Acórdão nº 274/21.3T8SEI.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução24 de Janeiro de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - Relatório 1. AA, residente em ..., intentou acção declarativa contra BB e CC, residentes em ..., peticionando: sejam os réus solidariamente condenados a restituir ao autor a quantia de 10.797,03 €, pelas benfeitorias realizadas no imóvel identificado no artigo 1. da petição inicial; sejam os réus solidariamente condenados a pagar ao autor indemnização por danos morais no montante de 2.500 €; ou, serem os réus condenados solidariamente a pagar indemnização ao autor no montante de 13.297,03 € (danos patrimoniais e não patrimoniais), por abuso de direito (violação do princípio da confiança), nos termos do artigo 334º do Código Civil.

Alegou, em síntese, que tomou de arrendamento, por acordo verbal com o 1º réu, uma determinada fracção autónoma, tendo permanecido no imóvel desde Junho de 2018 a Março de 2019. Foi acordado com o mesmo 1º réu que, depois de decorrido o seu divórcio, seria efectuado por ele a compra da referida fracção e que, se por mero acaso não fosse concretizada a venda os réus o ressarciam das quantias entretanto gastas em benfeitorias que fizesse. Que no imóvel efectuou diversas benfeitorias, tendo despendido nas mesmas cerca de 10.797,03 €. Que saiu do apartamento em Junho de 2019, tendo o 1º réu ficado de o ressarcir, do valor das benfeitorias, o que não fez. Tendo vindo a perceber que a fracção foi, entretanto, vendida e que a mesma não era propriedade do 1º réu, mas do 2º réu, seu familiar directo. Sustentou, por fim, que ambos os réus têm obrigação de o ressarcir do valor das referidas benfeitorias, por enriquecimento sem causa à sua custa, o primeiro réu por ter actuado sem poderes de representação e em nome próprio e o segundo por ter recebido o preço após a sua venda, venda esta que foi facilitada pela realização das benfeitorias, e bem assim dos danos não patrimoniais que sofreu.

Os réus contestaram, sustentando, além do mais, que o autor e o 1º réu outorgaram um contrato promessa de compra e venda, verbalmente, sobre a referida fracção, pelo preço de 75.000 €, tendo este acedido a que o primeiro tomasse posse imediata do imóvel, usufruindo-o como seu dono, adiantando mensalmente a quantia de 300 € por mês, por conta do preço a pagar na data da escritura. Que o autor realizou as obras que quis, ciente do seu futuro direito de propriedade, sem dar conhecimento aos réus, tendo posteriormente desistido do negócio. Que as benfeitorias sempre poderiam ser levantadas antes da venda do imóvel a terceiro, caindo a pretensão do autor na alçada do abuso de direito.

O autor respondeu, pugnando pela improcedência do invocado na contestação.

* A final foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e, em consequência, absolveu os RR do pedido.

* 2. O A. recorreu, concluindo que: I. Face da Douta Decisão de que se recorre, urge analisar criticamente a prova produzida e explanada na motivação e a prova documental e testemunhal junta aos autos que merece diferente entendimento.

  1. O tribunal fez errada interpretação da prova produzida em audiência de julgamento nos pontos que infra se discriminarão.

  2. O Tribunal ao apreciar e decidir a matéria constante do pedido fez errada interpretação da matéria de facto e aplicação da Lei.

  3. Pelo que se requer desde já que para além da apreciação de direito seja reapreciada a prova gravada.

    V.

    No caso dos presentes autos, os elementos de prova que foram produzidos e que não se podem desconsiderar por relevantes e fundamentais para a boa decisão da causa impõe decisão diversa da que foi tomada pela Mma. Juíz do tribunal a quo.

  4. Importa considerar o exposto na motivação para considerar os factos supra descritos como não provados: Quanto ao facto não provado descrito na Al a), b), c), d), e), i). J), k), n): “ A prova produzida nesse sentido reconduziu-se unicamente ás declarações de parte do Autor, não tendo as testemunhas inquiridas revelado conhecimento pessoal e direto de tal factualidade.” VII. Importa considerar que se deve conjugar as declarações de parte do A, com as declarações de parte do R BB e ainda da filha DD.

  5. O certo é que esta acaba por referir que pagava divida de condomínio, com valor de renda , sendo que, embora referindo, de forma pouca convincente que nada recebeu, referindo que a esta nada foi entregue, só se tivesse sido ao marido.

  6. Ora, importa tirar da conjugação de todos os elementos, para além do elemento temporal, em que o A permaneceu no apartamento mais de 8 meses.

  7. Não é de concluir que estaria todo este tempo sem nada pagar, assim como também não é de concluir que colocando uma mobília de cozinha nova, fosse esse o preço que tivesse de pagar pela renda.

  8. Uma vez que cerca de 6500 euros, daria em duodécimos uma renda de 812,50 euros por mês, em 8 meses! XII. Além do que, são os próprios réus em sede de contestação que assumem no ponto 18 da contestação a própria entrega de 300,00 euros por mês, alegadamente por princípio de pagamento do preço de venda do referido apartamento.

