Acórdão nº 01186/14.2BEAVR-A de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Janeiro de 2023
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 18 de Janeiro de 2023 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recurso para uniformização de jurisprudência interposto do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte no processo n.º 1186/14.2BEAVR-A 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada, inconformada com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 25 de Novembro de 2021 – que negou provimento ao recurso por ela interposto da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida contra a liquidação de contribuições para a Segurança Social –, dele interpôs recurso para o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto no art. 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), por alegada oposição com o acórdão proferido por este Supremo Tribunal Administrativo em 18 de Novembro de 2020, no processo n.º 2342/13.3BELRS (Disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/91481ce03f1c8f048025862c003b53a5.
), que transitou em julgado.
1.2 A recorrente apresentou as alegações de recurso, com conclusões do seguinte teor: «54. Impõe-se concluir que a análise jurídica efectuada pelo douto STA no processo 02342/12.3BELRS é a que se mostra conforme ao espírito da lei, devendo, por conseguinte, o entendimento neste preconizado, prevalecer na resolução do litígio em causa nos presentes autos.
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Assim, no caso em apreço, impunha-se considerar que os prémios pagos pela Recorrente não devem integrar a base de incidência para efeitos das contribuições da Segurança Social.
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Não o tendo feito, deve o Acórdão recorrido ser revogado, com todas as consequências legais.
Termos em que se requer a V. Exas. que admitam o presente recurso para uniformização de jurisprudência e que o julguem procedente, determinando a revogação do acórdão recorrido, com as demais consequências legais».
1.3 A Segurança Social apresentou contra-alegações, que rematou com conclusões do seguinte teor: «A.
A Recorrente pretende a admissão do Recurso Para Uniformização de Jurisprudência para o STA ao abrigo do artigo 284.º CPPT, na redacção dada pela Lei n.º 118/2019, de 17/09, contudo, não junta cópia do Acórdão em oposição, face a tal omissão de junção entende o Recorrido, nos termos do disposto do artigo 637.º, n.º 2 do CPC, ex vi artigo 2.º do CPPT, s.m.o. essa falta é insuprível, não obstante o Recorrente tenha identificado o Aresto que entende estar em contradição, nesse sentido, entende-se que não se encontrarem reunidos os pressupostos de admissão do Recurso para uniformização de jurisprudência, pelo que, deverá o mesmo ser rejeitado; Caso assim não se entenda, B.
A Recorrente interpôs recurso do Acórdão proferido pelo TCA Norte no âmbito do Processo n.º 1186/14.2BEAVR (Acórdão Recorrido), o qual negou provimento ao recurso interposto pela Recorrente contra a sentença proferida pelo TAF de Aveiro, que julgou improcedente a impugnação deduzida contra a liquidação de contribuições para a Segurança Social relativa aos períodos compreendidos entre 2008 e 2013, no montante de € 217.182,18 que têm subjacente a qualificação como “remuneração” de determinadas quantias pagas pela Recorrente aos seus trabalhadores; C. Defende a Recorrente que é na interpretação do que deve constituir o carácter regular que o Acórdão Recorrido e o Acórdão Fundamento se encontram em “vítrea oposição”; D. Mais alega a Recorrente que o Acórdão Recorrido circunscreveu esse conceito de regularidade à “frequência temporal em que se verifica o pagamento dos prémios (…)” e que o Acórdão Fundamento à “previsibilidade ou não arbitrariedade”, concluindo a final que “a análise jurídica efetuada pelo douto STA no processo n.º 02342/12.3BELRS é a que se mostra conforme ao espírito da lei, devendo, por conseguinte, o entendimento neste preconizado prevalecer na resolução do litígio em causa nos presentes autos. (…) No caso em apreço, impunha-se considerar que os prémios pagos pela Recorrente não devem integrar a base de incidência para efeitos das contribuições para a Segurança Social” e “não o tendo feito, deve o acórdão recorrido ser revogado, com todas as consequências legais”; E. Por referência ao conceito de remuneração, coloca-se, in casu, a questão de saber se as verbas pagas pela Recorrente, nos anos de 2008 a 2013, a título de “Prémios/ Prémios de Produtividade”, aos seus trabalhadores, devem ou não ser considerados como remuneração e se assim for constituir base de incidência para efeitos de contribuição para a Segurança Social; F. Ora, salvo o devido respeito, e ao contrário do que pretende a Recorrente a orientação perfilhada pelo aresto recorrido encontra-se de acordo com a orientação perfilhada pelo douto STA. Se não vejamos, G. Previamente, importa reconstituir a génese legislativa do conceito de base de incidência contributiva e de remunerações à data da publicação do Decreto-Regulamentar n.º 12/83, de 12 de Fevereiro, que se manteve com a entrada em vigor do Código Contributivo, que remonta ao Decreto n.º 45266, de 23 de Setembro, como a Lei n.º 2115, de 18 de Junho de 1962, ora o referido Decreto-Regulamentar n.º 12/83, de 12 de Fevereiro foi efetuado ao abrigo da Base XXXIII, da Lei n.º 2115, conforme consta do próprio preâmbulo, e a Lei n.º 2115 só foi revogada com a entrada em vigor da primeira Lei de Bases da Segurança Social (Lei n.º 28/84), em 14 de Setembro de 1984; H. O artigo 83.º, n.º 2 da mencionada Lei n.º 28/84 dispunha que “Mantêm-se transitoriamente em vigor as disposições complementares e regulamentares das Leis n.ºs 2115 e 2120 que não contrariem o preceituado na presente lei, bem como o regime de reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho.
”, entre as disposições regulamentares aludidas no citado preceito legal, encontram-se as do Decreto Regulamentar n.º 12/83, com as alterações introduzidas pelo Decreto Regulamentar n.º 53/83, pelo que as respectivas normas de incidência não padeciam, por esta via, de qualquer inconstitucionalidade; I. Considerando a que em diferendo se encontram os valores pagos pela Recorrente aos seus trabalhadores, sob a rubrica “prémios/ prémios de produtividade”, nos de 2008 a 2013, é forçoso atentar ao quadro jurídico vigente naquela data, ao conceito de retribuição e ao entendimento do legislador quanto à base de incidência retributiva; J. Ora o conceito legal de remuneração constante do Decreto Regulamentar n.º 12/83, aplicável à data dos factos, tinha por suporte o conceito legal de remuneração constante do CT, nas suas sucessivas versões, pois, o artigo 2.º do referido Decreto Regulamentar, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto Regulamentar n.º 53/83, de 22 de Junho, estabelecia, na parte que interessa para o efeito, que eram consideradas remunerações “as prestações a que, nos termos do contrato de trabalho, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito pela prestação de trabalho e pela cessação do contrato, designadamente: d) os prémios de rendimento, de produtividade, de assiduidade, de cobrança, de condução, de economia e outros de natureza análoga, que tenham carácter de regularidade”; K. Por sua vez, a noção de retribuição encontrava previsão no artigo 249.º do CT aprovado pela Lei n.º 99/2003, nos seguintes termos: “1- Só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho. 2- Na contrapartida do trabalho inclui-se a retribuição base e todas as prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro e em espécie. 3- Até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador”; L. Quanto aos “prémios/ prémios de produtividade”, o artigo 261.º do CT quanto às gratificações ou prestações extraordinárias concedidas pelo empregador, aqui se incluindo os prémios, entendia o legislador que não se consideravam retribuição excepto se a) essas gratificações sejam devidas por força do contrato ou das normas que o regem, ainda que a sua atribuição esteja condicionada aos bons serviços do trabalhador; b) essas gratificações, pela sua importância e carácter regular e permanente, devam, segundo os usos, considerar-se como elemento integrante da retribuição daquele; e c) essas gratificações, relacionadas com os resultados obtidos pela empresa, revistam carácter estável, quer no respectivo título atributivo, quer pela sua atribuição regular e permanente; M. Logo, afigura-se ao Recorrido que existia uma clara semelhança ente o conceito de retribuição, utilizado no CT, e o conceito utilizado no âmbito da legislação da Segurança Social, sendo que a doutrina e a jurisprudência tendem a utilizar essencialmente, quer num campo, quer no outro, os mesmos critérios para determinar a qualificação de certa quantia como retribuição, dado que tal decorre da lei. O primeiro critério salienta a ideia de correspectividade ou contrapartida negocial, i.e., é retribuição tudo o que as partes contratarem (ou resultar dos usos ou da lei para o tipo de relação laboral em causa) como contrapartida da disponibilidade da força do trabalho; o segundo critério assenta numa presunção, pois considera-se que as prestações que sejam realizadas regular e periodicamente pressupõem uma vinculação prévia do empregador e suscitam uma expectativa de ganho por parte do trabalhador, ainda que tais prestações se não encontrem expressamente consignadas no contrato (Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 11.ª edição, Coimbra); N. Veja-se, nesse sentido, o Acórdão do STJ de 15-09-2010, proc. 469/09.4, que definiu os elementos de “contrapartida da actividade do trabalhador e natureza periódica e regular da prestação” como sendo “caracterizadores e enformadores do conceito de retribuição”, e ainda que “IV- Enformando o conceito de retribuição, surgem, também, as características da periodicidade e da regularidade que, por um lado, apoiam a presunção da existência de uma vinculação prévia, e, por outro, assinalam a medida...
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