Acórdão nº 1144/21.0T8LLE-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelANABELA LUNA DE CARVALHO
Data da Resolução12 de Janeiro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Apelação 1144/21.0T8LLE-A.E1 2ª Secção Acordam no Tribunal da Relação de Évora I (…) deduziu a presente oposição à execução por embargos e por apenso aos autos de execução contra si instaurados por Banco (…), S.A..

Alega para o efeito, em síntese, a falta do título executivo porquanto não foi demonstrada a resolução do contrato de mútuo e invoca a suspensão do pagamento de capital, juros, comissões ou outros encargos prevista no Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, concluindo a final que se encontra em mera mora determinada pelas circunstâncias geradas pela pandemia covid.

Pede que, pela procedência dos embargos seja extinta a execução.

O Embargado contestou.

Alega que o contrato de mútuo foi resolvido e a Embargante interpelada para o pagamento, devendo improceder a invocada falta de título executivo.

Alega que o regime previsto no Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, não é de aplicação automática e que a Embargante nunca solicitou a adesão às medidas estabelecidas naquele diploma.

Conclui pela improcedência dos embargos.

Realizada a audiência prévia, o tribunal a quo decidiu que reuniam os autos todos os elementos para uma decisão de mérito, tendo então proferido sentença, na qual veio a julgar improcedentes os embargos de executado e, consequentemente, se determinou o prosseguimento da execução quanto à Embargante.

Inconformada com tal decisão veio esta recorrer assim concluindo as suas alegações de recurso: I . Na sua oposição à execução alegou a recorrente que a recorrida instaurou a ação executiva em causa nos presentes autos, “13. ...para pagamento coercivo da quantia total de € 104.561,36 (cento e quatro mil, quinhentos e sessenta e um euros e trinta e seis cêntimos).

  1. Montante este relativo ao capital no valor de € 97.657,78 (noventa e sete mil, seiscentos e cinquenta e sete euros e setenta e oito cêntimos) juros de mora no valor de € 2.688,04 (dois mil, seiscentos e oitenta e oito euros e quatro cêntimos), seguro multirriscos no valor de € 15,54 (quinze euros e cinquenta e quatro cêntimos) e despesas no valor de € 4.200,00 (quatro mil e duzentos euros).

  2. Alegando para tal o incumprimento, por parte da executada, das obrigações emergentes do contrato de mútuo com hipoteca celebrado com mesma e o marido (…), em 18/03/2008.

  3. Por falta de pagamento da prestação vencida em 02/10/2020, a qual, segundo o exequente, determinou o vencimento das restantes prestações, nos termos do disposto nos artigos 781.º e 817.º do CC.

  4. Juntando para o efeito cópia do referido contrato de mútuo com hipoteca como título executivo.

  5. Porém, não foi junto pelo exequente aos autos qualquer documento comprovativo da comunicação à contraparte da declaração resolutória, ou seja, o comprovativo da efetiva resolução.

  6. Bem como da receção da referida comunicação por parte da executada, ou o respetivo comprovativo do envio para o domicílio do devedor, conforme disposto no artigo 224.º, n.º 2, do CC.

  7. Elementos estes obrigatórios, quando se pretende dar à execução um contrato de mútuo garantido por hipoteca, abrangido pelo artigo 550.º, n.º 2, alínea c), do CPC.

  8. Para demonstração do exercício por parte do exequente do direito de resolução do contrato.

  9. Pelo que, não estão verificados os requisitos de exigibilidade da quantia exequenda, de acordo com o disposto no artigo 713.º do CPC, segundo o qual constituem elementos essenciais da obrigação exequenda a certeza, exigibilidade e liquidez.

  10. Não constituindo o contrato de mútuo com garantia de hipoteca só por si, sem a prova de resolução do mesmo, título executivo válido contra a embargante.” II. Na douta decisão proferida nos autos de embargos de executado, não tomou o Tribunal posição relativamente à validade do título executivo, com fundamento na falta de junção aos autos de execução, para além do contrato de mútuo, do documento comprovativo da efetivação da resolução do contrato, alegada pela recorrente no requerimento de oposição à execução.

    1. O Tribunal pronunciou-se apenas sobre a inexistência da “falta do título executivo porquanto não foi demonstrada a resolução do contrato de mútuo e invoca a suspensão do pagamento de capital, juros, comissões ou outros encargos prevista no Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, concluindo a final que se encontra em mera mora determinada pelas circunstâncias geradas pela pandemia covid.” IV. Nada dizendo quanto à matéria relativa à inexistência de título executivo alegada pela recorrente em sede de oposição à execução, nos pontos 17 a 27, nomeadamente, a falta de junção aos autos de execução, para além do contrato de mútuo, do documento comprovativo da efetivação da resolução do contrato.

