Acórdão nº 248/12.5TBCMN-D.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelALEXANDRA VIANA LOPES
Data da Resolução17 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

As Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam no seguinte: ACÓRDÃO I.

Relatório: Na presente ação de cessação de alimentos, movida por M. J.

contra A. R.

: 1.

O autor: 1.1.

Formulou as pretensões: 1) De decretamento da cessação imediata do direito a alimentos a pagar pelo autor à ré.

2) De devolução pela ré do valor pago pelo autor de alimentos desde a data da condenação até à presente, por nunca ter carecido de alimentos, sob pena de enriquecimento sem causa, por cumprimento de obrigação inexistente, a que se reporta o art.476º/1 do C. Civil.

3) Subsidiariamente, caso assim não se entendesse, de devolução do valor pago de alimentos desde a data da atribuição da pensão de velhice até à presente.

1.2.

Fundamentou os seus pedidos, alegando, em síntese:

  1. Que foi condenado a pagar € 400,00 de alimentos à ré, o que vem cumprindo desde o trânsito em julgado da decisão, em fevereiro de 2018, data desde a qual tem vindo a cumprir a sua obrigação.

  2. Que os fundamentos da condenação alteraram-se, tendo em conta que a ré: b1) Já se encontra a auferir pensão de reforma por velhice, em valor superior a €300; 00, deixando de carecer de alimentos.

    b2) É detentora de 9 prédios rústicos.

    b3) Tem conseguido suportar, desde a separação até à presente data, todos os custos das ações judiciais que intentou contra si (indicando exemplificativamente cinco), que explica na possibilidade de talvez auferir rendimentos não declarados, nomeadamente através de prestação de cuidados domésticos ou outros.

    b4) Nunca viveu com a sua irmã, podendo estar a viver em casa possivelmente arrendada na morada que indica, de onde se depreende que nunca careceu de alimentos.

    b5) Recebeu de si uma indemnização de cerca de €26 800,00 no processo nº248/12.5TBCMN.

    b6) Chegou agora ao conhecimento do autor que a ré em 2014 procedeu ao levantamento do montante de €17 291,70 e é detentora de conta bancária, nomeadamente … nº ……09 do Crédit ….

  3. Que a ré litigou no processo nº248/12.5TBCMN com má-fé, pois declarou não ter rendimentos para prover à sua subsistência e para custear despesas de habitação e ocultou património para conseguir a pensão que sabia não ter direito, o que constitui um abuso de direito e um verdadeiro enriquecimento sem causa.

    1. Realizou-se conferência, sem acordo.

    2. Após conferência, a ré apresentou contestação, concluindo pela improcedência da pretensão, alegando em síntese, depois da transcrição da decisão de facto do STJ no acórdão de 30.03.2017, com base no qual foi fixada a pensão de alimentos:

  4. Quanto à sua situação de saúde: que se mantêm os problemas de saúde dos factos 4 e 5 do acórdão, parcialmente gerados (quanto à rigidez do polegar) por violência doméstica perpetrada pelo autor (condenado no processo-crime nº52/12.0GBCMN), e que a impedem de trabalhar sem limitações (facto 15 do acórdão do STJ).

  5. Quanto aos rendimentos (facto 6): que deixou de receber o RSI em 2018 e passou a receber pensão de velhice em 2021, no valor mensal de € 340,16 (183,09 acima do RSI); que continua a não conseguir prover ao seu sustento (conforme factos provados de 13 a 16 do acórdão, com as devidas adaptações); que o valor alegado como recebido refere-se ao valor de pensões atrasadas e não ao da indemnização; que não se presume que tenha rendimentos por causa da instauração das ações, nas quais beneficiou de apoio judiciário; que durante o casamento fizeram dois depósitos poupança, de igual valor, tendo a ré procedido a transferência de € 17 000,00 de uma poupança para conta por ela titulada para evitar a dissipação pelo autor do depósito e que não gastou, tendo-se o autor apropriado de uma poupança de € 15 000,00, acrescida de juros capitalizados.

  6. Quanto ao património: que a matéria não é superveniente e o autor não se socorreu da mesma na primeira ação; que, de qualquer forma, os terrenos de que é proprietária têm um valor diminuto e não cumprem minimamente as suas necessidades de sustento.

  7. Quanto às despesas: que aumentou as despesas de farmácia (provadas em 7 do acórdão no valor de € 45, 00) para uma média mensal de € 97, 93; que não teve alterações sensíveis das despesas de 8, apesar da inflação; que é falsa a imputação que lhe faz da casa (não ter vivido na casa da irmã- facto 13 do acórdão- e viver agora em casa arrendada), vivendo agora em casa de terceira pessoa, a título gratuito e precário; que tem despesas consumíveis numa média de € 36, 00 (€ 10, 00 de água, € 10, 00 de gás e € 16, 00 de eletricidade) e despesas de telecomunicações numa média de € 30, 00 mensais; que gasta uma média de € 200, 00 mensais em supermercado (alimentação, produtos de higiene pessoal e limpeza, bens essenciais de uso corrente) e € 50, 00 em fisioterapia e pilates; e) Quanto ao autor, que este não colocou em consideração os factos 9 a 12 do acórdão e a si respeitantes.

    1. O autor: respondeu à contestação, impugnando a matéria alegada e reafirmando que a autora não carece de alimentos, articulado que o despacho de 04.03.2022 não admitiu e determinou o desentranhamento; indicou o valor da ação em € 24 000,00.

