Acórdão nº 0944/14.2BELSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Dezembro de 2022
Magistrado Responsável | SUZANA TAVARES DA SILVA |
Data da Resolução | 07 de Dezembro de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – A………….., UNIPESSOAL, LIMITADA, com os sinais dos autos, propôs no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, acção administrativa comum, contra a ADMINISTRAÇÃO CENTRAL DO SISTEMA DE SAÚDE, I.P. (ACSS, I. P.), igualmente com os sinais dos autos, na qual formulou o seguinte pedido: “[…] Nestes termos, e nos demais que V. Ex. ª doutamente suprirá, deve a presente acção administrativa comum ser julgada procedente, por provada, e consequentemente, devem os contratos de prestação de serviços serem declarados nulos e ser a entidade demandada condenada a pagar à autora a quantia de € 24.000,00, por ser esse o valor correspondente às prestações efectuadas, nos termos do artigo 289.º, n. º 1, do Código Civil; ou, subsidiariamente, a título de enriquecimento sem causa, ao abrigo do artigo 473. º do Código Civil; acrescida, de qualquer modo, de juros de mora vincendos, deste a data da citação até efectivo e integral pagamento.
[…]».
2 – Por sentença de 9 de Fevereiro de 2016, foi a acção julgada procedente e o ACSS, I. P. condenado a pagar à autora a quantia de €24.000,00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa anual de 4%, desde 03.06.2014.
3 – Inconformado, o ACSS, I. P. recorreu daquela decisão para o TCA Sul, que, por acórdão de 02.07.2020, julgou o recurso procedente, revogou a sentença recorrida e, em substituição, julgou a acção improcedente, absolvendo o Réu do pedido.
4 – Inconformada com aquela decisão, a A………, Unipessoal, Lda interpôs recurso de revista para este Supremo Tribunal Administrativo, que, por acórdão de 13 de Janeiro de 2022, a admitiu.
5 – A Recorrente apresentou alegações que rematou com as seguintes conclusões: «[…] I. O presente recurso de revista para o Colendo Supremo Tribunal Administrativo (STA), vem interposto do douto acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCA Sul), de 02/07/2020, proferido nos autos referenciados em epígrafe.
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O Acórdão recorrido concedeu provimento ao recurso apresentado pela A. da sentença proferida em 1ª instância pelo TAC de Lisboa, tendo-a revogado e julgado improcedente a acção administrativa, na qual era pedida a condenação da Entidade Demandada a pagar à A. a quantia de €24.000, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados à taxa de 4% e devidos desde 03/06/2014 até integral pagamento, com fundamento na falta de pagamento da prestação de serviços efectuada e nulidade do respectivo contrato.
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Tal Acórdão, teve, no entanto, um voto de vencido do Mmo. Juiz Pedro Marchão Marques no qual defendeu que: (…) De resto, mais recentemente o STA, no acórdão de 4.05.2017, proc. 443/16, teve oportunidade de concluir que: “[à] luz do art. 289.º do Código Civil, o beneficiário de um serviço já prestado – e não restituível – em execução de um contrato nulo deverá entregar à outra parte contratante o valor objectivo do serviço recebido (…). Por outro lado ainda, os ditâmes da boa fé reclamam a solução jurídica plasmada na sentença do tribunal a quo. Negaria, portanto, provimento ao recurso e confirmaria a sentença recorrida.” IV. A questão objecto do recurso será manifestamente necessária para uma melhor aplicação do direito.
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De facto, não constitui questão controvertida na presente ação a existência de nulidade do contrato, mas apenas os efeitos resultantes da aplicação do seu respetivo regime, atento o dever de ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.
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Tal como decidido pelo TCA Sul, no Acórdão de que se recorre, “não integra o objeto do presente recurso a reanálise da aplicação do regime da nulidade, segundo o disposto no artigo 289.º, n.º 1 do CC, mas tão só os exatos efeitos a extrair desse regime, em face da concreta factualidade provada e não provada nos presentes autos.” VII. O Acórdão recorrido, para fundamentar a sua decisão, recorreu a conceitos como "custos", "despesas" e "encargos" - que não teriam ficado provados – mas que, na realidade, não encontra subsunção alguma no artigo 289.º do Código Civil e que, afastada a aplicação do enriquecimento sem causa, não tem qualquer fundamento legal.
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Com efeito, o preceito em causa convoca apenas o conceito de "valor correspondente" - no caso, o "valor correspondente" à prestação dos serviços em causa - e não o de "custos", "despesas" ou "encargos". Tais conceitos em lado algum estão previstos nesse normativo.
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Não pode pretender-se, como o fez o Acórdão recorrido, que o "valor correspondente" seja equivalente aos "custos", "despesas" ou "encargos".
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Em último caso, quando muito, estes contribuirão para a formação desse "valor correspondente".
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O "valor correspondente" deverá equivaler, no caso concreto, àquele que efectivamente foi acordado e pago nos períodos abrangidos por contrato, pela prestação dos mesmos serviços e nos mesmos termos – como ficou provado – e que deverá corresponder ao valor de €24.000,00 correspondendo aos valores mensais daqueles estipulados nos contratos que foram integralmente cumpridos e cujo pagamento foi efectuado, estando provado que os serviços não pagos foram prestados nas mesmas condições daqueles.
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Nunca a acção poderia improceder, quando foi expressamente reconhecido o direito à restituição do "valor correspondente".
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Quando muito, deveria o Acórdão ter condenado em conformidade, ainda que relegando o apuramento desse "valor" para posterior liquidação (artigo 609.º, n.º 2, do Código Civil).
[…] XXIII. Ficou provado que, a ora Recorrente prestou efetivamente os serviços e que a aquisição da prestação de serviços pela Entidade Administrativa não foi precedida de procedimento pré-contratual e o contrato não foi reduzido a escrito.
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Na aplicação do direito, o TAC de Lisboa decidiu que o contrato é nulo e na aplicação do regime da nulidade prevista no art. 289.º do Código Civil, acolhendo a jurisprudência deste Venerando Supremo Tribunal, concluiu que: “(…) Poder-se-ia argumentar que pela eficácia retroactiva da declaração de nulidade (artigo 289.º, nº 1) tudo se passa como se o contrato não tivesse sido celebrado, ou produzido quaisquer efeitos, nessa medida se impondo inelutavelmente a restituição das aludidas importâncias solvidas em sua execução.
Todavia, a nulidade, conquanto tipicizada pelos mais drásticos predicados de neutralização do negócio operando efeitos interactivos ex tunc, nem assim pode autorizar a ilação de que o negócio...
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