Acórdão nº 2687/20.9T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelCRISTINA NEVES
Data da Resolução13 de Dezembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relator: Cristina Neves Adjuntos: Teresa Albuquerque Falcão de Magalhães Acordam os Juízes na 3ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra RELATÓRIO S..., S.A., AA, BB, e CC, intentaram acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra os réus P..., Lda.

e DD, pedindo a sua condenação solidária a pagar a cada um dos AA. a quantia de € 10.000,00, por ofensas à sua honra e consideração.

Para tanto, alegam que a sociedade ré e o réu, sócio gerente da sociedade ré, prestaram, para a sociedade autora, os seus serviços de revisão de contas, ao longo de vários anos, tendo entre 2013 e 2016, efectuado denúncias de factos que sabiam serem falsos ao M.P. e às ordens profissionais dos AA., originando processos disciplinares que vieram a ser arquivados e processos-crime, que vieram a terminar por absolvição dos arguidos cerca de seis anos depois, tendo sofrido danos por culpa dos RR.

* Regularmente citados, os RR. deduziram acusação invocando a excepção de ilegitimidade passiva da 1ª R., a excepção de prescrição pelo decurso do prazo previsto no artº 498 nº1 do C.C. e, por impugnação, alegando a veracidade dos factos denunciados e o cumprimento do dever legal do ROC de denúncia destes factos e ainda que uma participação crime não pode constituir um ilícito gerador de responsabilidade aquiliana, por se traduzir no exercício de um direito consagrado constitucionalmente e de um dever imposto ao ROC.

* Dispensada a audiência prévia, fixou-se o valor da causa e proferiu-se despacho saneador, no qual se julgou improcedente a excepção de ilegitimidade passiva da 1ª R. e a excepção de prescrição.

Definiu-se o objecto do litígio e elaboraram-se temas de prova.

* Realizou-se audiência de discussão e julgamento, com observância do formalismo legal, após o qual se proferiu sentença que absolveu os RR. do pedido.

*** Não conformados com esta decisão impetraram os AA. recurso da mesma, formulando afinal, as seguintes conclusões: 1. Os Autores instauraram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra os réus P..., Lda., contribuinte nº ..., com sede na Rua ..., ... Coimbra e DD, revisor oficial de contas, contribuinte nº ..., residente na Urbanização ... ..., ... Coimbra. De facto, 2. A sociedade ré, que tem por objecto a “revisão legal de contas, auditoria às contas e os serviços relacionados de empresas e outras entidades, bem como o exercício de outras funções que a lei exija a intervenção própria e autónoma de revisores oficiais de contas”, e o réu, sócio gerente da sociedade ré, prestaram, para a sociedade autora, os seus serviços de revisão de contas, ao longo de vários anos e, sendo, a Ré, à data uma sociedade Unipessoal, detida, em absoluto, o seu capital social, pelo aqui Réu, eram, ainda, membro do Conselho Fiscal eleito para o período de 2011 a 2013 na sociedade Autora.

  1. Os réus remeteram ao Departamento de Investigação e Acção Penal de Coimbra, uma participação crime, alegando a existência de, segundo os próprios, “factos indiciadores de cometimento de Crimes Públicos”.

  2. Também fizeram seguir, para a Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, participação contra o autor BB, que foi objecto de análise, resposta, e consequente decisão de arquivamento; 5. Fizeram, ainda, seguir participação contra o autor CC, na Ordem dos Advogados, em 2 de Janeiro de 2016, que foi objecto de análise, resposta e, por fim, decisão de arquivamento.

  3. Da leitura da participação-crime e das participações disciplinares, completamente infundadas, como bem sabem os réus, resultam que se encontraram denunciados factos subsumíveis, em abstracto, nos crimes de fraude na obtenção de subsídios e de fraude fiscal, pelo que, no âmbito do inquérito criminal que correu termos sob o nº 1819/13...., foi a queixa-crime remetida à Directoria do Centro da Polícia Judiciária e ao Director Distrital de Finanças de Coimbra, para que fizessem investigações.

  4. E, no âmbito do mesmo processo crime, foi, o réu, a 6 de Dezembro de 2013, inquirido, mantendo tudo o já alegado em sede de participação crime.

  5. E, a 12 de Dezembro de 2013, remeteu aos autos criminais, uma exposição da sua versão dos factos, mais uma vez, imputando a prática dos crimes aos aqui autores. E, a 24 de Julho de 2014, remeteram, os réus, ao mesmo processo crime, aquilo que apelidaram de “alegações de novos factos”.

  6. Por força da invenção dos aqui réus, a representante do Ministério Público, acabou por, a 13 de Dezembro de 2016, acusar os autores do crime de falsificação de documento.

  7. Por força da actuação infundada e ilícita e culposa dos aqui réus, os autores viram correr contra si um processo crime, que durou 6 anos, e, bem assim, processos disciplinares, nas respectivas ordens profissionais.

  8. Processo-crime onde o réu prestou testemunho, continuando a acusar os autores e, bem assim, não satisfeito, ainda dirigiu vários escritos ao processo.

