Acórdão nº 3529/21.3T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelFERNANDO BARROSO CABANELAS
Data da Resolução17 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório: Por despacho de 13 de julho p.p., e transcrevendo parte da fundamentação, foi decidido o seguinte: “Aliás, não se poderá descurar que a majoração a que alude o nº 7 do artigo 23º do EAJ está prevista não só para os casos de recuperação, mas igualmente para os casos de liquidação do ativo, na medida em que a remissão ali feita o é para os nºs 5 e 6.

Afigurando-se-nos que a referida majoração se aplicará, em regra, apenas nos casos em que exista liquidação do ativo (no âmbito de um processo de insolvência), mostrando-se a possibilidade de aplicação da referida majoração igualmente aos planos de recuperação aprovados e homologados, mas apenas se quando o próprio plano preveja que parte dos créditos sejam satisfeitos por via de liquidação de bens, entre outros casos, nos previstos nos artigos 195º nº 2 alínea c) e 196º nº 1 alínea e) do CIRE.

Não podendo extrair-se da remissão igualmente para o nº 5 do artigo 23º do EAJ a conclusão de que o resultado da liquidação e o resultado da recuperação terão o mesmo tratamento.

Sendo certo que, conforme o legislador consignou no referido preceito legal, o valor a majorar será em função do grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos, em 5% do montante dos créditos satisfeitos, sendo o respetivo valor pago previamente à satisfação daqueles.

Não se podendo desvalorizar a menção a créditos satisfeitos (coisa distinta de créditos a satisfazer) e nem o facto de se prever o pagamento desta componente da remuneração variável antes do pagamento aos credores.

O que apenas se vislumbra como aplicável e possível, precisamente, quando os credores tenham valores a receber de imediato por via de qualquer liquidação.

Isto porque, num quadro de recuperação, em que os créditos serão satisfeitos à medida que se forem vencendo de harmonia com o previsto no plano e parte da remuneração variável só se vencerá após dois anos (e em função do cumprimento do plano), nem existirão créditos satisfeitos e nem o pagamento da remuneração será possível nos termos ali previstos.

Sem que se vislumbre, aliás, fora um quadro de liquidação em que o administrador judicial tenha maior intervenção, porque razão é que este deverá ser recompensado na medida dos créditos a satisfazer, nos mesmos termos em que ocorrerá num cenário de insolvência com liquidação do ativo.

Aqui chegados, cumpre então concluir que o Sr. administrador judicial provisório terá direito à remuneração fixa de € 2.000,00.

Sendo que a tal remuneração acrescerá uma remuneração variável, correspondente a 10% da diferença entre o valor total dos créditos reconhecidos e o valor de tais créditos resultante da execução do plano de recuperação, valor da redução dos créditos reconhecidos [67.130,73].

Conforme cálculo efetuado pela secção deste Tribunal.

Sendo que tais montantes serão pagos pela requerente/devedora (artigo 17º-C nº 6 do CIRE).

A remuneração fixa a pagar de imediato e a remuneração variável em duas prestações de igual valor, sendo a primeira liquidada de imediato e a segunda dois anos após a data de homologação do plano, caso o devedor continue a cumprir regularmente o plano aprovado, sem prejuízo da redução desta segunda prestação para um quinto, caso o devedor deixe de cumprir o plano aprovado.

Pelo exposto fixo ao Sr. administrador judicial provisório o valor de remuneração fixa no montante de € 2.000,00 e a título de remuneração variável o montante de €10.717,08, montantes esses acrescidos do IVA legalmente devido, a pagar pela requerente/devedora, nos termos e prazos acima consignados.” Inconformado com a decisão, o senhor administrador judicial recorreu, formulando as seguintes prolixas conclusões: A.) Procede o presente recurso de decisão datada de 14-07-2022 em que determinou o Mmo. Juiz a quo, no que ao âmago do presente recurso interessa, o seguinte: “Pelo exposto fixo ao Sr. administrador judicial provisório o valor de remuneração fixa no montante de € 2.000,00 e a titulo de remuneração variável o montante de €10.717,08, montantes esses acrescidos do IVA legalmente devido, a pagar pela requerente/devedora, nos termos e prazos acima consignados.” Debruçando-se para o efeito na interpretação da nova redação dos art.ºs 23.º e 29.º da Lei n.º 22/2013, de 23 de Fevereiro. Determinou ainda que “A remuneração fixa a pagar de imediato e a remuneração variável em duas prestações de igual valor, sendo a primeira liquidada de imediato e a segunda dois anos após a data de homologação do plano, caso o devedor continue a cumprir regularmente o plano aprovado, sem prejuízo da redução desta segunda prestação para um quinto, caso o devedor deixe de cumprir o plano aprovado.” B.) Com o devido respeito, o Tribunal a quo desconsiderou os pressupostos factuais e a redação legal que subjaz ao confronto de interesses emergentes no presente recurso, nomeadamente arrendado a aplicação da majoração que o legislador EXPRESSA e DECLARADAMENTE consignou.

