Acórdão nº 1351/08.1TBVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Março de 2010

Data11 Março 2010

Processo nº 1351/08.1TBVCT.G1 Apelação Tribunal recorrido: 2º Juízo Cível do Tribunal da Comarca de Viana do Castelo ++ Acordam em conferência na 1ª Secção Cível da Relação de Guimarães: [A], [B], [C] (representado pelos pais, por ser menor) e [D] e marido [E] intentaram, pelo Tribunal da Comarca de Viana do Castelo, acção com processo na forma sumária (e que depois, por força de reconvenção, passou a seguir a forma ordinária) contra [F] e marido [G], peticionando que fosse declarada a denúncia do contrato de arrendamento a que aludem, com a entrega livre e desembaraçada de pessoas e bens do local arrendado

Alegaram para o efeito, muito em síntese, que são comproprietários do prédio urbano que descrevem. O rés-do-chão de tal prédio foi dado de arrendamento aos Réus em 1988. Os Autores [D] e marido, [A] e [C] necessitam agora do arrendado para nele habitarem, pelo que querem ver terminado por denúncia o contrato, sendo que cumprem os requisitos legais para tanto

Contestaram, os Réus, concluindo pela improcedência da acção

Mais deduziram, a título subsidiário (para o caso de proceder a acção) reconvenção, pedindo a condenação dos Autores no pagamento da indemnização correspondente a 60 vezes a retribuição mínima garantida em vigor à data da sentença, pois que, alegaram, é um direito que a lei lhes concede face à denúncia requerida, bem como da indemnização de €30.000,00 a título de danos não patrimoniais causados nas suas pessoas pelo propósito de denúncia

A final foi proferida sentença que julgou procedente a acção e improcedente a reconvenção

Inconformados com o assim decidido, apelam os Réus

Igualmente impugnam uma outra decisão tomada nos autos, a que deferiu o pedido formulado pelos Autores de rectificação de um suposto lapso de escrita de que enfermava a PI e ordenou a ampliação da base instrutória mediante o facto rectificado

Da alegação que apresentaram, extraíram os apelantes as seguintes conclusões: 1ª. Os AA. alegaram apenas que “não possuem outra casa própria ou arrendada para além da descrita no art. 1.º da p.i.” e não alegaram que tal acontecia “há mais de um ano”. 2ª. O requerimento apresentado em audiência de discussão e julgamento a pedir o aditamento daquela expressão temporal com o argumento de que a expressão “há mais de um ano” constava da minuta da p.i. e que foi “a pessoa que copiou o texto que omitiu essa expressão” não tem qualquer apoio no contexto dos articulados: nem sequer no art. 78.º (que trata “DO DIREITO”), onde se limitaram a enunciar os requisitos genéricos do art. 1102.º do Cód. Civil, sem qualquer imputação ao caso concreto; menos ainda no art. 80.º, onde se limitaram a concluir que “os AA. preenchem todos os requisitos previstos na lei para denunciar o contrato”

  1. O Tribunal não podia ter inserido no quesito 40.º-A, que adicionou em sede de julgamento, a expressão “há mais de um ano”. 4ª. Ao fazê-lo, inovou e substituiu-se aos Autores na alegação de um facto essencial à procedência da acção, que aqueles não alegaram

  2. Como consequência, tem de dar-se como não escrita, na resposta ao quesito 40.º-A a expressão “há mais de um ano”. 6ª. Só isso já conduz inexoravelmente à improcedência da acção, por falta de alegação e prova do factor temporal

    Sem prescindir: 7ª. O Tribunal deu como provado que são os Autores e os filhos [H] e [C] quem habita no prédio: 4 pessoas

  3. No art. 56.º da contestação, os RR. alegaram que, à data da celebração do arrendamento, só residiam no prédio os Autores e dois filhos: 4 pessoas

  4. Essa matéria não foi levada à base instrutória, apesar de reclamação, que nessa parte foi desatendida

  5. Mas trata-se de matéria relevante, porquanto “não há fundamento para decretar a denúncia do contrato de arrendamento para habitação própria se a necessidade do locado sentida pelo senhorio já existia, nos mesmos termos, à data em que celebrou o contrato de arrendamento” – cfr., v.g., Ac. Relação de Lisboa de 01/03/90

  6. Não tendo sido essa matéria seleccionada, não puderam os RR. dela fazer prova e isso implica nulidade da sentença e impõe que os autos baixem à 1.ª instância para repetição de julgamento

  7. Por outro lado, o Tribunal não atendeu a que os Autores pretendem denunciar o arrendamento do rés-do-chão (do prédio em cuja parte restante habitam) apenas com base na alegada exiguidade do espaço que ocupam e a que isso, só por si, não justifica a “necessidade” do arrendado

  8. De resto, os AA. propõem-se confessadamente ampliar o prédio ao nível do último andar e essa sua pretensão mais acentua a ideia de que eles só provaram a necessidade das obras de ampliação na parte que habitam mas não a “necessidade” do arrendado: aumentando o edifício em altura, menos precisarão do rés-do-chão

    Por último: 14ª. Os AA. alegaram (e comprovaram na réplica) que pretendem demolir todo o prédio, desse modo efectuando uma “remodelação profunda”

  9. Mesmo na denúncia do arrendado para habitação, o requisito da necessidade só pode aferir-se me função do prédio tal como ele é não à casa tal como a pretendem construir de novo: cfr. ainda Ac. Relação de Lisboa de 13/07/1995

  10. Por isso é que os RR. alegaram no art. 53.º da contestação que o arrendado, “tal como está, não é destinado nem está adaptado e adequado a habitação: porque está afecto ao comércio, mas sobretudo porque não tem rede de abastecimento de água nem outras infra-estruturas básicas, tais como instalação eléctrica, cozinha, rede de saneamento e esgotos a ele ligada, qualidade ambiental, isolamentos acústicos e térmicos e os demais requisitos indispensáveis para que possa ser-lhe concedida licença de habitação”. 17ª. Também essa matéria não foi contemplada nem na matéria assente nem na base instrutória (apesar de reclamada), com o argumento de que não contém factualidade mas considerações conclusivas – o que não é verdadeiro, como se vê da parte sublinhada do precedente número desta conclusão

  11. Pelo que também aqui se conclui como no precedente n.º 11

  12. De todo o modo, o certo é que os AA. só podiam lançar mão do fundamento da alínea a) do art. 1101.º do Cód. Civil se não se propusessem demolir todo o edifício e ampliá-lo ao nível do seu piso superior – como é sua confessa disposição

  13. Não está no poder dispositivo dos AA. reduzir ou restringir a qualificação jurídica dos factores que alegam: nesse sentido, eles não podem dizer que só fazem a denúncia com fundamento na alínea a) do art. 1101.º do Cód. Civil e não com fundamento na alínea b) do mesmo artigo, porque esse enquadramento jurídico não depende deles

  14. No que respeita ao requisito da “necessidade para habitação”, a lei vigente nada alterou em relação à que a precedeu – pelo que continua a ter pertinência tudo quando na doutrina e na jurisprudência, ao longo das últimas décadas, foi sendo burilado: a necessidade tem de ser séria, premente, fundada numa situação de carência diversa da que existia à data da constituição da relação locatícia e de que a denúncia para...

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