Acórdão nº 989/09.4TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Junho de 2010
Magistrado Responsável | ANTÓNIO DA COSTA FERNANDES |
Data da Resolução | 08 de Junho de 2010 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 2ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório: E …, Ldª.
, pessoa colectiva nº … , com sede … Porto, propôs a presente acção declarativa, com processo comum, na forma sumária, contra: C ..., S. A.
, pessoa colectiva nº …. , com sede ….. Lisboa, Peticionando a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 4.231,85 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal.
Para tanto, alegou, em síntese, que: - Para pagamento de produtos fornecidos pela sociedade Plasticofer, Lda, emitiu o cheque nominativo nº 9272448356, da Caixa Geral de Depósitos, no montante de 4.231,85 €, a favor daquela; - No dia 16-02-2006, enviou esse cheque, por via postal, para a sede da referida sociedade; - Esse cheque nunca chegou entrar na posse da sociedade “Plasticofer”; - Tal cheque foi viciado, passando a constar o nome Plachidos Fernando Mota, onde constava “Plasticofer, Lda.”; - Essa rasura nota-se visualizando o cheque; - O cheque foi endossado a Luís Manuel Pereira Ribeiro, em cuja conta veio a ser creditado pela agência da ré, em Braga (Santa Tecla), sendo debitado na sua conta; - Teve que reunir meios para assegurar o pagamento à sociedade “”Plasticofer”.
A ré contestou, impugnando, em parte, a factualidade alegada pela autora, e sustentando, em súmula, que: - A falsificação em causa não era detectável por um funcionário bancário; - Tratando-se de um cheque endossado a um cliente da ré, só estava obrigada a assegurar a regularidade do endosso e não também a autenticidade das assinaturas dos endossantes; - A autora, ao enviar o cheque por correio simples, não tomou precauções que obstasse ao desvio do mesmo cheque no percurso até ao destinatário; - A autora podia ter aposto, no cheque, a cláusula “não à ordem”, de forma a impedir o endosso; - A autora devia ter tomado a cautela de inutilizar o espaço em branco destinado à identificação do destinatário; - Existe culpa da lesada, bastante para a isentar da obrigação de indemnizar.
*** Por sentença de fls. 82 a 97, a acção foi julgada procedente, tendo a ré sido condenada a pagar à autora o montante de 4.231,85 €, acrescido de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, desde a citação e até integral cumprimento.
*** A ré recorreu, pretendendo a revogação da sentença e a sua absolvição do pe-dido, tendo alegado e retirado as seguintes conclusões: 1ª Tendo presentes os deveres da autora, enquanto titular de cheques, de os guardar cuidadosamente até à sua entrega ao beneficiário, evitando ou diminuindo os riscos de falsificação, preenchendo ou inutilizando todos os espaços em branco, mani-festa-se evidente que a opção feita pelo tribunal “a quo” de a isentar de toda e qualquer responsabilidade só foi possível em face de uma visão atomística da realidade, que o levou a analisar separadamente cada uma das condutas adoptadas por aquela, omi- tindo uma visão do conjunto, uma análise periférica e global dos efeitos da conjugação dessas condutas num único acto; 2ª Todavia, já uma visão global e única dos factos e da realidade que eles defi- nem impõe conclusão absolutamente diversa da que foi adoptada: quem envia cheques pelo correio simples tem obrigação de saber que a segurança do envio e a certeza da recepção do cheque, contido dentro da carta, pelo beneficiário, não é a mesma que existiria se seguisse ou por correio registado ou, mais ainda por seguro do correio, ou, melhor ainda, por entrega em mão ou o pagamento fosse feito por transferência bancá- ria (hoje em dia gratuita, se feita por via de ebanking ou multibanco); 3ª Por conseguinte, optando por esse meio de envio, era exigível à autora que adoptasse outras cautelas que, numa entrega pessoal ou por seguro do correio, seriam dispensáveis e se destinam a prevenir um risco que o emitente não pode deixar de ter presente e ele próprio assume ao enviar o cheque por correio simples: que o mesmo cheque seja interceptado por terceiro e falsificado; 4ª Colocando a cláusula “não à ordem”, preenchendo completamente a identi- dade do beneficiário e eliminando, com um ou dois traços paralelos horizontais, os espaços que ficassem em branco, quer quanto ao valor por números e extenso, quer quanto à identificação do beneficiário, a autora teria afastado ou, pelo menos, dimi- nuído sensivelmente qualquer veleidade de falsificação; 5ª Preenchendo completamente o espaço destinado à identificação do destina- tário/beneficiário ou com a denominação completa ou com duas linhas horizontais no espaço que ficasse em branco, o falsificador do cheque teria de rasurar não só o "ch" do Pláchido" ou Pláchidos" ou Plácido" mas também toda a extensão do "Fernando" e do "Mota"; 6ª Num tal caso, o funcionário da ré que recebeu esse cheque, entregue por um cliente seu, antigo e digno de todo o crédito, facilmente detectaria ou, pelo menos, estaria obrigado a detectar, a rasura e emenda que necessariamente se prolongariam ao longo dos três nomes: Pláchidos Fernando Mota e não apenas como ocorre numa única sílaba ou mesmo letra (o "I"); 7ª Ao conceder ao falsificador a possibilidade de inserir no cheque a identifica- ção de um beneficiário pessoa singular, de forma que a inscrição de dois dos nomes (ou sobrenomes) se exibisse sem qualquer sinal de rasura ou emenda, limitando o eventual sinal de alarme, a rasura, a uma ou duas letras de um nome constituído por três palavras, a autora colaborou negligente mas intensamente para a ocorrência da falsificação; 8ª O argumento de que a falsificação se deu sobre uma palavra "Plasticofer", escrita pela autora e que, por conseguinte, ainda que tivesse sido anulado o espaço em branco, com duas linhas horizontais ou com a identificação completa da destinatária, aquela adulteração da palavra não teria deixado de ocorrer, não é idóneo a justificar a conclusão de que à autora nenhuma responsabilidade poderia ser assacada: Se o espaço em branco tivesse sido totalmente preenchido, com toda a probabilidade nem sequer o autor da falsificação se teria tentado a produzí-Ia; teria de alterar todas as palavras relativas à identificação do beneficiário e, como tal, qualquer que fosse o nome que inventasse ao longo de toda a sua extensão teria de surgir com rasuras; 9ª No que se refere à cláusula “Não à ordem” tão simples quão eficaz (!) a sua inserção teria obstado, in casu, à falsificação, sem...
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