Acórdão nº 357/06.0TBCMN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Dezembro de 2010
Magistrado Responsável | ISABEL FONSECA |
Data da Resolução | 14 de Dezembro de 2010 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os juízes da 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO "A" intentou acção especial de prestação de contas contra "B".
Alega, em síntese, ter sido casado com a ré no regime da comunhão de adquiridos, sendo que, depois de decretado o divórcio, não foram ainda partilhados alguns dos bens comuns do ex-casal. Pede que a ré preste contas sobre a sua administração de um desses bens.
A ré contestou excepcionando a ilegitimidade do autor e, no mais, defendendo a não obrigatoriedade de prestação de contas. Invocou o abuso de direito. Pediu a condenação do autor como litigante de má fé.
O autor respondeu mantendo a versão adiantada na petição inicial. Pede igualmente a condenação da ré como litigante de má fé.
Foi proferido despacho que, além de afirmar a legitimidade do autor, decidiu que a ré não estava obrigada a prestar contas.
O autor recorreu para esta Relação que determinou o prosseguimento do processo.
Proferiu-se despacho fixando a factualidade assente e a levar à base instrutória.
Procedeu-se a julgamento e respondeu-se aos quesitos, sem reclamações.
Proferiu-se sentença que concluiu nos seguintes termos: “Pelo exposto, julgo o incidente procedente e, em consequência, decido que a R. está obrigada a prestar contas ao A. referentes ao contrato de distribuição celebrado com a Amway de Portugal.
Custas pela R.
Notifique”.
Não se conformando, a ré recorreu formulando as seguintes conclusões: “A – A douta decisão recorrida padece, data venia de nulidade, pelo vício decorrente de falta de fundamentação, do art.º 668.º, n.º 1 b) do C.P.C.; B – Tal, porquanto, chegados à parte em que deveria ser apreciada a questão de fundo da existência de Abuso de Direito e de Litigância de má-fé, a douta sentença resume-se a um mero “NÃO SE VISLUMBRA.”, sem mais; C - Da leitura da contestação, constata-se que várias foram as situações, de facto e de direito, suscitadas pela Recorrente, para basear o invocado Abuso de Direito, bem como a litigância de má-fé do Recorrido; D - No entanto, o Tribunal a quo não se pronunciou sobre qualquer uma destas questões apresentadas e documentadas nos autos. E nem sequer fez qualquer remissão, para fundamentar a sua decisão quanto a tais questões jurídicas; E - Este é um caso manifesto de falta de fundamentação da sentença, porquanto, inclusivamente até segundo a jurisprudência mais “exigente” quanto à verificação desta nulidade e que acima se cita, em sede de alegações; F – Ainda que assim se não entenda, do quanto se alcança da análise da prova apresentada aos autos, não foi devidamente dado como provado o facto sob o n.º 8; G – Salvo o devido respeito por diferente entendimento, o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que o contrato-promessa de partilhas junto aos autos, não correspondia, na forma de partilha – ou no tempo para o qual remetia a mesma – à vontade da Recorrente; H - A Recorrente apresentou uma testemunha, CARLOS C..., que referiu ao Tribunal como decorreram as “negociações para partilha” entre os ex-cônjuges, previamente ao divórcio de ambos, porquanto foi o “mediador” destas; I - Tal testemunha veio, inclusivamente, a revelar, que o contrato promessa de partilha, foi apresentado à Recorrente, com pouco tempo para a sua análise pela mesma, que esta não recorreu à assistência de um advogado para lhe esclarecer do conteúdo mesmo e numa altura em que a mesma não conseguiria reunir a “paz de espírito” e a capacidade de raciocínio bastante, para apreender o que nele se encontrava exarado; J – Assim, a Recorrente veio a outorgar um contrato promessa, no qual julgava encontrar-se definida a partilha, a partir do momento da sua outorga, porquanto confiou no seu ex-cônjuge e no mandatário deste, à altura amigo de ambos; L – Porém, tal revelou-se um logro; M – Toda esta situação é bem explicada no depoimento da referida testemunha que acima se deixa transcrito em sede de alegações; N – A Recorrente conseguiu comprovar ao Tribunal a quo, que o texto do contrato promessa de partilha não correspondeu, portanto, à realidade dos factos e nem da sua vontade, quanto à remissão da partilha do contrato de distribuição em causa, para a data da venda dos imóveis comuns do ex-casal.
