Acórdão nº 01169/06.6BELSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Dezembro de 2022
Magistrado Responsável | SUZANA TAVARES DA SILVA |
Data da Resolução | 07 de Dezembro de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – A……………….. – Pavimentos e Vias, SA e B……………… – Sociedade Geral de Construções e Obras Públicas, SA [à qual, entretanto sucedeu a C………… – Engenharia, S.A.
], com os sinais dos autos, propuseram no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, acção administrativa comum, contra a EP – Estradas de Portugal, EPE, igualmente com os sinais dos autos, em que formularam o seguinte pedido: “[…] seja declarada ilegal a deliberação do Conselho de Administração do então IEP de 18.11.2004, que considerou ter sido paga indevidamente às AA. a quantia de 631.489,25€ e a Ré condenada a pagar à A. B………………,, S.A. a quantia de 315.744,73€, acrescida de juros de mora desde 31.03.2005, até efectivo e integral pagamento, sobre aquela importância, os quais, calculados até 20 de Abril de 2006, ascendem ao montante 30.204,13€ e à A. A……………….., SA a quantia - a apurar em execução de sentença - que porventura não consiga receber nas acções executivas intentadas, onde reclama o pagamento da quantia total de 315.744,62€ acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento, e o cumprimento dos acordos celebrados no Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes referentes aos créditos que a R. ilegalmente compensou (…) Subsidiariamente, que a Ré seja condenada a pagar às AA a quantia de 493.278,12€, acrescida do IVA, em consequência do deferimento tácito da reclamação apresentada pelas AA. em 9.02.2006, bem como da quantia de 47.340,42€, acrescida de IVA, referente à revisão de preços calculada sobre o valor dos autos de medição da empreitada dos autos, por tal quantia representar a diferença entre o cálculo realizado sobre o valor ilegalmente alterado dos autos de medição n.° 35, 36 e 37, sendo que, destas quantias, no que à A. A…………………., S.A. diz respeito, a condenação no pagamento será até à quantia - a apurar em execução de sentença - que porventura não consiga receber nas acções executivas acima aludidas.
[…]».
2 – Por sentença de 10 de Maio de 2018, foi a acção julgada improcedente.
3 – Inconformadas, as AA. recorreram daquela decisão para o TCA Sul, que, por acórdão de 04.02.2021, julgou o recurso improcedente e confirmou na sentença recorrida.
4 – Novamente inconformadas com aquela decisão, as AA. interpuseram recurso de revista para este Supremo Tribunal Administrativo, que, por acórdão de 10 de Fevereiro de 2022, a admitiu.
5 – As Recorrentes apresentaram alegações que remataram com as seguintes conclusões: «[…] 1. A revista deve ser admitida, porquanto é absolutamente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Depois, 2. As cláusulas do caderno de encargos dos autos são cláusulas típicas, rígidas e imutáveis para todas as empreitadas, sejam elas por série de preço, por preço global ou por percentagem.
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Nessa medida, impõe-se interpretar e aplicar as ditas cláusulas do caderno de encargos ao regime legal próprio das empreitadas por série de preço, por preço global ou por percentagem.
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Neste caso, não pode valer o “desconto” no preço decorrente da aplicação da cláusula 15.8.4.7 das cláusulas especiais do caderno de encargos, por esse desconto violar o artigo 17º do Decreto-Lei n.º 405/93, de 10 de dezembro, já que essa aplicação resultaria no não pagamento do preço por conta das quantidades efetivamente executadas em obra pelo empreiteiro. A mesma lógica já não se passa na empreitada por preço global (artigo 7º do Decreto-Lei n.º 405/93, de 10 de dezembro), por exemplo, porque o preço final a pagar pelo dono da obra ao empreiteiro não depende das quantidades por ele efetivamente realizadas em obra.
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A cláusula 15.8.4.7 das cláusulas especiais do caderno de encargos viola em qualquer caso o artigo 60º do Decreto-Lei n.º 405/93, de 10 de dezembro, nos termos do qual compete ao dono da obra definir obrigatoriamente as características do terreno onde a obra decorre, correndo por sua exclusiva conta os “riscos do terreno”, não podendo ele passá-los, consequentemente, para o empreiteiro, mesmo que os preveja no projecto, sob pena de desequilibrar a economia do contrato.
