Acórdão nº 593/06.9TCGMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Abril de 2010
Magistrado Responsável | ESPINHEIRA BALTAR |
Data da Resolução | 12 de Abril de 2010 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães Agravante – A Agravado – B O réu veio deduzir articulado superveniente invocando a entrada em vigor da nova redacção dada ao artigo 1817 n.º 1 do C.Civil, pela Lei 14/2009 de 1 de Abril, e requereu a reapreciação da caducidade ao abrigo da nova lei.
O tribunal indeferiu a pretensão alegando, em síntese, que a nova lei, apesar de ser interpretativa ao abrigo do disposto no artigo 13 n.º 1 do C.Civil, e ter efeitos retroactivos, aplicando-se aos casos pendentes à data da sua entrada em vigor, não abrangia as decisões definitivas, isto é, o caso julgado. E como a questão da caducidade da propositura da acção já tinha sido julgada definitivamente, não reapreciou a questão, porque seria por em causa a segurança jurídica.
Inconformado com o decidido, a réu interpôs recurso de agravo formulando conclusões.
Houve contra-alegações que pugnaram pelo decidido.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
Damos como assente a matéria de facto acima relatada.
Das conclusões do recurso ressalta a questão de saber se a não aplicação da nova lei viola o disposto no artigo 205 da Constituição da República.
O réu defende, nas suas alegações e conclusões do recurso que a nova lei, que altera o artigo 1817 do C.Civil, mais concretamente o seu n.º 1, em que aponta o prazo de 10 anos para o exercício da acção de investigação da maternidade (ou paternidade) a partir da maioridade ou emancipação do investigante é aplicável à decisão sobre a caducidade. Esta lei, nos termos do seu artigo 2.º, aplica-se aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor. Daí que deva ser aplicada ao caso em apreço, uma vez que o processo está pendente. O que quer dizer que deveria ter sido reapreciada a questão da caducidade, mesmo com decisão transitada em julgado, porque o legislador, neste caso, por circunstâncias relevantes, quis que esta lei atingisse o caso julgado.
E, para fundamentar a sua posição, convoca a jurisprudência da Comissão Constitucional, mais concretamente o acórdão 87/78 de 16 de Fevereiro, publicado no BMJ. 274/103, em que foi defendido que o caso julgado não tinha foros de princípio constitucional, era um mero instituto do direito em geral, vinculante do intérprete julgador e não do legislador, que, por razões ponderosas de natureza social ou outras, poderia legislar no sentido de, através de normas gerais e abstractas, modificar decisões já transitadas em julgado.
Este acórdão fez doutrina na Comissão Constitucional sendo seguido por outros, nomeadamente o n.º103/78 de 15 de Junho, publicado no BMJ. 292/220. Esta doutrina estava em oposição frontal com a posição do STJ, que defendia que o caso julgado era um princípio constitucional, que se impunha a todas as autoridades públicas, inclusive os órgãos de soberania em geral, incluindo o órgão legislativo (conferir – Ac. 29/06/1976, Ac. 19/10/1976, 21/12/1976, publicados, respectivamente, no BMJ. 258/220, 260/153 e 262/126).
O Tribunal Constitucional, a partir de 1986, com o Acórdão 352/86, admitiu o caso julgado como princípio constitucional, assente na tutela dos valores da certeza e segurança jurídica e da confiança, inerentes à ideia de Estado de direito democrático (artigo 2.º e 282 n.º 3 da CRP). Mas o caso julgado não seria um valor absoluto, podendo ser atingido, excepcionalmente, por normas gerais e abstractas, que ficariam na discricionariedade do legislador, conforme as...
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