    2. Foi saneada a causa e identificados os temas para instrução.

    3. Realizou-se a audiência de julgamento.

    4. Foi proferida sentença, que julgou a ação improcedente.

    5. O autor interpôs recurso de apelação da sentença, no qual apresentou as seguintes conclusões: «1 – Não pode o Recorrente conformar-se com a douta decisão proferida nos presentes autos.

      2 – Entende o recorrente que existe uma incorreta decisão quanto à matéria dada como comprovada nos factos 8, 9, 12 e 14.

      3 – Quanto ao ponto 8, o tribunal “a quo” dá como provado que a Recorrida tem gastos com medicação.

      4 – Na verdade, a Recorrida junta aos autos uma mera declaração farmacêutica, à qual o próprio tribunal faz a seguinte interpretação: “Declaração com carimbo da farmácia com parcelas mensais, desconhecendo-se o valor de cada produto e a correcção das contas, faltando documento comprovativo de aquisição, de destinatário e de receitas.” 5 – Inexiste nos autos prova documental de suporte de que a Recorrida tem efetivamente despesas com medicação.

      6 – Em relação, ainda ao ponto 8, faz referência a “bens essenciais” desconhecendo o Recorrente a que se refere, uma vez que, o documento de suporte a tal alegação é igualmente a referida declaração farmacêutica junta sob o doc. n.º 3 da douta contestação e nenhuma prova foi feita a este respeito.

      7 – Não podia o tribunal, salvo melhor e douto entendimento, em sede de fundamentação, ter entendimento de que a Recorrida tem despesas com farmácia, porquanto inexiste prova nos autos a este respeito.

      8 – Em relação ao ponto 12 da factualidade dada como provada, não logrou a Recorrente fazer prova documental de que tem despesa com telemóvel.

      9 – No atinente ao ponto 14, entende o recorrente que a factualidade aí dada como provada, não o devia ter sido, nos exatos termos em que foi.

      10 – Na verdade, a Recorrida limitou-se a juntar aos autos um recibo de uma prestação de serviços de fisioterapia do mês de janeiro de 2022.

      11 – Pelo que, entende o Recorrente que o tribunal deveria tão só ter dado como provado que “no mês de janeiro de 2022 a R. teve de despesa de fisioterapia a quantia de €50,00”.” 12 – Quanto à factualidade dada como provada em 9, devia o tribunal atentas as declarações prestadas por A. G., ter dado como provado que “a Ré mora em casa emprestada de A. G., desde, pelo menos há 3 anos”: [00:02:54] Magistrada Judicial: Olhe, e então, há quanto é que esta senhora vive na sua casa? [00:02:59] A. G.: Talvez 3 anos.

      [00:03:01] Magistrada Judicial: 3 anos.

      [00:03:02] A. G.: 3, 4 anos.

      13 – A pertinência de tal fundamentação prende-se com o facto de em sede de fundamentação, o Tribunal de que se recorre entender que atualmente a Recorrida tem mais gastos, uma vez que deixou de viver em casa da irmã e passou a viver em casa alheia, emprestada, mas com despesas relativas a consumos domésticos que num mês lhe levam €36,00.

      14 – Aliás, a Recorrida no seu depoimento acaba por admitir que deixou a casa da irmã no ano de 2015, ou seja, em data em que ainda não recebia sequer pensão de alimentos.

      [00:02:25] Mandatária do Autor: Não prova absolutamente nada. Olhe, outra coisa que eu lhe queria perguntar, a senhora onde vive atualmente? [00:02:34] A. R.: Vivo em ....

      [00:02:35] Mandatária do Autor: Em .... Olhe, e diga-me outra coisa quando a senhora saiu de casa, quando se separou? [00:02:42] A. R.: Sim.

      [00:02:43] Mandatária do Autor: Do seu marido, a senhora foi viver para casa da sua irmã? [00:02:46] A. R.: Sim.

      [00:02:46] Mandatária do Autor: Já aqui foi dito….

      [00:02:48] A. R.: E vivi lá até 2015.

      15 – O facto de a Recorrida admitir que deixou a casa da irmã no ano de 2015, colide com a fundamentação, na parte em que o tribunal entende que, “vivendo autonomamente, é forçoso que gaste mais do que enquanto acolhida em casa da irmã, tem que fazer compras em lugar de beneficiar da ajuda da família.

      16 – O A. logrou fazer prova de uma circunstância superveniente, que na sua modesta opinião é suficiente para que seja cessado o direito a alimentos da Recorrida, designadamente, a pensão por velhice.

      17 – Pelo que, o presente recurso merece provimento por todos os factos supra vertidos.

      18 – De acordo com a Lei n.º 64/2008, de 31.10, o direito a alimentos entre ex-cônjuges no seguimento do divórcio está subordinado ao princípio da autos-suficiência de cada um, assumindo o direito a alimentos caráter temporário e subsidiário.

      Segundo este modelo, o direito a alimentos entre ex-cônjuges depende apenas dos pressupostos de necessidade do alimentando, da possibilidade do obrigado e, ainda, da possibilidade de o alimentando poder prover ele próprio à sua subsistência.

      19 – Na presente ação de cessação de alimentos, compete ao A. fazer prova de circunstâncias supervenientes de que o alimentando não carece de continuar a recebê-los.

      20 – Pelo que, provado que está nos autos que a R., passou a receber pensão por velhice em data...

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