Acórdão nº 865/22 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução21 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 865/2022

Processo n.º 863/22

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que é recorrente A., Unipessoal, Lda. e recorrido o B., a primeira veio interpor recurso de constitucionalidade da decisão proferida por aquele tribunal no dia 14 de julho de 2022.

Na providência cautelar em que é requerente o ora recorrido e requerida a ora recorrente, foi proferida sentença em 12 de outubro de 2017 julgando a providência improcedente. Depois de interposto recurso pela requerente e recurso subordinado pela requerida, foi comunicada pela Segurança Social a decisão de 12 de dezembro de 2017 rejeitando liminarmente o pedido de apoio judiciário formulado pela requerida em 2 de junho de 2017, com fundamento em não terem as pessoas coletivas com fins lucrativos e os estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada direito à proteção jurídica.

A requerida apresentou impugnação judicial desta decisão em 7 de março de 2018 e, por despacho de 23 de março subsequente, a impugnação não foi admitida com fundamento na sua extemporaneidade. Interposto recurso deste despacho, não foi o mesmo admitido, por despacho de 8 de maio de 2018, com fundamento na sua irrecorribilidade. Também no dia 23 de março de 2018 foi proferido despacho determinando o desentranhamento dos atos praticados pela requerida dependentes do pagamento das taxas de justiça não pagas.

Interposto recurso de apelação deste despacho pela requerida em 10 de abril de 2018, foi proferido acórdão no dia 23 de abril de 2020 no Tribunal da Relação, que deferiu parcialmente a reclamação e alterou a decisão reclamada nos seguintes termos: «Pelo exposto julga-se parcialmente procedente a apelação e decide-se: a) revogar o despacho recorrido na parte que mandou desentranhar a oposição da requerida recorrente, devendo esta ser notificada para pagamento da respetiva taxa de justiça acrescida de multa nos termos e para os efeitos dos artigos 570º e 642º do CPC, sob cominação de, não o fazendo, ser desentranhado o articulado de oposição; b) manter o despacho recorrido na parte que determinou o desentranhamento das contra-alegações da requerida recorrente e do seu recurso subordinado»

O requerente apelado interpôs recurso de revista deste acórdão para o Supremo Tribunal de Justiça, que decidiu não conhecer o recurso, por acórdão de 12 de novembro de 2020, transitado em julgado. A requerida apelante, por sua vez, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, sendo que, após outras vicissitudes processuais, regressaram os autos à Relação, tendo então a requerida apelada, por requerimento de 11 de outubro de 2022, invocado «caso julgado constitucional», em face da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, feita no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 242/2018, e pedido que a Relação faça «cumprir o disposto no artigo 282º nº 1 da Constituição, determinando, em obediência ao acórdão do TC de 7.06.2018, a anulação dos atos que determinaram o desentranhamento das peças processuais, dependentes do pagamento da taxa de justiça, assim como determinou o pagamento da taxa de justiça devida pela apresentação da oposição, considerando-se válidos e efetivos os efeitos do apoio judiciário conferido pelo "ato" de deferimento tácito de 03.07.2017; ou Quando assim não se entenda, sem conceder, considerar-se que o apoio judiciário concedido definitivamente a 21.08.2019 tem efeitos retroativos e abrange todos os atos praticados no processo, assim se devendo conformar a situação; já que o acórdão de 23.04.2020, ao não levar em linha de conta o apoio judiciário, entretanto confirmado, fica supervenientemente prejudicado, sem prejuízo da sua inexequibilidade por violar caso julgado constitucional.»

Foi então proferido despacho com o seguinte teor: «Transitadas as decisões do Tribunal Constitucional (fls 545) e esgotado o poder jurisdicional do presente Tribunal a Relação, indefere-se o requerimento de 11/11/2021. Devolva os autos à 1ª instância.» Notificada deste despacho, apresentou a requerida reclamação para a conferência, que foi então indeferida pelo referido acórdão do Tribunal da relação de Lisboa de 14 de julho de 2022, com a seguinte fundamentação:

«Para além do que já consta no relatório do presente acórdão, há que atender aos seguintes factos:

No apenso A deste processo correu termos a impugnação judicial da requerida ao despacho de 12/12/2017 da Segurança Social, de indeferimento do apoio judiciário, que não foi admitida por despacho de 23/3/2018, por extemporaneidade e, interposto recurso deste despacho em 11/4/2018, o mesmo não foi admitido por despacho de 8/5/2018, por irrecorribilidade nos termos do artigo 28º nº 5 da Lei 34/2004.

