Acórdão nº 021/21.0BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelGUSTAVO LOPES COURINHA
Data da Resolução23 de Novembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – RELATÓRIO I.1 Alegações I.

Z………, APARTAMENTOS TURÍSTICOS S.A.

, inconformada com a decisão arbitral proferida no processo nº 7/2020-T no dia 28 de Dezembro de 2020 que correu termos no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), julgando parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral deduzido contra as liquidações adicionais de IVA e respetivos juros, referentes a Janeiro e Fevereiro de 2016, no valor de € 111.238,13, vem dela apresentar Recurso para Uniformização de Jurisprudência, para o Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto no artigo 25.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro e do artigo 152º do C.P.P.T, por considerar que a referida decisão arbitral recorrida colide com a decisão arbitral proferida no processo nº 281/2017-T do CAAD, – datado de 27 de Abril de 2018, o qual transitou em julgado.

  1. Por despacho a fls. 145 do SITAF, o Ex.º Relator junto deste Supremo Tribunal veio admitir o recurso e ordenou notificação da recorrida para contra alegar e do Ministério Público para emissão de Parecer.

  2. A recorrente, veio apresentar alegações de recurso a fls. 4 a 56 do SITAF, no sentido de demonstrar a alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões: 1. Vai o presente recurso para uniformização de jurisprudência interposto do acórdão do Tribunal Arbitral proferido no processo n.º 7/2020-T (“acórdão recorrido”) por efetiva contradição com o acórdão do Tribunal Arbitral proferido no processo n.º 281/2017-T (“acórdão fundamento”), nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 152.º do CPTA, ex vi artigo 25.º do RJAT.

    1. Ambos comportam entre si a) situações de facto rigorosamente idênticas; b) um quadro normativo aplicável que não sofreu alterações; c) soluções jurídicas contraditórias e incompatíveis sobre a mesma questão fundamental de direito, ao que acresce que d) o sentido do acórdão fundamento está de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA, ao contrário do acórdão recorrido que dela frontalmente divergiu.

    2. O recurso deverá, portanto, ser admitido, porque se mostram preenchidos todos os requisitos fundamentais de sua admissão. Com efeito, 4. Existe identidade de facto entre as duas decisões em confronto bastante para que se possa concluir que há uma incompatibilidade insanável entre as soluções jurídicas perfilhadas no acórdão fundamento e no acórdão recorrido, posto que, conforme a ora recorrente desde logo antecipou nos artigos 79.º e seguintes da sua petição inicial, nos presentes autos foram suscitadas rigorosamente as mesmas questões amplamente debatidas e definitivamente resolvidas no seio do processo arbitral n.º 281/2017-T que deu origem ao acórdão fundamento.

    3. Colocados em paralelo os factos dados como assentes em cada um dos arestos, nitidamente se verifica uma unívoca, plena e integral correspondência substancial das situações de facto pressupostas nas decisões em confronto (cf. artigos 14.º a 35.º, supra).

    4. Os dois casos em pauta foram, porém, objeto de contraditória interpretação, e consequente decisão, do mesmo quadro normativo aplicado a idêntica situação factual, conforme se extrai do confronto entre as secções 6.2.2. do acórdão fundamento e B.2.1. do acórdão recorrido, respetivamente intituladas «O obstáculo à aceitação da retificação das faturas por não ter sido cumprido o prazo de dois anos» e «Quanto ao prazo de dois anos exigido pelo n.º 3 do artigo 78.º do CIVA».

    5. O acórdão fundamento decidiu que o n.º 3 do artigo 78.º do CIVA não se aplica ao imposto entregue em excesso por erro no enquadramento jurídico-normativo em sede de IVA, ao passo que o acórdão recorrido decidiu que o n.º 3 do artigo 78.º do CIVA encerra um prazo de caducidade de natureza especial que impede a correção de um erro no enquadramento jurídico-normativo em sede de IVA com mais de dois anos.

    6. A coincidência das questões decidendas é total: num e noutro caso, discutia-se se a regularização do IVA liquidado em excesso, por erro sobre os pressupostos de direito, nomeadamente por errada interpretação da verba 2.17 da Lista I Anexa ao CIVA, só poderia ser efetuada no prazo de dois anos de acordo com o n.º 3 do artigo 78.º do CIVA.

    7. De acordo com o douto acórdão fundamento, “o lapso cometido pela Requerente em torno da taxa de IVA aplicável aos serviços prestados aos seus clientes membros do Clube, o qual teve reflexo nas faturas emitidas entre janeiro de 2012 e outubro de 2014 e, consequentemente na autoliquidação de IVA desse período, consubstancia manifestamente uma situação de erro de enquadramento ou erro de direito”, logo, “não se poderá aplicar o regime nem o prazo do referido n.º 3 do artigo 78.º do Código do IVA.” 10. Já de acordo com o douto acórdão recorrido, pelo contrário, se “se a emissão da nota de crédito ou nota de débito for efetuada após o final do prazo de 2 anos àquele a que respeita a fatura a retificar, já não é possível proceder à regularização do IVA a favor do sujeito passivo”, porquanto está em causa “o prazo de dois anos exigido pelo n.º 3 do artigo 78.º do CIVA, sendo que estamos perante um prazo de caducidade de natureza especial.” 11. Destarte, temos, pois, que, no caso do acórdão fundamento, o tribunal admitiu a totalidade das regularizações do imposto liquidado em excesso, porque em violação da verba 2.17 da Lista I Anexa ao CIVA, compreendido nas faturas emitidas aos clientes membros do Clube pela X……… - Gestão de Empreendimentos Turísticos, Sociedade Unipessoal, Lda., incluindo as com mais de dois anos.

