25/10, resulta que, atenta a normal complexidade das cláusulas gerais integradas no tipo de contratos como aquele junto pela exequente, esta devia, o que não fez, explicar verbalmente a cláusula 20.1, que afecta os direitos dos opoentes, devendo a mesma ser considerada nula ou, pelo menos excluída do seu texto.

Na contestação apresentada, a exequente refere que no contrato de empréstimo, os executados José A... e Rosa de Fátima se constituíram “fiadores solidários e principais pagadores…” de todas as responsabilidades emergentes do mesmo, pelo que, enquanto fiadores, renunciaram expressamente ao benefício da excussão prévia, e daí, estarem a ser executados, a título principal e sem qualquer limitação, nos termos do artigo 640º, do C. Civil. Defendem, ainda, que é bem mais explícito para o cabal entendimento da cláusula referir na mesma que o fiador em causa se assume como “principal pagador” do que dizer que o mesmo renuncia ao “benefício da excussão prévia”.

No despacho saneador, foi julgada improcedente a oposição à execução, com fundamento de que, enquanto fiadores, os opoentes renunciaram ao benefício da excussão prévia e, por isso, podem ser executados a título principal – artigos 634º e 640º, do C. Civil. Por outro lado, a cláusula 20.1, nomeadamente, a expressão aí utilizada “principais pagadores do empréstimo” tem um conteúdo compreensível e acessível ao comum dos cidadãos, sendo, por conseguinte, inadequado trazer-se à colação, como fazem os opoentes, o disposto no artigo 6º, do D.L. nº 446/85, de 25/10.

Inconformados com a decisão, os executados/opoentes recorreram para esta Relação, formulando as seguintes conclusões: 1.A exequente limita-se a alegar que “para garantia do pagamento do referido emprétimo, foi constituída fiança pelos terceiro e quarta executados” aqui recorrentes, não alegando, sequer, que estes se responsabilizaram solidariamente como fiadores e principais pagadores pelo pagamento daquele e/ou nem sequer alega que aqueles renunciaram ao benefício da excussão.

  1. Ainda que se entenda que aquela falta de alegação é irrelevante – o que não se concede – sempre se diz que a douta sentença fez uma errada interpretação das normas previstas nos artigos 627º, nº 2 e 638º, do C. Civil.

  2. O artigo 627º, nº 2, do C. Civil, define uma das características da fiança: a acessoriedade, que significa que a fiança se apresenta como acessória da dívida principal: acessória no sentido de a fiança ficar subordinada e acompanhar a obrigação afiançada. A acessoriedade é uma característica que faz parte da natureza da fiança, pelo que, não pode ser afastada por vontade das partes.

  3. A segunda característica é a subsidiariedade, referida na lei, através do benefício da excussão (artigo 638, do C. Civil). Nos termos desta regra, o fiador só responde pelo pagamento da obrigação se e quando se provar que o património do devedor é insuficiente para saldar a obrigação por este contraída. Já esta última característica pode ser afastada pela vontade das partes. Sempre que assim aconteça, o fiador, ao lado do devedor, apresenta-se como principal pagador; ou seja, o fiador e o devedor tornam-se responsáveis, em termos solidários, pelo pagamento da dívida.

    Terá sido este, ao que parece, o entendimento do tribunal “a quo”.

  4. porém, em relação à solidariedade, quando o fiador se obriga como principal pagador, deve entender-se que são distintas a obrigação do devedor e a do fiador, pelo que, mesmo quando este se obriga como principal “pagador”, não existe entre ambos solidariedade passiva, atendendo à acessoriedade da obrigação do segundo em relação à do primeiro – cfr., entre outros, Ac. da Rel. De Coimbra, de 28.2.1968, J.R., 14º (1968), Tomo I, p. 203; Ac. da Rel. do Porto, de 9.5.1995, C.J., ano XX, Tomo III, p. 210; e na doutrina, Garantias do Cumprimento, de Pedro Romano Martinez e Pedro Fuzeta da Ponte, Almedina, 2ª edição.

  5. Nessa medida, deve entender-se que os recorrentes gozam do benefício da excussão prévia, previsto no artigo 638º, do C. Civil.

  6. Acresce ainda que a exequente não pode socorrer-se do conteúdo da cláusula 20.1 – fiança do contrato de empréstimo junto aos autos com o requerimento executivo, para dizer que os recorrentes se constituíram...

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