  9. Facto que também era com esse valor que pagava divida de condomínio conforme refere a testemunha Fátima.

  10. Desde logo e ao contrário do decidido pelo tribunal, deveria daqui ter sido extraído certidão, tanto de depoimento de parte, depoimento da testemunha DD e ainda da contestação para eventual processo crime por falsas declarações.

    Gravação nº ...20-2870924 (16.23) - Depoimento de parte BB Gravação nº ...20-2870924 Testemunha: DD XV. Ao invés decidiu o tribunal dar como não provado, facto que já deveria ter dado como assente atendendo á contestação, pelo que, deveria ter sido dado como provado os factos das al’s a), b), c) d) dos factos não provados.

    XVI.

    Quanto aos pontos e), f), h), dos factos dados como não provados: “ … a mesma resultou da ausência de prova…” XVII. Efetivamente entende-se que, para além das declarações de parte do Autor, que existe prova documental e testemunhal, considerando o depoimento do vendedor da mobília de cozinha, bem como do depoimento da testemunha eu comprou material de construção, nomeadamente daquele que se encontra dado como provado, que efetuou as obras e aplicação dos referido material.

  11. Tudo conjugado com os documentos juntos aos autos bem como das declarações de parte do Autor.

    Gravação nº ...20-2870924 Depoimento de parte AA XIX. Juntamente também se deve considerar os documentos juntos aos autos, bem como o testemunho prestado pela esposa do A.

  12. Ainda que o valor, por mera hipótese não se considerasse na globalidade como provado, pelo menos e considerando os factos provados deveria o mesmo ser considerado parcialmente provado.

  13. Bem como os vertido nos factos i), j), k), n) e o), dados como não provados, deveria ter sido dado como provados, conjugando a globalidade da prova referida, a prova documental nomeadamente as cartas enviadas e recebidas pelos Réus, que os mesmos confessam ter recebido.

  14. Bem como com a conjugação da prova testemunhal nomeadamente da testemunha EE.

  15. Para além do que, são os próprios Réus que assumem, na versão apresentada em contestação o valor de venda do imóvel, pelo que, e mais uma vez, contrariando o que antes usam para sua defesa.

    XXIV.

    É igualmente de concluir que da conjugação da prova produzida para concluir que os factos supra indicados estão provados deverão ter interpretação diversa da efetuada, e é da mesma prova que se concluiu que os restantes factos dados como não provados deveriam ter tido conclusão diversa.

  16. Considerando o Direi vertido em sentença (… transcrição de texto) Dispõe o artigo 1273.º do Código Civil que: (… reprodução do artigo).

    Estabelece, por sua vez, o artigo 1275.º do Código Civil: (… reprodução do artigo) Deste modo, as benfeitorias necessárias conferem tanto ao possuidor de boa fé como ao possuidor de má fé, o direito a ser indemnizado nos termos gerais, isto é, segundo as regras da reconstituição natural (artigos 1273º, nº 1, parte, 562º e 566º, todos do Código Civil).

    As benfeitorias úteis conferem ao possuidor de boa ou má fé o direito ao levantamento das benfeitorias, desde que tal levantamento não implique detrimento para a coisa benfeitorizada (artigo 1273º, nº 1, parte, do Código Civil).

    As benfeitorias úteis que não possam ser levantadas conferem tanto ao possuidor de boa fé como ao possuidor de má fé o direito ao valor das benfeitorias, valor calculado de acordo com as regras do enriquecimento sem causa (artigo 1273º, nº 2, do Código Civil).

    Finalmente, as benfeitorias voluptuárias apenas conferem ao possuidor de boa fé o direito ao levantamento das mesmas, desde que isso não envolva prejuízo para a coisa benfeitorizada, porque se isso decorrer do levantamento das benfeitorias voluptuárias, o possuidor de boa fé não terá nem direito ao levantamento, nem sequer a ser indemnizado (artigo 1275º, nº 1, do Código Civil). O possuidor de má fé perde, em qualquer caso, as benfeitorias voluptuárias efectuadas (artigo 1275º, nº 2, do Código Civil).

  17. Ora, no caso em apreço estamos perante benfeitorias úteis, uma vez que se trata de benfeitorias que serviram para criar condições objetivas de habitabilidade do imóvel.

  18. Sem a mobília de cozinha e respetivos eletrodomésticos, o autor não poderia habitar o imóvel em condições de usufruir daquilo que é uma habitação condigna, como poder ter agua quente, lavar loiça, cozinhar ou sequer aquecer uma simples refeição.

  19. Assim como a inexistência de fichas e tomadas, bem como ligações elétricas, sem as mesmas, inviabilizaria as condições de habitabilidade do apartamento.

  20. Tornaria praticamente impossível retirar o efeito útil do apartamento que é o fim habitacional do mesmo, pelo que, o tribunal, foi omisso ao não considerar e classificar as benfeitorias realizadas como benfeitorias uteis ao fim a que se destina o imóvel, que é poder ser habitado em condições condignas.

  21. Até porque, e conforme depoimento das testemunhas, a cozinha não tinha mobiliário nem qualquer eletrodoméstico.

  22. As obras foram realizadas antes mesmo que o A se mudasse para o começar a habitar.

  23. Pelo que...

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