Acórdão nº 1812/21.7T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelPEDRO MAUR
Data da Resolução03 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES, * * *1. RELATÓRIO 1.1. Da Decisão Impugnada A Autora O. S., LDA instaurou a presente acção declarativa de condenação com processo comum contra a Ré B. M. - CONSULTORIA, SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA, pedindo que: «a) seja a Ré condenada a devolver à Autora a quantia paga a título de honorários no montante de € 61.500,00 c/iva, acrescida de juros de mora legais desde a citação até efetiva devolução; b) seja a Ré condenada a ressarcir a Autora a título de perda de chance, em valor cuja liquidação se relega para execução de sentença; c) subsidiariamente, e apenas no caso de a Ré não ser condenada a devolver a totalidade dos honorários à Autora, serem os mesmos reduzidos segundo juízos de equidade em valor/percentagem a fixar pelo tribunal».

Fundamentou a sua pretensão, essencialmente, no seguinte: «em Setembro de 2016, a Autora e Ré celebraram um contrato de prestação de serviços no qual a Ré prestaria à Autora os serviços necessários de preparação de candidatura à medida Inovação Produtiva do Sistema de Incentivos Portugal 2020; em 30/09/2016, a Ré apresentou a candidatura da Autora ao Portugal 2020, indicando como investimento elegível potencial o montante de € 1.555.672,19; em 13/06/2017, a Autora foi notificada da decisão final, tendo sido atribuído um incentivo reembolsável de € 1.055.555,31, referente ao projecto de investimento elegível no montante de € 1.507.936,16; em 28/06/2017, na sequência da decisão de aprovação de candidatura, a Autora assinou o termo de aceitação do qual constava do seu teor como cláusula primeira que o período de execução do investimento decorreria entre 01/10/2016 e 30/09/2018; uma vez proferida aquela decisão de aprovação, em 10/08/2017, a Ré solicitou à Autora a emissão e entrega de cheques pré-datados no valor global de € 92.738,08 c/IVA, equivalente a 5% do investimento elegível pela entidade competente, conforme consta do contrato de prestação de serviços, emitindo a competente factura; em 11/08/2017, a Ré, em representação da Autora por via do contrato de prestação de serviços celebrado, submeteu via Balcão Portugal 2020, um primeiro pedido de pagamento/adiantamento; contando com este, a Autora, em 20/09/2017, celebrou um contrato de abertura de crédito com o Banco ..., SA, solicitando em 06/10/2017 a utilização do montante de € 150.000,00 destinado a antecipação de incentivos Portugal 2020, pedido que foi aprovado e pago em 12/10/2017 correspondente a um incentivo reembolsável de € 211.094,29; em 24/11/2017, a Ré submete novo pedido de pagamento/adiantamento, em face do qual a Autora celebrou, em 14/12/2017, novo contrato de abertura de crédito com aquele Banco, solicitando a utilização do montante de € 200.000,00 destinado a antecipação de incentivos Portugal 2020; a Ré submeteu mais três pedidos de pagamentos/adiantamentos, em 15/12/2017, 28/02/2018 e 08/03/2018; no âmbito dos trabalhos de verificação do investimento reportado no primeiro e único pedido de certificação das despesas apresentadas submetido em 24/11/2017, a entidade competente verificou a existência de um pagamento, no montante de € 38.000,00, montante esse efectuado em data anterior à candidatura; o investimento em causa representaria 18,70% do investimento elegível contratado e não foi identificado na candidatura da Autora efectuada pela Ré, como excepção do referencial de aprovação; por esse motivo, a entidade competente concluiu que o projecto apresentado pela Autora violava o requisito do efeito do incentivo; a Ré, em 16/04/2019, devolveu uma parte dos cheques emitindo uma nota de crédito no montante de € 25.132,25, cobrando, ainda assim, cerca de € 61.500,00 com IVA; em 19/03/2020 a Comissão Directiva do Norte 2020 aprovou a anulação do projeto, revogando o ato de concessão do apoio e à descativação de € 1.055.555,31 de Incentivo reembolsável Feder atribuído, e à recuperação, pela Agência Para o Desenvolvimento e Coesão, do valor já pago no montante de € 211.094,29 de Incentivo Total; a Autora, em 17/07/2020, enviou a Ré carta solicitando a devolução dos valores pagos a título de honorários no valor de € 61.500,00; em 16/09/2020, a Ré responde, alegando que as partes acordaram uma redução no preço dos serviços prestados para € 50.000,00; acordo que nunca aconteceu; a Ré jamais teria direito ao fee de sucesso, caso tivesse assinalado corretamente no formulário de candidatura a existência de investimentos com adiantamentos já realizados, porquanto a candidatura teria obtido, logo à partida, decisão desfavorável; em consequência do cumprimento defeituoso do contrato de prestação de serviços por banda da Ré, a Autora não recebeu a totalidade do incentivo reembolsável nem o incentivo não reembolsável; apesar da anulação da candidatura, a Autora cumpriu integralmente o projeto, pelo que era provável e possível receber tais incentivos».

