Acórdão nº 4587/18.3T8VIS.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelFERREIRA LOPES
Data da Resolução19 de Janeiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Autora: Rabiscos n’Areia, Ldª; Réus: 1º Razão Pictórica, Ldª, 2ºAA, 3º BB, 4º Maria CC, 5º A... Portugal, SA, 6º DD e 7º EE A Autora instaurou a presente acção declarativa comum peticionando a condenação solidária dos RR a pagarem-lhe a quantia de 52.873,80€, por si suportado, na sequência da inspeção da Autoridade Tributária, acrescida de juros vincendos à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, e ainda da quantia não inferior a 5.000,00€ por danos morais sofridos pela A.

Fundamenta o pedido no incumprimento pela 1.ª Ré das obrigações emergentes do contrato de prestação de serviços que a ligava à A., da qual os 6.º e 7.º Réus são sócios, estes demandados por via do regime jurídico que rege a sua atividade de prestação se serviços de contabilidade. O 2º a 4º RR. – que prestavam serviços à 1ª R. -foram demandados por serem os técnicos responsáveis pela contabilidade da A. perante a Autoridade Tributária. A ação foi instaurada ainda contra a 5ª R. por garantir, por contrato de seguro, a responsabilidade civil por danos causados pelos 2.º a 4.º RR., no exercício da sua atividade.

Concretamente, alegou que a 1.ª R, através dos seus prestadores de serviços, enquadrou a atividade da A. em regime de isenção de IVA, o que levou a que a A. não tivesse cobrado IVA pela prestação dos seus serviços aos clientes, vendo-se confrontada com a obrigação de o pagar ao Estado porque, afinal, a atividade desenvolvida pela A. estava sujeita ao regime do IVA e não estava isenta como erradamente foi enquadrada; foram efetuadas correções de IRC relativas a faturas em falta nos registos contabilístico; foram considerados gastos indevidos e, por isso, corrigidos valores em sede de IRC; foram apurados gastos de viatura ligeira de passageiros considerados para efeitos de tributação autónoma; foi considerado haver infrações pelas quais foi sancionada pagando as respetivas coimas; foi compelida, por via dos valores liquidados e falta de disponibilidade financeira, a aderir ao programa Peres, suportando juros de mora e juros compensatórios e sofreu danos na imagem comercial.

Todos os RR contestaram negando os factos que lhes são imputados, tendo ainda os 1º, 5º, 6º e 7º RR excepcionado a sua ilegitimidade, excepções que foram julgadas improcedentes.

A Autora requereu a intervenção, que foi admitida, da A..., SA.

e da M..., SA.

, que também pugnaram pela improcedência do pedido da autora.

Realizada a audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que julgou a ação totalmente improcedente e absolveu todos os RR. do pedido.

Inconformada, a Autora interpôs recurso de apelação, com parcial sucesso pois que a Relação de Coimbra, por acórdão de 24.05.2022, proferiu a seguinte decisão: “…condenam a 1ª R. a pagar à A. a quantia líquida de 29.856,09, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento e a quantia que se vier a liquidar em incidente de liquidação relativamente aos danos referidos nos pontos 31, 34 e 36, resultantes do errado enquadramento da A. como isenta de IVA, nos termos supra expostos, acrescida de juros, à taxa legal, a partir da data da liquidação, até integral pagamento.

Mais condenam a 5ª R. a pagar à A. a pagar à A. a quantia líquida de 29.856,09, deduzida da franquia de 10%, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento e a quantia que se vier a liquidar em incidente de liquidação relativamente aos danos referidos nos pontos 31, 34 e 36, resultantes do errado enquadramento da A. como isenta de IVA, nos termos supra expostos, igualmente deduzida da franquia de 10%, acrescida de juros, à taxa legal, a partir da data da liquidação, até integral pagamento.

Mais condenam os 2ºs a 4º RR. a pagar a quantia de 2.985,60 correspondente a 10% da franquia sobre a quantia de 29.856,09, acrescida de juros à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento e 10% da quantia que se vier a liquidar em incidente de liquidação, relativamente aos danos referidos nos pontos 31, 34 e 36, resultantes do errado enquadramento da A. como isenta de IVA, acrescida de juros, à taxa legal, a partir da data da liquidação, até integral pagamento.

Custas pela A. e pelos 1º a 5º RR., na 1ª instância, na proporção do decaimento, fixando-se provisoriamente em 80% para o RR. e 20% para a A., fazendo-se o rateio final, após a liquidação.

Custas da apelação provisoriamente pelos 1º a 5º RR., fixando-se provisoriamente em 88% para os RR. e 12% para a A., fazendo-se o rateio final após a liquidação.” Do assim decidido, recorrem de revista os RR Razão Pictórica Lda e A... Portugal, SA.

Os Recorrentes concluem como segue as respectivas alegações: A Razão Pictórica Lda: a) (…) não pode a Recorrente conformar-se com o decidido.

  1. A questão fulcral reside em apurar se o dano invocado pela Autora é consequência de ação ou omissão por parte da Recorrente Razão Pictórica, Lda., concretamente, quanto ao enquadramento fiscal e isenção ou não de IVA da sociedade Autora, por aplicação do disposto no n.º 11 do artigo 9.º do Código do IVA.

