Acórdão nº 305/15.6GAVLC.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA JOANA GRÁCIO
Data da Resolução26 de Outubro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. n.º 305/15.6GAVLC.P1 Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo de Competência Genérica de Vale do Cambra Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto (…) Para análise destas questões que importa apreciar releva desde logo a factualidade subjacente, sendo do seguinte teor o elenco dos factos provados e não provados constantes da sentença recorrida (transcrição): «II – Fundamentação de facto 1.

Factos Provados Discutida a causa, provou-se que: Da acusação pública 1. No dia 5 de dezembro de 2015, cerca das 18:20 horas, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..-PP-.., de marca Fiat, modelo ..., pela Avenida ..., em ..., Vale de Cambra, o que fazia no sentido descendente daquela via.

  1. No local, a faixa de rodagem é constituída por duas vias de trânsito no mesmo sentido, tem 7,10 metros de largura, com inclinação de 3%, sendo o respetivo pavimento betuminoso.

  2. Não chovia nem havia nevoeiro e o piso encontrava-se seco e limpo.

  3. O arguido conduzia a uma velocidade não concretamente apurada, mas superior a 50,00 km/h, 5. O que determinou que, quando se encontrava já a sair da rotunda... e a entrar na Avenida ..., não tenha imobilizado o veículo que conduzia a tempo de evitar o embate no corpo da vítima AA, que se encontrava naquele momento a atravessar a via, o que fazia pela passadeira.

  4. Na verdade, devido à forma desatenta a que seguia viagem e a velocidade que imprimia no veículo, não prestando inteira atenção ao que se passava na faixa de rodagem, nomeadamente se ali circulavam pessoas, não foi o arguido capaz de imobilizar a sua viatura, sem antes embater no ofendido.

  5. Como consequência do embate descrito, a vítima sofreu lesões traumáticas crânio-meníngeo-encefálicas, torácicas e do membro inferior direito, associados com choque hipovolêmico, o que foi causa direta e necessária da sua morte.

  6. O arguido sabia que ao conduzir desatento e a uma velocidade não permitida pela lei e que não adequou concretamente às características da via, nomeadamente pelo facto de se aproximar de uma passadeira, sendo previsível o surgimento de peões, tal conduta seria apta a produzir o resultado verificado e, não obstante, conduziu da forma supra descrita.

  7. Sabia que a sua descrita conduta era censurada e proibida por lei.

    Da acusação particular 10. No dia 5 de dezembro de 2015, cerca das 18:20 horas, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros matrícula ..-PP-.., na Av. ..., da freguesia ..., concelho de Vale de Cambra, no sentido descendente desta, tendo entrado e contornado parcialmente a rotunda..., após o que mudou de direção à direita, entrando na Avenida ....

  8. Nesse local, o troço é constituído por duas faixas de rodagem, separadas por um passeio/separador central, cada uma delas com duas vias de trânsito para cada sentido (sem marcas delimitadoras de vias), com traçado retilíneo e inclinação descendente de 3% (três por cento), considerando o sentido de marcha do veículo ..-PP-...

  9. Sendo a largura da faixa de rodagem, no sentido descendente, de 7,10 metros, com pavimento de asfalto betuminoso, que, nas referidas circunstâncias de tempo, se encontrava em bom estado de conservação, seco e limpo.

  10. A faixa de rodagem no sentido descendente encontrava-se delimitada, de ambos os lados, por guias (marcas M19).

  11. A velocidade máxima permitida naquele local é de 50 km/h (cinquenta quilómetros por hora), sendo a via ladeada de habitações e tratando-se de uma via situada dentro de uma localidade.

  12. Na rotunda que antecede a Av. ... encontrava-se colocado o sinal vertical de obrigação “D4”, indicando aos condutores a entrada numa rotunda; 16. E à entrada na Av. ..., atento o sentido de marcha do veículo ..-PP-.., encontravam-se apostas na via, em tinta branca bem visível, marcas transversais “M11”, que consistem em barras longitudinais paralelas ao eixo da via, alternadas por intervalos regulares, indicativas do local por onde devem os peões efetuar o atravessamento da faixa de rodagem, faixas essas que estavam apostas nas duas vias de trânsito para cada sentido.

  13. Nas referidas circunstâncias de tempo e lugar, não chovia nem estava nevoeiro, encontrando-se o piso seco e limpo.

  14. No momento do acidente, a via estava dotada de iluminação pública que possibilitava boa visibilidade ao arguido.

  15. Era possível ao arguido avistar a totalidade da passagem assinalada na faixa de rodagem para travessia de peões a uma distância de, pelo menos, 30 (trinta) metros.

  16. Nas referidas circunstâncias de tempo e lugar, AA atravessou a via de trânsito ascendente da dita Av. ..., da esquerda para a direita, atento o sentido do veículo ..-PP-.., o que fez pela referida passadeira e até chegar ao passeio/separador central.

  17. Uma vez neste passeio central, aproximou-se da via de trânsito descendente da dita Av. ... e iniciou o seu atravessamento, na mesma passadeira.

