Acórdão nº 783/20.1T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelALEXANDRA VIANA LOPES
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

As Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam no seguinte: ACÓRDÃO I.

Relatório: Na presente ação de anulação de deliberações sociais, sob a forma de processo comum, movida por AA contra E..., L.da: 1.

O autor, por petição inicial de 04.02.2000, dirigida ao Juízo Central Cível ...: 1.1.

Pediu:

  1. Que fosse declarada nula ou anulável a deliberação social constante da ata nº...2, que aprovou a sua destituição do cargo de gerente da sociedade ré, bem como declarados inválidos e sem efeito todos os atos praticados e que se tivessem produzido ou viessem a produzir em resultado daquela deliberação, designadamente a nomeação para gerente de BB.

  2. Que, em consequência da ilicitude da deliberação de destituição, fosse investido no cargo de gerente da sociedade ré, condenando-se esta a pagar-lhe as remunerações mensais que deixou de auferir desde a data da sua destituição até à efetiva reintegração no cargo de gerente, no montante mensal de € 3.100,00, acrescidos do montante em dinheiro de € 1 000,00.

  3. Que, subsidiariamente, fosse reconhecida a falta de justa causa na destituição do cargo de gerente da ré e fosse esta condenada a pagar-lhe a indemnização prevista no artigo 257º/7 do C. S. Comerciais, no valor de € 229 600,00, acrescido dos juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento.

    1.2.

    Como fundamento dos pedidos, em síntese: 1.2.1.

    Alegou, como enquadramento geral (arts.1º a 9º da petição inicial):

  4. Que é sócio da ré com uma quota correspondente a 33, 33% e que o art. 4º do contrato de sociedade incumbiu a gerência aos três sócios, sendo necessária a intervenção dos três para obrigar a sociedade.

  5. Que foi convocado, por notificação judicial avulsa, para uma assembleia em que a ordem de trabalhos integrava: a sua destituição como gerente nos termos do art.257º/1 e 2 do C. S. Comerciais; a nomeação de nova gerente; a alteração do art.4º do contrato de sociedade, nos termos indicados; outros assuntos de interesse geral.

  6. Que não esteve presente na assembleia, nem se fez representar, tendo tido conhecimento da ata da mesma (nº...2) a 08.01.2020, altura em que teve conhecimento da sua destituição como gerente e dos factos que fundamentaram a sua destituição com justa causa.

    1.2.2.

    Alegou, como fundamentos da anulabilidade da deliberação de destituição (arts.24º a 32º da petição inicial): que não constavam da convocatória os factos que integravam os comportamentos e as condutas que lhe foram imputados, com base nos quais veio a ser destituído por justa causa, o que considera abusivo, ilegal e fundamento de anulabilidade.

    1.2.3.

    Invocou e alegou, como fundamentos da nulidade da deliberação de destituição, a violação do art.4º do contrato de sociedade, que atribui ao autor um direito especial à gerência, face ao qual apenas poderia ser destituído por justa causa e por via judicial ou por alteração prévia do contrato de sociedade, não estando a destituição, por natureza, sujeita a deliberação dos sócios (arts.13º a 16º da petição inicial).

    1.2.4.

    Impugnou os factos constantes da ata nº...2 como fundamento da justa causa da destituição e alegou factos com vista a justificar alguns dos comportamentos que lhe foram imputados:

  7. Quanto aos factos em geral: impugnou-os (arts.10º-1ª parte, 17º, 23º-1ª parte, 65º da petição inicial) e defendeu que os atos surpresa que lhe foram imputados, ainda que fossem verdadeiros, não levariam a qualquer prejuízo patrimonial ou para a própria imagem da ré, sendo pormenores que poderia justificar e atualizar nos serviços administrativos da ré se esta permitisse, nem implicariam justa causa de destituição (arts.23º-2ª parte, 80º a 82º, 84º da petição inicial).

  8. Quanto às imputações feitas em especial como fundamento da deliberação de destituição de gerente por justa causa nos pontos 1 a 8 da ata: b1) No que se refere à falta de entrega no escritório da empresa de talões dos depósitos em cheque e em numerário realizados (para que se pudesse fazer o acerto com as contas dos clientes) e à falta de realização das conciliações de pagamentos: __ Impugnou de forma simples e motivada a imputação (arts.33º a 35º, 38º, 46º e 47º da petição inicial).

    __ Alegou, em exceção: que, após o tempo de ausência de uma trabalhadora da ré entre 2018 e 2019, só pôde fazer os acertos da conta corrente quando esta regressou em 2019 (arts.36º a 42º da petição inicial); que nunca ninguém da ré o alertou da necessidade de realizar as conciliações ou alegou que tal estava a ser reclamado pelos clientes ou perturbava o funcionamento da empresa (art.43º da petição inicial); que, numa das operações de conciliação que estava a fazer com a trabalhadora, esta foi impedida pelo sócio CC de o continuar a fazer, sócio que mais tarde a veio a proibir também de realizar essas operações; que apenas ficaram por realizar três ou quatro conciliações e, face aos referidos impedimentos, respeitantes aos clientes indicados na ata nº...2 (arts.34º e 45º da petição inicial), clientes em relação aos quais alegou que a A...

