Acórdão nº 1379/07.9PBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Maio de 2010

Magistrado ResponsávelCRUZ BUCHO
Data da Resolução17 de Maio de 2010
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães:*I- Relatório No processo comum singular n.º 1379/07.9PBGMR do 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Guimarães, por sentença de 13 de Julho de 2009, o arguido Domingos M..., com os demais sinais dos autos, foi absolvido da prática do crime de violência doméstica que lhe vinha imputado e condenado: a) pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143.º, n.º 1 do CP, na pena de 120 (cento e vinte dias) de multa, à taxa diária de €6 (seis euros); b) pela prática de um crime de ameaça agravada, p. e p. pelos arts. 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1 al. a), ambos do CP, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de €6 (seis euros); c) em cúmulo jurídico, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de €6 (seis euros), no montante global de €900 (novecentos euros).

O arguido foi, ainda, condenado a pagar à demandante/assistente Cristina V..., também com os demais sinais dos autos, a título de indemnização por danos não patrimoniais, a quantia de €600 (seiscentos euros), acrescida de juros à taxa legal de 4%, desde a data da prolação da decisão e até pagamento integral, tendo sido absolvido “do demais peticionado”.

*Inconformado com tal sentença o arguido dela interpôs recurso, rematando a sua motivação com as seguintes conclusões que se transcrevem: 1. O arguido recorrente foi acusado pelo Ministério Público da prática de certos factos e de ter cometido um crime de violência doméstica. Foi proferido despacho que recebeu a acusação com estes factos e qualificação jurídica. Procedeu-se ao julgamento, foram proferidas alegações finais em que se considerou não ter ficado provado nenhum facto que consubstanciasse a prática pelo arguido do crime de violência doméstica de que vinha acusado, encerrada a audiência de discussão e julgamento, antes da leitura da sentença, foi confrontado com uma declaração alterando os factos provados entendendo o tribunal o arguido ter cometido os crimes de ofensa à integridade física simples e ameaça agravada.

  1. Alteração de factos e qualificação jurídica, extemporânea, mas que nos termos do art.358 n.º1 e 3 do C.P.P. foi considerada não substancial.

  2. A sentença condenatória reproduziu estes mesmos factos.

  3. Tal comunicação de completa alteração de 12 dos 18 factos e alteração da qualificação jurídica depois de encerrada a discussão só serviu a celeridade e aproveitamento processual, mas nega o contraditório, a defesa eficaz e em tempo útil.

  4. A alteração configura uma alteração substancial, não uma versão diferente dos mesmos factos, mas na maioria são factos novos, quatro é até impossível defender-se porque ocorridos em dia não concretamente apurado, fundamento esse que serve na sentença, a fls. 19/35 para absolver o arguido do crime de violência doméstica, nenhum dos novos factos é a pormenorização, concretização dos factos acusados e só quatro constituem em parte uma alteração dos da acusação. São episódios diferentes dos da acusação que deveriam levar a um outro julgamento com objecto e qualificação diversos.

  5. A comunicação da alteração e a sentença dão como provados factos diferentes e condena por crimes diversos do acusado, o que o arguido nunca consentiu, entendendo o recorrente que se verifica a nulidade do art. 379 n.º1 al. b) do C.P.P.

  6. Por a Mmª. Juiz desviou-se do âmbito de conhecimento do Juiz delimitado e definido pela acusação a que estava vinculado tematicamente e desviou-se dos factos e incriminações imputadas ao arguido e das quais se tinha de defender.

  7. Uma coisa é vir acusado de julgar ter direitos sobre a mulher, considerá-la seu objecto e não admitir que dele se divorcie, ameaçando dizer mal dela, acusando-a de defeitos e de ter amantes, de a perseguir e controlar, injuriando-a de puta e de a difamar perante os filhos, impedindo estes de a verem, outra diferente é ser condenado por haver discussões, em 2/7/07 ter-lhe erguido a mão e dito até te bato, minha puta, em 29/10/07 ter-lhe erguido a mão, ou em finais de 2007 ter atendido uma chamada no telemóvel da filha e chamado de puta.

  8. O recorrente tinha de defender-se de factos imputados, não podia ser surpreendido com factos, datas e práticas novas, diferentes das acusadas, que alargam o objecto do processo, fazendo-o perder a sua identidade, modificam os crimes pelos quais velo a ser condenado, pelo que houve alteração substancial e verifica as nulidades da comunicação e sentença.

  9. Factos que têm por efeito a condenação do arguido por dois tipos de crimes diversos: ofensa à integridade física simples e ameaça agravada, do de que vinha acusado: violência doméstica e não podia ser considerada alteração não substancial dos factos, que é aquela que embora modifique os factos da acusação não imputa um crime diverso, caso em que deveria haver lugar ao previsto no art. 359 CPP., o arguido opôs-se à continuação do julgamento, e merece agora, por isso, censura a sentença por tal comunicação não poder ter sido levada em conta pelo Tribunal na condenação, sob pena de nulidade (art.379 do CPP).

