Acórdão nº 1144/07-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelGOUVEIA BARROS
Data da Resolução28 de Junho de 2007
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: J. P. A. e esposa M. DA G. N., residentes no Lugar de G., freguesia de C, concelho de Barcelos, intentaram a presente acção declarativa com processo ordinário contra: CONSTRUÇÕES B. N, Lda com sede no Lugar da Quinta, Barcelos e VARANDAS DO N. –, Lda, com sede no C. C., 2º andar, sala 12, , Viana do Castelo, --------------------------------------------------------------------------- pedindo a execução específica de um contrato promessa que celebraram com a primeira ré relativo a uma fracção autónoma destinada a habitação ou, subsidiariamente, se declare resolvido tal contrato e se condene a mesma ré a restituir-lhe em dobro o sinal de €67.356,00 que lhe entregaram em execução desse mesmo contrato.

Pedem ainda a resolução de outros dois contratos promessa que celebraram com a mesma ré e referentes a uma outra fracção autónoma destinada ao exercício do comércio e a um lote de terreno e a consequente condenação da ré, promitente – vendedora, a restituir-lhes em dobro os sinais no valor total de €21.734,00 que lhe entregaram no âmbito desses contratos.

Por fim pedem a resolução de um contrato promessa que celebraram com a segunda ré e referente a outro lote de terreno para construção urbana e a condenação da mesma ré a devolver-lhes a quantia de €50.000,00, correspondentes ao dobro do sinal por si entregue à ré e atinente a esse contrato.

Fundamentam tais pedidos no incumprimento pelas rés dos contratos promessa em questão.

***Contestaram as rés para dizer que foram os AA quem incumpriu os contratos promessa, não comparecendo nas diversas datas aprazadas para a celebração das escrituras e convocadas sob cominação de que tal falta de comparência determinaria o incumprimento definitivo.

Concluem pugnando pela improcedência da acção e, em reconvenção, pedem que se declarem resolvidos os contratos promessa por incumprimento culposo dos AA. e se declare perdido a seu favor o montante do sinal entregue em execução dos contratos.

Replicaram os AA para impugnar supostas excepções invocadas pelas contestantes, bem como os factos por elas alegados que ancoram a reconvenção, defendendo a sua improcedência.

***Findos os articulados foi proferido saneador sentença, julgando a acção totalmente improcedente e parcialmente procedente a reconvenção, declarando resolvidos os contratos promessa celebrados entre os AA e as rés reconvintes e perdidos a favor da primeira o montante do sinal entregue (€79.090,00 e não os €89.090,00 por ela peticionados) e a favor da segunda o sinal de €15.000,00 entregue pelos autores.

***Inconformados com o decidido, recorrem os autores pretendendo a revogação da decisão “substituindo-se por outra que ordene o prosseguimento dos autos, com elaboração da matéria assente – base instrutória, ou para o disposto no artº508º, nos1,2 e 3 do CPC” ao abrigo das conclusões que se transcrevem: 1- O contrato-promessa relativo à fracção autónoma correspondente ao apartamento tipo T3, com garagem fechada, constitui um contrato-promessa bilateral, assumindo cada uma das partes intervenientes na relação jurídica em causa, a posição simultânea de credor e devedor, com o correspondente feixe de comportamentos e prestações que de ambos são esperados.

2- A construção doutrinária do Tribunal a quo assenta numa composição arbitrária das posições de credor (que seria o promitente vendedor) e de devedor (o promitente-comprador), negligenciando a dupla categoria de ambos.

3- Tratando-se, como se trata, de um contrato-promessa bilateral, a promitente vendedora é simultaneamente credora e devedora, traduzindo-se tal posição nas acções que dela são esperadas, a saber, exigir do promitente-comprador a celebração do contrato prometido e o pagamento do preço (como credora), e celebrar o contrato prometido e entregar a coisa prometida vender (como devedora).

