Acórdão nº 183/22.9YREVR de Tribunal da Relação de Évora, 22 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelCARLOS DE CAMPOS LOBO
Data da Resolução22 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A Exmª Senhora Procuradora-Geral Adjunta, em funções neste Tribunal da Relação de Évora, vem requerer a execução do presente Mandado de Extradição, emitido em 25 de abril de 2022, pelas autoridades competentes da ..., no âmbito do processo de inquérito nº ...00/PR, representação criminal nº ...00/PR da ... ..., Secção ..., em que é requerido o cidadão de nacionalidade ...

AA, solteiro, operador de máquinas de carga e descarga, nascido a .../.../1989, em ..., ..., ..., filho de BB e de CC, portador do passaporte nº ..., válido até 09/02/2024, residente, antes de detido na Urbanização ... – ....

* O Requerido foi detido em 20 de setembro de 2022, pelas 11h00 em cumprimento do referido mandado – fase provisória dos autos -, sendo que após nomeação de defensor oficioso se procedeu à sua audição a 21 de setembro 2022, observando o formalismo expresso nos normativos combinados dos artigos 38º e 40º da Lei nº 144/99, de 31 de agosto, e sequentemente, foi decidido manter a situação de detenção provisória.

O pedido formal de extradição foi apresentado, oportunamente, às autoridades portuguesas pelas autoridades da ..., tendo a Senhora Ministra da Justiça, por despacho proferido em 24 de outubro de 2020, considerado o pedido admissível e autorizado a prossecução dos seus termos.

* Sequentemente, tendo-se considerado viável o pedido de extradição e face ao pedido formulado pelo Digno Mº Pº, em 26 de outubro de 2022, teve lugar a audição do extraditando neste Tribunal – 3 de novembro de 2022 -, em conformidade com o estatuído no artigo 54º da supra referida Lei, na qual, tendo aquele reafirmado o anteriormente declarado, além de não ter renunciado ao princípio da especialidade, igualmente se opôs à sua extradição.

Observando o que reza o nº 1 do artigo 55º da Lei nº 144/99, de 31 de agosto, foi concedido o prazo de 8 dias para ser deduzida oposição, por escrito.

* Usando-se dessa faculdade contida no citado artigo 55º veio o arguido apresentar oposição escrita, invocando, em síntese: - Os factos de que o extraditando se encontra acusado foram praticados em solo português, país onde reside desde 1 de Julho de 2017, pelo que sendo Portugal um Estado soberano, com jurisdição e competência para o procedimento criminal por partes das suas autoridades judiciárias, o pedido de extradição deve ser negado pelo Estado Português.

- Igualmente prevê o artigo 32º nº 1 al. a) da mesma lei que a extradição deve ser excluída quando o crime tiver sido cometido em território português, sendo que os factos indiciários de que o extraditando se encontra acusado pelo Estado requerente ocorreram em território português; - Ainda que se trate de uma suposta rede internacional no âmbito de tráfico internacional, o requerido considera que é em Portugal que deve ser julgado.

- Por outro lado, o cumprimento do pedido de extradição implicaria a sujeição do extraditando a condições degradantes, dado que as prisões brasileiras não apresentam condições condignas. Prisões sobrelotadas, camas partilhadas, celas cheias de humidade e mofo, infestadas de piolhos, ratos e outros rastejantes, estas são algumas das condições que as prisões apresentam.

- É de conhecimento geral, a constante violação dos direitos humanos ocorridos nas prisões brasileiras.

- Acresce que o ... vem reclamar a entrega do requerido para procedimento criminal no âmbito do processo n.º ...96 que corre termos na 9.ª Vara .../PR, visando apenas e só assegurar a necessidade do requerido contestar a acusação que pende sobre si, fim este que pode ser efetivado mantendo-se este em Portugal. Assim é inútil proceder à sua extradição.

- O extraditando tem conhecimento, através da sua irmã, que tem sido alvo de ameaças contra a vida e integridade física, no ..., sendo que algumas dessas mensagens constam do próprio processo e, nessa medida, o mesmo corre sérios riscos de vida.

- Reside em Portugal desde 2017, aqui fixou residência definitiva desde o início de Julho desse ano, residindo actualmente na ..., Letra ..., em ..., Concelho ..., prédio arrendado pela entidade patronal (doc.1).

- É trabalhador da empresa S... limitada, desde 2 de Julho de 2021, estando efectivo na empresa (doc.2 e 3).

- Fez formação na área de operadores de equipamentos WD, que lhe permite exercer a sua actividade profissional na empresa. (doc.4 e 5).

- Aufere mensalmente aproximadamente €1500,00 (doc. 6, 7 e 8), (mil e quinhentos euros), ajudando todos os meses a sua família que vive no ...; - Tem uma namorada e da qual tem perspectivas de contrair matrimónio e de constituir família em Portugal, beneficiando do apoio de três primos, residentes em ...