  2. Ressalvado o devido respeito por douto entendimento contrário, ainda que se considere compreendido nos deveres da Recorrente o enquadramento fiscal da Autora, daí não advém por si só a responsabilidade da Recorrente por um eventual incorreto enquadramento.

  3. A informação prestada pela Autora à Recorrente foi a de que as explicações seriam dadas pelas sócias, diretamente aos alunos que as procurasse. Nesse prisma, o regime da isenção seria – e é – o da isenção, facto de que a Autora foi informada.

  4. Nenhum dos Réus contabilistas levantou qualquer reserva relativamente à escolha do regime de IVA, tendo em conta as informações disponíveis na Recorrente.

  5. E mesmo a inspetora tributária explicou que quando a atividade de explicações ou apoio ao estudo é exercida com carácter pessoal professor-aluno está isenta de IVA.

  6. Acresce que, assinalado o regime de isenção de IVA da sociedade Autora na declaração de início de atividade apresentada perante a Autoridade Tributária, nenhum reparo foi feito, quer no momento quer posteriormente.

  7. A tudo isto acresce a indiscutível possibilidade de várias interpretações do disposto no n.º 11 do artigo 9.º do Código do IVA, que desde logo sobressaem das informações vinculativas que foram sendo emanadas pela AT.

  8. Perante todo este circunstancialismo, a que acresce o facto de o entendimento corrente no ano de 2010 era o que as explicações e apoio ao estudo ministradas da forma que foi transmitida à Recorrente estavam isentas de IVA, nenhuma censura poderá ser feita à indicação, na declaração de início de atividade, de que a Autora se encontrava isenta de IVA.

  9. Discordando-se assim do entendimento do douto Acórdão de que era exigível à Recorrente a solicitação de informação vinculativa à AT ou, pelo contrário, seria legítima a interpretação de que a sociedade Autora se encontrava isenta de IVA.

  10. A interpretação de que a sociedade Autora se encontrava isenta de IVA foi e é legítima, não se verificando por parte da Recorrente, ainda que o ato tenha sido praticado por colaborador, cumprimento defeituoso de contrato de prestação de serviços.

  11. A interpretação de que a situação da Autora se subsumia à previsão legal de isenção de IVA, foi efetuada mediante os conhecimentos técnicos, e mediante a interpretação da lei no sentido que se julgava correto.

  12. Sendo certo que a interpretação do referido n.º 11 do artigo 9.º do Código do IVA continua a ser passível de diferentes interpretações, tanto que, como refere a douta sentença, ainda no ano de 2019 foi proferida Informação Vinculativa no processo n.º 14624 com despacho concordante da Diretora de Serviços do IVA, de 12-04-2019.

  13. Pelo que, sempre ressalvado o devido respeito, e como dá boa nota a decisão da primeira instância, não se poderá entender que houve violação de qualquer dever quer por parte da Recorrente, quer por parte dos Réus contabilistas.

  14. Por outro lado, sendo manifesta a controvérsia na interpretação do mencionado n.º 11 do artigo 11.º do Código do IVA, sempre seria sustentável a impugnação pela Autora – única com legitimidade – da decisão da inspeção tributária a que foi sujeita.

  15. Ao invés, a Autora não impugnou tal decisão, conformando-se com a mesma, antes optando por tentar imputar a terceiros a responsabilidade pelo pagamento da quantia apurada naquela decisão da inspeção tributária.

  16. Em face de tudo o exposto, parece-nos que a única conclusão que se pode alcançar é a de que não ocorreu qualquer negligência por parte da Recorrente, nem tão pouco por parte dos 2.º, 3.ª e 4.ª Réus – por cujos atos a Recorrente seria responsável.

  17. Consequentemente, e ao contrário da decisão alcançada pela Relação, não se verificou incumprimento defeituoso do contrato de prestação de serviços celebrado entre Autora e Recorrente, inexistindo assim fundamento para que a Recorrente seja responsabilizada pelo pagamento de qualquer quantia à Autora.

  18. A douta sentença violou as normas legais dos artigos 1154.º, 1156.º, 1165.º do Código Civil.

    Conclusões da A... Portugal, SA: 1. Estão em causa nestes autos danos que a Autora/Recorrida reclama, em consequência dos serviços de contabilidade prestados pela 1ªRé, sociedade prestadora de serviços de contabilidade, e pelos Réus Contabilistas Certificados (doravante CC), ao serviço daquela, tendo sido peticionada a condenação solidária de todos os responsáveis pela obrigação de indemnizar tais danos, parcialmente reconhecida por via do acórdão recorrido.

    1. A responsabilidade da Ré/Sociedade de serviços de contabilidade, fundamenta-se na sua responsabilidade contratual, com base no cumprimento defeituoso do contrato de prestação de serviços de contabilidade, que celebrou com a Autora/Recorrida (factos provados n.ºs 10 e 11), porquanto dos factos provados conclui-se que “ocorre responsabilidade contratual da 1ª A.

      por cumprimento defeituoso do contrato de prestação de serviços...

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