Acórdão nº 3136/20.8T8FNC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelANA PAULA LOBO
Data da Resolução10 de Novembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I – Relatório I.1 – Questões a decidir AA, BB, CC e DD, interpuseram recurso de revista do Acórdão proferido pela ... Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em 10 de Março de 2022 que revogou a decisão de 12 de Outubro de 2021 do Tribunal Judicial da Comarca ...- Juízo Central Cível ... – Juiz ... que tinha decidido que o direito de atribuição preferencial da casa de morada de família e uso do respectivo recheio fora extemporaneamente exercido, requerendo a revogação do acórdão recorrido com confirmação da decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância.

Apresentaram alegações de recurso que culminam com as seguintes conclusões: A.

No que respeita à violação prevista no artigo 674.º, n.º 1, al. a) do CPC, importa referir que o tribunal recorrido violou a lei substantiva, sendo que esta violação reconduz-se a um erro de interpretação da norma aplicável.

B.

Os AA. não concordam com a interpretação que o Tribunal da Relação fez do artigo 2103.º do CC.

C.

Consideramos AA. que a supra citada norma deve ser interpretada no sentido que lhes atribuiu a sentença proferida em primeira instância, por ser aquela que mais se coaduna com a vontade da lei em decidir de forma justa.

D.

O pedido de encabeçamento do direito de uso e habitação em apreço foi formulado pela Ré, pela primeira vez, aquando da pronúncia pelas partes sobre a forma da partilha, nos termos do n.º1 do art.57.º do RJPI, ou seja, já após a decisão acerca da partilha dos bens e respetiva adjudicação.

E.

Momento manifestamente inapropriado e tardio, para os devidos efeitos F.

A admissão, adjudicação e integração de tal direito de habitação de casa de morada de família a favor da ora Ré, confronta, sem qualquer dúvida as expetativas dos restantes interessados, ora recorridos.

G.

Trata-se de um direito de preferência (atribuição preferencial) que, como resulta do art.º 2103-A.º CC, deve ser exercido no momento crucial da partilha, ou seja, no momento das adjudicações e não da forma à partilha, que trabalha com as adjudicações feitas e respetivos valores.

H.

A ponderação desta circunstância terá repercussões nos direitos de cada um dos interessados, pelo que urge concluir que tal questão se reconduz, necessariamente, a questão que influi na partilha.

I.

Saber se sobre os bens objeto de partilha irá recair o ónus do artigo 2103.º-A do CC influi sobre o modo de os partilhar.

J.

Mas não só. O exercício do direito consagrado no dito artigo constitui uma questão que influi decisivamente nas demais adjudicações.

K.

Sendo imperioso aos demais interessados a consciência de tal exercício, para poderem concorrer às adjudicações em condições corretas, e com todas as informações relevantes.

L.

O valor da casa de morada de família e o próprio interesse pela mesma é totalmente diferente se tal bem for “onerado” com os direitos reais menores de habitação e de uso, com a ainda prevista longa indisponibilidade desse património.

M.

Tal conclusão é sustentada pelo regime estabelecido para os encargos ou ónus da herança, uma vez que estes igualmente apenas podem ser reclamados até à conferência preparatória.

N.

Significa dizer-se que, tendo celebrado acordo quanto à composição dos quinhões e tomando a Ré conhecimento, nesse momento, que os bens em causa não lhe seriam adjudicados, deveria, nessa mesma altura, expressamente declarar pretender exercer o seu direito às atribuições preferenciais em causa.

O.

Não o tendo feito, forçoso se torna concluir que o exercício de tal direito pela Ré foi exercido intempestivamente, pelo que não poderá ser considerado na partilha em apreço.

P.

Sendo certo que esta interpretação do artigo 2103.º do CC é aquela que mais se coaduna com uma decisão justa e equitativa do litígio, pelo que não restam dúvidas que tal norma legal deveria ter sido interpretada neste sentido pelo tribunal a quo.

Q.

Pelo que forçoso se torna concluir que no caso em apreço esta questão deveria ter sido suscitada em sede de conferência preparatória.

R.

Tendo sido neste sentido que decidiu o tribunal de primeira instância, em cuja decisão consta que a Ré, aqui recorrida, deixou passar o tempo legalmente estabelecido para formular o pedido em apreço e, por força disso, e da natureza potestativa dos direitos em causa, gerou-se a renuncia tácita aos referidos direitos de habitação e uso, pela falta de manifestação atempada da sua vontade.

S.

Inclusive, acórdão recorrido, ao decidir como decidiu, está em absoluta contradição com anteriores acórdãos, conforme acima exposto, nomeadamente: Ac. da Relação do Porto, proferido no processo n.º 9231043, Ac. do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo 0536414, Relator FERNANDO BAPTISTA, datado de 01 de dezembro de 2006; Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 10-02-1991, in CJ, 1991, t.I, p.249; de 25-0-1993, Pº9231043 (acima mencionado), e de 21-11-1995, in BMJ 451.º, p.504.

T.

Posição relativamente à qual os recorridos manifestam plena concordância, pelo que pugnam para que a mesma seja mantida, em todos os seus termos.

A recorrida, EE apresentou contra-alegações defendendo a confirmação do acórdão recorrido que terminam com a formulação das seguintes conclusões: 1.

Entende a recorrida que o recurso interposto por parte dos recorrentes é legalmente inadmissível, e como tal deverá ser a sua apreciação rejeitada.

  1. Com efeito, e no que tange à aferição da admissibilidade do recurso de revista, não poderemos obliterar a aplicabilidade do disposto no capítulo I do Título V que prevê as disposições gerais aplicáveis aos recursos.

  2. Neste concreto aspecto, urge atender desde logo ao denominado critério “das alçadas e da sucumbência” que limita a admissibilidade da pretensão recursiva e que se encontra prevista no n.º 1 do art.º 629.º do CPC.

  3. Com efeito, resulta do referido inciso legal que: “1- O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao...

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