O – O Tribunal a quo, no entanto, erradamente em nosso modesto entendimento, não o deu como provado, como deveria; P – Pelo que deve ser alterada a resposta ao quesito sob o n.º 8 e julgada improcedente a presente acção, como consequência de tal e de acordo com a verdade real dos factos; Q - Ainda que pudéssemos concordar com a justeza da douta decisão aqui recorrida, o que não se concede, a mesma não delimita a alegada obrigação que se pretende impor à Recorrente; R - É que, apesar de a mesma se fundar num contrato promessa de partilhas e neste se remeter – falsamente, saliente-se – a partilha dos direitos provenientes do contrato de distribuição da AMWAY, ora em causa, este estipula um termo – o tempo da transacção dos bens imóveis que eram comuns ao ex-casal, tal termo não é, sequer, referido na decisão de que ora se recorre; S - O que sempre deveria ter acontecido, pois que o contrato de distribuição em causa, ainda existe e opera efeitos, mormente trazendo à Recorrente os rendimentos dos quais tem vivido; T - Assim, caso não se entenda que a douta sentença ora recorrida deve ser anulada ou revogada, pelas razões acima expostas, sempre deve a mesma ser rectificada com o termo da obrigação que impõe à Recorrente”.
O autor apresentou contra alegações, propugnando pela manutenção da decisão.
Formula as seguintes conclusões: “1.- A. e Ré celebraram em 21-06-2004, de livre vontade, junto de Cartório Notarial, um acordo consistente em contrato promessa de partilha que dispõe claramente que o bem em causa é bem comum.
-
- Posteriormente a esta data (21-06-2004), nada mais acordaram.
-
- Tal documento é claro ao considerar que o bem em questão – Titularidade do Direito – é bem comum de ambos até à venda dos imóveis.
-
- A Ré pura e simplesmente não quer cumprir o acordado, pretendendo antes locupletar-se com o bem e o respectivo rendimento”.
Cumpre apreciar.
II – FUNDAMENTOS DE FACTO A 1ª instância deu por provada a seguinte factualidade: 1. Autor e ré foram casados entre si no regime patrimonial de comunhão de bens adquiridos até ao dia 21 de Junho de 2004, data em que foi decretado o divórcio entre ambos (A); 2. No dia 21 de Junho de 2004, autor e ré celebraram o acordo cuja cópia se encontra junto aos autos de fls. 8 a 15, ao qual apelidaram de contrato-promessa de partilha (B); 3. No referido acordo, na cláusula 4ª, pode ler-se que “é adjudicada à outorgante as verbas nºs. 3 e 7” (C); 4. De acordo com a relação de bens comuns junta aos autos de divórcio que correu na Conservatória do Registo Civil de Caminha, da verba nº 3 consta “a titularidade da posição no contrato celebrado com «Amway de Portugal», nº 8708423, no valor de € 20.000,00 (vinte mil euros)”, conforme se lê na cópia constante de fls. 16 a 18 dos autos (D); 5. Com data de 29 de Março de 2004, autor e ré enviaram para a Amway Portugal a missiva cuja cópia consta de fl. 35 dos autos (E); 6. Em 10 de Abril de 2004, a ré solicitou à Amway Portugal a mudança da conta bancária para a qual deveriam passar a ser creditadas as comissões mensais. Desde essa data, a ré passou a receber a totalidade das comissões, bónus e demais remunerações mensais resultantes da titularidade da posição no contrato supra referido, não dando qualquer explicação ao autor, nem entregando a este qualquer quantia (F e G); 7. À luz desse contrato, autor e ré exerceram ambos, até 29 de Março de 2004, a função de distribuidores independentes, auferindo ambos retribuições mensais sob a forma de comissões e bónus. A partir daquela data, só a ré continuou a exercer tal função, trabalho a que se dedica diariamente e o qual garante a sua principal fonte...
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