    tinha problemas de contabilidade (arts.48º a 50º da petição inicial), que a cliente 840 – B...

    tinha uma dívida com a ré que ficaria saldada em acerto de contas por o próprio ter um automóvel a reparar na sua oficina (arts.53º e 54º da petição inicial), que a cliente V...

    era um bom cliente e pagaria a sua dívida insignificante de € 72, 58, conforme já há muito informara a ré (art.55º da petição inicial).

    b2) No que respeita à má-imagem causada à ré pelos comportamentos imputados ao autor: impugnou o facto (arts.51º e 52º da petição inicial).

    b3) No que se refere às suas despesas: impugnou que a ré tivesse deliberado a entrega semanal dos comprovativos de despesas e que não os tivesse entregado e afirmou que sempre poderiam ser verificadas no extrato bancário do cartão as despesas em relação às quais foi imputado a falta de comprovativos (arts.56º e 58º da petição inicial); alegou que sempre usou este procedimento há mais de 15 anos (de entregar as despesas quanto fosse solicitado), sem que a ré ou os seus sócios alguma vez o tivessem questionado (art.57º da petição inicial).

    b4) No que respeita à falta de rotinas de trabalho: impugnou os factos (arts.58º a 61º da petição inicial).

    b5) No que se refere ao processo de contraordenação: impugnou o facto (arts.62º a 64º da petição inicial).

    1.2.5.

    Defendeu o abuso de direito da fundamentação da justa causa de destituição (ao concluir que «Em concreto, nunca a destituição do cargo de gerente possa revelar justa causa, o que foi abusivamente invocado na deliberação constante da ata nº...2 e a fere de abuso de direito» e «Assim, ainda que (…) se possa entender que (…) a assembleia geral da Ré tinha a possibilidade legal de destituição de gerente do A. (…), nunca a mesma poderia, com base nos factos que constam da ata nº...2, ser fundamentada em justa causa» (arts.87º e 88º da petição inicial), sem indicar expressamente o efeito decorrente do mesmo e por si pretendido, defesa essa no âmbito da qual alegou: que a sociedade sempre apresentou resultados positivos (art.69º da petição inicial); que tem experiência de vários anos, foi sempre zeloso, cumpridor e considerado pelos clientes (art.70º da petição inicial); que até à data em que os sócios se incompatibilizaram nunca foi feito qualquer reparo à sua forma de trabalhar (art.71º/1ª parte da petição inicial); que aguardou o regresso da trabalhadora DD para fazer os acertos das contas dos clientes e que foi a própria gerência da ré quem o impediu de realizar com a mesma a conferência e a conciliação dos movimentos em falta (arts.83º, 85º a 86º da petição inicial); que os sócios gerentes EE e CC pretenderam beneficiar pessoalmente a mulher daquele como nova gerente (que nada sabe da atividade e dos clientes), afastando-o da gerência da sociedade apenas com o intuito de poderem manipular a empresa a seu belo prazer e com vista a prosseguirem interesses pessoais (arts.22º, 71º/2ª parte a 74º, 79º da petição inicial), após contexto de dissensões desde 2018 e de tentarem comprar a sua quota sem sucesso (arts.18 a 22º da petição inicial); que os gerentes atuais estão a prejudicar intencionalmente os interesses patrimoniais da ré/sociedade (arts.77- 1ª e 78º parte da petição inicial).

    1.2.6.

    Invocou e alegou também, como fundamento dos pedidos b) e c) referidos em I- 1.1. supra: o prejuízo causado pela sua destituição, face aos rendimentos que indica que deixou de auferir, estando contratado um novo funcionário para a sua antiga zona de Trás-os-Montes (arts.66º a 68º, 75º, 76º, 77º-2ª parte da petição inicial); as operações de contabilização dos valores pedidos nos pedidos b) e c) (arts.89º a 92º da petição inicial).

    1. A ré apresentou contestação, na qual: 2.1.

    Defendeu-se por exceção, invocando: a exceção dilatória de incompetência em razão da matéria; a exceção perentória de caducidade, defendendo que caducou o direito de anulação, uma vez que a assembleia ocorreu a 2 de janeiro de 2020, o prazo de instauração da ação era de 30 dias (art.59º/2-a), b) e c) do C. S. Comerciais; art.298º/2 do C. Civil) e a ação entrou no Tribunal a 4 de fevereiro de 2020.

  9. Defendeu que, face ao contrato de sociedade, não existe qualquer direito especial à gerência previsto nos arts.24º/1 e 257º/3 do C. S. Comerciais.

  10. Defendeu a justa causa da destituição, alegando, em referência aos temas da justa causa indicados na ata nº...2, os factos respeitantes aos mesmos.

    1. O autor, em 25.02.2020, pronunciou-se quanto: à exceção de incompetência; à exceção de caducidade, defendendo que, não constando da ordem de trabalhos os factos que lhe eram imputados e apenas tendo tido conhecimento dos factos novos a 09.01.2020, quando recebeu a ata nº...2 enviada a 08.01.2020, apenas se pode contar o prazo de caducidade desde aquela data de 09.01.2020, sendo a ação tempestiva nos termos do art.59º/2-b) do C. S. Comerciais.

    2. A 4 de setembro de 2020 foi proferido despacho, que: julgou verificada a exceção de...

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