Acórdão nº 54/07-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelESPINHEIRA BALTAR
Data da Resolução15 de Março de 2007
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães A e mulher B, e C e marido, D, vieram interpor a presente acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra E, peticionando que fosse declarada a resolução do contrato de arrendamento celebrado entre as partes e que fosse decretado o despejo do local arrendado, devendo o mesmo ser entregue aos Autores livre de pessoas e bens.

Para tanto, alegam, em síntese, que, por escritura pública celebrada no Cartório Notarial de Vila Nova de Cerveira em 11.01.83, os antecessores dos Autores deram de arrendamento a F, para “exercício de comércio de casa de pasto, não lhe podendo ser dado outro qualquer destino sem consentimento escrito dos senhorios”, o prédio melhor descrito no artigo 1º da petição inicial. Em 14.10.97, por escritura pública, o referido F trespassou a G o referido estabelecimento de casa de pasto. Mais alegam que em data não anterior a Março de 1998, através de negócio do qual não foi dado conhecimento aos proprietários, a referida G “passou” o estabelecimento à Ré que desde então e até hoje o vem explorando continuadamente. Por outro lado, alegam, a partir de 1998, de modo ininterrupto e continuado, a Ré passou a usar o arrendado, não para uma casa de pasto, mas para restaurante, bar e cervejaria. Finalmente, alegam que a Ré encontra-se a explorar no arrendado um estabelecimento de restauração sem possuir sistema de detecção de incêndios, sem casa de banho para o pessoal e respectivos vestiários. Acresce que as portas em lugar de abrirem para o exterior, abrem para o interior do arrendado e as garrafas de gás cheias se encontram dentro do estabelecimento.

Citada regular e pessoalmente, contestou a Ré por impugnação, por excepção e deduziu reconvenção, admitida por despacho de fl. 63.

Foi proferido despacho saneador, no qual se afirmou a competência do Tribunal em razão da matéria, da nacionalidade e da hierarquia; a inexistência de nulidades que afectem todo o processado; a personalidade e a capacidade judiciária das partes, bem como a regularidade da sua representação; a legitimidade dos Autores e dos Réus para a presente acção; e a inexistência de quaisquer outras nulidades, excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa e de que cumpra conhecer. Foi elaborada a condensação, não tendo havido qualquer reclamação.

Procedeu-se a julgamento com observância de todas as formalidades legais.

A matéria de facto controvertida foi decidida por despacho constante de fls. 177 a 179, não tendo havido, igualmente, reclamações.

A instância mantém-se válida e regular.

A final foi prolatada sentença que julgou a acção e reconvenção improcedentes.

Inconformados com o decidido, os autores interpuseram recurso de apelação, formulando conclusões.

Não houve contra-alegações Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Das conclusões de recurso ressaltam as seguintes questões, a saber: 1– Se há nulidade da sentença por violação do artigo 668 n.º 1 al. d) do CPC., por se ter, na resposta ao artigo 4.º da base instrutória, alargado o âmbito da matéria de facto constante no respectivo quesito.

2 – Dar como não escrita a parte da resposta ao quesito 4.º que se refere a “ sendo que no estabelecimento se servem refeições há mais de 20 anos” por aplicação analógica do disposto no artigo 646 do CPC.

3 – Se houve mudança de fim do contrato de arrendamento com a exploração do estabelecimento para restaurante em prejuízo da casa de pasto.

4 – Se a exploração do estabelecimento com falta de licença de utilização é um acto ilícito, fundamento de resolução do contrato de arrendamento.

Na 1ª instância provou-se a seguinte matéria de facto que passamos a transcrever: a) Os Autores são donos, em comum e sem determinação de parte ou direito, e legítimos possuidores de um prédio urbano de rés-do-chão e andar sito à Rua Ricardo Joaquim de S,,,, na freguesia e concelho de Caminha, descrito na competente Conservatória sob o n.º 00477/090102 e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo 173º (cfr. doc. junto a fl. 7 dos autos – certidão do registo predial); b) Por escritura pública lavrada a 11.01.1983, exarada a fls. 96 a 97 v.º do livro de escrituras diversas n.º B-81 do Cartório notarial de Vila Nova de Cerveira, I e mulher, J, pais e sogros dos Autores e anteriores donos do imóvel referido em a), deram de arrendamento a F, para o “exercício do comércio de casa de pasto, não lhe podendo ser dado outro qualquer destino sem consentimento escrito dos senhorios”, o rés-do-chão do identificado prédio, composto de duas divisões e quarto de banho; c) O arrendamento teve início em 01.02.1983, pelo período de um ano, mediante a renda mensal de sete mil escudos, a pagar em casa dos senhorios, no primeiro dia útil do mês a que respeitar; d) Por escritura pública lavrada a 14.10.1997, de fls. 38 a 39 do livro de notas para escrituras diversas n.º 160-A do Cartório Notarial de Caminha, F trespassou a G o estabelecimento “de casa de pasto” instalado no imóvel descrito na anterior alínea b); e) Por escritura pública de trespasse celebrada a 12.02.1999, no Cartório Notarial de Caminha, G declarou trespassar à Ré e esta, por intermédio dos seus sócios gerentes L e M, declarou aceitar o estabelecimento “de casa de pasto” instalado no imóvel descrito na anterior alínea b); f) A Ré vem explorando continuadamente desde 12.02.99, e até hoje, o estabelecimento referido na alínea c); g) A partir de 12.02.99, e até hoje, a Ré passou a usar o arrendado de modo ininterrupto e continuado como restaurante, sendo que no estabelecimento se servem refeições há mais de 20 anos; h) Passou a confeccionar no locado sopas, pratos de peixe e carne, com os respectivos acompanhamentos de arroz, massas e batatas; i) E a servir no mesmo sobremesas, cafés e todo o género de bebidas; j) A Ré serve diariamente no locado refeições em travessas a dezenas de clientes, que comem à mesa e ao balcão de faca e garfo; k) A Ré não dispõe de licença de utilização do estabelecimento sito no prédio referido na alínea c); l) A Ré não possui sistema de detecção de incêndios, nem casas de banho e vestiários para o pessoal; m) As portas abrem para o interior do estabelecimento; n) Onze dias antes da celebração da escritura de trespasse referida na alínea d) foi dado conhecimento a J, na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por morte de I, do preço, respectivos outorgantes e demais elementos essenciais do negócio; o) Por carta enviada a 28 de Setembro de 2001, dirigida à mãe...

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