Acórdão nº 82/07.TBAMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Novembro de 2010

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução11 de Novembro de 2010
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO A… e mulher B…, intentaram a presente acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra C… e D…, pedindo que estas sejam condenadas a: - reconhecerem aos Autores o direito de peticionarem e exigirem serem satisfeitos pelos bens da herança do “de cujus”, a quantia total de € 8.609,35 euros, a título de indemnização por danos, acrescida de juros de mora à taxa legal a contar da citação; - pagarem aos autores, na proporção das respectivas quotas que lhes coube na herança (na razão de metade para cada uma), a quantia de € 8.609,35 euros, a título de indemnização por danos, acrescida de juros de mora à taxa legal a contar da citação.

Em fundamento da sua pretensão alegam, em síntese, que contrataram o falecido E… - a quem sucederam como herdeiras as Rés - para lhes prestar serviços de contabilidade no âmbito das respectivas actividades de exploração, em nome próprio, de estabelecimentos de bebidas e restauração, sucedendo que já depois do falecimento deste, souberam os Autores que o mesmo não observou os deveres emergentes do contrato de prestação de serviços consigo celebrado, o que causou aos Autores um prejuízo global de € 8.609,35.

Na contestação, as Rés invocaram a ineptidão da petição inicial com fundamento na ininteligibilidade da causa de pedir, impugnando especificadamente ou por desconhecimento a generalidade da matéria alegada pelos Autores, acrescentando que apesar da doença de que foi admitido e da sua saúde débil, sempre tentou acautelar os interesses dos Autores, pagando algumas vezes as contribuições e os impostos destes, a título não profissional, actuando em favor dos Autores, exigindo, porém, cheque à ordem dos serviços públicos a que se destinavam.

Foi elaborado despacho saneador, tendo sido julgada improcedente a excepção da ineptidão da petição inicial, com subsequente enunciação da matéria de facto tida por assente e organização da pertinente base instrutória, da qual reclamaram os Autores com parcial êxito.

Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, tendo o Tribunal a quo proferido decisão sobre a matéria de facto, sem reclamação, e, em seguida, a sentença, julgando a acção procedente, por provada, com a consequente condenação das Rés a pagarem aos Autores, nas proporções das respectivas quotas que lhes coube na herança do falecido E., a quantia de € 8.609,35, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento.

Inconformadas com o assim decidido, as Rés interpuseram recurso de apelação da sentença, tendo formulado, a rematar a respectiva alegação, as seguintes conclusões:

  1. O valor de 2 000,00 euros (dois mil euros) dos trazidos a pleito correspondiam a valores entregues no âmbito da relação contratual objecto desta acção.

  2. Não se apurou o valor da avença, ou honorários que o falecido E… cobrava pela prestação desses serviços, com clara violação do artigo 342.º do Código Civil.

  3. Em nenhum momento os autores provaram quais os valores efectivamente depositados pelo E…, na sua conta pessoal, por incumprimento contratual com clara violação do artigo 342.º do Código Civil.

  4. Não conseguiram provar, os autores, a razão de ser de haver cheques sacados à ordem do falecido E…, com violação do artigo 347º do Código Civil.

  5. A obrigação de restituir tem por objecto o que foi indevidamente recebido e o valor indevidamente recebido não foi alcançado.

  6. O facto de os autores terem pago uma quantia (aquela data já exequenda) ao falecido E… ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, não implica não pode implicar – que esse valor correspondesse na sua totalidade a valores recebidos e não entregues pelo falecido E….

  7. É notório que desde 25.08.2005, o falecido foi sujeito a quimioterapia e era doente terminal, não podendo considerar-se provado que, pelo menos, as faltas de pagamento das quotizações dos meses de Setembro e Outubro fossem da responsabilidade do falecido E… e não dos autores.

    Tal, com violação do artigo 515.º do CPC que refere que o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las, sem prejuízo das disposições que declarem irrelevante a alegação de um facto, quando não seja feita por certo interessado – no caso em apreço a prova documental junta pelas rés deveria ser atendida e é clara quanto à impossibilidade do falecido para o trabalho.

    Com violação, ainda, do artigo 239.º do Código Civil, uma vez que a declaração negocial deve ser integrada de harmonia com a vontade que as partes teriam tido se houvessem previsto o ponto omisso (doença do falecido), ou de acordo com os ditames da boa fé, quando outra seja a solução por eles imposta.

  8. O julgador não pode abstrair-se dos termos concretos de um contrato em detrimento de um código deontológico, com clara violação do princípio da liberdade contratual, nos termos do artigo 405.º do Código Civil.

    Os Autores apresentaram contra-alegações, defendendo a rejeição liminar do recurso na parte relativa à impugnação da decisão de facto, ou a sua improcedência, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.

    Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    II - ÂMBITO DO RECURSO Sendo o âmbito do objecto do recurso definido pelas conclusões dos recorrentes (arts. 684º, nº 3 e 690º, nºs 1 e 3, do CPC), importando ainda decidir as questões nelas colocadas e, bem assim, as que forem de conhecimento oficioso, exceptuadas aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (art. 660º, nº 2, também do CPC), as questões a decidir são as seguintes: - se a decisão da 1ª instância sobre a matéria de fato deve ser alterada; - se os Autores têm direito a receber a quantia peticionada com base nos factos articulados e dados como provados (com fundamento em que institutos jurídicos), em termos de apreciação do tipo de contrato em causa e das obrigações dele decorrentes .

    III - FUNDAMENTAÇÃO A) - OS FACTOS Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos (com as correcções agora feitas relativamente a alguns deles, considerando as respostas afirmativas dadas aos artigos 1º a 29º da base instrutória e o teor desses mesmos artigos): 1 – Em 19.12.2005 faleceu E… (cfr. assento de óbito a fls. 4 da certidão de óbito extraída dos autos de...

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