Acórdão nº 813/22 de Tribunal Constitucional (Port, 07 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução07 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 813/2022

Processo n.º 940/2022

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. A. (a ora recorrente) deduziu embargos de terceiro a uma execução fiscal, na qual é executado B., seu cônjuge, invocando, em síntese, que a fração autónoma penhorada e com venda anunciada constitui a sua casa de morada de família e é sua propriedade. O processo que corresponde ao referido incidente correu termos no Tribunal Tributário de Lisboa com o número 2481/12.0BELRS.

1.1. Por sentença de 04/02/2019, o Tribunal Tributário de Lisboa decidiu absolver a requerida da instância, considerando, em síntese, que os embargos deduzidos constituem meio processual impróprio para fazer valer a pretensão deduzida, não sendo possível proceder à sua convolação para o meio próprio (reclamação de atos dirigida à penhora), por ter sido apresentado fora do prazo para esse efeito, visto que o prazo para embargar é de 30 dias contados da prática do ato que ofende a posse e o prazo para reclamar é de 10 dias contados da notificação da decisão.

1.1.1. Desta decisão recorreu a embargante (aqui recorrente) para o Tribunal Central Administrativo Sul. Nas alegações de recurso, invocou, designadamente, o seguinte:

“[…]

[O] Direito à Habitação que se visa proteger com o disposto no n.º 2 do artigo 244.º do CPPT é um Direito de toda a Família do Devedor, e não apenas um Direito individual do mesmo, nos termos conjugados no disposto no referido artigo 65.º com o artigo 67.º, ambos da CRP.

[…]

Em conclusão, afigura-se-nos, assim, que houve uma errónea interpretação das normas aplicáveis ao caso em apreço, designadamente, ao não ter sido convolado o processado e ao não ter sido aplicado o n.º 2 do artigo 244.º do CPPT ao presente caso, violando-se ainda o Direito Constitucional à Habitação, previsto no artigo 65.º da CRP .

[…]

12 – O impedimento previsto no n.º 2 do artigo 244.º do CPPT, claramente, é a defesa e garantia do Direito Constitucional à Habitação, previsto no artigo 65.º da CRP, sendo este um Direito superior em relação à tutela do crédito tributário, pretendida na Execução Fiscal.

13 – A Casa de Morada de Família, ou se se quiser, o domicílio familiar, corresponde, numa Dimensão Constitucional, ao espaço habitacional de acesso restrito ao agregado familiar que nele reside e ao qual o acesso de estranhos é vedado e onde, através da garantia da sua inviolabilidade, é possível o livre desenvolvimento da personalidade, e, consequentemente, da inviolabilidade de Reserva da Vida Privada, prevista no artigo 26.º, n.º 1, da CRP, conforme ensinam J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, Coimbra, Coimbra Ed., 4.ª edição rev. 2007, p. 539 e Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição da República Portuguesa Anotada, tomo I, Coimbra, Coimbra Ed., 2.ª edição, 2010, p. 759, visando-se proteger um Direito de toda a Família do Devedor, e não apenas um Direito individual do mesmo, conforme se constata pela conjugação dos artigos 65.º e 67.º, ambos da CRP.

[…]

Em conclusão, afigura-se-nos, assim, que houve uma errónea interpretação das normas aplicáveis ao caso em apreço, designadamente, ao não ter sido convolado o processado e ao não ter sido aplicado o n.º 2 do artigo 244.º do CPPT ao presente caso, violando-se ainda o Direito Constitucional à Habitação, previsto no artigo 65.º da CRP .

[…]” (sublinhados acrescentados).

1.1.2. Por acórdão de 24/02/2022, o Tribunal Central Administrativo Sul decidiu não tomar conhecimento do objeto do recurso, em suma, porquanto a recorrente não impugnou a decisão (absolvição da instância), centrando o recurso no mérito dos embargos, que não foi apreciado na decisão de primeira instância.

1.1.3. Ainda inconformada, a embargante pretendeu recorrer para o Supremo Tribunal Administrativo (STA), invocando “violação do direito constitucional à habitação”.

1.1.4. Por acórdão de 13/07/2022, o STA não admitiu a revista, em síntese, por entender não se verificarem os pressupostos de recorribilidade previstos no artigo 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), uma vez que a recorrente se limitou a invocar omissão de pronúncia, sem impugnar os fundamentos expressos da decisão do Tribunal Central Administrativo Sul.

1.2. A embargante interpôs, então, recurso desta última decisão para o Tribunal Constitucional, ao abrigo das alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – recurso que deu origem aos presentes autos –, nos termos seguintes:

“[…]

A Recorrente não se conforma com o Douto Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal Central Administrativo a 24 de fevereiro de 2022, bem como também não se conforma com o Douto Acórdão proferido pelo Colendo Supremo Tribunal Administrativo a 13 de julho de 2022, pelo que, por Dever de Patrocínio, vem proceder à Interposição de Recurso para o Colendo Tribunal Constitucional, o qual deverá ser admitido e subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, fundando-se no disposto na alínea b) e/ou na alínea f) do n.º 1, no n.º 2, no n.º 4, bem como à cautela no n.º 6, todos do artigo 70.º da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional.

Os presentes autos enfermam de manifestas inconstitucionalidades que foram suscitadas durante a tramitação do mesmo, nomeadamente, nas Alegações e Conclusões do Recurso para o Tribunal Central Administrativo que incidiu sobre a Decisão Final proferida em 1.ª Instância e também nas Alegações e Conclusões do Recurso de Revista para o Supremo Tribunal Administrativo que incidiu sobre o Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo.

[…]

1. A Recorrente não se conforma com o Douto Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal Central Administrativo a 24 de fevereiro de 2022, bem como também não se conforma com o Douto Acórdão proferido pelo Colendo Supremo Tribunal Administrativo a 13 de julho de 2022, pelo que vem interpor Recurso para o Colendo...

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