Acórdão nº 126/21.7T8ABF.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA ADELAIDE DOMINGOS
Data da Resolução10 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Évora I – RELATÓRIO C… e I… intentaram a ação de despejo contra P… pedindo que seja condenada a entregar aos Autores o imóvel locado livre e devoluto de pessoas e bens, bem como a pagar-lhes uma quantia a liquidar em execução de sentença correspondente ao dobro da renda acordada entre as partes dada a mora na entrega do imóvel locado, nos termos do artigo 1045.º do Código Civil.

Alegaram para o efeito e, em síntese, que por contrato de arrendamento celebrado com a Ré lhe deram de arrendamento para habitação, em 15-02-2016, mediante o pagamento de uma renda mensal de €600,00, pelo prazo de um ano, com renovação automática no fim do prazo por igual prazo, a fração autónoma designada pela letra “D”, do prédio constituído em propriedade horizontal, sito …, freguesia de Albufeira e Olhos de Água, mediante o pagamento de uma renda mensal de €600,00.

Em 09-09-2020, os Autores comunicaram à ré, por intermédio de agente de execução, que não tinham intenção de renovar o dito contrato de arrendamento, findo o seu termo, e que o mesmo deveria ser considerado extinto em 14-02-2021, devendo, consequentemente, aquela entregar-lhes o imóvel arrendado, devoluto de pessoas e bens.

A Ré não entregou o imóvel até à presente data, fazendo uso do mesmo.

Contestou a Ré, alegando, em suma, que se aplica ao contrato em causa a nova redação dada ao artigo 1096.º do Código Civil, introduzida pela Lei n.º 13/2019, de 12-02, que entrou em vigor a 13-02-2019.

De acordo com essa redação, a renovação automática dos contratos de arrendamento destinados a habitação permanente passou a ser, no mínimo, de três anos. Tal significa que o contrato de arrendamento aqui em causa renovou-se, ope legis, por mais três anos, ou seja até 14-02-2022 e, portanto, por tal motivo, não poderiam os senhorios em 09-09-2020 oporem-se à sua renovação para 14-02-2021.

Por tal motivo, os pedidos formulados em sede de petição inicial contra a Ré devem ser julgados improcedentes.

Sem prescindir, ainda alegam que à data da notificação da Ré da intenção de não renovação do contrato de arrendamento, em 09-09-2020, estava em vigor o artigo 8.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19-03, na redação dada pela Lei 14/2020, de 09-05, que estabelecia a suspensão até 30-09-2020 da produção de efeitos de oposição à renovação de contratos de arrendamento habitacional efetuadas pelo senhorio, tendo esse prazo sido sucessivamente alargado para 31-12-2020 e, posteriormente, novamente alargado para 30-07-2021, por força da Lei 58-A/2020, de 30-09, e da Lei n.º 75-A/2020, de 30-12.

Daqui decorre que só em 01-07-2021, a oposição à renovação de um contrato de arrendamento habitacional poderia, legalmente, produzir os seus efeitos, nomeadamente, de poder ser exigível a entrega do locado, sendo que à data da propositura desta ação (15-02-2021) os efeitos dessa oposição estariam sempre suspensos, razão pela qual não se aceita que o contrato tenha terminado a 14-02-2021 e que o locado deveria ser entregue nessa data.

Foi proferida sentença que julgou a ação improcedente, absolvendo a Ré do pedido.

Inconformados, recorreram os Autores pugnando pela revogação da decisão recorrida e, em consequência, ser a decisão substituída por outra que verifique a caducidade do contrato de arrendamento (por oposição à sua renovação do senhorio) e condene a Ré nos pedidos formulados, apresentando as seguintes CONCLUSÕES: «1. O presente recurso tem como objecto a matéria de direito da sentença proferida nos presentes autos.

  1. Peticionavam os recorrentes, no âmbito da presente acção de despejo que a recorrida fosse condenada a entregar-lhes o imóvel que lhe havia sido arrendado, bem como a condenação no pagamento de uma indeminização a que correspondia o valor da renda em dobro por cada mês de mora na entrega do locado.

  2. Acontece que, entendeu o Tribunal a quo que, ao contrato de arrendamento em apreço, deveria ser aplicável o disposto no artigo 1096.º do CC, na redacção introduzida pela Lei 13/2019, que, na opinião do Tribunal a quo se encontrava em vigor aquando da renovação deste contrato de arrendamento ocorrida em 15.02.2019.

  3. Entendeu-se assim que, no seu termo, os contratos de arrendamento com prazo para habitação permanente se renovam automaticamente, por períodos sucessivos de igual duração ou, se esta for inferior, de três anos, em conformidade com o estipulado no número 1 do artigo 1096.º do Código Civil.

  4. O que significa que se o contrato de arrendamento foi celebrado por prazo inferior a três anos, e não foi excluída a renovação, o contrato se irá renovar automaticamente sempre por períodos mínimos sucessivos de três anos, em face do prazo mínimo imperativo previsto na referida disposição legal.