    8. Ao passo que, no caso do acórdão recorrido, o tribunal não admitiu a totalidade das regularizações do imposto liquidado em excesso, igualmente por violação da verba 2.17 da Lista I Anexa ao CIVA, compreendido nas faturas emitidas aos clientes membros do Clube pela Z………, Apartamentos Turísticos, S.A., excluindo as com mais de dois anos.

    9. Existe, assim, plena identidade de factos e do direito entre as duas decisões, bastante para concluir que há incompatibilidade entre as soluções jurídicas preconizadas no acórdão fundamento e no acórdão arbitral.

    10. Estamos, pois, em condições objetivas de afirmar que se mostram plenamente reunidos os pressupostos legais para que este Supremo Tribunal possa conhecer deste recurso, pois que dele emerge uma contradição juridicamente relevante que só o Pleno poder dirimir.

    11. Acresce que a solução do acórdão recorrido está em desacordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada deste Supremo; é, pelo contrário, a solução do acórdão fundamento que encontra o respaldo da jurisprudência mais recentemente consolidada do STA.

    12. Conforme a ora recorrente desde logo antecipou nos artigos 132.º e 156.º da sua petição inicial, é entendimento hoje consolidado na jurisprudência do STA, que o prazo aplicável para regularizar o IVA entregue em excesso numa situação enquadrável no denominado erro de direito é de quatro anos, nos termos previstos no artigo 98.º do CIVA, e não de dois anos, nos termos previstos no artigo 78.º do CIVA.

    13. Dimana mesmo do Acórdão de 03 de junho de 2020 deste Supremo Tribunal, processo 0498/15.2BEMDL, com a superior clareza a que a respetiva Relatora já nos habitou, que “se a existência de um erro material ou de cálculo é susceptível de determinar a regularização do IVA liquidado em excesso ao abrigo do disposto no artigo 78.º do Código do IVA (vide o Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo proferido a 18 de Maio de 2011 no Processo n.º 0966/10), a existência de um erro de direito "não se enquadra nos "erros" tipificados no art.º 78º do CIVA" (neste sentido, vide o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo proferido a 20 de Dezembro de 2017 no Processo n.º 0366/17).” 18. Donde, decisivamente, “face à inaplicabilidade das normas ínsitas no artigo 78.º do Código do IVA, no caso de erro de direito deverá ser aplicado o prazo geral e supletivo de quatro anos previsto no artigo 98.º do Código do IVA” (Idem).

    14. Ora, no caso dos autos, basta convocarmos os concisos argumentos expendidos pela Dra Sílvia Oliveira na declaração em que expressou o seu voto vencido no sentido de considerar inaplicável o prazo de 2 anos do artigo 78.º do CIVA, para constatar que o sentido divergente do entendimento que logrou obter vencimento procede de erro de julgamento.

    15. É hoje pacífico na jurisprudência tributária que o prazo de dois anos previsto no artigo 78º do CIVA se acha reservado a erros materiais ou manifestos, nele incluindo apenas as situações de erro de cálculo, de escrita, de inexatidão ou de transcorrência formal (cf. os Acórdãos do STA, processos n.ºs 1427/14, de 28.06.2017; 0498/15.2BEMDL, de 03.06.2020; 0443/13.0BEPRT, de 17.06.2020; 1783/13.3BEBRG, de 18.11.2020 e 0136/14.0BEALM, de 02.12.2020; bem como decisões do CAAD n.ºs 117/2013-T, de 06.12.2013; 245/2013-T, de 28.03.2014; 251/2014-T, de 03.11.2014; 502/2014-T, de 19.12.2014; 608/2014-T, de 18.05.2015; 170/2016-T, de 07.12.2016; 649/2017- T, de 28.05.2018; 138/2018-T, de 03.09.2018 e 278/2018-T, de 12.02.2019, inter alia).

    16. Tal como se afirmou no Acórdão de 28 de março de 2014, proferido no processo arbitral n.º 245/2013-T, “O erro no enquadramento jurídico-normativo em sede de IVA de uma operação não é uma inexatidão da fatura, nos termos referidos do artigo 78.º, n.º 3 do Código do IVA, porque consubstancia um erro de direito sobre o regime jurídico aplicável e não uma inexatidão no cumprimento dos requisitos formais previstos para as faturas.” 22. E na esteira do acórdão fundamento, “Não existe uma definição legal do conceito de faturas inexatas, utilizado no n.º 3 do artigo 78.º do Código do IVA, mas a terminologia utilizada aponta manifestamente no sentido de se ter em vista a “veracidade” dos elementos que devem constar das faturas, nos termos do artigo 36.º, e não as questões de enquadramento jurídico.” 23. Também na doutrina...

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