Acórdão nº 02530/05.9BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução09 de Novembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- Relatório – 1 – A………, S.A., com os sinais dos autos, vem, ao abrigo do disposto no artigo 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) interpor para este Supremo Tribunal recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 14 de outubro de 2021, que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto que julgara improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra liquidações adicionais de IRC dos exercícios de 2001 e de 2002.

A recorrente concluiu as suas alegações de recurso nos seguintes termos: 1.ª Em face do decidido em segundo grau de jurisdição, considera a Recorrente verificar-se violação do disposto nos artigos 17.º, n.º 1 e 18.º, n.º 3, alínea a), do Código do IRC e dos princípios da especialização dos exercícios e da tributação pelo lucro real, bem como, do disposto nos artigos 83.º, n.º 1, e 85.º, n.º 1, da LGT. Colocam-se, em concreto, as seguintes questões: 1) Saber se, no âmbito de uma ação inspetiva em que a administração tributária procede à desconsideração de custos com a aquisição de mercadorias em existências pode, ao abrigo do artigo 17.º, n.º 1, do Código do IRC, determinar-se a matéria coletável por mera avaliação direta mediante a mera desconsideração de tais custos, ou se, se impõe, sob pena de ilegalidade, o recurso a métodos indiretos por forma a compreender também a correção dos correspondentes proveitos declarados com referência à venda das existência; 2) Saber se, é compatível com os artigos 17.º, n.º 1 e 18.º, n.º 3, alínea a), do Código do IRC e com os princípios da especialização dos exercícios e da tributação pelo lucro real, a imediata desconsideração fiscal de um custo com a aquisição de existências, sem verificação da sua efetiva relevação fiscal no lucro tributável do exercício no cumprimento dos sobreditos preceitos e princípios, assim como, com o determinado nas regras de registo contabilístico previstas no Plano Oficial de Contabilidade (POC); 2.ª Entende a Recorrente que resulta evidente a necessidade de intervenção do Supremo Tribunal Administrativo no caso sub judice, impondo-se a revista para uma melhor aplicação do Direito e por se tratar de uma questão de importância jurídica e social fundamental; 3.ª No caso sub judice, a necessidade da revista para uma melhor aplicação do Direito assenta, desde logo, no facto de a questão ter a potencialidade de se repetir num número elevado de casos; 4.ª Com efeito, e desde logo, está em causa a distinção entre os casos em que se revela imperativo o recurso à avaliação indireta para motivar a correção efetuada no âmbito da inspeção tributária e os casos em que apenas se exige o recurso à avaliação direta por se tratarem de correções técnicas ou meramente aritméticas (distinção essa que tem sido amplamente debatida na jurisprudência, nomeadamente no acórdão do STA de 20.05.2020, proferido no processo n.º 0276/14.6BECBR; acórdão do STA de 17.06.2015, proferido no processo n.º 0535/14 e ainda o acórdão do TCA Sul de 14.11.2019, proferido no processo n.º 7735/14.9BCLSB, o acórdão de 17.10.2019, proferido no processo n.º 487/11.6BECTB); 5.ª Da mesma forma, está em causa um tema relativo ao tratamento contabilístico e fiscal e à natureza de gastos especificamente relacionados com a aquisição de mercadorias registadas como existências/inventários, cuja relevância é por demais evidente, considerando a necessidade de efetuar uma correta interpretação legal das normas contabilísticas e fiscais em apreço; 6.ª O dever de ajuizar e avaliar o método de avaliação da matéria coletável, por forma a evitar abusos no procedimento inspetivo ou diminuição das garantias dos contribuintes, deve ser particularmente elevado, tanto mais quando a utilidade dessa decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio, o que seguramente é o caso sub judice; 7.ª O mesmo juízo deve ser tido em especial conta quando em causa está um tipo de custo que não pode, nem deve, em circunstância alguma influenciar o resultado contabilístico e fiscal apenas por ocorrer (ou não) uma transação comercial de aquisição de mercadorias; 8.ª O juízo do Tribunal a quo padece, no entendimento da Recorrente, de erro ostensivo; 9.ª Tendo presente a errónea posição do Tribunal recorrido – cujo juízo não tem em linha de conta o facto de a administração tributária manter o “reconhecimento” contabilístico e fiscal dos proveitos correspondentes à venda de mercadorias que expressamente afirma não terem sido adquiridas, ficcionando uma margem de lucro de 100% que apenas se coadunaria com o recurso a métodos indiretos – impõe-se a intervenção, por parte deste STA, por forma a melhorar a interpretação e aplicação dos preceitos legais consagrados nos artigos 17.º, n.º 1, 18.º, n.º 3, alínea a), do Código do IRC e dos artigos 81.º, n.º 1 e 83.º, n.º 1 da LGT, à situação em apreço; 10.ª Por seu lado, ao avalizar a correção sem atender à específica natureza do custo e o seu tratamento contabilístico e tributário, o TCA Norte profere um entendimento que se revela ostensivamente errado, na medida em que considera legal uma correção ao lucro tributável que nunca poderia ter lugar, tendo em conta as normas contabilísticas e fiscais aplicáveis; 11.ª De facto, mesmo que não houvesse qualquer operação comercial subjacente, nunca de tal circunstância decorreria qualquer correção ao lucro tributável correspondente ao montante das faturas emitidas pela B…….., uma vez que o seu impacto no resultado do exercício da Recorrente é nulo, conforme resulta claro do Parecer junto aos presentes autos; 12.ª No que se refere à relevância jurídica fundamental, que se manifesta, por um lado, na complexidade das operações jurídicas indispensáveis à resolução do caso e, por outro lado, na capacidade de expansão da controvérsia, impõe-se ao Tribunal a interpretação de um conjunto de preceitos, recorrendo aos vários elementos interpretativos das normas; 13.ª Não se trata, por conseguinte, de uma mera operação de interpretação de uma determinada norma jurídica, mas de um complexo de operações de subsunção jurídicas que, até à data e com o devido respeito, os tribunais superiores não efetuaram de forma completa e consistente; 14.ª De facto, atendendo aos conceitos em presença e às disposições normativas aplicáveis, é inequívoco para o Recorrente a existência de uma complexidade jurídica superior à comum, que justifica a admissão do presente recurso de revista; 15.ª A complexidade da primeira questão em equação surge evidenciada pelo facto de não ser, numa primeira análise, absolutamente claro e percetível que os factos e circunstâncias alvo da correção devessem ser avaliados com recurso a métodos diretos ao abrigo dos artigos 81.º e 84.º da LGT, como parece entender o Tribunal a quo; 16.ª A complexidade da restante questão em equação advém do facto de em causa estarem gastos cuja natureza, por si, têm um tratamento contabilístico e fiscal diverso dos restantes gastos normais da atividade, o que, apenas com recurso ao Parecer junto aos autos, é possível alcançar que a correção dos serviços da administração tributária padece de vício estrutural; 17.ª Considera a Recorrente que a interpretação proferida em segundo grau de jurisdição, em clara violação da lei, por perfilhar aceção contrária ao próprio espírito do legislador tributário, é suscetível de se aplicar em numerosos novos litígios administrativos e judiciais, e inclusivamente originá-los, gerando uma avultada incerteza e instabilidade e fazendo antever como objetivamente útil a intervenção do Supremo Tribunal Administrativo; 18.ª Para além disso, não vigora até esta data...

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