  9. Todos os processos vieram a ser arquivados, com a absolvição dos aqui autores, seja em sede disciplinar, seja no Tribunal de primeira instância, seja no Tribunal da Relação de Coimbra.

  10. Por força da invenção dos aqui réus, e para além do processo crime e dos processos disciplinares, também diversos jornais se interessaram pelo assunto e deram foro de primeira página às imputações dos réus, nomeadamente do 2º réu.

  11. Durante seis anos, os autores tiveram sobre as suas “costas” os processos acima referidos e o confronto com as notícias dos jornais, nas quais algumas vezes o próprio 2º réu prestava “informações”.

  12. Durante mais de um ano, os autores tiveram que se apresentar no julgamento que corria no Tribunal ... e, aí, assumir o lugar de arguidos, sujeitos a todas as pressões, humilhações e desgastes, com acompanhamento do mesmo, nomeadamente, pela comunicação social.

  13. Em consequência da conduta dos réus, os autores sofreram danos patrimoniais e não patrimoniais, cuja indemnização pretendem.

  14. Pelo exposto, entenderam e entendem que devem os réus ser condenados, solidariamente, a pagar aos autores, para reparação dos danos que os actos dos réus lhes causaram, as seguintes quantias, acrescidas de juros, devidos desde a citação dos mesmos, até efectivo e integral pagamento: ` o À sociedade S..., S.A., a quantia de 10.000,00 €; o A AA, a quantia de 10.000,00 €; o A BB, a quantia de 10.000,00 €; o A CC, a quantia de 10.000,00 €.

  15. O Tribunal há de formar a sua convicção, para a determinação da matéria de facto dada como provada, nos factos admitidos por acordo das partes, no teor dos diversos documentos juntos aos autos, nas declarações de parte dos autores e do réu, bem como no depoimento das testemunhas inquiridas.

  16. Ora, da prova produzida nos autos, impõe-se proceder à alteração da resposta à matéria de facto do Tribunal de 1.ª Instância. Em concreto, 20. Importa dar como não provado, ao contrário do entendimento do Tribunal de Primeira Instância: 11. “Em Março de 2013, o réu tratou de emitir a certificação legal de contas da primeira autora, referentes ao ano de 2012 e, por intermédio da auditora, sua colaboradora, Dr.ª EE, deu-se conta de factos que constam da participação remetida à Ordem dos Revisores Oficiais de Contas.

  17. De imediato, no cumprimento dos seus deveres profissionais, tratou de reunir com o conselho de administração da primeira autora, alertando os respectivos membros das irregularidades detectadas.

    Porém, a primeira autora não atendeu aos seus reparos e decidiu apresentar as contas para aprovação aos respectivos accionistas.

  18. O réu DD procurara já contactar o FF, admitindo que este, na qualidade de representante do principal accionista da autora sociedade (a Diocese ...) pudesse chamar à razão o autor AA. No entanto, tal não surtiu o referido efeito.

  19. O réu DD também contactou o POPH, em 2 de Abril de 2013, com o objectivo de ver esclarecidas as dúvidas já referidas e poder emitir a certificação legal de contas de 2012. Com base na informação fornecida, o réu DD entendeu que a primeira autora pedira subsídios com base em valores de vencimentos pagos aos seus trabalhadores que não eram verdadeiros - que a primeira autora registou na sua contabilidade custos com pessoal superiores aos que efectivamente suportou e com este erro levou o POPH a pagar-lhe mais em subsídio do que o devido.

  20. Não concordando com o parecer, por não responder ao problema que suscitou, foi pedido novo parecer, tendo os autores diligenciado inclusivamente para que o jurista estivesse presente na assembleia geral de 6 de Maio e respondesse a todas as dúvidas.

  21. Na assembleia geral da primeira autora, realizada a 08/04/2013, com continuação a 06/05/2013, destinada a aprovar as referidas contas de 2012, o réu DD, estando presente, informou os accionistas de que iria participar os factos em causa ao Ministério Público – até porque entendia que o parecer, subscrito pelo Dr. GG (constante do doc. ... junto com a p.i.), trazido à reunião pelos autores para suportar uma eventual aprovação das contas, entre outras questões, não tratava das questões relativas às irregularidades junto do POPH.

  22. Os réus solicitaram ao Professor Dr. HH um parecer sobre as questões em causa, parecer que corroborou o entendimento do réu.

  23. Um parecer da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas de 25/09/2017 corroborou o entendimento do réu relativo às irregularidades, inclusive com implicações fiscais, que o réu entende que os autores praticaram.

  24. Também a Autoridade para as Condições de Trabalho, em 28 de Abril de 2014, se pronunciou no sentido do entendimento do réu relativamente à redução dos vencimentos dos trabalhadores da ré sociedade.

  25. O Revisor Oficial de Contas que substitui o réu, e que não colocou reservas à certificação legal de contas da autora sociedade relativa ao ano de 2013, foi sancionado disciplinarmente pela OROC, na medida em que “(...) deveria ter adotado uma posição mais prudente em relação à existência ou não de indícios de fraude (...)” - tendo-lhe sido aplicada uma pena de multa no valor de €1.500...

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