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*Em resposta, o Digno Mº Pº vem opinar, em síntese: - O pedido de extradição foi formulado ao abrigo da Convenção de Extradição entre Estados Membros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (doravante referida "Convenção de Extradição da CPLP" ou "Convenção"), assinada na Cidade da Praia, dia 23-11-2015 publicada no Diário da República nº 178, lª Série, de 15-’09-2008, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 49/2008, de 15-09, ratificada pelo Decreto do Presidente da República nº 67/2008, da mesma data, a qual se trata de uma lei especial.

- A Convenção dispõe, no seu artigo 8º (epigrafado de «Direito de defesa»), que “A pessoa reclamada gozará, no Estado requerido, de todos os direitos e garantias que conceda a legislação desse Estado …”, direito esse conformado pelas normas constantes do artigo 55º («Oposição do extraditando») da Lei n.º 144/99, de 31 de agosto.

- Atento o disposto no nº 2 do referido artigo 55º “A oposição só pode fundamentar-se em não ser o detido a pessoa reclamada ou em não se verificarem os pressupostos da extradição.” - Como resulta do próprio Auto de Audição e o reafirma na oposição apresentada o oponente é a pessoa reclamada.

- Por seu turno, os casos de inadmissibilidade da extradição, como os titula o artigo 3º nº 1 da CONVENÇÃO são os taxativamente elencados e nenhum deles ocorre, em concreto.

- Acresce que o cidadão reclamado não é nacional português, sendo penalmente imputável, em razão da idade.

- Igualmente não se verifica qualquer das causas de recusa facultativa de Extradição, não apresentando a oposição qualquer fundamento que seja suscetível de conduzir à recusa, obrigatória ou facultativa da Extradição.

- Pretende ainda o Oponente que o pedido deve ser negado, porquanto «os factos indiciários de que o extraditando se encontra acusado pelo Estado requerente, todos ocorreram em território português.

- Consta da matéria indiciária que o pedido de Extradição do Oponente resulta da sua identificação «no âmbito da operação “Risco Duplo”, como membro de uma organização criminosa que se dedica ao tráfico internacional de droga» e « A investigação revelou que AA está associado aos cabecilhas da organização criminosa investigada, sendo um dos que estão encarregados de receber a cocaína enviada do ... e transportada pelos “correios” recrutados pela organização, assim como da sua distribuição em território europeu.».

- Está imputada a prática, em co-autoria material. dos crimes de Tráfico internacional de estupefacientes e Associação Criminosa, pp nos Artigos 35 e 40 da Lei 11 343/2006, Artigo 2 da Lei 12.850/2003.

- O crime de associação criminosa configura-se como um crime de comparticipação necessária; para que a organização exista indispensável se torna a comparticipação de vários agentes, com ressalva da modalidade de acção traduzida na “promoção” - Figueiredo Dias, “Associações Criminosas”, pág. 65 e Comentário Conimbricense, § 43, pág. 1172.

- Trata-se de um crime em que os contributos dos vários comparticipantes para o facto se dirigem, na mesma direcção, à violação do bem jurídico - Paulo Pinto Albuquerque “Comentário do CP, UCE, 2008, pág. 753”.

- O Oponente efectuou as «tarefas» distribuídas e acordadas, de acordo com o plano comum, no alcance da solução global, sendo co-autor dos imputados crimes, devendo imputar-se-lhe toda a acção como se sua e própria; como se se tratasse de uma pessoa com muitas mãos, pés, muitas línguas …, no dizer de Fernanda Palma , citada no CP anotado por Miguez Garcia e Castela Rio, 172 .

- Sendo a prática de todos os factos imputada a todos e cada um dos membros da Organização/Associação, todos têm de ser julgados no mesmo processo.

- Os crimes estão a ser investigados na ..., no âmbito do Processo nº ...00, que corre termos na ... ..., Secção ..., no ... e, em Portugal não pende ou pendeu Processo pelos mesmos factos, nem há conhecimento de correr termos processo pelos factos respeitantes aos autos que requerem a extradição.

- Em caso de pendência de Processos só seria caso de Recusa facultativa de extradição, «A pessoa reclamada estiver a ser julgada no território do Estado requerido pelos factos que fundamentam o pedido» - al c) do artº 4º da Convenção.

- Ao contrário da pretensão do Oponente não ««É em Portugal que o extraditando deve ser julgado, segundo a Lei portuguesa.

- A má condição das prisões brasileiras, não é motivo de recusa de Extradição.

- Evocando o artº 6º nº 1 al a) da Lei nº 144/99, vem o Oponente referir que «Portugal, país respeitador dos direitos humanos e da DUDH e da CEDH, não pode sujeitar um cidadão residente no seu país, a sofrer ou a correr sérios riscos de sofrer violação dos seus direitos humanos, em consequência do pedido de extradição.

- Trata-se de uma alegação genérica, sem especificação em...

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