    2. Violou assim a citada sentença os artigos 615.º, n.º 1, alínea d) e 608.º, n.º 2, do CPC, de cuja interpretação e aplicação decorre a necessidade de decisão sobre a totalidade dos fundamentos da oposição à execução, invocados pela recorrente.

    3. Na sequência da mencionada falta de pronúncia, incorreu a douta sentença recorrida na nulidade prevista nas supracitadas disposições legais que aqui expressamente se deixa alegada para todos os efeitos legais.

    4. Considerou o Tribunal que “não cabe à Embargada o ónus de alegar e provar que no seu sistema informático inexiste outra morada, bastando-lhe demonstrar que enviou a carta para a morada que dispõe por ser a que conta no contrato.” VIII. Com o devido respeito, não se conforma a recorrente com tal decisão.

    5. Efetivamente, para justificar o cumprimento da obrigação que sobre ela impende, concretamente, do cumprimento do dever de comunicação da resolução do contrato de mútuo, veio a recorrida alegar na contestação que remeteu a referida comunicação para a morada que consta do seu sistema informático, tendo sido a mesma devolvida por motivo “objeto não reclamado”.

    6. Nos termos do disposto no artigo 342.º, n.º 1, do CC, sob a epígrafe “Ónus da prova”, estabelece-se que “Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado”.

    7. Competindo assim à recorrida a prova dos factos que invocou, ou seja, que remeteu a comunicação para a morada constante do seu sistema informático.

    8. Pelo que, salvo melhor opinião, ao decidir que o ónus de alegar e provar que a morada para a qual foi enviada a comunicação de resolução do contrato de mútuo é a que consta do sistema informático da recorrente não cabe à recorrida, viola o Tribunal a quo o disposto no artigo 342.º, n.º 1, do CC.

    9. Em sede de embargos de executado, alegou a recorrente que devido à crise económica gerada pela pandemia, sofreram a recorrente e o marido graves problemas financeiros, com perda de parte significativa do rendimento familiar, devido ao desemprego de um dos elementos do casal, que levou a que não conseguissem cumprir atempadamente com o pagamento das obrigações a que se vincularam através do contrato de mútuo com hipoteca supra identificado.

    10. Situação que afetou não apenas a recorrente e o marido desta, atingiu grande parte da sociedade e que levou a que fossem tomadas pelo Governo medidas excecionais de apoio social e económico, para proteção quer das famílias quer das empresas, nomeadamente, medidas de proteção dos créditos das famílias, as quais contemplavam a possibilidade de suspensão do pagamento de capital, juros, comissões ou outros encargos, até dezembro de 2021, de acordo com o Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, posteriormente alterado pela Lei n.º 50/2021, de 30 de julho.

    11. Circunstância que não foi tomada em consideração pela recorrida, que, em plena pandemia e na vigência do período de suspensão do pagamento dos créditos hipotecários contraídos pelas famílias, instaurou a presente ação executiva, ignorando as medidas de proteção criadas pelo Governo, para salvaguarda das mesmas, que permitiram a deferimento do prazo de pagamento das prestações, até ao final do período de suspensão.

    12. Não se verificando, por tal motivo incumprimento definitivo por parte da recorrente, mas sim uma situação de mora, justificada pelas circunstâncias geradas pela pandemia, as quais levaram a que fossem criadas medida excecionais de proteção, para evitar precisamente o incumprimento por parte das famílias dos contratos de crédito celebrados.

    13. Em sede de exercício de direito de contraditório concedido na audiência prévia, face a tais argumentos alegados pela recorrida na contestação, que de acordo com o disposto no artigo 6.º-A da Lei n.º 8/2020, de 10 de abril, que procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março, as instituições de crédito têm o dever de divulgar e publicitar as medidas previstas, no supra identificado decreto-lei, nas suas páginas de Internet e através dos contactos habituais com os seus clientes, obrigação que a recorrida não cumpriu.

    14. Impedindo assim a recorrente de beneficiar das medidas excecionais criadas pelo Governo, para apoio à famílias, no período da pandemia e que possibilitaria o deferimento do prazo de pagamento das prestações em falta até ao final do período de suspensão.

    15. Entendeu o Tribunal que a alegação pela recorrente de tal argumento, em sede de audiência prévia, no exercício do direito de contraditório, constitui facto novo, não admitindo, por tal motivo tal alegação, acrescentando ainda que “a eventual omissão de divulgação das medidas de apoio é apenas suscetível de configurar um ilícito contra-ordenacional como previsto no artigo 6.º-A e 8.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26/3, nunca daí resultando o estabelecimento da pretendida moratória (que como já referido implicava o desencadeamento pelo devedor do respetivo procedimento)”.

    16. Os factos em causa não constituem factos novos, foram alegados no exercício do direito de contraditório, ao abrigo do disposto no artigo 3.º do CPC, relativamente ao alegado na contestação pela recorrida quanto à omissão pela executada dos procedimentos previstos no Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de março.

    17. Os referidos factos deveriam ter sido admitidos pelo...

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