Acórdão nº 1985/17.3T8GMR.G1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelVIEIRA E CUNHA
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Notícia Explicativa Break Point – Comércio Serviços e Gestão, SA, propôs a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra Banco BIC Português, SA, peticionando a condenação deste a pagar-lhe a quantia de € 100.000,00, a título de reembolso do capital investido em obrigações “SLN 2006” e competentes juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal em vigor até efectivo e integral pagamento ou, se assim não for entendido, seja declarado nulo qualquer contrato de adesão que traduza a aplicação pela autora da referida quantia, declarado ineficaz em relação à autora qualquer aplicação financeira relativa a tal quantia que a Ré tenha efectuado, condenando-se esta a restituir os € 100.000,00 e juros vencidos e não pagos, acrescido de juros vincendos, desde a data da citação e até integral pagamento.

Alegou ter, no dia 12 de Dezembro de 2007, por sugestão da sua gestora de conta, subscrito obrigações “SLN 2006”, apresentadas como um produto em tudo idêntico a um depósito a prazo, com melhores taxas de juro, investindo a quantia de € 100.000,00 (cem mil euros) na sequência da garantia dada pela gestora de que o retorno daquele valor era garantido, podendo proceder-se ao seu resgate a todo o tempo. Invocou ainda que só quando surgiram as notícias sobre a nacionalização do BPN foi informada das reais características da aplicação financeira, sendo que a Ré jamais lhe entregou qualquer documento a titular a subscrição em causa, acrescentando que esta em tempo algum lhe leu, explicou ou entregou qualquer contrato relativo às obrigações “SLN 2006”. Tentou resgatar o capital investido nas datas de vencimento destas obrigações, sem sucesso até à presente data. Por fim, alegou que se lhe tivesse sido explicada a natureza e o risco das obrigações em causa, nunca as teria subscrito.

O Réu contestou, invocando as excepções da incompetência territorial e da prescrição do direito que a A. pretende fazer valer na presente acção.

No mais, alegou a ausência de risco das obrigações subordinadas à data da sua subscrição, a inexistência de qualquer dever de advertência para com o investidor da possibilidade de insolvência da entidade emissora das obrigações, a imprevisibilidade da nacionalização parcelar do grupo a que pertencia o BPN e consequente alteração das circunstâncias que presidiram à prestação da informação à A. na data da subscrição.

Por fim, invocou que o BPN nunca assumiu a obrigação da devolução do capital investido, tendo apresentado o produto financeiro como sido emitido pela SLN SGPS, SA, a quem competia a entrega do capital e dos juros, não havendo a registar a violação de qualquer dever legal de informação relativamente à A. Concluiu pela procedência das excepções invocadas e, caso assim não se entendesse, pela improcedência da acção.

As Decisões Judiciais No despacho saneador, foi relegado para decisão final o conhecimento da prescrição do direito da Autora.

Na sentença, foi julgada a acção procedente e consequentemente condenado o Réu a pagar à Autora a quantia de € 100.000,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data de 09 de Maio de 2016 e até efectivo e integral pagamento.

Tendo o Réu recorrido de apelação, a Relação confirmou a decisão antes proferida.

Inconformado, o Réu recorre agora de revista excepcional, admitida pela Formação deste S.T.J. à luz das normas do artº 672º nº1 als.a) e c) CPCiv, sumariando aquela revista com as seguintes conclusões: 1. O douto acórdão da Relação de Guimarães violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 7º, 290º nº 1 alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D e 327º do CdVM e 4º, 12º, 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Directiva 2004/39/CE e 364º, 483º e ss., 563º, 628º e 798º e ss. do C.C.

2. A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao Réu e o seu comportamento verificado tem que ver com o facto do Tribunal considerar que a circunstância do funcionário do Banco Réu ter assegurado ao Autor (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação financeira era uma produto sem risco e com capital garantido, configura a prestação de uma informação falsa.

3. Porém, tal realidade não configura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.

4. Não adianta aliás o douto Acórdão qual o risco que associa às Obrigações SLN e que entende deveria ter sido informado ao A, sendo que não podemos deixar de entender que se refere ao verificado incumprimento do reembolso… 5. O único risco que percebemos existir na emissão obrigacionista em causa é exactamente o relativo ao cumprimento da obrigação de reembolso.

6. Este risco corresponde ao incumprimento da prestação principal da entidade emitente! Ou seja, corresponde ao chamado risco geral de incumprimento! 7. A possibilidade deste incumprimento não corresponde a qualquer especial risco inerente ao modo de funcionamento endógeno do instrumento financeiro... antes corresponde ao normal e universal risco comum a todos, repete-se... a todos, os contratos! 8. Do incumprimento da obrigação de reembolso da entidade emitente, em 2016, não podemos, sem mais, retirar que esse o risco dessa eventualidade fosse relevante – sequer concebível, à excepção de ser uma mera hipótese académica -, em 2006, dez anos antes! 9. A SLN era titular de 100% do capital social do Banco-R., exercendo, por isso o domínio total sobre este.

10. O risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da SLN.

11. E sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência corresponderia, grosso modo, ao risco de solvabilidade do próprio Banco! 12. A segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela SLN seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no BPN.

13. O risco BPN ou risco SLN, da perspectiva da insolvência era também equivalente! 14. A única diferença consistiu no facto do Banco ter sido resgatado através da sua nacionalização, numa decisão puramente política e alicerçada num regime aprovado propositadamente para atender a essa situação e não em qualquer quadro legal previamente estabelecido.

15. A menção do dito risco praticamente inexistente, como de resto do capital garantido, não pode senão ser entendida no contexto da atribuição de uma segurança acima da média ao produto, de confiança no normal cumprimento de todas as obrigações da emitente, sustentada em factos e juízo objectivamente razoáveis e previsíveis.

16. A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação… 17. A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido! 18. A este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt! descreve as características de produtos financeiros, entre os quais as Obrigações, e explica a garantia de capital, exactamente nos termos que vimos de expor.

19. Ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densificação ou explicação aos clientes, a fim de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá afirmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave! 20. O Banco limitou-se a informar esta característica do produto, não sendo seu obrigações assegurar-se de que o cliente compreendeu a afirmação.

21. A interpretação das menções “sem risco” ou de “capital garantido” não é susceptível de ser feita apenas com recurso à impressão do destinatário, nos termos do previsto no artº 236º do CCiv. uma vez que esta disposição aplica-se, apenas e só, às declarações negociais.

22. A comercialização por intermediário financeiro de produto com a indicação de que o mesmo tem “capital garantido” não implica a corresponsabilização do referido intermediário pelo prejuízo decorrente da...

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