4- Em cada uma destas distintas (ainda que inter-conexas) dimensões, encontra-se uma série de prestações principais e acessórias de conduta (que incumbem a ambas as partes) e que, naquela que lhes é comum (a celebração do contrato prometido), para além do normal dever de actuar de boa-fé, decorrem apenas para a promitente vendedora, a qual, a fim de possibilitar a efectivação do negócio, deve fornecer a documentação necessária a essa celebração.

5- Em tal contexto relacional/obrigacional não faz qualquer sentido falar-se de mora do credor, uma vez que este (o promitente comprador) desde cedo fez saber à promitente vendedora que apenas compareceria à celebração da respectiva escritura uma vez em posse dos elementos solicitados, o que, além dos elementos documentais abrangia a realização de vistorias e eliminação de defeitos detectados.

6- Está em causa uma fracção autónoma cuja aquisição foi acordada quando a mesma ainda não se encontrava sequer em fase de construção, pelo que era a promitente vendedora quem teria que diligenciar pela obtenção dos documentos necessários à celebração do contrato prometido (compra e venda), promovendo inclusivamente a feitura de alguns deles, e de que constitui exemplo a escritura de propriedade horizontal e seu registo junto da Conservatória do Registo Predial, sendo ela quem dispunha de legitimidade para obter outros, nomeadamente a licença de utilização, e em relação, ainda, a outros seria ela quem disporia dos elementos que os permitiria obter.

7- Celebrado o contrato, efectuada a tradição da coisa e pago o preço, a vistoria e correcções exigidas pelos A.A./apelantes apenas se lograriam por via judicial e após aqueles terem incorrido em mais e desnecessárias despesas.

8- O sentido que se pode retirar da recusa do promitente vendedor a facultar os elementos solicitados pelos A.A./apelantes e a aceder a acções (vistoria e reparação) por eles requeridas é precisamente esse: o de lograr o negócio, e depois discutir essas questões, com as demoras de anos que se podem antever, e os custos de parte a parte que sempre se devem procurar evitar.

9- Com o envio da carta de 04 de Janeiro de 2006 não deixou de ser essencial para o promitente-comprador (apelantes) a realização da vistoria, uma vez que tal pedido, tal como a solicitação de entrega das chaves, é repetido em nova carta de 09 do mesmo mês (vd. art° 15 dos factos elencados), e cuja essencialidade como condição sempre foi manifestada e comunicada ao promitente vendedor (apelada).

10- A solicitação de entrega das chaves – de que o promitente-comprador estava privado destinava-se a permitir aos A.A./apelantes verificar in loco, e antes da celebração da escritura, se os defeitos apontados já haviam sido corrigidos; a solicitação da licença de utilização permitir-lhes-ia certificarem-se que a Câmara Municipal, que faz depender a sua emissão de uma série de requisitos, efectuara já uma vistoria, constatando pelo menos a inexistência de defeitos aparentes.

11- Nunca a vistoria ao T3 perdeu o carácter de essencialidade para o promitente-comprador (apelantes), nem de essencialidade deixou de ser comunicado ao promitente vendedor (apelada), tendo sempre constituído a sua inexistência impedimento à outorga da escritura.

12- Existe mora do devedor, que é, quanto a estas concretas obrigações – documentação e vistoria – o promitente-vendedor.

13- A mora debitória por banda da promitente-vendedora legitimou o recurso à execução específica por parte dos ora apelantes.

14- A entender-se existir por parte da promitente vendedora mora creditória, havia que indagar qual a sua repercussão concreta no âmbito do contrato promessa em causa.

15- Isto porque, se a recusa do promitente-comprador (que apesar de tudo tem um específico interesse em obter, para si, a tradição da coisa, em perfeito estado e melhores condições de fruição) em outorgar na escritura enquanto não obtiver da contraparte a satisfação das suas “exigências” implica mora da sua parte, não é menos certo que não pode também ser “forçado” a outorgar uma escritura sem estar convicto do estado de conservação e das condições de fruição da coisa objecto do negócio.

16- Os apelantes recusaram legitimamente a outorga da escritura e, consequentemente, não incorreram em mora, pois que, tratando-se de um contrato de natureza sinalagmática, é-lhes lícito recusar a sua prestação porquanto a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT