Acórdão nº 01919/17.5BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelANÍBAL FERRAZ
Data da Resolução11 de Janeiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa; # I.

A..., S.A. – Sucursal em Portugal, …, recorre de sentença, proferida no Tribunal Tributário (TT) de Lisboa, em 30 de abril de 2022, que julgou totalmente improcedente impugnação judicial, dirigida a questionar o indeferimento de reclamação graciosa, versando autoliquidação, de Contribuição sobre o Setor Bancário (CsSB), referente ao ano de 2016, no montante de € 984.489,77.

A recorrente (rte) produziu alegação e concluiu: « A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, no processo de impugnação judicial n.º 1919/17.5BELRS, no âmbito do qual se encontrava em discussão a legalidade da decisão de indeferimento proferida pela Direcção de Finanças de Lisboa sobre a reclamação graciosa apresentada pela ora Recorrente contra o ato de autoliquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário, com referência ao exercício de 2016, bem como a ilegalidade do próprio ato de autoliquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário, no montante de € 984.489,77.

  1. A Recorrente considera que a sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação do direito, tendo violado o disposto nos artigos 18.º, 49.º e 63.º do TFUE, na Diretiva n.º 2014/59/EU, nos artigos 8.º, n.º 4 e 103.º, n.º 3 da CRP, no artigo 11.º, nº 2 da LGT, bem como o disposto no artigo 100.º do CPPT.

  2. O presente recurso é dirigido ao STA, por se tratar de um recurso exclusivamente sobre matéria de direito, pois o Tribunal a quo deu como assente toda a factualidade levada aos autos pelas partes e compreendeu a situação de facto apresentada, quanto à forma de cálculo e apuramento da CSB.

  3. Com efeito, os factos em que assenta a aplicação do direito aqui em discussão nunca foram controvertidos, na medida em que a autoliquidação da CSB foi feita de acordo com e a Autoridade Tributária confirmou-o, não tendo o Tribunal a quo ficado com dúvidas sobre a forma de apuramento da referida contribuição no que respeita às sucursais, como é o caso da ora Recorrente.

  4. O Tribunal fez tábua rasa da natureza jurídica da sucursal ou estabelecimento estável e, por essa razão, não considerou ilegais, nem a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, nem o ato de autoliquidação da CSB, que como se demonstrou no presente recurso são ilegais, por ausência de facto tributário, porque consubstanciam uma situação de dupla tributação internacional e, finalmente, porque violam o princípio da não discriminação e constituem restrições injustificadas à liberdade de estabelecimento e à liberdade de circulação de capitais.

  5. Assim, o fundamento do presente recurso é o erro de julgamento de direito do Tribunal a quo na interpretação e aplicação da lei à factualidade trazida aos autos, nomeadamente no que respeita à questão da natureza jurídica da sucursal/estabelecimento estável e à questão da dupla tributação e também por errónea aplicação do Direito da União Europeia e violação da Constituição da República Portuguesa (CRP), com vista a que este Supremo Tribunal Administrativo proceda a uma melhor aplicação do direito.

  6. Senão vejamos, H. Quanto à primeira questão de saber se “o RCSB é contrário ao Direito da UE por violar a Diretiva n.º 2014/59/EU, em particular, por criar uma situação de dupla tributação e a base de incidência desta contribuição resultar de um passivo de sucursal relativamente à empresa mãe, que é uma mera ficção, já que a sucursal não tem qualquer autonomia em relação à empresa mãe” o Tribunal a quo conclui sumariamente que “Quanto à alegada situação de dupla tributação do passivo, que refere a Impugnante como tributado duas vezes, na sua esfera e na da sociedade mãe, refira-se desde já que uma situação de dupla tributação não é, em si mesma, ilegal pois mecanismos europeus e internacionais asseguram que a mesma seja atenuada ou eliminada, o que ocorre quando se trata de impostos e não se relevando, nessa sede, as contribuições (e que, aliás, tal eliminação ou atenuação da situação de dupla tributação, sempre caberia ao estado no qual é residente a sociedade mãe).

    ” I. Ora, a questão da ficção de tributação na esfera da sucursal e da consequente inexistência de passivo para efeitos de tributação em sede de CSB, não foi bem apreendida pelo Tribunal a quo, senão vejamos.

  7. Desde logo se diga que o Tribunal confirma e conforma-se com a situação de dupla tributação, pois ficou demonstrado que o “passivo” da Recorrente (sucursal) é considerado na base de incidência objetiva para o cálculo da CSB prevista no ordenamento jurídico português e também para o cálculo da contribuição paga em Espanha pela casa mãe, mas o Tribunal a quo daí não retira qualquer consequência, o que a Recorrente não pode aceitar.

  8. Com efeito, como notou a doutrina, a propósito da aprovação desde regime: “ficam excluídas as sucursais portuguesas de ICs sediadas em Estado membro da EU, bem como estas mesmas ICs, quando prestem serviços bancários em Portugal ao abrigo da liberdade de prestação de serviços. São exceções inteiramente justificadas, numa ótica de evitar a dupla tributação desta contribuição na UE” (cfr. Campos Ferreira Sá Carneiro & Associados, ob. cit. – …) L. Ainda sobre a dupla tributação o Tribunal a quo afirma que a mesma só deve ser evitada no que respeita a impostos e não a contribuições financeiras, como a CSB.

  9. Tendo o Tribunal a quo concluído que “a CSB é qualificável como uma contribuição financeira, dotada das típicas características desse tributo”, não tendo “que corresponder às “modalidades de imposto” admitidas, como pretende a Impugnante pois são um tributo diverso”, deveria ter também concluído que a dupla tributação deve ser evitada quanto a qualquer espécie de tributo e não apenas quanto aos impostos.

  10. Refere ainda o Tribunal a quo, que teria de ser o país da residência da casa mãe (sede do estabelecimento estável, i.e., Espanha) a resolver a questão da dupla tributação, mas para tal não convoca qualquer norma de direito convencional ou europeu que sustente que o ónus do afastamento da dupla tributação recai sobre o Estado Espanhol.

  11. Sobre a segunda parte desta questão decidenda, a de saber se a CSB é ilegal porque “a base de incidência desta contribuição resultar de um passivo de sucursal relativamente à empresa mãe, que é uma mera ficção, já que a sucursal não tem qualquer autonomia em relação à empresa mãe”, o Tribunal a quo não faz uma análise exaustiva do argumento, focando-se na questão da dupla tributação, mas também esse argumento devia ter sido apreciado.

  12. Com efeito, doutrina e jurisprudência são unânimes na caracterização do instituto da sucursal, como se deixou largamente expendido nas presentes alegações e já se havia exposto na petição inicial e que podemos resumir numa frase: “a sucursal não reveste personalidade jurídica, não constituindo por isso um sujeito autónomo de Direito, apesar de ter personalidade tributária”.

  13. Acresce que também os acórdãos proferidos pelo Tribunal Central Administrativo Sul, em 24/06/2008, no processo n.º 02297/08, em 28/01/2021, no processo n.º 415/05.8BELRS e em 15/04/2021, no processo n.º 1071/07.4BELRS, consideraram ilegais os actos de liquidação de IRC, por retenção na fonte, por entenderem que, afinal, os fluxos financeiros que foram considerados pelos serviços de inspecção como juros pagos a não residentes, eram afinal apenas movimentos financeiros entre uma entidade e o seu prolongamento, enquanto parte da mesma organização empresarial, sem as características necessárias para serem considerados como rendimento de capital (juros) e, por isso, não estavam sujeitos a IRC em Portugal, por retenção na fonte.

  14. Como refere PETER HOOGTERP: “(...) There are some important differences between transactions (between different enterprises) and dealings (between different parts of an enterprise). First, a permanent establishment is not in fact legally or economically separate from the rest of the enterprise of which it is a part. Second, dealings between a permanent establishment and the rest of the enterprise of which it is a part have no legal consequences for the enterprise as a whole (...)” (cfr. «Internal Interest Dealings for Financial and Non-Financial Enterprises and Art. 7 of the OECD Model Tax Convention», International Transfer Pricing Journal, IBFD, Nov-Dec 2009, p. 398 – …).

  15. Ora, o mesmo raciocínio tem de ser feito...

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