Citada, a Ré contestou, pugnando pela «improcedência da acção e pela sua absolvição dos pedidos».

Fundamentou a sua defesa, essencialmente, no seguinte: «só no final do ano de 2017, e no momento em que o IAPMEI leva a cabo diligências de verificação do investimento e de certificação das despesas apresentadas é que a Autora deu conhecimento que por conta da despesa elegível nº1, havia realizado um adiantamento de 38.000,00€; tal adiantamento não foi identificado pela Autora no momento da apresentação do seu plano de investimento, como excepção, nem foi identificado pela mesma como despesa anterior ao projecto; à data da apresentação da candidatura, a legislação em vigor permitia a elegibilidade de despesas sinalizadas em momento anterior ao da apresentação da candidatura até 50%; tal legislação veio a ser alterada no decurso da apreciação desta candidatura, que atribuiu efeitos retroactivos, fundada em mais recentes orientações emanadas pela Comissão Europeia; a despesa elegível já constava do plano de investimento, e ainda que houvesse erro por banda da Autora ao não assinalar aquele excepção, tal omissão nunca poderia conduzir à revogação total do incentivo; notificada da decisão final de revogação da decisão de aprovação, Autora e Ré reuniram, sendo que, por motivos e razões que a Ré não pode compreender, não quis impugnar o acto administrativo e pretendeu, antes sim acomodar-se a uma decisão, que é infundada, ilegal e desproporcional; pese embora entendesse que tinha prestado os seus serviços à Autora, este pediu à Ré que fizesse um desconto ao preço fixado, e esta acedeu, acordando com aquela fazer um “acerto” naquela conta, e reduzir para 50.000,00€, acrescido de IVA o valor do preço, o que aconteceu em Abril de 2019; a Autora podia e devia ter reagido e impugnado judicialmente junto do Tribunal Administrativo e Fiscal o acto administrativo de revogação do projecto».

Foi proferido despacho saneador, no qual se identificou o objecto do litígio e se enunciaram os temas da prova.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença com o seguinte decisório: “Pelo exposto, o Tribunal julga a presente acção parcialmente procedente, e, consequentemente: - condena-se a R. a devolver à A. a quantia de 61.500,00 € (sessenta e um mil e quinhentos euros), com IVA, acrescida de juros de mora legais contados desde a citação e até integral pagamento; - absolve-se a R. do demais peticionado…”.

*1.2. Do Recurso da Ré Inconformada com a sentença, a Ré interpôs recurso de apelação, pedindo que seja “revogada a sentença recorrida e substituída por outra que julgue a acção totalmente improcedente”, e formulando as seguintes conclusões no final das respectivas alegações: “A. O presente recurso recai sobre matéria de facto, mas também sobre matéria de direito.

  1. A sentença recorrida padece de nulidade por excesso de pronúncia ao ter conhecido de questões sobre as quais estava impedida de o fazer, porque não colocadas pelas partes, nem de conhecimento oficioso.

  2. O Tribunal estava adstrito às questões relativas ao incumprimento contratual por parte da R. e à eventual indemnização por perda de chance, de acordo com as disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2 e 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC.

  3. Nunca foi colocada em causa nos autos o critério de fixação de honorários, nem a interpretação de qualquer clausula do contrato, pelo que o Tribunal ao conhecer das mesmas na sentença incorreu em nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC.

  4. Quanto à matéria de facto, a parte final do facto provado NN) é claramente conclusiva, pelo que deve ser expurgada a parte em que refere “montante manifestamente indevido e não correspondente ao benefício realmente obtido pela Autora”.

  5. Nos termos do disposto no artigo 640º / nº 1 alínea a) do C.P.C., encontra-se incorrectamente julgado, e por isso vai concretamente impugnado o facto provado nº7 elencado na sentença em crise, impondo decisão diversa, nos termos do disposto o artigo 640º / nº 1 alínea b) do C.P.C. o documento n.º13 junto com a P.I. e n.º5 junto com a Contestação.

  6. Assim, o facto não provado n.º7 deveria ter sido considerado provado por força da conjugação dos factos provados JJ) e NN) (expurgada a parte conclusiva) e atendendo ao comportamento concludente da A. desde a notificação da intenção do IAPMEI em revogar a decisão de concessão de apoio, comunicada em 16/05/2018, tendo esta emitido em concordância com a R./Recorrente cheques para o dia 20/05/2018, 20/06/2018, 20/07/2018, 20/08/2018 e 20/09/2018.

  7. A A./Recorrida com o seu comportamento demonstrou a sua concordância em pagar os serviços prestados pela R., até porque o objectivo fixado no contrato havia sido alcançado.

    I. Veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 09/07/2014, processo n.º299709/11.0YIPRT.L1S1, disponível para consulta em www.dgsi.pt , onde ficou sumariado: «1. Na definição legal, a declaração tácita é a que se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam – art. 217º nº 1 do CC.

    1. Os factos de que a vontade se deduz...

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