  18. No momento em que AA efetuava tal travessia na mesma passadeira e já tinha percorrido uma distância de não concretamente apurada mas de mais de metade da faixa de rodagem, desde o passeio central, o arguido, em virtude da velocidade e desatenção com que seguia, não travou nem imobilizou o veículo que tripulava no espaço livre e visível à sua frente em tempo e modo de evitar o embate, vindo a bater com a lateral frontal esquerda do veículo (parte inferior do para-choques deste) no membro inferior direito do AA.

  19. Em consequência direta e necessária desse embate, AA foi projetado na diagonal pelo ar por, numa distância superior a 20 metros, ficando imobilizado na via de trânsito descendente, na posição de decúbito ventral, com a cabeça encostada ao passeio central e os pés em plena via, direcionados para o eixo da mesma.

  20. Devido à violência do embate e da sua subsequente projeção e queda, AA sofreu lesões traumáticas crânio-meníngeo-encefálicas, torácicas e do membro inferior direito, designadamente: nos ossos da cabeça (abóbada), fratura ao nível da região temporal esquerda com 3 centímetros de diâmetro; outra na região parietal à direita com traços lineares com 7 centímetros por 8 centímetros de comprimento com infiltração sanguínea dos tecidos moles adjacentes e topos ósseos; nos ossos da cabeça (base), fraturas lineares ao nível do andar anterior médio e posterior, com infiltração sanguínea dos tecidos moles adjacentes e topos ósseos; na cabeça, meninges, hemorragia subdural e subaracnoídea em toda a superfície do encéfalo, mais acentuada na região occipital bilateralmente; no tórax, paredes, fraturas com infiltração sanguínea dos tecidos adjacentes e topos ósseos dos 1.º até 3.º arcos costais na linha média anterior e dos 1.ºaté 10.º posteriores à direita; no tórax, clavícula, cartilagens e costelas direitas, fraturas com infiltração sanguínea dos tecidos adjacentes e topos ósseos dos 1.º até 6.º arcos costais na linha média anterior à esquerda; tórax, pericárdio e cavidade pericárdica, laceração traumática e do pericárdio com infiltração sanguínea dos tecidos moles adjacentes com 8 centímetros de comprimento; membros, membro inferior direito, fratura exposta ao nível do terço inferior da perna.

  21. As lesões descritas no ponto anterior, associadas a choque hipovolêmico, foram a causa direta e necessária da morte de AA.

  22. Após o embate, o veículo ..-PP-.., conduzido pelo arguido, ficou imobilizado junto do limite direito da via de trânsito descendente, a uma distância de cerca de 50 metros da passagem para peões localizada na via de trânsito descendente da dita Av. ... pela qual o referido AA efetuava o atravessamento.

  23. No pavimento não existiam marcas de travagem nem outras marcas de pneumáticos.

  24. Em virtude do embate, o veículo conduzido pelo arguido ficou com a ótica esquerda, capô e para-brisas danificados.

  25. O arguido atuou de forma livre e consciente, conhecendo as regras de cuidado a que estava obrigado para a condução de veículos automóveis, bem sabendo que circulava numa via ladeada de habitações e que, naquele local, devia reduzir especialmente a velocidade a que seguia e dedicar a sua atenção ao trânsito e aos peões, por se aproximar de uma passagem para peões, o que o arguido não fez, apesar de saber que poderiam surgir peões a quem tinha o dever de ceder passagem, e que, ao agir desse modo, punha em perigo os eventuais utilizadores da mesma, não conseguindo imobilizar o veículo em segurança sem atingir os demais utentes da via, o que efetivamente veio a suceder.

  26. Em virtude de conduzir a velocidade excessiva para o local e de não ter reduzido em face da aproximação da dita passagem para travessia de peões, o arguido atuou com imprudência, de forma leviana, desatenta e descuidada, não travando, nem imobilizando o veículo que conduzia de forma a evitar o embate, não tendo atuado como devia e podia, omitindo os deveres de atenção que, enquanto condutor, lhe era imposto e de que era capaz, prevendo que, ao atuar desse modo, poderia provocar, como provocou, um acidente e a morte dos peões que efetuassem a travessia daquela passagem para peões e que por si fossem atingidos como aconteceu com o AA, mas sem que se tivesse conformado com esse resultado.

  27. Esta forma de agir do arguido fê-lo embater com a sua viatura no peão AA que atravessava a via na passadeira.

  28. O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

    Exclusivamente do pedido de indemnização civil 33. AA faleceu no mesmo dia do descrito acidente (05.12.2015).

  29. Nascido em .../.../1967, à data do acidente e do seu óbito tinha 48 anos de idade.

  30. Faleceu no estado de solteiro, sem deixar descendentes, 36. Tendo deixado a suceder-lhe a sua mãe BB, 37. Por contrato de seguro titulado pela apólice n.º ..., a demandada assumiu a responsabilidade pelos danos causados a terceiros emergentes da circulação do veículo automóvel ligeiro de passageiros, matrícula ..-PP-...

  31. Mercê do acima descrito acidente, AA sofreu as já descritas lesões traumáticas, associadas com choque hipovolêmico, em...

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