Acórdão nº 3238/17.8T8LRA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelVIEIRA E CUNHA
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Notícia Explicativa AA e mulher BB intentaram a presente acção, com processo declarativo e forma comum, contra Banco Bic Português, S.A., pedindo a condenação do Réu a pagar-lhes o valor do capital e juros vencidos e garantidos, no montante de € 57.000,00 à data da instauração da acção, a que acrescem os juros vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Subsidiariamente pediram a declaração de nulidade de qualquer eventual contrato de adesão que o réu invoque para ter aplicado os € 50.000,00 que os autores lhe entregaram em obrigações subordinadas SLN 2006; que seja declarada ineficaz em relação aos autores a aplicação que o réu tenha feito desse montante; e que o réu seja condenado a restituir aos autores € 57.000,00 que ainda não receberam dos montantes que entregaram ao réu e de juros vencidos à taxa contratada, acrescidos de juros legais vincendos, desde a data da citação até efetivo e integral cumprimento.

Cumulativamente pediram a condenação do réu a pagar-lhes a quantia de €3.000 a título de dano não patrimonial e a condenação do réu no pagamento das custas e demais encargos legais.

Alegaram serem clientes do Banco Português de Negócios, S.A., na agência de ... - ..., onde movimentavam parte dos seus dinheiros, realizavam pagamentos e efectuavam poupanças.

Em 27 de Abril de 2006 o gerente da agência disse ao Autor que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo e com capital garantido pelo BPN e com rentabilidade assegurada.

O dito funcionário do Banco sabia que o autor não possuía qualificação ou formação técnica que lhe permitisse à data conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente, e que tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro.

Sucede que o seu dinheiro – € 50.000,00 – veio a ser colocado em obrigações SLN 2006, sem que os autores soubessem em concreto o que constituía tal produto financeiro.

O Autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, um produto com risco exclusivo do Banco.

Se o autor tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações SLN 2006, produto de risco, e que o capital não era garantido pelo BPN, não o autorizaria.

Os juros foram sendo semestralmente pagos, o que transmitiu segurança aos Autores e nunca os alertou para qualquer irregularidade, face ao que tinha sido dito ao autor pelo referido gerente da agência.

Em Novembro de 2015 o Banco réu deixou de pagar os juros respetivos, atribuindo a responsabilidade pelo pagamento à SLN, entidade que os autores nem sabiam existir.

Os autores não foram informados sobre a compra das obrigações subordinadas SLN 2006.

Nunca qualquer contrato lhes foi lido nem explicado, nem entregue cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações subordinadas SLN, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelos autores; e nem nunca conheceram os autores qualquer título demonstrativo de que possuíam obrigações SLN, não lhes tendo sido entregue o documento correspondente.

Tais eventuais documentos a existirem só podem ser contratos de cláusulas gerais, cujas assinaturas feitas, nas condições supra descritas, não têm validade, por os contratos serem nulos.

Sendo nulas as cláusulas principais e essenciais, é nulo todo o negócio, nos termos dos artigos 5º e seguintes do D-L n.º 446/85, de 15/10.

Na data de vencimento contratada o réu não lhes restituiu o montante que os autores lhe confiaram.

O Réu não tem cumprido o pagamento dos juros acordados, uma vez que contrataram uma taxa de 4,5% ao ano ilíquida e foram pagos juros na ordem de 1% desde Maio de 2009 e até novembro de 2015.

Com a sua actuação, o réu colocou os autores num permanente estado de preocupação e ansiedade.

O Banco Réu contestou, alegando a prescrição do direito invocado pelos autores, argumentando que qualquer direito sobre o intermediário financeiro por eventual responsabilidade em transação em que haja intervindo prescreve no prazo de 2 anos a contar do conhecimento da conclusão da operação.

Mais alegou ser qualquer obrigação um produto tendencialmente conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente, ao que acrescia, no caso concreto, o facto de a entidade emitente ser “mãe” do Banco, sendo este necessariamente, um garante da solvabilidade daquela, por ser o principal ativo do seu património.

Dificilmente haveria um produto financeiro tão seguro com a subscrição daquelas obrigações, pelo que o risco de um depósito a prazo seria semelhante a uma tal subscrição, sem prejuízo do Fundo de Garantia de Depósitos, à data no valor máximo de € 25.000,00 por conta bancária.

O produto dado à subscrição dos autores era seguro, acabando o seu incumprimento por ser determinado por circunstâncias completamente imprevisíveis e anormais, como uma nacionalização e a forma como essa nacionalização foi determinada, separando o Banco do restante grupo de empresas.

Os autores foram contactados pelo seu gestor para oferta da possibilidade de subscrever o produto aqui em causa, constituindo esse produto valores mobiliários em representação de dívida da sociedade emitente, tendo explicado de que se tratava da sociedade-mãe do Banco, pelo que se tratava de um produto seguro.

O gestor apresentou as condições do produto, concretamente remuneração vantajosa relativamente aos depósitos a prazo, prazo de 10 anos, condições de reembolso, e obtenção de liquidez ao longo do prazo de 10 anos, que apenas seria possível por via de endosso, que era à data extremamente fácil e rápido, porquanto a procura superava inúmeras vezes a oferta.

Os autores foram total e exaustivamente esclarecidos sobre as condições do produto, de forma acompanhada com a respetiva nota técnica e sabiam perfeitamente que não tinham um depósito a prazo.

Nunca o réu disse aos autores que o Banco garantiria fosse o que fosse quanto ao cumprimento ou incumprimento das obrigações da SLN e o réu sempre explicou todos os formulários dados a assinar aos autores.

A subscrição de Obrigações SLN não foi sujeita a qualquer tipo de contrato de adesão, ou qualquer tipo de formulário de cláusulas contratuais gerais.

Sendo um contrato entre os autores e a SLN (não o Banco BPN), não se corporizou num qualquer escrito, mas apenas e tão-só numa proposta da SLN, veiculada pelo Banco réu e numa aceitação dos autores corporizada numa ordem de subscrição de títulos.

Terminou pedindo a improcedência da ação e a sua absolvição do pedido.

As Decisões Judiciais Após audiência de julgamento, a sentença proferida julgou a acção improcedente, absolvendo o Réu do pedido.

Tendo os Autores recorrido de apelação, a Relação revogou a decisão antes proferida, condenando agora o Réu no pagamento aos AA. do capital de € 50.000,00, acrescido de juros de mora contados desde a data de citação do Réu, à taxa legal, e até efectivo pagamento, nos termos dos artºs 805º, nº 1 e 806º, nºs 1 e 2, do C. Civil, absolvendo o Réu do mais peticionado.

Inconformado, o Réu recorre agora de revista, sumariando-a nas seguintes conclusões: 1. O douto acórdão da Relação de Lisboa violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 7º, 290º nº 1 alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D e 327º do CdVM e 4º, 12º, 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Directiva 2004/39/CE e 364º, 483º e ss., 563º, 628º e 798º e ss. do C.C.

2. A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao Réu e o seu comportamento verificado tem que ver com o facto do Tribunal considerar que a circunstância do funcionário do Banco Réu ter assegurado ao Autor (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação financeira era uma produto sem risco e com capital garantido, não transmitindo a característica da subordinação, emitindo opiniões sobre a solvabilidade da entidade emitente quando não conhecia, em concreto a sua situação financeira, configura a prestação de uma informação falsa.

3. Porém, tal realidade não configura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.

4. Não adianta...

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