Acórdão nº 0246/11.6BECBR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelGUSTAVO LOPES COURINHA
Data da Resolução09 de Novembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – RELATÓRIO I.1 Alegações A……….

e B………, melhor identificados nos autos, vêm recorrer da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que julgou improcedente a presente impugnação judicial por eles deduzida contra os actos de liquidação adicional de IRS dos anos de 2007 e 2008, e respectivos juros compensatórios, no montante global de €21.252,85 Apresentam as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões a fls. 123 a 162 do SITAF;

  1. A sentença recorrida, versa sobre as liquidações adicionais de IRS para os anos de 2007 e 2008, as quais são provenientes de correcções efectuadas no âmbito do Relatório Final de Inspecção, facto dado por provado em 9) da matéria probatória assente, constituindo este a fundamentação dos actos.

  2. Por análise ao mesmo, denota-se, de forma inequívoca, que existe falta de fundamentação, quer porque é completamente omisso quanto à simulação das respectivas liquidações, quer porque não se vislumbra o itinerário de apuramento dos montantes, muito menos as normas jurídicas que os suportam.

  3. A fundamentação que se afigura, é manifestamente insuficiente, uma vez que não dá a conhecer, minimamente, de facto e de direito, as razões e os termos em que se operaram as correcções que originam a liquidação adicional, não esclarecendo sobre o itinerário cognoscitivo do autor do acto e não esclarecendo sequer os normativos legais índice que motivaram as correções e a consequente liquidação adicional, muito menos, decorre qualquer elucidação para a obtenção dos valores aí constantes.

  4. Neste contexto, a simples leitura do facto dado por provado em 9) da matéria probatória assente na sentença, que sustenta as liquidações, não permite identificar todo o iter cognoscitivo que presidiu e sustentou as liquidações, muito menos em que normas legais sustentou a AT as mesmas.

  5. Não sendo o tribunal fiscal um órgão de administração activa dos impostos, mas antes um órgão para dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas fiscais (art.º 212.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa), não lhe cabe praticar o acto tributário que, como título formal e abstracto, declara constituídos na Ordem Jurídica os efeitos jurídicos próprios de uma obrigação pecuniária.

  6. A tanto se opõe o princípio da separação de poderes entre os tribunais e o executivo ou a administração, consagrado como princípio estruturante do sistema de poderes no artigo 111.º da Constituição, princípio este que a Senhora Juiz “manda para as ortigas”.

  7. A motivação de direito da sentença, encontra argumentos, quer na contestação apresentada pela Fazenda Pública, quer na própria inferência que o Tribunal faz dessa mesma peça processual, o que se traduz num evidente erro de julgamento.

  8. O que, por si só, salienta que a alegação dos impugnantes, de falta de fundamentação dos actos de liquidação, se confirma, de forma, por demais, óbvia.

  9. Para que seja adequada a fundamentação, esta, deverá respeitar os princípios da suficiência, da clareza, e da congruência e que, por outro lado, seja contextual e/ou contemporânea do acto, não podendo ser apresentada a posteriori (cfr. os acórdãos do STA, de 26/3/2014, proc. n.º 01674/13 e de 23/4/2014, proc. n.º 01690/13).

  10. Neste contexto, a fundamentação a posteriori, dos actos de liquidação, constante quer da contestação apresentada pela Fazenda Pública, quer da própria sentença, não é admissível, isto porque, só poderá equivaler como fundamentação, a declaração de motivos que a AT exteriorizar aquando da prática do acto e contemporâneo ao mesmo, conforme dispõe o nº2 do art.º77 da LGT.

  11. Assim, o que se impõe ao Tribunal é a análise da prova recolhida nos autos sob o prisma da fundamentação formal, captando da decisão os elementos que comprovem ou infirmem que se trata de uma exposição sucinta dos factos e das regras jurídicas em que se fundam, que os seus destinatários concretos, pressupostos cidadãos diligentes e cumpridores da lei, ficam em condições de fazer a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela entidade decidente L) É entendido na Doutrina e Jurisprudência Portuguesas que a fundamentação há-de ser «a indicação dos factos e das normas jurídicas que a justificam» (Prof. J. Alberto Reis, in vol.V, pag.24). Ou ainda como diz Henri Capitant, no seu «Vocabulaire Juridique», a «exposição das razões de facto e/ou de direito que determinam... uma decisão».

  12. Quando é desconhecido o itinerário cognitivo e valorativo seguido pelo autor do acto, que é totalmente omisso quanto às razões de direito e indicação das normas legais que o legitimam, deve concluir-se que houve preterição de formalidades legais, que se faz equivaler à falta de fundamentação.

  13. Pelo que, só se poderá concluir, que a sentença ao decidir que os actos impugnados estão suficientemente fundamentados, faz uma errónea interpretação e aplicação do disposto no artigo 77º da LGT e artigo 66º do CIRS, tal como viola, ainda, os princípios do inquisitório, deveres de imparcialidade, justiça e proporcionalidade, bem como o princípio da tributação pelo rendimento real, constantes, dos artigos , , , , , , , 10º, 11º, e 12º do CPA, 55º, 71º, 74º da LGT, bem como dos artigos 20º, 48º, 111º, 266º e 268º da CRP.

I.2 – Contra-alegações Não foram produzidas contra-alegações no âmbito do recurso.

I.3 - Parecer do Ministério Público Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, veio o Ministério Público emitir parecer com o seguinte conteúdo: “I. Objecto do recurso.

  1. O presente recurso vem interposto da sentença do TAF de Coimbra que julgou improcedente a ação intentada contra os atos de liquidação adicional de IRS relativos aos anos de 2007 e 2008, no valor de € 21.252,85 euros.

    Considera a Recorrente que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao ter dado como não verificado o vício de falta de fundamentação dos atos tributários impugnados, violando o disposto no artigo 77º da LGT e artigo 66º do CIRS, assim como os princípios do inquisitório, deveres de imparcialidade, justiça e proporcionalidade, assim como o princípio da tributação pelo rendimento real.

    Para o efeito alega que ao contrário do decidido é manifesta a falta de fundamentação do ato tributário, pois o relatório dos Serviços de Inspeção que lhe serve de suporte «é completamente omisso quanto à simulação das respetivas liquidações, quer porque não se vislumbra o itinerário de apuramento dos montantes, muito menos as normas jurídicas que os suportam» e «não dá a conhecer, minimamente, de facto e de direito, as razões e os termos em que se operaram as correções que originam a liquidação adicional».

    E termina pedindo a revogação da sentença e a sua substituição por decisão que julgue a impugnação procedente.

  2. Para se decidir pela improcedência da ação, considerou o tribunal “a quo” que «do teor do RFI, conjugado com as demonstrações das liquidações de IRS elaboradas inicialmente de acordo com as declarações de IRS preenchidas e apresentadas pelos ora Impugnantes, a par das demonstrações das liquidações de IRS resultantes das correcções determinadas em sede inspectiva (e que os Impugnantes expressamente declaram ter sido notificados, pese embora...

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