I – do PRAZO DE PAGAMENTO DA SEGUNDA PRESTAÇÃO C.) Desde logo, refira-se que, o Tribunal a quo fez consignar que “A remuneração fixa a pagar de imediato e a remuneração variável em duas prestações de igual valor, sendo a primeira liquidada de imediato e a segunda dois anos após a data de homologação do plano (...).”.

D.) Ora, presumindo-se que o legislador se soube expressar corretamente – cfr. art.º 9.º n.º 3 do CCivil (Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados - não estamos perante qualquer lacuna ou erro na expressão do legislador); E.) Porque existindo a opção entre o cômputo dos dois anos para o pagamento da segunda prestação, por referência à data da aprovação de tal plano ou à data da sua homologação, optou o legislador por consignar expressamente que tal pagamento deveria ocorrer nos dois anos seguintes à data da APROVAÇÃO do referido plano.

F.) Neste sentido e do teor da lei, dispõe o art.º 29.º n.º 3 da Lei n.º 22/2013, de 23 de fevereiro, que “3 - A remuneração variável relativa ao resultado da recuperação do devedor é paga em duas prestações de igual valor, sendo a primeira liquidada no momento da aprovação do plano de recuperação e a segunda dois anos após a aprovação do referido plano, caso o devedor continue a cumprir regularmente o plano aprovado.” G.) Assim, o pagamento da segunda prestação deverá ser efetuado dois anos após a aprovação do plano e não dois anos após a homologação do plano, devendo ser alterada a decisão recorrida em conformidade.

II – do CÁLCULO DA REMUNERAÇÃO VARIÁVEL H.) Por outro lado, e no que ao âmago do presente recurso se refere, entendeu o Tribunal o seguinte: “Sendo que a tal remuneração acrescerá uma remuneração variável, correspondente a 10% da diferença entre o valor total dos créditos reconhecidos e o valor de tais créditos resultante da execução do plano de recuperação, valor da redução dos créditos reconhecidos [€ 67.130,73]. Conforme cálculo efetuado pela secção deste Tribunal.” I.) Arrendando ainda a aplicação de qualquer majoração, in casu, de 5%, por entender que a mesma não é aplicável aos casos de recuperação do devedor, mas apenas aos casos de liquidação do ativo.

J.) Com o devido respeito, tal interpretação afronta literalmente o teor da lei.

K.) Neste sentido, não concorda o recorrente com a decisão a quo, mormente no que tange à fórmula de cálculo aplicada e à justificação apontada para a sua remuneração variável, por desconsiderar os pressupostos factuais e a redação legal que subjaz ao confronto de interesses emergentes no presente recurso, nomeadamente, arrendado a aplicação da majoração que o legislador EXPRESSA e DECLARADAMENTE consignou.

  1. da REMUNERAÇÃO/art.º 23.º n.ºs 4, alínea a) e 5 L.) Nos termos do art.º 23.º n.ºs 4, alínea a) e 5 da Lei n.º 22/2013, de 23 de fevereiro, a situação líquida da sociedade revitalizanda “calculada 30 dias após a homologação do plano de recuperação do devedor, nos termos do n.º 5” corresponderá à sua situação líquida apresentada no final do último exercício, de (-)146.127,20€, acrescido do valor da redução dos créditos reconhecidos de 67.130,73€, ou seja, o valor de (-)78.996,47€.

    M.) Neste sentido, JOÃO ANTUNES in “O capital próprio”, Revista TOC 99 – JUN 2008, págs. 32 e 33, que consigna esclarecidamente que “O capital próprio, também designado por capitais próprios ou situação líquida, é uma realidade que sempre confundiu leigos e não leigos, questionando-se sobretudo sobre a sua natureza, finalidade e em que circunstâncias pode ser movimentado. O capital próprio corresponde ao património líquido da empresa e é composto pelas seguintes rubricas com tradução contabilística: capital social, reservas, prestações suplementares e resultados transitados.” N.) O conceito de “SITUAÇÃO LÍQUIDA” de uma sociedade está contabilisticamente tipificado e resulta dos seus elementos contabilísticos da revitalizanda, na rúbrica “CAPITAL PRÓPRIO”, sendo esta a definição que melhor se coaduna com a interpretação literal da lei.

    O.) Aliás, a interpretação vertida na decisão recorrida poderia levar à seguinte situação: recorrendo uma empresa ao Processo Especial de Revitalização, não pretendendo aprovar nenhuma redução de capital junto dos seus credores, mas apenas (re)negociar novos prazos de pagamento – como tantas vezes sucede, P.) O Administrador Judicial Provisório não teria direito a qualquer remuneração variável!!! Q.) Com o devido respeito, a remuneração variável computada nos termos do art.º 23.º n.ºs 4, alínea a) e 5 da Lei n.º 22/2013, de 23 de fevereiro, corresponderá à aplicação do fator percentual de 10% do valor da...

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