  5. Conclui-se, assim, que a oposição à renovação promovida pelos autores não produziu qualquer efeito sobre o contrato de arrendamento celebrado, considerando que o mesmo se renovou em 15.02.2019 por um período mínimo de três anos.

  6. E na sequência deste entendimento, julgou o Tribuna a quo, a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, absolveu a ré dos pedidos.

  7. Entendem os recorrentes que dado o contrato de arrendamento objecto dos autos ter sido outorgado em Fevereiro de 2016, não se lhe deve ser aplicável a nova redacção do artigo 1096.º do CC dada pela Lei 13/2019, de 12 de Fevereiro.

  8. Porque a referida Lei só entrou em vigor em 13 de Fevereiro de 2019, e à referida norma não foi atribuído qualquer força retroactiva.

  9. Entendem os recorrentes que, ao abrigo do disposto no artigo 12 n.º 1 do CC, o qual dispõe que "A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular." Não deve a presente norma na sua actual redacção ser aplicável ao caso.

  10. O entendimento em contrário viola claramente o disposto no artigo 12.º do CC, e põe em causa a segurança jurídica com a qual as partes acordaram e celebraram o contato objecto dos autos.

  11. E é precisamente este o princípio basilar do artigo 12.º do C.C., que entendem os recorrentes aqui ter sido violado.

  12. Não sendo justo, obrigar-se e sujeitar-se aos recorrentes a uma nova realidade jurídica, que à data da contratação não existia, nem tão pouco era espectável que viesse a existir, sendo certo que a referida Lei 13/2019, de 12 de Fevereiro não atribui especificadamente força retroactiva à nova redacção do artigo 1096.º 14. Entendendo assim os recorrentes, salvo o devido respeito, que fez errada aplicação do artigo 12.º do CC.

  13. Além do mais, a interpretação feita pela douta sentença, viola o princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança, o qual derroga do princípio de Estado de Direito, consagrado no artigo 20.º da CRP.

  14. Sem conceder, por mera cautela e dever de patrocínio ainda que assim não se entenda, e caso se entenda que a referida norma é aplicável ao presente caso, ainda assim, entendem os recorrentes, que foi feita errada a aplicação do disposto no artigo 1096ª do C.C.

  15. Com efeito, os recorrentes entendem que o artigo 1096º nº 1 do CC, é de natureza supletiva e não imperativa.

  16. Desde logo porque a norma clarifica, na opinião dos recorrentes e salvo o devido respeito, de forma clara} a supletividade da norma, uma vez que, começa-se logo por dizer, "salvo estipulação em contrário".

  17. Ou seja, tal expressão, logo no início do corpo da norma, quis o legislador conferir natureza supletiva à norma.

  18. O contrato, esteve em vigor desde Fevereiro de 2016 até Setembro de 20211 (por força da suspensão da produção de efeitos da oposição à renovação derivada à pandemia COVID19), ou seja o contrato esteve vigente por cinco anos e seis meses, pelo que foi ultrapassado o período mínimo de vigência dos contractos de arrendamento urbano destinado à habitação passiveis de renovação, conforme impõe o artigo 1097º nº 3 do C.C.

  19. A comunicação de oposição à renovação do contrato de arrendamento produziu os seus efeitos, em tempo útil, e como tal deve o contrato ser considerado caduco, e a recorrida condenada a entregar o locado.

  20. Veja-se que foi a própria Lei 13/2019 que veio estabelecer como limite mínimo da duração dos contractos o período de um ano, de acordo com o que se estabeleceu para o no 2 do artigo 1095.º do C.C.

  21. Entendendo os recorrentes, que face à letra da própria norma, esta deve ser a interpretação correcta, e não a aplicada pelo Tribunal a quo, a qual nos termos em que é feita, viola o artigo 9.º do CC., e consequentemente, os artigos 1080.º , 1096.º, n.º1 e 3, e 1097.º, n.º 3, todos do Código Civil.

  22. E neste sentido já julgou o Tribunal da Relação de Lisboa, no processo no 8851/21.6T8LRS.L1-6, por acórdão datado de 17/03/2022, disponível em wwwdgsi.pt» II- FUNDAMENTAÇÃO A- Objeto do Recurso Considerando as conclusões das alegações, as quais delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC), não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do CPC), no caso, a questão essencial a apreciar consiste em saber se ao arrendamento em apreço nos autos se aplicam a alterações ao artigo 1096.º, n.º 1, do Código Civil introduzidas pela Lei n.º 13/2019, de 12-02, ou seja, se a partir da entrada em vigor deste diploma o contrato de arrendamento passou a renovar-se automaticamente pelo prazo mínimo de três e não por um ano como inicialmente estipulado pelas partes.

    B- De Facto FACTOS PROVADOS «1 – A favor dos autores C… e I… mostra-se inscrito o direito de propriedade quanto à fracção “D” do imóvel descrito sob o n.º …-CRP, freguesia de Albufeira, da Conservatória do Registo Predial de Albufeira; 2- Em 15 de Fevereiro de...

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