Acórdão nº 13304/17.4T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelPEDRO DE LIMA GONÇALVES
Data da Resolução17 de Janeiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

AA e BB intentaram ação declarativa de condenação contra Banco BIC Português, S.A., pedindo que se:

  1. Declare que a aquisição do produto financeiro traduzido na compra da obrigação SLN, ao Réu, BPN (actual Banco BIC, S.A., réu na presente acção, adquirida na agência de ..., foi levada a efeito no pressuposto de que o produto financeiro em causa se mostrava a coberto da garantia de reembolso do capital a 100% (cem por cento).

  2. Declare que é da responsabilidade do Banco BIC S.A. o reembolso do capital reportado à aquisição por parte dos Autores das obrigações SLN, no valor de €50.000,00 (cinquenta mil euros), porquanto com a transmissão do nacionalizado Banco BPN, para a esfera jurídica do Réu Banco BIC, S.A., transmitiram-se de igual modo na sua totalidade todas as obrigações emergentes dos contratos que obrigavam o BPN, independentemente de todo e qualquer acordo que o Réu Banco BIC, S.A., tenha estabelecido com o Estado Português no acto de compra ou em momento anterior, o que só lhe concede o direito de regresso a discutir entre as partes em causa (Estado Português e Banco BIC, S.A.), sendo tal acordo marginal aos aqui Autores.

  3. Condene o Réu, Banco BIC, S.A., a proceder ao imediato reembolso do capital de €50.000,00 (cinquenta mil euros), acrescidos dos juros vencidos desde 08 de Maio de 2015 sobre as obrigações SLN 2006, à taxa legal, até integral reembolso do capital, condenando ainda o Réu Banco BIC, S.A., a pagar aos Autores quantia indemnizatória a fixar em liquidação de sentença, por danos morais sofridos pelos Autores com o comportamento imputável ao Réu Banco BIC, S.A., traduzido na informação falsa prestada pelo gerente do Balcão de ... e que conduziu à presente situação e nunca inferior a €10.000,00 (dez mil euros).

E, no entendimento de que o contrato é nulo; d) Julgar-se nulo o contrato de intermediação financeira celebrado entre os Autores e Réu que deu origem à ordem de subscrição, muito antes de 08-05-2006, de obrigações SLN no valor de €50 000,00 (cinquenta mil euros) E, e) Em consequência, condenar-se o Réu Banco BIC, S.A., a restituir aos Autores o valor de €50 000,00 (cinquenta mil euros) acrescido de juros, à taxa legal, desde 08-05-2015 e até efectivo e integral pagamento.

Alegou, em síntese, que a Ré prestou informações erradas e falsas ao Autor, nomeadamente garantindo-lhe que, findo o prazo de maturidade, o capital que investira na obrigação “SLN 2006” ser-lhe-ia reembolsado na sua totalidade e que o gestor de cliente afirmou era um produto cujo capital era garantido pelo próprio Banco.

  1. Citada, a Ré veio contestar, por impugnação e por exceção, impugnando os factos alegados pelos Autores e invocando a prescrição, pugnando pela absolvição do pedido.

  2. Realizada a audiência final, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente improcedente, absolvendo a Ré do pedido 4.

    Os Autores interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa.

  3. O Tribunal da Relação de Lisboa, proferiu a seguinte decisão: “Face ao exposto acordam os juízes da secção cível em conceder parcial provimento ao recurso e, consequentemente, revogar-se em parte a sentença apelada, indo agora o réu condenado a pagar aos autores a quantia de €50.000,00, acrescida dos juros de mora sobre aquele montante, contados desde 08.05.2016 até integral pagamento”.

  4. Inconformada com tal decisão, a Ré veio interpor o presente recurso de revista, formulando as seguintes (transcritas) conclusões: 1.ª O douto acórdão da Relação de Lisboa violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 7º, 290º nº 1 alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D e 327º do CdVM e 4º, 12º, 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Directiva 2004/39/CE e 364º, 483º e ss., 563º, 628º e 798º e ss. do C.C.

    2.ª A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao Réu e o seu comportamento verif‌icado tem que ver com o facto do Tribunal considerar que, a circunstância do funcionário do Banco Réu ter assegurado ao Autor (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação f‌inanceira era um produto sem risco e com capital garantido, não transmitindo a característica da subordinação, emitindo opiniões sobre a solvabilidade da entidade emitente quando não conhecia, em concreto, a sua situação financeira, configura a prestação de uma informação falsa.

    3.ª Porém, tal realidade não configura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.

    4.ª Não adianta aliás o douto Acórdão qual o risco que associa às Obrigações SLN e que entende deveria ter sido informado aos AA, sendo que não podemos deixar de entender que se refere ao verificado incumprimento do reembolso… 5.ª O único risco que percebemos existir na emissão obrigacionista em causa é exactamente o relativo ao cumprimento da obrigação de reembolso.

    6.ª Este risco corresponde ao incumprimento da prestação principal da entidade emitente! Ou seja, corresponde ao chamado risco geral de incumprimento! 7.ª A possibilidade deste incumprimento não corresponde a qualquer especial risco inerente ao modo de funcionamento endógeno do instrumento f‌inanceiro... antes corresponde ao normal e universal risco comum a todos, repete-se... a todos, os contratos! 8.ª Do incumprimento da obrigação de reembolso da entidade emitente, em 2016, não podemos, sem mais, retirar que esse o risco dessa eventualidade fosse relevante – sequer concebível, à excepção de ser uma mera hipótese académica -, em 2006, dez anos antes! 9.ª A SLN era titular de 100% do capital social do Banco-R., exercendo, por isso o domínio total sobre este.

    10.ª O risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da SLN.

    11.ª E sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência, corresponderia, grosso modo, ao risco de solvabilidade do próprio Banco! 12.ª A segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela SLN seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no BPN.

    13.ª O risco BPN ou risco SLN, da perspectiva da insolvência era também equivalente! 14.ª A única diferença consistiu no facto do Banco ter sido resgatado através da sua nacionalização, numa decisão puramente política e alicerçada num regime aprovado propositadamente para atender a essa situação e não em qualquer quadro legal previamente estabelecido.

    15.ª A menção do dito risco praticamente inexistente, como de resto do capital garantido, não pode senão ser entendida no contexto da atribuição de uma segurança acima da média ao produto, de conf‌iança no normal cumprimento de todas as obrigações da emitente, sustentada em factos e juízo objectivamente razoáveis e previsíveis.

    16.ª A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação … 17.ª A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido! 18.ª A este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt! descreve as características de produtos f‌inanceiros, entre os quais as Obrigações, e explica a garantia de capital, exactamente nos termos que vimos de expor.

    19.ª Ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densif‌icação ou explicação aos clientes, a f‌im de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá af‌irmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave! 20.ª O Banco limitou-se a informar esta característica do produto, não sendo seu obrigações assegurar-se de que o cliente compreendeu a af‌irmação.

    21.ª A interpretação das menções “sem risco” ou de “capital...

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