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Por força do artigo 60º do Decreto-Lei n.º 405/93, de 10 de dezembro, a cláusula 15.8.4.7 das cláusulas especiais do caderno de encargos não poderia ser aplicada ao caso em apreço, porque a ser, ela opera a transferência dos “riscos do terreno” da Recorrida para as Recorrentes, o que aquele preceito impede.
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A interpretação que o Tribunal recorrido faz da cláusula 15.8.4.7 das cláusulas especiais do caderno de encargos não é correta (mesmo que ela se aplique ao caso dos autos).
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Com efeito, na sua aplicação, não há que somar as quantidades escavadas pelo empreiteiro com recurso a meios mecânicos e com recurso a explosivos, aplicando-se a percentagem de 20% à totalidade dos trabalhos de escavação, como fez o Tribunal a quo.
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É que nada da letra da disposição o indicia. Aliás, a conjunção “ou”, colocando em alternativa a escavação mecânica à escavação com recurso a explosivos, aponta no sentido oposto.
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Depois, esta disposição é específica para a escavação com recurso a explosivos (está na disposição do critério de medição para este efeito) e não para esta e para a escavação mecânica.
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Por outro lado, a própria cláusula 15.8.4.7 das cláusulas especiais do caderno de encargos também não se divide entre variações iguais ou inferiores a 20% e superiores a 20%, com o sentido de, para as quantidades executadas iguais ou inferiores a 20%, não se considerar o preço efetivo, sendo ele apenas devido na parte remanescente, caso exista, superior a 20% (como a Recorrida alegou na contestação).
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Assim é porque a letra do preceito fala em “variações”, no sentido de variações em bloco, e não em “as variações”, no sentido de as dividir.
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Acresce que a escavação com recurso a explosivos em quantidades superiores a 20% em relação às estimadas não se traduz numa mera soma de quantidades a mais, no sentido de “quem escava 1%, escava 30% com os mesmos meios e custos”. Na verdade, o sucessivo aumento das quantidades escavadas ou demolidas em rocha com explosivos aumenta os respetivos meios e custos.
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Por fim, a parte final do preceito, ao evidenciar a sua razão de ser, deixa a entender que o que está em causa é lidarmos com a margem de erro do trabalho em causa, sobretudo na forma como ele é executado, e não com as quantidades de trabalhos executadas e respetivos custos efetivos.
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É por isso que se o empreiteiro fizer trabalhos de escavação com recurso a explosivos em quantidades superiores a 20% em relação às previstas, o preço é todo devido, correspondendo às quantidades totais executadas e não apenas às quantidades executadas que em si excedam aqueles 20%, porque, acima desta percentagem, o trabalho globalmente considerado já não decorre (no seu conjunto) de qualquer margem de erro na sua execução.
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Ainda quanto à aplicação ao caso da cláusula 15.8.4.7 das cláusulas especiais do caderno de encargos, mesmo que se aceite que o volume total de escavação com recurso a explosivos foi de 1.496.905m3, a variação seria de 20,3% face ao inicialmente previsto, o que não permitiria, afinal, a aplicação daquela disposição ou, mesmo que assim não se entendesse, o que apenas se pondera, sem conceder, sempre obrigaria a considerar o pagamento às Recorrentes do preço correspondente a 0,3 % dos trabalhos que excedessem em 20 % a respetiva quantidade prevista, o que não foi feito pelo Tribunal recorrido.
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A cláusula 15.8.4.5 das cláusulas especiais do caderno de encargos não é aplicável ao caso dos autos, porque ela parte do pressuposto que a escavação em causa foi feita com meios mecânicos. Ora, a escavação com recurso a explosivos nos autos, para os efeitos em apreço, foi feita, passe a redundância, diretamente com explosivos, e não com (prévio) recurso a meios mecânicos, já que as...
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