Nesse recurso, interposto a 11/4/2018, não admitido ao abrigo do artigo 28º nº 5 da Lei 34/2004, a requerida alega que a decisão de extemporaneidade do recurso assenta num pressuposto incorreto sobre a data da notificação da requerida recorrente, que não foi devidamente notificada da decisão de indeferimento do apoio judiciário, que se formou um ato de deferimento tácito do pedido de apoio judiciário, que, por acórdão do TC nº 591/2016, foi decidido que as pessoas coletivas com fins lucrativos têm direito ao apoio judiciário, que a requerida está na situação de insuficiência económica, que devem ser considerados válidos os atos praticados pela recorrente na pendência do pedido de apoio judiciário, entrando as taxas de justiça não pagas em regra de custas, que é inconstitucional a norma do artigo 24º nº 1 da Lei 3472004 por violação do artigo 20 nº 2 da CRP, interpretada no sentido de que o não pagamento da taxa de justiça após o indeferimento do pedido de AJ implica o desentranhamento dos atos praticados pela parte na pendência do procedimento do pedido de AJ e que, assim não se entendendo, deve a requerida ser notificada para pagamento das taxas em singelo, sem acréscimo de multa.

No apenso B correu termos uma reclamação deduzida pela requerida, ao abrigo do artigo 643º do CPC, do despacho que não admitiu o recurso de 11/4/2018.

Em 5/9/2018 foi proferida decisão sumária neste Tribunal da Relação, que julgou improcedente a referida reclamação de não admissão do recurso.

Em 11/12/2018 foi proferido acórdão em conferência que manteve o decidido na decisão sumária.

Em 26/12/2018 a requerida interpôs recurso deste acórdão de 11/12/2018 para o Tribunal Constitucional, com fundamento na inconstitucionalidade do artigo 28º nº 5 da Lei 34/2004, por violação do artigo 20º nº 4 da CRP, na interpretação de que a irrecorribilidade do recurso ali prevista abrange as nulidades da decisão, quando tiverem por fundamento específico a violação dos princípios básicos da igualdade e do contraditório, ou a nulidade invocada tiver influência manifesta no julgamento de mérito, por contender com a aquisição processual e factos ou com a admissibilidade dos meios probatórios.

Embora não se encontre acessível no citius a decisão proferida pelo Tribunal Constitucional no âmbito deste recurso, verifica-se do apenso B que os autos subiram ao Tribunal Constitucional e foram devolvidos ao Tribunal da Relação, que por sua vez os devolveu à 1ª instância, onde, em 25/9/2019, foi proferido despacho que apôs visto no processo e o remeteu à conta (donde se retira que se manteve o acórdão de 11/12/2018 que julgou improcedente a reclamação de não admissão do recurso interposto do despacho de não admissão da impugnação do despacho de 12/12/2017 de indeferimento do apoio judiciário).

Em 21/08/2019 foi proferido despacho pela Seg. Social que deferiu o pedido de apoio judiciário da requerida na modalidade de dispensa da taxa de justiça e demais encargos com o processo.

No apenso D foi este despacho da Segurança Social impugnado judicialmente pelo requerente apelado e a impugnação foi julgada procedente por despacho de 21/10/2019, que julgou nula a decisão da Segurança Social, com fundamento na total omissão de fundamentação.

A decisão de nulidade da decisão da Segurança Social foi mantida por despacho de 20/11/2019, que julgou improcedente a arguição de nulidade apresentada pela requerida.

O acórdão de 23/4/2020 que julgou o recurso de apelação deste apenso C e que agora é objeto de impugnação pela requerida, pronunciou-se, nos seguintes termos sobre a questão prévia suscitada pela requerida apelante, da superveniente decisão de 21/8/2019 da Segurança Social que concedeu apoio judiciário à requerida apelante:

"Tendo sido concedido o apoio judiciário à requerida já depois do despacho recorrido, depois da decisão singular ora reclamada e também depois da reclamação da decisão singular para a conferência e da respetiva oposição, pretende a requerida reclamada que fiquem prejudicados os ulteriores termos do processo, o que pressuporia a aplicação desta decisão de concessão de apoio judiciário às taxas de justiça não pagas anteriormente, devidas pela oposição à providência, contra-alegações e recurso subordinado.

Porém, como decorre do artigo 18º nº 2 a) da LAJ, o pedido de apoio judiciário deve ser formulado antes da primeira intervenção processual, exceto se a situação de insuficiência económica for superveniente, caso em que deve ser requerido antes da primeira intervenção processual que ocorra após o conhecimento da situação de insuficiência económica, do que se conclui que o deferimento do apoio judiciário tem de ser sempre para futuro, não assumindo assim relevância esta última decisão da Seg. Social para afastar os efeitos cominatórios do não pagamento das taxas de justiça anteriores, que são as taxas objeto do presente recurso e cujo não pagamento deu lugar ao despacho recorrido.

De qualquer forma, no âmbito da impugnação judicial interposta pelo requerente reclamante a esta decisão da...

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