  10. É profunda a discordância do recorrente para com a sentença que se crê padecedora de erro de julgamento da matéria de facto, insuficiência da matéria de facto dada como provada, nos termos do art. 410 n.º2 al. a) e c) do C.P.P., o recorrente invoca e valora as suas declarações e extrai excertos das suas testemunhas presenciais e outras (cfr. art. 412 n.º 3 al. b) e n.º 4 art. 364 n.º2 do C.P.P.) que impunham leitura, análise e interpretação das provas pelo tribunal diversa. Erro na apreciação da prova, dando-se provados factos inconciliáveis, desconformes com o que realmente se provou, contra as regras da experiência das leges artis, baseado em juízos arbitrários.

  11. O recurso visa o reencontro com critérios mais objectivos e imparciais, afastando deduções e conclusões subjectivadas, aponta para a reapreciação da insindicável, arbitrária prova do texto decisório, fundamentado no depoimento único da ofendida em detrimento do oposto pelo arguido e das suas testemunhas presenciais.

  12. Realizado o julgamento a sentença deu como provado facto 6.º baseado única e exclusivamente no depoimento da ofendida e seus pais, mas não comprovados por terceiros que podiam ter sido arrolados. A ofensa à integridade física e a ameaça agravada objecto da condenação nunca foram comprovadas por terceiros estranhos à ofendida e aos seus pais.

  13. Facto provado, desmentido pelo arguido e suas testemunhas Rosa e Carlos, não se percebendo porque foi sobrevalorizado o depoimento do pai e da ofendida “sincero, isento e coerente” (10/35), não foi explicado porque foram desvalorizados os depoimentos da Rosa e do Carlos só por terem revelado animosidade e contraditórios entre si, sem explicar concretamente porque se considera animosidade e qual a contradição. Deviam terem ficado provadas as versões apresentadas pelo arguido e as testemunhas Rosa e Carlos.

  14. O facto provado em 7.º ocorrido em dia não concretamente apurado é mais um facto apenas relatado pela ofendida, desmentido pelo arguido. Não se percebe o maior crédito à versão da ofendida que a do arguido para servir à condenação, à luz do princípio in dubio pro reo deveria ter merecido outra interpretação, quando se sabe que 2/3 acusação instigada pela ofendida veio a ser dada como não provada, também por se ter provado não terem ocorrido os factos que aquela denunciou. Elucidativos os factos patenteados em julgamento pela ofendida: que disse o divórcio teria sido da sua iniciativa, quando se veio a provar que foi do arguido ou quando ostentou um relatório onde afirmava constar serem os filhos vítimas de alienação parental do pai, mas sendo capaz de ler e provar. Diverso, portanto, devia ter sido o sentido atribuído à prova produzida.

  15. O facto provado em 8 falece pelas mesmas razões uma vez que tal terá sido presenciado apenas pela ofendida, mas foi desmentido pelo arguido que até referiu tal proposta ter partido da ofendida, não se percebe do texto da sentença, porque foi o depoimento da ofendida sobrevalorizado em detrimento do do arguido. Apenas se refere o relato da ofendida aos pais e a Esmeralda que não presenciaram nada, apenas ouviram dizer, o que o recorrente não pode aceitar como sustentáculo judicial de prova. À luz do princípio in dubio pro reo a prova deveria ter sido a versão do arguido.

  16. Quanto ao facto provado em 9º a chamada do filho Lucas, por ordem do arguido. Não concebe o recorrente que se dê como provado este elemento intencional do arguido, afirmado apenas pela ofendida, nunca foi confirmada pela Esmeralda que só confirma o teor da chamada, sendo que o pai nunca assistiu à chamada do filho, confirmado pelas testemunhas Rosa e Fernando, não se percebe da sentença o sustento da intencionalidade, nem o filho Lucas confirma. Nem se aceita que só as declarações da ofendida mereceram crédito, claras, sinceras e coerentes, conforme as regras da experiência e da normalidade do acontecer e corroboradas por testemunhas, que o recorrente desconhece, a quem aquela relatou, testemunhas de ouvir dizer que o recorrente não aceita, ficando sem se perceber porque foram preteridas as versões do arguido e das suas duas testemunhas em detrimento das versões de quem ouviu dizer.

  17. O facto provado em 10º como consta da motivação apenas foi referido pela assistente, o que não se compreende tendo ocorrido à saída do comboio e a ofendida não consiga arrolar uma só testemunha. Não se consegue o recorrente entender como pode a Mma Juiz descrever que as testemunhas Rosa e Fernando apenas confirmaram troca de palavra quando estes negaram a existência de agressões, injúrias e ameaças. Nem consegue o requerente perceber como pode o depoimento da ofendida prevalecer sobre o presencial do arguido, da Rosa e do Fernando, com a justificação da animosidade, com o relato da Esmeralda, Joaquim e Laurinda que apenas ouviram relatar/dizer o episódio. Nem serve o argumento: se o objectivo...

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